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Capítulo Trinta e Oito: Lâminas Quebradas.

A dupla, composta pela vidente e o mercenário, seguiu pelas várias selas da masmorra, todas vazias, não haviam janelas, e em certos pontos estava escuro como se o manto da noite já tivesse sido jogado sobre elas.

--- Por que não há prisioneiros aqui? --- Kalias perguntou, após a ruiva avisar que estavam perto.

--- As masmorras são divididas em alas, vários prisioneiros estão nas outras, essa aqui é especial. --- Eles viraram a direita --- Há correntes nas paredes para prendê-los, por isso tantas chaves.

--- Uma ala para os prisioneiros mais perigosos. --- Constatou.

--- Exatamente. Ali...acho que é aquela sela, vamos.

A última sela estava escura, havia uma tocha acesa na parede logo a frente dela, e lá dentro, quatro figuras estavam acorrentadas a parede.

--- Que estado deplorável. --- Meifie franziu as sobrancelhas, pondo uma das mãos numa das barras de ferro --- Questiono-me se vão ser uma ajuda, ou um atrapalho.

Kalias parou ao lado da ruiva, olhando para dentro da sela cheia de sombras. Ele reconheceu o cavaleiro Levi, a um canto estava em pé, rosto fatigado e preocupado, encarava-o com surpresa.

Apolo, que estava sentado num grande bloco de pedra, não parecia se importar com as correntes, e logo ficou de pé, assim como uma das gêmeas, que o assassino reconheceu como sendo Ice.

Meifie estava procurando a chave para abrir a fechadura da porta da sela, quando ele a viu, estava sentada no chão, parecia abatida, e ele notou sangue no sobretudo de Alasca quando ela o encarou.

--- Achei que não viria. --- Apolo começou, olhando-o de cima abaixo --- Onde está Octávia? Ela está aqui?

--- Está, na sala do trono com a rainha.

Respondeu o assassino, pondo as mãos nos bolsos para evitar a vontade de partir as barras ele mesmo.

Meifie abriu a porta, e ele foi o primeiro a entrar.

--- Com a rainha? E ela está bem? --- Levi perguntou, tentando mover as mãos acorrentadas --- Você está mesmo nos ajudando?

--- É o que parece. --- Ele caminhou até a gêmea de olhos azuis.

Meifie soltava as correntes de Apolo, e o loiro sentiu seus braços reclamarem de dor. Não havia pregado os olhos durante a noite e as correntes machucavam sempre que se movia, seus pulsos estavam roxos.

--- Parece que você cumpriu com sua palavra. --- Alasca disse ao assassino, em um sussurro, quando ele se abaixou --- Obrigada.

Kalias a olhou um pouco surpreso, então sorriu, segurando-a pela cintura fina e a pondo de pé, para responder:

--- Não tem de quê, princesa.

A bruxa sentiu o rosto esquentar pelo modo como ele falara o apelido, havia algo no assassino que fazia seu coração palpitar, então observou a moça ruiva soltar seus amigos, e começou:

--- O quê está acontecendo aqui, exatamente? --- Alasca franziu as sobrancelhas, aflita.

Ela olhou para todos na sela, cansados e preocupados, a ruiva jogou uma chave para Kalias e ele soltou a gêmea de olhos azuis, que massageou os pulsos doloridos.

--- Vocês aqui, e Octávia com a rainha, ela está bem? --- Insistiu a jovem.

--- Realmente não posso garantir isso, ela deve estar tendo alguma diversão com os guardas e cavaleiros enquanto soltamos vocês, então agradeçam a ela depois. --- Meifie quem respondeu --- Agora temos mesmo que sair daqui, explicamos no caminho.

--- Então vamos sair. --- Ice concordou.

Um a um eles saíram da sela, de volta ao corredor, a ruiva se pois a explicar a situação, a quantidade de guardas e o caminho até a sala do trono.

--- Estou surpresa por vocês terem se mantido tão quietos enquanto estavam presos, eu esperava... alguma resistência. --- A vidente de cabelos ruivos comentou.

--- Não podíamos nos dar ao luxo de tentar algo, nossa situação era delicada, e a rainha havia nos dado mais um tempo de vida. --- Apolo respondeu --- Ela estava esperando por algo e nós também.

--- Poderiam ter saído, se quisessem. --- Rebateu a ruiva --- Mas seriam mortos.

--- Sair daqui teria custado nossa carta na manga. --- O loiro disse, um sorriso no canto dos lábios.

--- Carta na manga? --- Repetiu Kalias, levantando uma sobrancelha.

Eles viraram a esquerda, em meio as tantas e sombrias selas vazias da masmorra. Alasca se pois ao lado do mercenário de olhos azuis, que ainda tinha a sobrancelha levantada.

--- Agora que está nos ajudando... --- Começou a jovem de cabelos platinados --- Há uma ou outra coisa de que deve saber.

--- Sou todo ouvidos. --- Ele deu de ombros, olhando-a de canto.

A princesa mordeu os lábios, enquanto Meifie explicava a disposição dos guardas para o plano de saírem das masmorras, Alasca começou a contar:

--- Octávia não é a única bruxa aqui, vi que a sua... amiga ali, tem os olhos de uma vidente, então imagino que ela já saiba, mas você não parece saber, minha irmã e eu... --- Ela hesitou --- Somos bruxas também.

--- Bruxas? --- Repetiu ele, surpreso.

--- Sim...finalmente achei uma coisa da qual você sabia. --- Ela sorriu --- É a primeira vez que consigo deixá-lo surpreso, Kalias.

O mercenário sorriu admirado, havia algo nas palavras da jovem, um tom ameno e amável, que fazia querer sorrir o tempo todo. Ele assoviou baixinho.

--- Mas algum segredo seu que eu deva saber? Alasca. --- Kalias praticamente sussurrou o nome da princesa.

A gêmea de olhos azuis olhou para o chão, envergonhada, o outro sorriu, pondo as mãos nos bolsos, e fazendo questão de ficar ao lado da bruxa.

Ice franziu as sobrancelhas ao olhar para a dupla atrás dela, e só não fez um comentário sobre a situação, graças a Apolo, que envolveu a princesa na conversa.

--- Aquela é a porta para fora daqui, se ainda não vieram nos procurar, quer dizer que não deram por falta das chaves. --- Meifie parou, alguns metros entre eles e a porta --- Ninguém vai descer até aqui, todavia, não vão sentir falta dos guardas.

--- Assim espero. --- Comentou Levi, respirando fundo.

Meifie saiu correndo das masmorras, e abriu a porta de madeira com um estrondo, ofegante, com as mãos nos joelhos, e medo refletindo nos olhos castanhos avermelhados.

--- Os prisioneiros estão fugindo! Eles estão fugindo! --- Exclamou para os seis guardas do salão.

Dois deles avançaram pela porta, enquanto a ruiva convencia os demais a fazerem o mesmo. Uma vez dentro das masmorras, os guardas foram nocauteados.

--- Que tipo de guardas são vocês?! Vão ajudá-los! --- A ruiva mandou, jogando as mãos para cima --- Vou chamar os cavaleiros!

Ela viu os oficiais trocarem olhares, e então saíram de seus postos para a masmorra, enquanto ela começava o caminho até as escadas.

A ruiva parou no primeiro degrau de pedra, ouvindo o som de lâminas se chocando, e exclamações de dor, então quando o barulho cessou, ela voltou para abrir a porta, e encontrar meia dúzia de guardas desacordados.

--- Eu disse que meu plano funcionaria! --- Meifie sorriu, pegando o aro de chaves de dentro do decote --- Coloquem-os nas selas.

Apolo, Levi e Kalias arrastaram os guardas para as selas, onde a ruiva os acorrentou a parede, trancando a porta após todos saírem para o salão.

--- Certeza de que não irão dar por falta deles tão cedo? --- Alasca questionou.

O grupo subia a escadaria de pedra para fora das masmorras, Levi e Apolo agora com espadas em punho. Ouviram um barulho alto, indicando que algo havia explodido andares a cima.

--- Sua amiga está sendo uma ótima distração, não temos que nos preocupar. --- A ruiva soltou um suspiro, a escadaria havia acabado --- A maior parte dos cavaleiros, se não na sala do trono, está a caminho dela, o que significa que sua amiga tem problemas.

--- E o que faremos? --- Apolo perguntou, enquanto os outros se juntavam ao círculo que haviam formado.

--- Tiramos a rainha da sala do trono.

A sala do trono estava destruída. Janelas quebradas, cortinas em chamas e sangue, muito sangue, em toda parte, no chão, nas paredes, e em Octávia.

A bruxa de cabelos loiros estava ofegante, sangue sujando suas roupas, seu rosto, suas mãos. A rainha Yracedette, com um corte na perna, estava em pé, ao lado do trono, onde também estava o príncipe, Ângelo.

Haviam muitos cavaleiros e guardas pelo chão, alguns mortos, outros apenas feridos, um ou outro ainda estava de pé.

--- O quê estão esperando?! Matem-na! --- Gritou o príncipe.

A bruxa fechou a mão em direção ao trono, ele tremeu, sua base de mármore explodiu e a bruxa o jogou sobre os guardas que restavam, derrubando metade de uma das paredes no processo.

--- Vossa alteza parece-me assustada... --- Octávia tombou a cabeça de lado, ofegando --- Está com medo de uma bruxa?

Yracedette tremeu, recuando lentamente. O príncipe lançou um olhar sugestivo para o buraco recém aberto na parede.

--- Deveria me temer. Eu acabo com seus cavaleiros se quiser, queimo seu reino se achar que devo. --- Ela pegou uma espada caída no chão --- E mato você se tiver vontade.

O príncipe Ângelo avançou em direção ao buraco na parede, e antes que Octávia podesse impedi-lo, cavaleiros bem armados entraram pelas portas e cercaram a loira.

--- Matem-na! --- Yracedette ordenou, antes de correr para fora da sala.

A loira respirou fundo, sentido uma agonia atravessar seu corpo junto com o medo da morte. Ela estava encurralada.

A porta e toda a parede que a recebia foram explodidas em chamas brancas e gelo. Cavaleiros voaram pelo ares junto com os destroços de pedra e madeira, então Ice, Alasca e Apolo adentraram a sala do trono.

--- Vá atrás deles! --- Gritou o loiro.

Octávia sentiu alívio percorrer seu corpo, e sorriu, avançando pela mesma abertura por onde os soberanos haviam passado, e deixando os cavaleiros nas mãos de seus amigos.

--- Já ouviu aquele ditado... --- Apolo começou para Ice.

Alasca incendiava a abertura por onde a amiga acabara de passar, impedindo que os cavaleiros fossem atrás dela.

A bruxa de olhos brancos encarou o loiro, e ele continuou, empunhando a espada.

--- ...onde diz que, lâminas quebradas são tão afiadas quanto uma inteira? --- Ele levantou as sobrancelhas.

O cavaleiros cercaram o trio.

Apolo sorriu, puxando a bruxa de olhos brancos pelo pulso e dando um beijo rápido em seus lábios antes de continuar:

--- Vamos mostrar que os cavaleiros não são tão bons assim.

Ice o encarou surpresa, então sorriu assentindo.

E o trio se preparou para garantir que ninguém sairia daquela sala, eles a guardariam com suas próprias vidas, pois muitas dependiam deles, e seus amigos dependiam deles. Jeter dependia.

Sangue e suor, ataque e defesa, lâmina e magia, todos seriam usados para garantir um futuro. Um recomeço, mesmo que eles não estivessem nele.

Meifie espiou o corredor atrás de uma parede, então viu o príncipe sair correndo da sala do trono, por uma abertura na parede. Ângelo Abraxs era mais ágil do que aparentava.

--- Onde está a rainha? --- Kalias levantou as sobrancelhas.

Cavaleiros entraram na sala, aos montes, Levi, a vidente e o druida observaram as gêmeas e Apolo cruzarem o corredor em direção as portas, enquanto a rainha Darot corria pelo mesmo buraco que seu noivo.

--- Estão descendo por um atalho. --- Disse Levi, vendo que o casal corria em direção a uma escadaria que ele conhecia.

O ex cavaleiro saiu de detrás de uma armadura quando ouviu a explosão da entrada de seus amigos na sala do trono, Meifie e Kalias o alcançaram a tempo de ver Octávia passar pela abertura na parede.

--- Octávia! --- O ex cavaleiro chamou.

A bruxa se virou depressa para ele, o reconhecendo imediatamente e correndo para abraçá-lo, sem se importar com o sangue em suas roupas, ou com a difícil situação em que estavam.

--- Bruxas são mais resistentes do que pensei... --- Sussurrou Levi, apertando a loira, com a voz emocionada.

--- Já disse que sou forte, não ia me curvar para um rainha maldita! --- A bruxa riu, pendurada no pescoço do amigo.

Meifie havia avançado em direção a escadaria por onde Yracedette e Ângelo haviam descido, enquanto a loira e o ex cavaleiro se separavam. Kalias os observou em silêncio.

--- Parece que estamos devendo uma a você. --- A loira encarou o mercenário, séria --- Obrigada.

--- Me agradeça se sobrevivermos. --- Ele levantou o queixo --- Yracedette ainda está viva até onde sei, então temos coisas a fazer.

Kalias acompanhou Meifie no topo da escadaria, Octávia e Levi começaram o caminho até eles, a passos rápidos.

--- Para onde essa escadaria leva? --- A loira questionou ao amigo.

--- É um atalho para o pátio externo... os cavaleiros que restam estão lá! É... é uma emboscada! --- O ex cavaleiro correu para chegar a escadaria.

Kalias e Meifie pararam nos primeiros degraus da escadaria, ouviram explosões vindas da sala do trono, e Octávia os acompanhou.

--- Vão nos emboscar lá em baixo, os cavaleiros que restam a Berg estão lá. --- Levi avisou, respirando fundo várias vezes --- Vai ser difícil passar por eles.

--- Não vamos saber sem tentar. --- A vidente disse, decidida ao começar a descer a escadaria --- Se os cavaleiros estão esperando alguém, vamos dar a eles uma distração.

A ruiva se pois a descer correndo, os outros três a acompanharam na corrida, não havia nenhum guarda atrás deles, mas o tempo não estava a favor.

--- Se Yracedette conseguir fugir, não teremos outra oportunidade! --- Kalias ressaltou, um pouco ofegante pela corrida --- Que tipo de...distração acha que pode...funcionar?

--- Acredito que uma bruxa e uma vidente sejam bastante...chamativas para segurá-los! --- Octávia quem respondeu.

--- Vai...ficar...para trás? --- Levi perguntou, incrédulo, se esforçando para ficar ao lado da loira.

--- Vou...e Jeter vai ficar nas...mãos de vocês!

Eles chegaram ao fim da escadaria, ofegantes, havia um corredor a frente, e um desvio para a esquerda. Eles entreolharam, teriam que se separar.

--- O desvio vai levar vocês duas diretamente aos cavaleiros, eles devem estar protegendo a rainha e o príncipe. --- Começou o ex cavaleiro --- Kalias e eu vamos pelo corredor, esperar o momento certo para nos aproximar.

--- Boa sorte. --- Octávia desejou, dando um abraço rápido em Levi --- Para os dois.

Ela encarou o mercenário, e ele assentiu, então pegou a adaga que trazia na cintura e a estendeu para a loira, dizendo:

--- Acho que já usou muito da sua magia, bruxa.

Octávia pegou a adaga, então Meifie alertou sobre o tempo curto, e desejando boa sorte, se afastou deles, a loira a seguiu, e os dois homens saíram correndo na direção contrária.

Era tudo, ou nada.

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