36_ Dor
ㅡ Ta, chega desse clima de velório, vamos jogar just dance. ㅡ Cecília me puxou em direção a sala.
ㅡ Just dance? ㅡ Fiz uma careta me sentando no sofá. ㅡ Eu não danço nada.
ㅡ Como assim? Você não puxou o talento do seu pai? ㅡ Ela perguntou enquanto colocava o jogo na televisão.
ㅡ Talento do meu pai? Ele dança? ㅡ A olhei boquiaberta.
ㅡ Nós dois sempre brincamos disso desde novos. ㅡ Meu pai apareceu na sala. ㅡ Conta pra ela que eu te detonava nas danças.
ㅡ Eu não me lembro de ser detonado na dança. Lembro apenas de ganhar em todas as vezes. ㅡ Ele se gabou deixando o celular no braço do sofá.
ㅡ Você dança mesmo? ㅡ Cruzei os braços.
ㅡ Cheguei até a fazer aulas de danças urbanas na adolescência. ㅡ Ele confessou já se preparando para jogar contra Cecília e eu fique de queixo caído vendo que ele realmente dançava. E Cecília não ficava para trás, não, porque ela estava dançando muito bem. Aparentemente eu era a única dura feito tábua naquela sala.
As horas foram passando e eles só pararam porque já não estavam nem conseguindo respirar.
ㅡ Eu vou tomar um banho. Odeio ficar suada. ㅡ Cecília saiu da sala nos deixando sozinhos.
Meu pai se sentou no tapete no chão e limpou o suor da testa com o braço.
ㅡ Eu aguentava horas de aula com dezesseis anos. Agora não aguento nem uma. ㅡ Ele riu.
ㅡ Pois mesmo não aguentando, dançou melhor do que eu jamais conseguiria. ㅡ Balancei a cabeça.
ㅡ Por que olha tanto para esse celular? Está esperando a mensagem de alguém? ㅡ Quando ouvi sua pergunta que percebi que estava olhando para o celular. Eu nem sei quantas vezes fiz aquilo naquele dia, mas já era tão automático que eu nem percebia.
ㅡ Talvez. ㅡ Pendi a cabeça para o lado pensando seriamente se contava para o meu pai sobre Gabriel ou não. É claro que ele teria que saber em algum momento, mas nós não tínhamos esse tipo de conversa, em que eu contava fatos da minha vida.
Meu pai me olhou parecendo entender o meu conflito e apenas assentiu.
ㅡ Espero conhecê-lo. ㅡ Foi o que ele disse.
ㅡ Se ficar aqui até mais tarde, talvez conheça. ㅡ Cruzei as pernas em cima do sofá. ㅡ Eu vou jantar na casa dele hoje. Ainda não é nada certo, mas... Meio que estamos nos conhecendo.
ㅡ Espero que ele seja bom pra você. E você pra ele. Que se gostem de verdade e... ㅡ Os pensamentos pareceram tomar conta da mente dele.
ㅡ Ta tudo bem, pai. ㅡ Sorri para o tranquilizar. ㅡ Ele é ótimo. E vocês vão se conhecer um dia.
Nós começamos a prestar atenção num filme de ação que estava passando na televisão. Cecília também se juntou a nós e quanto mais as horas passavam, mais nervosa eu ficava. Eu nunca jantei na casa de ninguém antes, muito menos do cara que pode vir a ser o meu namorado. Meu estômago já estava embrulhando de tanto nervoso.
Foi quando batidas apressadas e fortes soaram pelo apartamento. Batidas que vinham da porta da sala.
Cecília franziu o cenho e se levantou para atender.
ㅡ Já vai! Calma! ㅡ Resmungou segundos antes de abrir a porta.
Minha mãe adentrou a sala com um olhar furioso. Meu coração acelerou e meu pai se levantou com o susto.
ㅡ Então você fica semanas viajando, não tem tempo nenhum para mim e quando passa pelo Rio vem visitar a sua filha?? E não me visita?? O que eu sou?? Um pedaço de pau naquela casa?? ㅡ Ela começou a gritar com meu pai, o mesmo discurso de sempre. ㅡ Já não basta ficar mandando presentinhos e só me ligar pra perguntar dessa garota, agora também só vai visita-la? Vai morar aqui também? Por que não alugam um apartamento e morem vocês dois juntos já que eu sou um nada pra você?
ㅡ Patrícia... ㅡ Meu pai respirou fundo com as mãos na cintura.
ㅡ Patrícia? Viu! Você não me ama mais! Não me considera mais! A uns anos atrás você me chamava de amor, de docinho e querida, agora é só Patrícia. ㅡ Ela engrossou a voz para falar o próprio nome. ㅡ Eu ainda sou sua esposa, sabia? Eu quem estive aqui pra você por todos esses anos, mas você nem liga pra mais pra mim. Só quer saber da Marina.
ㅡ Você está se ouvindo?
ㅡ Por que você ainda tenta dialogar com essa maluca? ㅡ Cecília, que ainda estava na porta, perguntou, atraindo o olhar da minha mãe.
ㅡ Maluca, não!! Eu não admito que você fale assim comigo, sua peste!
ㅡ Olha aqui, sua vagabunda, você pode falar da maneira que quiser com o besta do meu irmão, mas eu não vou ficar aturando você, não. Você está na minha casa e me deve respeito! E fala baixo porque aqui não é bagunça, não. ㅡ Cecília apontou o dedo indicador para minha mãe.
ㅡ Patrícia, vamos conversar lá fora. ㅡ Meu pai tentou segurar no braço dela, mas ela não deixou.
ㅡ Ah, agora você quer conversar? Agora você quer minha devida atenção? ㅡ Ela abriu os pensamentos. ㅡ Você... Você ta percebendo a situação em que estamos? Eu precisei pegar a droga de um ônibus e vir até essa droga de cidade para só aí você querer conversar comigo. Eu tenho que fazer um escândalo para ter sua atenção. Agora essazinha... ㅡ Ela apontou para mim, que ainda estava imóvel no sofá. ㅡ Se ela tosse, você vem correndo. Se ela liga pedindo presentes, você dá.
ㅡ Era o aniversário dela, Patrícia.
ㅡ Dane-se! ㅡ Gritou. ㅡ E eu? Não ganho nada? Pelo que me lembro, eu quem fiquei horas em trabalho de parto para ela sequer ter um aniversário. Eu quem deveria ganhar presentes nesse dia.
ㅡ Meu Deus... ㅡ Cecília passou a mão no rosto. ㅡ Você já superou o narcisismo.
ㅡ Patrícia, você está ouvindo o que está dizendo? Isso é loucura! Eu nunca te destratei, nunca deixei faltar nada, te ligo todo dia e sempre passo em casa. Por que está agindo dessa forma? Ela é nossa filha! ㅡ Meu pai, com todo o seu jeito calmo, explicou.
ㅡ Exatamente. Ela é nossa filha. E eu sou sua esposa. Eu deveria vir primeiro pra você. Não essa... Coisa.
Eu não sei como tive forças para me levantar e correr até o quarto. Minhas pernas estavam fracas e eu senti que vomitaria a qualquer momento. A dor que eu estava sentindo no peito era tão grande que eu pensei que meu coração ia explodir.
Foi quando me tranquei no quarto que vi já era quase noite.
Ainda com lágrimas nos olhos, liguei para Gabriel.
Gabriel- Alô?
Marina - Gabriel? Me desculpa ligar assim quase em cima da hora.
Tentei disfarçar o fato de que estava chorando, mas tenho certeza que não consegui.
Gabriel - O que foi? O que aconteceu?
Marina - Eu não vou conseguir ir ao jantar na sua casa. Peça mil desculpas aos seus pais por mim. Eu sinto muito mesmo.
Desliguei a chamada sem dar chance para ele perguntar o motivo. Eu jamais conseguiria ir jantar na casa dele do jeito que eu estava. Na verdade, tudo o que eu queria era chorar para tentar colocar toda aquela dor para fora.
•••
Continua...
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