ㅡ Quem nesse mundo amor tão grande pode ter
De entregar a própria vida sem temer?
Quem já sentiu a dor de ser cravado em uma cruz
Pagando pelos erros que não cometeu? ㅡ Uma música vinha da área atrás da casa. Passei pela sala e cozinha, encontrando Carol lavando e estendendo roupa pelo quintal. ㅡ E olhar nos olhos de quem tanto mal lhe fez
E sem ressentimento oferecer perdão
Quem pode ser melhor amigo que o Senhor?
Que pelo servo a própria vida renunciou? ㅡ Ela estava cantando junto.

ㅡ Já voltou do trabalho? ㅡ Minha pergunta a fez notar minha presença e ela sorriu.

ㅡ Me deram folga hoje. Pra eu conseguir orginazinar tudo. ㅡ Ela passou a mão molhada na bermuda. ㅡ Tem comida pronta se quiser almoçar.

ㅡ Ah, me desculpa, eu almocei na rua. Devia ter avisado. ㅡ A verdade é que eu me acostumei a não ter alguém em casa me esperando com almoço pronto. Meu pai sempre trabalhou muito e eu almoçava sozinha.

ㅡ Tudo bem, não tem problema.

ㅡ A Duda tá aí?

ㅡ Não, ela estuda a tarde. Deve chegar umas seis horas. ㅡ Assenti com sua resposta e voltei para dentro de casa, deixando-a a vontade para voltar a cantar junto de suas músicas.

Subi para o quarto no intuito de guardar as novas roupas que ganhei, mas percebi um número excessivo de mensagens no meu celular.

Perola- E aí? Pra onde a gente sexta?

Dafine- O que tem sexta?

Saulo- Carnaval

Dafine- Já?? O ano novo foi ontem!

Maicão- Eu sou o samba
Tenho certeza que você vai se amarrar

Priscila- Odeio Carnaval

Marina- Odeia? Vocês são a cara do carnaval

Priscila- Eu não sou cara de carnaval. Odeio ficar suando no sol, grudando em um monte de gente e sentindo cheiro de cc. Sem contar que os acidentes sempre aumentam nessa época porque o povo fica doido.

Dafine- Também não gosto de ficar na muvuca. Mas a gente sempre aluga algum lugar pra passar o fim de semana. Ano passado fomos para um sítio.

Pedro- Fizemos uma zona lá. Não podemos voltar.

Gabriel- Maicão tinha falado de uma casa pra alugar em Saquarema.

Perola- Sério? Muito caro? Porque tô ficando pobre.

Maicão- Se essa boca não beijasse tão bem
Se esse abraço não fosse tão massa
Se quer saber se eu quero outro alguém
Nem de graça
Nem de graça

Pérola- Responde a droga da pergunta

Maicão- Tem uma casa no centro, em frente a praia. Ela é grande, tem cinco quartos e piscina no quintal. A piscina não é grande, não, mas a casa é boa.

Saulo- Deve ser os olhos da cara

Maicão- Tá em promoção por causa do carnaval e eu conheço o cara, então eu consigo um desconto

Pérola- Todo mundo pode?

Pedro- Já tô lá

Saulo- Também posso

Gabriel- Aham

Marina- Posso, sim

Priscila- Eu também, mas não quero ninguém me enchendo o saco pra sair pra bloquinho

Dafine- Tá, antissocial, ninguém vai te obrigar a nada

Perola- Bora, Ju?

O que fazer? Ficar em casa durante o carnaval ou ir para uma casa ficar de vela em meio a quatro casais?

Dafine- Ela vai

Pedro- É só chamar o Marcos que ela vai

Pérola- Papo é esse em? Hmmm

Priscila- Marcos é o cara do jogo? Que dedicou quatro gols pra Ju?

Pedro- Nem conto pra vocês! Fui fotografar uma modelo hoje pra convidar uma coleção de uma loja de roupas e a modelo era quem? A Jurema. E quem era o dono da loja? O Marcos.

Jurema- Parece uma velha fofoqueira

Perola- Mentiraa

Dafine- Que isso em Ju!

Pérola- Diz pra mim que você fez eles tirarem uma foto juntos

Pedro- Tá me achando com cara de amador?

Logo abaixo Pedro enviou uma das fotos que tirou de Marcos e eu na loja, usando as blusas combinando.

Dafine- Caracaaaa que casal

Priscila- Como não shippa, gente? Parecem modelos!

Perola- Ui ui

Jurema- Pedro, por que você não vai dormir?

Perola- Concordo

Pedro- Vou mesmo, tô cansado

Maicão- Vou confirmar com o cara então em

As mensagens continuaram, mas eu estava ocupada demais jogada na cama encarando a foto que Pedro havia tirado. Na foto em questão, estávamos em pé, a mão dele estava na minha cintura e eu estava olhando para a câmera. Provavelmente não seria uma das fotos escolhidas, pois Marcos não estava olhando para a câmera, mas, sim, para mim.

ㅡ Ai, que ódio!! ㅡ Meu coração quase saiu pela boca quando Duda entrou no meu quarto, jogando a mochila no chão e grunhindo.

Olhei para a hora e vi que já eram três e quarenta da tarde. Como a hora passou rápido.

ㅡ Que susto, o que houve?

ㅡ O Caio. O imbecil do Caio. ㅡ Ela cruzou os braços enquanto andava de um lado para o outro no meu quarto.

ㅡ Caio é o garoto que você gosta? ㅡ Me sentei para tentar acompanhar.

ㅡ Não! ㅡ Ela gritou. ㅡ É. ㅡ Choramingou. ㅡ A gente estuda junto faz uns três anos e eu gosto dele desde o ano passado. A gente é amigo, não superamigos, mas somos amigos. Já fizemos trabalhos juntos, já fomos duplas em algumas aulas e eu até já fui na casa dele uma vez com minhas amigas. Ele já até me convidou pro aniversário dele, que ia só algumas pessoas. ㅡ Ela se sentou no tapete. ㅡ Eu pensei que ele também gostava de mim, mas hoje eu vi ele ficando atrás da escola com a Amanda.

ㅡ Ficando? Ele tem quantos anos?

ㅡ Treze, eu acho.

ㅡ Gente, e na escola? ㅡ Perguntei chocada. ㅡ Vocês são tão novos. Não devia estar sofrendo de amor aos doze anos. Devia estar se divertindo, saindo com as amigas, pintando o cabelo de colorido e se apaixonando por alguma boyband.

ㅡ Eu gosto do Straykids. ㅡ Ela deu com os ombros.

ㅡ Que bom. ㅡ Ri. ㅡ Aproveita sua pré adolescência. Tem muito tempo de vida para sofrer por amor.

ㅡ Nossa... ㅡ Duda me olhou com uma careta. ㅡ Isso é muito animador. ㅡ Ri novamente. ㅡ Você sofre por amor?

ㅡ Eu acho que é preciso ter um antes de sofrer por ele. Não posso sofrer por algo que nem existe ainda na minha vida. ㅡ Suspirei.

ㅡ E o Marcos? ㅡ A fitei. ㅡ Que foi? A Pérola disse que ele estava afim de você. Não foi ele que dedicou quatro gols pra você sábado?

ㅡ Você tem conversado com a Pérola? Não preciso de uma mini pérola na minha casa para bancar a cupido. ㅡ Voltei a me deitar.

ㅡ Não vou bancar a cupido. ㅡ Ela se aproximou da minha cama, ainda se arrastando no chão. ㅡ Voltou a falar com ele? ㅡ Sua pergunta em tom inocente me fez olha-la de novo.

Acabei não resistindo e contei tudo o que tinha acontecido, desde o banheiro do vestiário até o almoço de hoje.

ㅡ Eu sei que eu só tenho doze anos, mas acho que quando um cara te chama pra sair duas vezes, isso significa que ele tá interessado.

ㅡ Eu sei. ㅡ Bufei. ㅡ E eu até queria sair com ele. Mas... Não posso. Não agora. Não seria bom... pra nenhum de nós dois.

ㅡ Se você diz... ㅡ Ela deu com os ombros. ㅡ Eu vou tomar banho e ler um livro. Prefiro passar raiva lendo do que com garotos da vida real.

ㅡ Sua mãe disse que você só ia chegar às seis.

ㅡ Eu tive aula vaga. ㅡ Disse antes de sair do quarto e me deixar sozinha.

Fiquei poucos minutos na cama até resolver me levantar e fazer o que eu precisava. Tomei um banho, lavei o cabelo, fiz minha skincare, organizei a bagunça que fiz no meu quarto em meio a isso.

ㅡ Vamos para Niterói. ㅡ Meu pai anunciou em meio a jantar. Estávamos na mesa e Carol tinha feito macarrão à bolonhesa.

ㅡ Niterói por que? ㅡ Duda perguntou curiosa, enquanto servia um pouco do suco de caju em seu copo.

ㅡ Papai sempre vai para Niterói no carnaval. Ele tem o apê lá. ㅡ  Expliquei.

ㅡ Você não vai? ㅡ Duda me olhou.

ㅡ Não. ㅡ Neguei com a cabeça. O bairro onde meu pai tinha apartamento ficava lotado de pessoas. Era muita muvuca, bloquinhos e assaltos. Sempre que eu ia ficava trancava no apartamento o dia todo e era um tédio. ㅡ Geralmente eu saio com o pessoal.

ㅡ Pra onde eles vão esse ano? ㅡ Meu pai perguntou.

ㅡ Saquarema.

ㅡ Vai com eles? ㅡ Ele voltou a perguntar. Meu pai nunca ligou de eu viajar ou passar alguns dias fora com eles. Na verdade, desde que eu comecei a me dar bem com eles, ele fica feliz que eu tenha com quem sair.

Ele já não precisa pagar ninguém para ficar comigo...

Okay, entre ir para Niterói ficar trancada no apartamento, ficar em casa sozinha ou ir para Saquarema ficar de vela... Qual eu escolho?

Ao menos em Saquarema eu não vou ficar num completo tédio. Mesmo que o pessoal me deixe de vela, vou ter uma praia e uma piscina para me distrair.

ㅡ Vou. ㅡ Assenti.

•••
Continua...