Capítulo 10: Shari
X: Shari
Scien ficava a sete horas de caminhada de Pillar e Leor chegou às quatro e meia da tarde na capital, exausto. Mesmo gostando de praticar algumas artes marciais típicas do seu reino e tendo um bom porte físico, caminhar por horas seguidas não era do seu costume, daí o desgaste.
Mesmo cansado, ele queria ir o mais rápido possível para Alzask, então foi diretamente para o mercado principal da cidade. Lá eles vendiam de tudo: algumas coisas ele nunca tinha visto e havia até artistas de rua pintando retratos ou tocando instrumentos inusitados. Aquela era uma feira bastante interessante. Leor aproximou-se de uma mulher que estava vendendo velas e incensos.
–– Boa tarde, senhora, sabe onde posso encontrar um guia para viagens?
–– Compre uma vela e um pouco de incenso que eu lhe digo.
–– Não tenho interesse em comprar nada disso, por favor, apenas me diga onde encontro um guia, é uma questão de vida ou morte!
–– Ora essa, seu folgado, para mim também é uma questão de vida ou morte: eu dependo dessas vendas para por comida em minha mesa. Agora se você não vai comprar nada, saia da minha loja.
Leor deixou a barraca indignado. Tentou parar um homem para pedir ajuda, mas ele o ignorou e continuou caminhando. Ele nunca tinha visto pessoas tão mal-educadas quanto àquelas! Um homem gritava vendendo uma cabra, outro gritava vendendo galinha e dizendo que galinha dava muito menos trabalho do que cabras. Os dois começaram a discutir. Tudo ali parecia ser resolvido na base do grito. Então resolveu entrar na onda.
–– Guia de viagens, eu preciso de um guia de viagens! Quem quer cliente? Quem quer dinheiro?
Uma jovem de cabelo preto cacheado e olhos castanhos aproximou-se de Leor, rindo.
–– Você quer um guia de viagens ou ser assaltado?!
Ela usava um vestido vermelho gasto, não possuía nenhum adorno fora a pena branca que usava como brinco e o cabelo era curto, o que era considerado como motivo de vergonha para as mulheres orientais. Ela aproximara-se rindo da ingenuidade de turista de Leor, mas, mesmo assim, o encantou desde a primeira vez que ele a viu. Com traços femininos delicados, era simplesmente linda.
–– Ei, estou falando com você!
Leor tinha perdido as palavras quando a viu, agora estava embaraçado.
–– Desculpe... Er, você sabe onde eu encontro um guia?
–– Sei. E não é gritando que você vai conseguir um, posso te garantir isso.
–– Ótimo, me levaria até ele?
Ela deu outra risada, parecia achar graça de tudo o que Leor falava.
–– Não precisa, você está diante da melhor guia de Saas.
–– Mas... Você é uma mulher...
–– Tudo bem, você quem sabe. Boa sorte com sua viagem então, tchau!
Ela virou-se para ir embora e Leor instintivamente segurou seu braço.
–– Não, espere! – Ela voltou-se, fitando-o com os olhos semicerrados – Quanto você cobra para me levar até Alzask?
Sua expressão mudou de chateada para surpresa.
–– Alzask?! Puxa, vai para bem longe...
–– Você não faz longos trajetos?
–– Eu não disse isso. Eu cobro quatro moedas de ouro e você aluga a carroça.
–– Eu pago três moedas e nada de carroça.
Ela deu outra gargalhada.
–– Você é muito engraçado. Sem carroça eu cobro sete moedas.
Foi a vez de Leor rir.
–– Quer saber, você tinha razão quanto ao assalto. Eu vou procurar outro guia.
Leor virou-se para ir embora, mas torcendo para que a jovem o impedisse. E ele não foi desapontado.
–– Tudo bem, tudo bem, calma aí! Vamos negociar, não é?! Achei que você era mais tolo do que realmente é.
–– Puxa, você é um doce de pessoa, me diga: ofender seus clientes faz parte da sua estratégia para cativá-los?
Ela revirou os olhos.
–– Eu não posso cobrar menos do que quatro moedas médias e uma pequena, de ouro... Tem os gastos de viagem e a distância é longa...
–– Tudo bem, mas eu não tenho condições de lhe pagar as cinco moedas de uma vez, pago parte agora e parte depois.
A jovem suspirou.
–– Ok, não precisa me pagar tudo agora, mas se é pra parcelar eu vou cobrar juros: você me paga quatro moedas médias de ouro agora e duas pequenas depois. E lembre-se: você não está contratando uma simples guia, você acaba de contratar a melhor!
Leor a estudou com o olhar, ela estava cobrando mais do que Hadin lhe dissera que era o normal, mas ela era linda e divertida, bem melhor tê-la como guia do que um homem fedido, ainda que cobrasse menos.
–– Tudo bem... – Ele estendeu-lhe as quatro moedas – Partimos imediatamente.
–– Está maluco?! Daqui a pouco são cinco horas e é bem mais seguro dormir numa pousada do que na estrada.
–– Eu não me importo, preciso chegar o mais rápido possível em Alzask, por isso digo que partimos imediatamente. – Ele deu-lhe duas moedas de prata – Compre os suprimentos para a viagem.
–– Você é louco! – Ele sorriu para ela, não tinha como fazê-lo mudar de ideia – Me espere sentado ali, vou me preparar...
♜ ♜ ♜
Nemat estava preparando um ensopado de frango. Pretendia levá-lo para Tyane, a pobre senhora estava muito abalada. Terminou o prato e foi até a vizinha. Bateu duas vezes na porta, mas ninguém abriu. Então resolveu arrombá-la com um grampo. Tyane estava deitada no sofá com uma expressão sombria.
–– Senhora Tyane, sente-se... – Ela colocou a vasilha sobre a mesinha de centro da sala e sentou-se na beirada do sofá – Você precisa comer para estar viva quando Leor chegar.
A senhora olhou para Nemat. Ela parecia um fantasma, com os olhos sem brilho e a pele exageradamente branca.
–– Como você faz isso?
–– Ensopado? Fácil, se quiser depois lhe dou a receita.
–– Não. Me tratar bem, mesmo eu lhe tratando como uma ninguém por todos esses anos...
Nemat levantou-se e pegou o ensopado. Voltou e entregou-o para a senhora que estava sentando-se.
–– Simples. O que os outros dizem sobre mim ou a maneira como me tratam não define quem eu realmente sou.
–– Isso não é simples – Disse Tyane tomando a primeira colherada de sopa – Huum, está uma delícia.
–– É simples sim, Senhora Tyane, só não é fácil...
–– Me perdoe, Nemat, pela maneira como venho tratando-a. – Ela começou a chorar – E me perdoe pela maneira como eu tratava sua mãe...
É incrível como que o fato de saber que está morrendo amolece os mais duros corações...
–– Eu lhe perdoo pela maneira como me tratou, mas não posso perdoá-la por minha mãe. Você teve a chance de desculpar-se enquanto ela estava viva...
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Leor estava sentado esperando a guia, arrependido por ter lhe pagado e depois tê-la deixado sair. Já eram cinco horas e a jovem ainda não tinha voltado. De repente, alguém falou ao lado dele:
–– Pronto. Vamos?
–– Achei que iria embora com o meu dinheiro...
Ela o encarou furiosa.
–– Sou uma guia, Senhor seja-lá-qual-for-seu-nome, não uma ladra.
–– Tudo bem, não quis ofendê-la. – Apesar de ter se desculpado, Leor não iria confiar nela. A verdade é que ele demorava a confiar nos outros...
Eles partiram de lá, atravessaram a cidade e pegaram a estrada. De repente, Marboh, que estava voando até então, pousou ao lado de Leor, cheirando os pés da guia, que deu um pulo de susto.
–– Minha nossa! – Ela pegou o arco e flecha para acertar o lobo, mas Leor a impediu a tempo.
–– Ei! Quer matar o Marboh?!
–– Ma o quê?! Por favor, não me diga que esse lobo é seu...
–– O nome dele é Marboh e ele é o meu amigo.
A guia colou as mãos na cabeça em sinal de desespero.
–– Não acredito! Era o que me faltava, o turista tem um lobo... Olha aqui, Senhor...
–– Acho que está na hora de nos apresentarmos... Meu nome é Leor.
–– Shari. E eu...
–– Shari esse lobo vai conosco, prometo que ele não nos trará problemas.
Shari morria de medo de lobos, mas não queria admitir isso...
–– Eu deveria ter cobrado mais... – Murmurou.
Eles caminharam até às nove horas e tiveram que parar, porque Leor não aguentava mais. Era a primeira vez que ele viajava, não estava acostumado a andar longas distâncias e o desgaste físico dele era evidente.
Eles estavam no topo de uma colina coberta por uma relva verde e a lua cheia dava um toque prateado na noite estrelada. Não havia árvores ali e uma brisa refrescava os viajantes. Shari tinha acendido uma fogueira e estava preparando a refeição deles. Com o dinheiro que Leor lhe dera eles poderiam comer por três dias.
–– Aposto que você nunca viajou. – Comentou.
Leor estava deitado no chão, quase dormindo de exaustão. Marboh estava deitado ao seu lado, com a cabeça apoiada na barriga dele.
–– Sério, é tão evidente assim?
Ela sorriu, entregando-lhe um prato de sopa e um pedaço de pão.
–– Não se preocupe, amanhã piora.
–– Puxa, sua sinceridade é tocante.
Depois de comerem, adormeceram sob o pedacinho de universo que embelezava a noite...
♜ ♜ ♜
Shari não acreditava na sorte que deu. Ela era uma artista de rua e nunca havia saído de Nalahu. Há muito tempo vinha querendo visitar Alzask, mas nunca teve condições para tal. Agora ela não só tinha conseguido uma carona, mas estava recebendo por isso! Quando disse no mercado que ela era guia, não imaginava que Leor quisesse ir para tão longe, na verdade não imaginava que ele quisesse viajar para além do reino. Se ele tivesse dito que iria para qualquer outro reino ela teria negado, mas ele ia justo para Alzask!
Ela virou a cabeça eviu Leor deitado no chão, dormindo em sono profundo. Não conseguiu evitar umsorriso. Até que ele é bonitinho.Lembrou-se então de Magnus, um ator que a roubara e fugira com um circoambulante para Alzask. Ela estava indo atrás daquele filho da mãe e o fariapagar por ter partido seu coração. Eu sóespero que a gente sobreviva a essa viagem maluca!
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Ahhhh, o que acharam da Shari??
U-U
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As lendas de Saas
Escrito e publicado por: Becca Mackenzie
Wattpad.com | 2014
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