54_ Coração partido
( Narrado por Gabriel )
Faziam, sei lá, uma ou duas horas que estava dentro do meu carro, parado do outro lado da rua, esperando o momento que ela fosse aparecer.
Ela não ia querer minha carona. Eu sabia. Então por que eu estava ali?
Parte de mim não conseguia entender o que aconteceu. Parte de mim queria uma explicação. Queria entender que merda tinha acontecido para ela ter mudado de opinião tão rápido. Não entrava na minha cabeça que a garota que olhou nos meus olhos e disse que amava, agora já não sentia mais nada por mim e achava melhor terminarmos. Não entrava na minha cabeça que a garota que disse para mim que eu havia alcançado o padrão de relacionamento que ela idealizou através dos livros, agora já não queria mais ficar comigo.
Parte de mim só queria ouvir uma resposta, mesmo que fosse dolorosa. Eu só queria ouvir da boca dela para parar de me torturar assim.
Infelizmente, a outra parte acreditava fielmente que eu já sabia o motivo. Que outro motivo poderia ser a não ser que ela fez comigo o que as últimas fizeram? Nas últimas três vezes que tentei me relacionar sério com alguém, fui deixado de lado sem nenhum motivo plausível. É claro, tirando a vez que preparei tudo para o nosso aniversário de três meses e ela terminou comigo dizendo que voltaria para o ex.
A outra parte de mim estava certa de que Marina havia sido só mais uma que ficou comigo, seja lá por qual motivo, mas que já se cansou. Parecia que eu causava isso nas pessoas. Elas se cansam de mim.
Apertei os olhos ao passo que minhas mãos apertaram o volante. Eu não queria acreditar nisso. Não fazia sentido. Não consigo olhar nos olhos dela e pensar que ela não gostava mesmo de mim. Ela me ama, eu sinto isso, por isso não consigo entender o que pode realmente ter acontecido.
Foi quando ela apareceu no meu campo de visão. Saindo do apartamento de sua tia com alguns livros na mão e a bolsa pendurada no ombro. Os cabelos estavam presos num rabo de cavalo e seu rosto não se ergueu para olhar em volta.
Na hora senti o meu coração pular no peito. Me remexi no banco do carro e toquei a porta na intenção de sair e ir na direção dela, mas hesitei.
Marina ergueu o olhar apenas para atravessar a rua e chegar ao ponto de ônibus. Ela estava poucos metros de mim. Minha vontade era sair daquele carro, correr até ela e implorar para esquecer tudo o que possa ter ocasionado o dia de ontem e voltar para mim. Eu a colocaria no meu carro e levaria para o mais longe possível, apenas para ficarmos juntos por umas horas sem interferência de qualquer outra coisa.
Infelizmente não foi isso que fiz. Eu não suportaria ser rejeitado mais uma vez.
Eu vi tanta certeza em seus olhos ontem que não acredito que ela vá voltar atrás, e isso me machuca de uma forma que sinto como se meu coração estivesse sendo arrancado do meu peito.
E é essa a sensação que estou sentindo desde ontem. Que alguém arrancou o meu coração e o jogou para cães comerem. Me sinto vazio. Puro. Oco.
Continuei observando-a até o ônibus aparecer e leva-la para o destino onde eu deveria leva-la.
Observei o livro que eu estava lendo para dar a ela naquele mês. Estava jogado sobre o banco do passageiro. Ela devia encontra-lo hoje e eu poderia só ficar olhando para ela enquanto demonstra animação por ter outro livro para ler.
Meus olhos passaram para a aliança em meu dedo. Eu devia tirar? Se sim, por que ela parece pesar toneladas?
[...]
ㅡ Liberados. ㅡ Voltei a minha mesa enquanto ouvia o arrastar das cadeiras dos alunos.
ㅡ Tio, o senhor ta bem? ㅡ Uma das minhas alunas veio até minha mesa para entregar a folha com a música. A maioria largava nas próprias mesas, mas ela sempre vinha me entregar. Devia ter uns dez anos no máximo.
ㅡ Estou. ㅡ Peguei a folha de sua mão e fingi um sorriso.
ㅡ Não parece, parece triste. ㅡ Ela analisou meu rosto.
ㅡ Ele está de coração partido. ㅡ Uma voz vinda da porta atraiu o olhar dela. Eu não olhei, já tinha ouvido tanto ela nos últimos dias que meu instinto era revirar os olhos quando ela aparecia. ㅡ A namoradinha terminou com ele. ㅡ Thalia entrou na sala.
ㅡ Sua namorada terminou com você? ㅡ A menina voltou os olhos para mim e eu encarei Thalia com uma expressão irritada. Ela apenas deu com os ombros. ㅡ Não se preocupa, tio. Você é bonito e a sua namorada vai voltar pra você. Vai ver ela só tá irritada, mas depois fica feliz de novo. Minha mãe também fica irritada e briga com meu pai, mas eles sempre se acertam. Que tal chocolate? Ela deve voltar pra você se der chocolate pra ela. ㅡ Olhei para a menina e sorri novamente.
ㅡ Vou pensar nisso. ㅡ Toquei o topo da cabeça dela e me sentei em minha cadeira. ㅡ Obrigado pelo conselho.
ㅡ De nada. ㅡ Ela sorriu animada e olhou para Thalia. ㅡ Mas dá chocolate só pra ela. ㅡ Ela disse aquilo com tanto deboche que eu quase me esqueci que estava triste demais para rir.
Thalia encarou a menina que saiu saltitando da sala e depois revirou os olhos.
ㅡ Como se chocolates fossem resolver alguma coisa. ㅡ Ela voltou a falar e a centelha de sorriso que estava em meus lábios desapareceu. ㅡ E como se ela merecesse que você rastejasse até ela.
ㅡ Você quer alguma coisa? ㅡ Soltei as folhas e a encarei. ㅡ Precisa de algo? Por que ta aqui? Porque se não precisa de nada, não tem porque estar aqui. Eu to trabalhando.
ㅡ Por que você sempre me trata desse jeito? Eu te fiz alguma coisa? ㅡ Ela se inclinou, apoiando as mãos na minha mesa. ㅡ Na verdade não fiz nada do que quero fazer com você ainda. ㅡ O tom de sua voz fez eu me levantar e dar a volta na mesa. ㅡ Qual é? Você nem é mais comprometido. Não era essa a desculpa?
ㅡ Como você sabe que eu e a Marina terminamos? ㅡ Estava perto da porta, mas voltei meus olhos para ela.
ㅡ As notícias correm rápido. ㅡ Cruzou os braços. ㅡ E eu vi ela hoje. E não foi você quem a trouxe. E não tinha aliança no dedo dela.
Eu estava irritado com ela, mas ser lembrado de que a aliança da Marina estava comigo foi como tocar numa ferida recente e eu precisei sair da sala.
Não era meu horário de almoço. Eu não tinha permissão para sair do prédio naquela hora, mas não tinha nenhuma aula para dar pelos próximos quinze minutos e algo em mim me levou até a faculdade dela. Era o horário de almoço dela.
Quando cheguei na frente do campus, o livro estava em minhas mãos junto com um chocolate que comprei no caminho.
Fiquei uns minutos parado na calçada esperando ela aparecer entre os vários alunos saindo do prédio. Eu só tinha mais sete minutos quando ela finalmente apareceu.
Novamente o coração acelerou, como se fosse a primeira vez que eu a via. Como se minha mente tivesse se esquecido de como ela era e eu estivesse me apaixonando pela primeira vez de novo.
Eu quase me esqueci das circunstâncias e sorri, mas foi quando um cara apareceu do lado dela. Um cara que eu não conhecia e que não parava de falar e rir do lado dela. Eles não estavam nem se encostando e eu já sentia algo queimar na boca do meu estômago.
Minhas mãos apertaram o livro e eu tentei a todo custo ignorar aquele pensamento. Mas foi quase automático a pergunta vir na minha cabeça: Ela conheceu mesmo outra pessoa? Ela estava confusa porque tinha sentimentos por outra pessoa? Um cara que ela conheceu na faculdade e agora convive com ele durante os últimos três meses? Aquele cara?
Meu maxilar começou a doer quando percebi que o estava apertando demais. Minha respiração estava desregulada e eu pensei em ir embora, mas os olhos dela encontraram os meus e eu permaneci imóvel no lugar.
Está lá! Eu vejo em seus olhos que ela ainda sente algo por mim. O que realmente está acontecendo?
Dei uns passos na direção dos dois e parei quando eles pararam na minha frente. O cara olhou para mim e depois para Marina. Depois para mim e novamente para Marina.
ㅡ Eu sou o Arthur. ㅡ Ele interrompeu o silêncio que pairava entre nós dois, então apenas olhavamos um para o outro sem dizer ou expressar nada. ㅡ Prazer. ㅡ Estendeu a mão para mim.
ㅡ Gabriel. ㅡ Respondi ao seu cumprimento e vi as sobrancelhas dele se arquearem.
ㅡ Gabriel? O Gabriel da Marina? ㅡ Apontou para nós dois. ㅡ É bom finalmente conhecer você, porque ela só fala de você desde o primeiro dia de aula.
Um pequeno alívio tomou conta de mim, mas não era o suficiente.
ㅡ Você pode nos dar licença? ㅡ Ela pediu ao rapaz.
ㅡ Claro. Não queria ser vela mesmo. ㅡ E assim ele se afastou, nos deixando a " sós " em meio ao campus lotado.
Nós dois nos encaramos por mais uns segundos até eu dar um passo a frente.
ㅡ Marina... ㅡ Ela me interrompeu.
ㅡ O que ta fazendo aqui? ㅡ Sua pergunta não foi nem um pouco rude, mas me fez engolir em seco.
ㅡ Eu... ㅡ vim te implorar para me dizer a verdade, esquecer tudo isso e voltar pra mim. ㅡ Vim te entregar isso. ㅡ Estendi o livro e o chocolate.
ㅡ Você não precisava... ㅡ Foi a minha vez de interrompe-la.
ㅡ É seu. Não tem porque ficar comigo. ㅡ Coloquei as mãos nos bolsos da calça e analisei seu rosto enquanto ela observava o livro. Ela não riu ou deu pulinhos de alergia como fazia, e isso partiu as partes do meu coração.
Esperei que ela abrisse a primeira página e visse o post it com as páginas que marquei para ela e mais uma mensagem. Depois fui pego ela hora em meu relógio e precisei voltar.
ㅡ Eu gostei. Espero que goste também. Preciso ir, tenho uma aula para dar. ㅡ Dei uns passos para trás. ㅡ Se precisar de mim, é só falar que... Eu venho correndo.
O sofrimento em seus olhos me impediu de continuar ali. A deixei sozinha com a frase que escrevi dentro do carro.
" Enquanto houver ondas do mar, vou amar você. "
•••
Continua...
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