Capítulo 90: Dia das Bruxas
Saint Luna, 30 de outubro de 1991
Quarta-feira - 11:11 A.M.
Não podíamos simplesmente atacar Adam sem provas na biblioteca depois do que Alice nos disse. Até tentamos supor que fosse outra pessoa, o bibliotecário novo, por exemplo, mas tudo apontava diretamente para o professor de química.
Passamos os outros dias de olho em Adam. Ele agia normalmente, dava aula no colégio, passou a prova, tudo como sempre fez. Decidimos segui-lo por um tempo, mas sua rotina era a mesma. Todo dia ia à escola, quando saía passava na padaria e na biblioteca e depois ia à igreja rezar. Era um pouco contraditório essa parte da Igreja, mas então Alice notou algo diferente.
Adam pode não saber o que está acontecendo, Lúcifer pode estar dentro dele como um hospedeiro apenas ganhando força antes de voltar ao seu plano maligno de nos matar e trazer o apocalipse. Por enquanto, Adam não sabe disso, não sabe que carrega Lúcifer dentro de si. Seria um problema, mas aos poucos ele estava despertando isso.
Ele achava que ninguém notava, mas conseguimos perceber a sua mudança. Adam começava a ficar nervoso conforme o tempo, começava a ter atitudes agressivas e não ia mais à igreja. Foi então que decidimos testá-lo. Usamos uma pequena e fina corrente do mesmo material que Lilith havia usado para segurá-lo da primeira vez. Dessa vez o plano estava com Crystal, mas por estarmos na mesma sala eu consegui acompanhar.
— Na próxima semana iremos continuar a matéria com um novo tema, pois será importante para a prova final, então espero que vocês prestem a atenção. — Disse Adam andando em frente ao quadro onde havia algumas informações da matéria.
Toda vez que ele focava seus olhos em mim, eu sentia a energia satânica transpirando dele. Era como uma conexão, tanto por eu ser uma bruxa satânica quanto por ele ser o diabo. No momento em que ele passou ao lado de Crystal, ela propositalmente deixou a corrente que havia usado como pulseira, cair no chão.
Adam olhou por alguns segundos para a garota e para a corrente, então se abaixou para pegar como um cavalheiro (algo que obviamente ele não era).
— Ah, não precisa... — Crystal insistiu segundos antes de Adam se abaixar totalmente e virou um pouco seu corpo na direção do chão como se fosse pegar a corrente ao mesmo tempo.
— Não há problemas, senhorita Price. — Respondeu o professor segurando a corrente em sua mão.
Ela olhou fixamente para ele, então no momento em que sua pele entrou em contato com o objeto, Adam o soltou imediatamente. Notei uma pequena queimação entre seus dedos, mas quando deixou a corrente cair no chão de novo, ela se curou. Nesse momento Adam notou que havíamos descoberto seu disfarce, mas apenas limpou a garganta, deixou a corrente lá e saiu de perto de Crystal.
Antes de dizer algo mais, o sinal tocou indicando o fim do expediente. Suspirei aliviada guardando meus materiais e me levantando com a mochila presa no ombro. Um garoto aleatório se abaixou e pegou a corrente para Crystal, devolvendo para a mesma.
— Agora temos certeza de que Lúcifer está em Adam, mas o problema é que agora ele também sabe que sabemos!
Crystal falou enquanto caminhava ao meu lado até a saída da sala. Levo um susto na porta ao ver uma pessoa com uma máscara assustadora com o rosto deformado estilo filme de terror. A pessoa tira a máscara e eu vejo que era apenas Jesse rindo do meu susto.
— Nossa, que engraçada! — Falei irônica cruzando os braços.
— Tinha que ver a sua cara! — Jessica debochou enquanto tentava controlar a crise de riso e Crystal acabou rindo junto. — Mas então, o plano deu certo?
Olhei ao redor e vi que Adam estava distraído corrigindo alguns trabalhos, mas ainda havia alguns alunos dentro de sala. Puxei Jesse e Crystal para fora dali e andei alguns passos até chegarmos em uma parte vazia do corredor.
— Melhor mantermos discrição! — Pedi, pois correríamos o risco de alguém ouvir nossa conversa.
— Certo. Então, Lúcifer realmente está no corpo de Adam. O plano deu certo, ele deixou a corrente cair e ainda queimou parte do dedo, mas logo depois se curou. — Crystal respondeu na minha frente encarando Jesse.
— Então é ele... — Jesse sussurrou pensativa por alguns segundos. — Amanhã será o ritual, mas quando formos atrás dele não podemos matar Adam. Ele não sabe o que está acontecendo, vamos precisar fazer tipo um...
— Exorcismo? — Crystal completou encostando as costas em uma das paredes. — É, digamos que eu saiba lidar com o assunto.
— Você vai nos ajudar? — Perguntei já sabendo a resposta, mas Jesse me interrompeu.
— É claro que não! — Falou em um tom um pouco alto, fazendo Crystal e eu a encararmos um pouco surpresas. — Será perigoso, mesmo com poderes não sabemos se iremos sair vivas, quanto mais colocarmos a vida de Crystal em perigo!
— Ei, eu sei me defender sozinha! — Crystal falou repreendendo Jesse, mas a garota insistiu.
— Se você soubesse se defender sozinha, não teria sido sequestrada!
— Aquilo foi antes de eu obter treinamento com o padre! Agora eu conheço táticas, símbolos e tipos de exorcismos e sei muito bem como prender um demônio!
— Não estamos falando de demônios ou coisas do tipo, Crystal! Estamos falando de Lúcifer, do diabo, o ser que quer trazer o apocalipse e quase conseguiu várias vezes!
— Meninas, parem! — Chamei a atenção das duas e elas logo pararam de discutir. Ao redor havia algumas pessoas passando e nos encarando, pois a tonalidade de voz aumentava conforme a discussão das duas.
A escola estava arrumada e enfeitada para o dia das bruxas. Os armários tinham figuras e esqueletos de brinquedo presos, teias de aranha penduradas no teto e diversos cartazes. No dia seguinte teria uma festa a fantasia com o tema "Halloween" organizado pelos alunos na escola e quase todos iriam, mesmo tendo trauma de festas nessa escola.
— Alice e Alex estão investigando casos de desaparecimentos no Halloween todo ano aqui na cidade. A maioria são crianças que saem para pedir doces e nunca mais voltam, mas a delegacia nunca achou um possível suspeito. Isso já acontece há uns quatro anos... desde então nenhuma criança foi encontrada.
Jesse falou deixando a briga anterior para lá e explicando até então. Ainda não tínhamos uma vítima exata para "o sangue de um pecador", pois existiam diferentes tipos de pecados que poderiam ser levados em conta. Na verdade, Jesse, Alice e eu decidimos que o sangue deste pecador deveria ser um homem, pois havia sido aquilo que nos levou a tornarmos parte da tríade de Hécate quando matamos nosso irmão, pai e namorado, respectivamente. Não era uma coincidência, Hécate visivelmente odiava homens.
— Espera, vocês realmente vão matar uma pessoa? — Crystal perguntou um pouco surpresa e Jesse e eu nos olhamos.
— Nada que nunca tenhamos feito. — Respondi dando de ombros.
— E se alguém descobrir? Se a polícia achar o corpo ou notar o desaparecimento de alguém na cidade?
— Relaxa, Crystal. Está tudo sob controle. — Jesse falou ansiosa e sorriu tentando aliviar o clima, mas Crystal não se convenceu muito.
Ao lado de nós havia uma enorme caixa de achados e perdidos para caso algum aluno tivesse perdido algo. A maioria dos objetos eram chaves, livros e até mesmo roupas, mas quase nunca iam buscar. O zelador da escola passou ao nosso lado e deixou um chapéu de bruxa com uma enorme ponta, preto e com algumas fitas roxas. Assim que ele sai, me aproximo da caixa e seguro o chapéu, colocando-o sobre minha cabeça e mostrando às meninas.
— O que acharam? Agora sou uma bruxa oficial com chapéu. — Falei brincando e elas riram de mim.
— Uau, agora só falta a vassoura. — Crystal brincou, mas logo voltamos ao assunto principal. — O que vamos fazer agora?
— Esperar Alice e Alex voltarem com todas as informações desse suposto maníaco de criança fantasiado de Frankenstein. Talvez ele mesmo seja nossa vítima. — Avisei tirando o chapéu da cabeça e segurando-o na mão enquanto olhava as duas.
Antes de Jesse ou Crystal falarem algo, vi uma garota familiar se aproximar de nós, mas ela olhava diretamente para mim. Estranhei um pouco sua aproximação, pois quase nunca nos falávamos, principalmente depois que ela se afastou de Alex por achar que ele gostava de mim.
— Seline, sua mãe está te chamando na sala dos diretores. — Avisou parando ao meu lado e eu olhei um pouco confuso.
— Certo, obrigada. — Agradeci o aviso e a vi caminhando para longe de nós. — Vamos lá.
Jesse, Crystal e eu caminhamos até a sala da direção. Assim que chegamos, esperei um aluno que conversava com ela sair e dei algumas batidas na porta antes de entrar.
— Mãe? — Chamei e ela olhou na nossa direção, mandando fecharmos a porta. — Me chamou?
— Na verdade eu chamei vocês três. — Disse tirando os óculos e apontou para as cadeiras, indicando que era para sentarmos. — Aylen ligou e pediu para avisar que vocês devem estar na cabana amanhã antes do ritual para uma espécie de preparação. Ela e o coven irão preparar o corpo de vocês para a recepção do poder supremo da tríade, pois será uma carga de poder muito mais forte do que os que tinham e talvez não resistam a ele.
Uma onda de perguntas surgiu na minha cabeça quando ela disse aquilo. Como assim "nosso corpo não podia resistir aos poderes?" Iríamos nos tornar tríades ou parte divina? E se o ritual desse errado? Morreríamos? Respirei fundo tentando não surtar ou entrar em pânico, pois tentava me convencer de que tudo ia dar certo e que Lúcifer seria vencido e então viveríamos felizes para sempre.
O problema era que não éramos as princesas da história, aquilo não era um conto de fadas onde as donzelas viveriam felizes para sempre. Aquilo era a realidade, não existiam fadas madrinhas para nos ajudar. Éramos as bruxas, fazíamos parte de algo além da compreensão humana, algo divino. Bruxas nunca tiveram um final feliz, sempre eram vencidas pelas pobrezinhas princesinhas, ou, na realidade, eram queimadas ou enforcadas em praça pública por terem conhecimento.
Não eram apenas as bruxas que foram queimadas. Muitas mulheres acusadas de bruxaria também tiveram este triste final por se recusarem a ser submissas, por conhecerem chás, ervas, por adorarem à natureza. Era delas que deveríamos nos lembrar, das nossas ancestrais.
— Eu não quero nem pensar o que você quer dizer com isso, mas tudo bem. — Jesse me tirou do meu transe ao falar com Mariyah, mas a mais velha parecia preocupada.
— Nenhuma tríade nunca conseguiu passar por esse ritual, mas vocês precisam. É algo importante que vai determinar o futuro...
Enquanto Mariyah falava coisas que eu já imaginei que ela fosse fazer, deixo minha mente pairar por diversos pensamentos. Se não desse certo nosso trabalho teria sido tudo em vão e o pior iria acontecer. Lúcifer ia dar um jeito de se fortalecer e nem mesmo Lilith iria conseguir impedi-lo. Era a reta final, seria nosso último jogo e nossa última chance. Qualquer movimento errado e já era. Seria o fim!
— Seline? Seline! — Jesse me chamou, fazendo com que eu saísse do mundo da lua e voltasse a atenção.
— O que foi? O que aconteceu? — Perguntei me ajeitando na cadeira enquanto olhava elas.
— Eu estava dizendo que depois do ritual é bom vocês praticarem um pouco os poderes. Não sei se a deusa vai dar algum auxílio para vocês, mas é bom estarem prontas e terem uma estratégia montada para capturarem Lúcifer. — Mariyah diz olhando para mim e eu dou de ombros.
— Tudo bem. Já falamos com Josephine e ela está preparada para o plano de prender Lúcifer no inferno. Está tudo certo, tudo montado, só falta atacarmos. Dessa vez ele não vai ter escapatória, mãe. Vamos pôr um ponto final nisso de uma vez! — Falei confiante me levantando da cadeira.
— Precisamos ir, marcamos de encontrar Alice e Alex na cabana. — Disse Jesse se levantando também junto de Crystal.
— Boa sorte, meninas. Que tudo dê certo!
Sorrio fraco para minha mãe e logo saio da sala. Coloquei o chapéu de bruxa na cabeça novamente determinada a encerrar logo aquilo.
Espero que tenham gostado. Vote no capítulo se você gostou e comente suas opiniões sobre o livro! Sz
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