Saio sozinha para a roda de samba que rola no sábado à noite. Como sempre tive um gosto musical bem eclético, sambo no miudinho até encontrar um negro de parar o trânsito. Ele é um dos vocalistas da roda e canta olhando para mim. Também eu vim causando para ninguém botar defeito usando uma blusa frente única transpassada e uma saia justa com babado que balança enquanto eu danço, fechando com cabelos soltos e um salto bloco que deixa minhas pernas mais lindas do que já são.

No fim do show ele chega bem perto de mim e a atração é imediata. Quando os novos músicos começam, não estava ouvindo mais nada do que cantavam. Parece que o cara tem mais mãos do que uma pessoa normal e a voz no pé do meu ouvido me deixa inebriada. Na hora o convido para a minha casa.

Pegamos um táxi e seguimos nos beijando durante o caminho. Quando chegamos na minha casa me lembro do meu lindo e querido Encantado e sua mania surpreendente me causar dor de cabeça. Por causa disso com muito custo convenço o negão cantor me esperar alguns minutos do lado de fora. Pego o meu gatinho e o prendo no banheiro. Essa noite ele não vai aprontar nada.

Abro a porta com um sorriso sedutor para ele. Ele me beija novamente e indico que o que ele quer vai conseguir no andar de cima. Nunca pensei em me aventurar em uma arte como a música, mas devo confessar que passei a noite cantando muito mais de um samba de uma nota só.

***

Já de tarde depois de ter dispensado o negão cantor, resolvo ligar para o Cris.

Agora estou conseguindo memorizar o nome dele. Até que enfim.

— E como foi a noite de ontem? — Pergunta ele

— Foi normal. — Digo tranquila. Mesmo o carinha tenho caprichado na noite anterior, para mim são sempre sem importância. Não fazem diferença. É só mais um para o meu álbum de figurinhas.

— Como ele era o cara?

— Era negro, alto e o cantor de um dos grupos da noite. Foi uma noite boa, melhor do que algumas das que tive...

— Assim você me magoa — Comenta ele me cortando e rindo com falsa tristeza.

— Prefiro não dar o meu veredito a você — digo rindo e pensando. A verdade que não lembro muito da noite que passei com o Cris. Mas vendo como acordamos, já deixa subentendido o que rolou dentro do meu quarto. Mesmo depois de eu estar vestida de manhã.

— Posso viver com isso. Mas me conta. O que ele comeu no café?

— Frutas e suco natural — respondo rindo. — Nem sabia que músicos se alimentavam tão bem.

— Fala sério?! Queria muito um pão doce com creme que não sei de onde você compra.

— Sei... Vai falar que você não vai para a academia. Esqueceu que vi você sem camisa.

— Na verdade você viu um pouco mais que isso. Mas é tudo por causa da corrida que faço de manhã. ― Retruca ele sem modéstia.

— Tem certeza!? — Pergunto, desconfiada.

— Claro. E também graças a ótima genética da minha família.

Ri bastante do comentário dele.

— Modéstia é a sua maior virtude — ironizo gargalhando. — Me conta como foi a sua noite ontem?

— Não sou como você, Lelê Baladeira. Mas conheci a Luíza na mesma boate que conheci você. Muito bonita. Simpática.

— Não está falando nada de interessante — falo, fingindo irritação.

Ele ri e me fala.

— É mesmo — diz ele, concordando. — Não rolou nada ontem. Zero a zero.

— Você está fraco. Vou ter que te ensinar algumas coisas — ouço ele rir no fundo da linha

— Vou aprender com a mestra dos encontros? — Pergunta animado.

— Só se for mestra nos encontros de uma noite — esclareço, rindo para ele.

Nós conversamos ainda por um tempo, então ouço a campainha tocar.

— Vou ter que desligar, Cris. A Virgínia chegou, ontem ela teve que ir embora rápido e na certa tem um mega bafo para me contar. Se não fosse, ela não apareceria no domingo à noite.

— Estou curioso para conhecê-la. Até amanhã, então.

— Oportunidades não vão faltar. Até amanhã — digo, desligando.

Ergo uma sobrancelha enquanto me levanto para atender a porta.

— E aí, Miga? Abre aí — abro a porta.

Encantado sobe na mesinha das chaves para recebê-la. Ele está meio irritado comigo desde que o coloquei no banheiro na noite anterior. Estou realmente considerando o levar a um exorcista, vai que ele decide me derrubar também.

— Tem algum cara na sua casa? — Perguntou Vi, entrando e investigando a casa a procura de sei lá o que. Mas pela cara está irritada.

Virgínia é uma moça de altura mediana, corpo magro, mas não seco e com seios fartos para deixar muitas com inveja. Têm cabelos louro claro e olhos verdes. Ela vive entre altos e baixos, é uma romântica incorrigível e também a pessoa que mais confio no mundo.

— Estou esperando uns dez minutos na sua porta e nada. Caramba, Lelê. Hoje é domingo e está deserto na sua rua. ― reclama ela.

— Estava no telefone com o meu novo amigo. ― confesso.

― Para tudo! O gato de sexta! virou amigo!? — Pergunta incrédula. — Graças a Deus a Lelê vai mudar as regras! ― ela comemora

— Nunca. Fala sério, Vi — digo, irritada.

— Como assim "Fala sério"? Você abriu brecha de fazer amizade com um homem que passou uma noite contigo. Cê tá dando moral pra ele. — Sentencia ela animada pegando o Encantado que já está miando em suas pernas pedindo carinho. Ele realmente está chateado comigo. — Vem cá, meu príncipe. Acho que você vai ter um dono em breve. Quem sabe ele curte tango como a Lelê fazia?

— Ele é somente um amigo que também trabalha na Cosmos. Só isso, Vi. Mas uma, não fala de Tango por favor. Isso é algo que prefiro esquecer.

― Mais uma regra. Pelo amor de Deus. ― Reclama ela

― Outra coisa. Acho melhor você dar bastante carinho para o Encantado. Ele está chateado comigo porquê o coloquei no banheiro ontem à noite.

— Por causa de que cê fez isso? Tadinho dele!

— Ele um dia vai causar uma morte na minha casa. Não podia deixar ele solto e acabar com a minha noite de ontem.

Ela me olha indo para a sala com o gato no colo.

— Então, foi boa?

— Como disse para o Cris...

— Cris!? Esse é o nome dele? E você lembra o nome dele!? — Comenta ela, ainda mais animada. — Você nunca pergunta.

— Vi, você sabe...

— Das suas regras? É claro que sei. Uma das principais é sem repeteco. Mas você, Letícia Serra, cultivar um amigo homem hétero para mim é incrível, você está progredindo — diz ela rindo

— Não é nada demais, ele perguntou se podia ser meu amigo. E aceitei. Você vai conhecer ele na próxima sexta — Respondo.

Vi me olha por um momento, então um sorriso que já está ali, amplia. Só não sei se é de deboche ou de esperança.

— Cara — ela diz. — Tô louca para conhecer o cara que te convenceu a ser amigo dele.

— Cê vai gostar dele — deixo um sorriso sonhador inclinar na minha boca. — Não é um idiota completo. — E quando percebo que estou sorrindo demais, preciso tossir com o fundo da garganta, para tirar meu novo amigo da superfície da minha cabeça. — Mas mudando de assunto. Fala qual o bafão que você veio me contar.

Ela solta o encantado e se levanta para começa a contar "A História".

— Miga. Sabe o meu cara da sexta? Que mora, super-ultra-mega longe? — confirmo com a cabeça. — Me ligou ontem quando eu estava na sua casa, esqueci o meu cartão de crédito na casa dele. Por isso que tive que ir embora voando. Aí eu marquei com ele hoje de manhã no Esquina Shopping pra dar gente conversar. Ele é tão legal, inteligente... Só de ouvir o nome dele já fiquei apaixonada.

Não disse? Romântica incorrigível.

— Qual o nome dele? — pergunto, sem interesse.

— Lucas Miguel Mattos — Anuncia saltando do sofá. — Não é bonito. Quando ele me beija eu sinto como se estivesse no céu.

— Então você já está apaixonada? — Pergunto para ver a confirmação com a cabeça e seus olhos sorridentes. Não é a primeira vez que ela cai de amores por um cara e todas as vezes anteriores tive que levantar a sua autoestima, aguentar a sua deprê e suas declarações de amor ao álcool.

— Ainda não. Tá quase. Ele ainda não falou. Tipo: "Vi, você quer ser minha namorada?". Mas sinto que vai dar certo. Miga estou tão feliz. Queria tanto que você se sentisse como estou agora. Bem que o cara poderia ser o seu novo amigo Cris.

— Sabe muito bem que não tenho interesse nesse tipo de coisa.

— Quem te ouve falar assim, acha que você nunca namorou na vida — comenta ela falando demais.

— É melhor que pensem assim. Me dá menos dor de cabeça. Prefiro viver como se eu nunca tivesse experimentado um tipo diferente de vida.

— Você tem que resolver o seu passado Letícia...

— Não vamos entrar no assunto — A corto finalizando a conversa.

Ela me olha irritada novamente. A Vi me conhece há muito tempo. Sabe que o meu passado é campo minado. Sei que ela faz isso por quê quer me ver feliz, mas ainda não estou preparada para falar de tudo que já aconteceu.

— Vi, eu...

— Sei que ainda não está pronta. Só me preocupo se vai ter um dia que você vai estar.

Olho para ela e percebo que consegue ver todas as minhas fraquezas e armaduras. Devo tudo o que sou a essa loira peituda que está comigo a muito tempo.

— Vamos mudar de assunto? — pergunto e ela me confirma com a cabeça. — E então, o que mais você decidiu com o tal do Lucas beijo dos céus?

Ela sorri se animando novamente.

— A gente está se falando pelo telefone. Quero muito que dê certo, miga. Já chamei ele para o fim de semana

— Então vamos encontrar o Lucas lá também? — Questiono tentando disfarçar a minha não animação. Certamente ele vai fazer estragos quando fizer alguma merda e eles se separarem.

— Com certeza ele vai. — Esclarece ela animada.

Depois trocamos de assunto novamente e ficamos conversando sobre o lançamento dos filmes da semana até mais tarde. A Vi decidiu passar a noite na minha casa. No dia seguinte ela irá trabalhar bem cedo numa loja de brinquedos.

Já faz um tempo que não saio aos domingos, tudo isso porque nas poucas vezes que saí sempre encontrei partidos desinteressante. O que quer dizer, os chatos, de muita idade, grudentos e afins.

A minha noite foi muito mais divertida batendo papo com a minha melhor amiga e falando de como são bobas as comédias românticas que engrandecem o amor nos filmes sem mostrar a realidade do real sentimento.  

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Falei que no sábado sairia o capítulo. 

Mas decidi adiantar para vocês!!!

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Mil bjnhos.