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Capítulo Nove: Quanto Vale a Honra?

A chuva estava mais calma quando Octávia decidiu ir dormir, os trovões haviam parado e os relâmpagos já não iluminavam mais os céus e a floresta lá fora.

A loira estava mesmo cansada, não fisicamente, havia algo lhe perturbando a mente, mas não sabia o que era. Um angústia que tomava seu peito, sufocando.

A camisola que Merlin lhe entregou era três tamanhos acima do seu, visto que ela, apesar de comer muito na frente dos outros, estava magra, e apenas Apolo sabia o quão magra ela havia ficado após deixar Estelin.

Os outros podiam não ver, mas a comida que entrava, não ficava muito tempo em seu estômago.

A cama era macia, e o cansaço venceu a assassina antes que seus fantasmas vivessem assombrar seus sonhos, e ela dormiu.

Foi o canto dos pássaros que acordou Octávia na manhã seguinte, a chuva já havia passado, mas seu frescor banhava a floresta lá fora e isso, de alguma forma a alegrava.

A loira tratou de se levantar logo, ficar deitada até tarde não ajudaria em nada. Vestiu o simplis vestido verde, de corte fechado, com mangas até os pulsos, da noite anterior e passando as mãos pelos cabelos, se perguntou se não seria mais fácil pentear a juba de um leão.

Na mesinha de cabeceira havia uma jarra com água, um espelho redondo e um pente de madeira, e ela logo tratou de pegá-lo.

Enquanto penteava os cabelos loiros e longos, Octávia colocava os pensamentos e acontecimentos do dia anterior em ordem.

Floresta. Emboscada. Mercenários. Carnificina. Apolo. Taber. Merlin e Levi. Cavaleiros e Feiticeiros. Príncipe tirano. Jeter e sua queda eminente. Problema.

Ela balançou a cabeça após terminar a trança única que fez no cabelo, e abriu as janelas para ver a floresta molhada e o céu nublado.

Apolo havia partido depois do almoço no dia anterior, ela e Levi saíram em seguida, gastaram a tarde toda a pé para chegar a cabana de Merlin, e Octávia não esqueceria da má vontade de Trovão durante todo o caminho.

Se os cálculos de Apolo forem exatos, o que quase sempre eram e ela admitia que o amigo era muito inteligente, o loiro deveria chegar a Taber ao escurecer do dia seguinte, e Octávia já estava anciosa para receber notícias do amigo.

--- Dormiu bem?

Merlin estava bem humorado no café da manhã. A mesa já estava posta, e Levi não estava lá quando Octávia se sentou para comer.

--- Melhor do que pensei. Onde está Levi? --- A loira pegou um pedaço de pão, tentando ver o quintal pela porta aberta.

--- Ele foi dar uma olhada em Trovão, alimenta-lo, e conversar com ele, as vezes é necessário falar com Trovão, ele é um cavalo sentimental. --- O feiticeiro explicou, se sentando no banco de frente a assassina.

--- Aquele cavalo não é normal, já percebeu isso? --- Ela sorriu sarcástica --- Mas considerando o dono que tem, não estou surpresa.

--- Trovão é um cavalo difícil, mas Levi o ajudou a melhorar. --- Merlin começou a comer.

--- Ele era pior?! --- Octávia se assustou, Merlin sorriu.

--- Nem queira saber.

Eles já estavam na metade da refeição quando Levi entrou, segurando a mão direita com a esquerda, tentando esconder o pouco de sangue que escorria a pelos dedos queimados de sol.

--- Ele te mordeu, não mordeu? --- Octávia escondeu o sorriso comendo um pedaço de bolo.

--- Tivemos um mal entendido. --- Levi sentou a mesa, contrariado --- Nada fora do comum.

Merlin revirou os olhos escuros, pegando a mão de Levi e deixando que uma suave névoa azulada envolvesse a mordida, e quando a soltou, a mão de Levi estava completamente curada.

--- Feiticeiros e seus truques. --- Murmurou a loira, diante o olhar surpreso do ex cavaleiro.

--- Acabei de me lembrar que vocês não explicaram como se conheceram, nem de que, ou quem, estavam fugindo quando chegaram aqui. --- O feiticeiro comentou.

Octávia e Levi trocaram olhares rápidos, e a assassina começou a contar.

--- Nos conhecemos em Tíbia, há quase uma semana, alguns mercenários tentaram matar Levi, mas Apolo e eu conseguimos ajudá-lo.

--- Apolo? E quem seria esse? --- Merlin franziu as sobrancelhas.

--- Apolo é um amigo meu, ele está a caminho de Taber agora. --- A loira respondeu --- Está verificando se é seguro irmos até lá, sabe, não somos bem vindos em alguns reinos.

Merlin não pode evitar de olhar com reprovação para a loira, mas Levi tomou a narrativa da história, contando como ele fora apresentado a Madame Boss, sobre como saíram de Tíbia e a decisão de viajar para Oeste, juntos, sobre os vilarejos pelos quais passaram e os dias na estrada, até a chegada a floresta, o encontro com os mercenários e a separação do grupo para que Apolo fosse a Taber e ele e Octávia chegarem até aquela cabana.

--- Vocês têm passado por uma aventura e tanto. --- Merlin analisou, começando a tirar a mesa --- Vocês podem ficar aqui por quanto tempo desejarem, eu não me incomodo.

--- Obrigada, Merlin. --- Octávia agradeceu, frisando o nome do feiticeiro --- Vou ficar lhe devendo uma, caso queira se livrar de alguém, eu...

--- Acho que essa conversa já pode ser encerrada. --- Levi a interrompeu, olhando sério para a loira --- Marcos, o que acha que devo fazer? Em relação ao príncipe.

O feiticeiro ficou em silêncio por alguns segundos, então respondeu:

--- Jeter está em perigo, e se você tem informações que podem impedir que nosso continente caia, deveria interferir. --- Ele encarou o amigo --- Mas fique sabendo que não será fácil, se o Príncipe Ângelo souber que você está tentando atrapalhar os planos dele, não vai tardar em tentar te matar.

--- Um caminho como esse é sem volta. --- Octávia acrescentou.

--- Se eu expor o príncipe... --- Começou Levi --- E salvar Jeter, acha que minha honra vai ser restabelecida?

--- Está preocupado com sua honra? Não em que tipo de morte horrível vai ter se o Príncipe Ângelo por as mãos em você? --- Merlin se admirou.

--- A morte é uma opção boa para alguém que não tem motivos para continuar respirando.

Octávia ficou de pé, com as sobrancelhas franzidas.

--- Sua vida não se resume a coroa! --- A loira exclamou --- Quanto está disposto a arriscar por sua honra? Quanto ela vale para você?

Físia, Cidade-Capital de Taber...

Apolo encarou a janela fechada da estalagem onde estava hospedado, mal havia tocado na comida, a penumbra da noite do outro lado do vidro parecia convidativa para uma caminhada.

Ele amava caminhar a noite, no silêncio de sua própria mente, nas suas conversas internas, com seus pensamentos e seus fantasmas.

O loiro encarou o papel sobre a escrivaninha.

Sua letra estava lá, curvada e elegante, poucas palavras num pedaço pequeno e amarelado de papel, a pena e o tinteiro ainda lá. A mensagem simplis devia ser entregue a Octávia o mais rápido possível.

Querida, O.H.

Taber continua a ser o reino mais pacífico de Jeter, e Físia é completamente segura para nós. Estou bem. Você e o Lord pedrada podem vir assim que puderem.

Atenciosamente A.H.

O loiro enrolou o bilhete e o prendeu com uma fita azul. Um gracioso falcão de penas pretas e brancas aguardava na ponta da escrivaninha.

Ele e o animal já estavam habituados um com o outro, Apolo o usava para mandar recados a Ria, a moça que era sua informante e, algo a mais.

--- Já sabe o quê tem que fazer, entregue isso aquela maluca, está bem? --- Apolo prendeu o recado na perna do animal.

O falcão saltou para o ante braço do loiro, e Apolo não se incomodou com ele, andou até a janela, a abriu com um leve empurrão e deixou que o falcão voasse para os céus, sumindo nas sombras da noite.

--- Não acredito que estou sentindo falta até do cavalo. --- Apolo balançou a cabeça e fechou a janela.

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