Capítulo 68: Caçadora de Demônios
Saint Luna, 10 de maio de 1991
Sexta-feira - 03:04 P.M.
— Então você quer dizer que foi sequestrada pelo Stephen, viu ele e as meninas usando magia e quando voltou para casa, pesquisou sobre tudo isso?
— Quase isso. De início eu pensei estar ficando louca, mas aí comecei a ligar os pontos. Pensei que fosse algo como demônios e essas coisas, mas acertei na questão de bruxas. — Respondi Chris enquanto andava ao seu lado, em direção ao Hospital Central de Saint Luna.
— Daí pesquisou sobre o assunto e estudou formas de capturar demônios?
— Exatamente, com a ajuda de um padre da cidade. Eu tive que acabar contando algumas coisas, mas fiz o máximo possível para manter a identidade das meninas em segredo.
Ao chegarmos no hospital, entramos diretamente e fomos até a recepcionista, que nos olhou com cara de entediada. Ouvi alguns médicos e enfermeiras ao redor comentando sobre a chegada de vários pacientes com tuberculose, como se a doença tivesse se espalhado.
— Estão chegando muitos, não teremos como dar conta de todos! Enviaremos parte o mais rápido possível para as unidades de Newlade, coloque todos em quarentena. Se já não bastasse essa crise de alimentos e essa neve repentina, ainda teremos que lidar com uma epidemia!
Reconheci a voz de imediato. Quando me virei, observei Elizabeth Whitmore, com seu uniforme de trabalho, enquanto atendia diversos pacientes.
— Querida, vocês não podem entrar aqui a não ser que estejam doentes. Está me ouvindo? — Disse a recepcionista, chamando minha atenção.
— Eu só preciso de um segundo. — Insisti me afastando, mas ela me impediu.
— Se você não sair daqui agora, vou precisar chamar os seguranças!
Ignorei a mulher e caminhei na direção que Liz, supostamente distraída. Chris me acompanhou em silêncio, enquanto segurava sua bengala e dava passos leves para não acabar caindo.
— Elizabeth. — Chamei, e no mesmo instante ela se virou surpresa.
— Crystal? O que você está fazendo aqui? Chris?
— É o seguinte, precisamos que você arrume um jeito de fechar o hospital. Estamos em guerra, tudo isso foi causado por Lúcifer para trazer o apocalipse e escravizar a humanidade. Como a nova tríade está aqui e conseguiram unir os poderes, ele quer usá-las para ajudar, mas antes ele está lançando algumas pragas. Esta doença é uma delas.
— Crystal? — Liz me olhou totalmente confusa. — Como você sabe disso?
— É uma longa história. — Dei de ombros e olhei ao redor, preocupada. — Você tem duas opções: a primeira é fechar os hospitais com todos aqui dentro e a segunda é enviar todos para fora da cidade o mais rápido possível!
— Ou deixar os que estão aqui e os próximos que chegarem irem direto para Newlade. — Chris sugeriu e Liz concordou.
— Então, qual é o próximo destino? — Perguntei me virando para o garoto e ele ficou levemente pensativo.
— A delegacia!
Saímos do hospital e deixamos a responsabilidade daquele lugar nas mãos de Elizabeth. Fomos depressa até a delegacia, que estranhamente estava cheia.
— Detetive Butler. — Chamei, passando na frente dos outros, que me olharam furiosos. — Com licença.
— Você não é a garota que foi sequestrada há uns meses? — Questionou deixando uma pasta em cima da mesa e caminhando na minha direção. — Como posso ajudar?
— Preciso que feche a delegacia o mais rápido possível e acione o toque de recolher. É questão de vida ou morte, por favor, acredite em nós.
— Eu não posso fazer isso de uma hora para a outra sem motivos. Pode me contar o que está acontecendo?
— Não tem como explicar, mas saiba que é um bem para todos.
Assim como no hospital, a delegacia estava lotada. Haviam muitas pessoas assustadas e vários policiais tentando controlar a situação, mas o clima não era dos melhores.
Antes de contestar, uma mulher ensanguentada entrou na delegacia completamente desesperada. Os policiais, incluindo o detetive Butler, correram para acudí-la.
— Eu não sei o que aconteceu, meu marido ficou com os olhos completamente pretos e tentou me esfaquear. Ele mudou de uma hora para outra, aquele não era meu marido. Era um demônio!
— Ele está usando demônios para possuir as pessoas. — Chris sussurrou ao meu lado e eu concordei. — Eu tenho uma ideia, só não sei se vai funcionar.
— Qualquer sugestão no momento é bem vinda. — Falei esperançosa e aguardei ele continuar.
— Já que o detetive não quer dar o toque de recolher, por quê não faz por você mesma?
Olhei na direção da porta da sala do detetive e vi que não havia ninguém, pois todos estavam distraídos demais no meio daquela confusão. Aproveitando o momento, puxei Chris comigo até dentro da sala e fechei a porta.
Peguei um dispositivo parecido com um rádio e apertei o botão de ligar, até que fizesse um barulho agudo e irritante.
— Atenção a todos os moradores de Saint Luna! A cidade está sendo interditada e todos deverão ficar em casa até os problemas serem resolvidos. As estradas deverão ser fechadas e todas as lojas e mercados também. Fiquem todos em casa!
Assim que eu terminei de falar, um dos policiais entrou na sala e me encarou furioso pelo meu pequeno delito e começou a se aproximar.
— O que vocês pensam que estão fazendo?
Dei alguns passos para trás, sentindo cada gotícula de fúria que ele transmitia. Obviamente ele não estava em seu estado normal, e quando notei, seus olhos estavam completamente escuros.
— Chris, ele é um deles! — Falei preocupada.
Eu sabia prender os demônios, talvez matá-los, mas não sabia exorcizá-los. Essa era a função do padre Benedetti, mas ele não estava aqui para nos ajudar. Bem, ainda não.
— Vamos sair daqui, agora! — Disse Chris tentando manter a calma, mesmo sem enxergar absolutamente nada o que estava acontecendo.
— Vocês não vão a lugar nenhum! Meu senhor mandou prendê-los e levá-los daqui. — O demônio falou no corpo do policial, jogando uma cadeira na nossa direção, mas o suficiente para desviarmos.
— É o que vamos ver. — Falei e empurrei a mesa na frente dele, impedindo sua passagem.
No mesmo instante, Chris e eu corremos para a saída, mas uma sombra escura fechou a porta e a trancou, impossibilitando nossa fuga.
— Onde está a deusa de vocês agora? Hécate nunca foi divindade o suficiente para combater uma simples catástrofe do nosso Senhor dos Infernos. — Falou em tom de deboche e sorriu.
— "Quando ouvir o chamado da Deusa Hécate, não hesite.
Siga e torne-se um de seus cães enquanto ela guia você pela escuridão
Vá e sinta o poder!"
— O que é isso, uma oração? — O demônio falou em meio a risos, olhando para Chris, logo após ele citar uma frase em defesa da deusa.
— Não, é apenas um recado. — Chris empurrou sua bengala pela metade, revelando uma ponta afiada e brilhante. Ele a girou e a lançou com força na direção do homem, acertando bem no meio do seu coração. — Nem sempre temos piedade.
— Chris, você está louco? Você matou o policial que ainda estava vivo! — Falei perplexa, olhando o sangue escorrendo pelo corpo do cadáver.
Chris se aproximou e tirou sua bengala de lá, fechando e escondendo sua lança mágica completamente ensanguentada.
— Na verdade ele já estava morto, o corpo era apenas uma casca para o demônio. Aliás, essa é uma das armas que só atinge qualquer ser sobrenatural, então não seria letal para os seres humanos.
Saímos da delegacia o mais rápido que conseguimos, mas a cidade continuava um caos. O frio congelava tudo ao redor, e caía tanta neve que parecia que o céu iria desabar.
— Você realmente matou aquele demônio? — Perguntei ao seu lado enquanto andávamos de volta até a cabana tríade. — Como fez isso? Achei que fosse da linhagem wicca.
— Eu já enfrentei certos problemas com demônios, e não matei o que estava no policial. Demônios não podem ser mortos, não que eu saiba. Por enquanto eles só são levados de volta ao inferno, de onde nunca deveriam ter saído.
— Temos quatro problemas então. A crise em alimentos, a tuberculose, o frio em plena primavera e uma legião de demônios. O que faremos?
— Você, como uma caçadora de demônios, vai ajudar a criar um portal que leve todos os demônios de volta para o inferno de uma vez. Enquanto isso, os outros resolvem os problemas que restaram.
— Mas e você? — Perguntei parando de andar aos poucos, assim que estávamos prestes a entrar na floresta.
— Eu vou te ajudar.
— Foi sem querer! Enquanto treinávamos para ligar os nossos poderes infernais, acabamos abrindo um portal em que uma das legiões de demônios saíssem. — Seline falou nervosa, andando de um lado para o outro na cabana.
— Espere aí, uma das? — Questionei surpresa e com medo. Se aquela era apenas uma legião de demônios, quantas mais teriam?
— Toda legião tem um príncipe que comanda seus atos. Achem ele e mandem de volta ao inferno, depois fechem o portal e automaticamente todos os demônios que estão soltos vão voltar ao inferno.
Stephen falou pensativo, encostado na parede ao lado da porta e olhando atentamente pela janela. Jesse e Alice estavam sentadas no chão, e até então em um silêncio constante.
— Eu sei como acabar com a crise da tuberculose!
Todos voltaram suas atenções para Nantai, que havia acabado de chegar na cabana completamente coberta de neve. Ela entrou o mais rápido possível e fechou a porta, respirando com certa dificuldade.
— Trouxe as ervas, velas e sei lá mais o que? — Perguntou Jesse, e Nantai concordou com a cabeça.
— Vamos tentar o feitiço de fertilização em vocês três, e minha avó e eu vamos acabar com essa epidemia que está acontecendo lá fora.
— Fomos ao hospital e pedimos que todos que estivessem com tuberculose ou suspeita, fossem para o hospital de Newlade. Elizabeth estava lá, ela estava tentando controlar a situação. — Disse Chris.
— Essa doença foi uma das pragas que Lúcifer enviou. — Alice sussurrou enquanto passava a mão pelo grimório. — O frio também foi uma, ressecar as terras foi outra.
— E o que quer dizer com isso? — Perguntei esperando uma resposta exata.
— Ele está nos distraindo.
Um silêncio curto predominou naquele lugar. A ideia de Alice parecia fazer sentido, e faria. Todos nós nos distraímos tentando manter em controle todas as pragas que ele enviou, mas nenhum de nós se lembrou onde ele estava e nem o que ele fazia nesse exato momento.
— Vamos continuar com o antigo plano. Lucy e as gêmeas estão tentando acabar com esse frio para que a fertilização volte e o coven possa praticar feitiços novamente. Crystal e Chris vão fechar o portal e prender essa legião que está a solta, e vocês três precisam recuperar seus poderes urgentemente! — Nantai falou tentando não surtar, e se apoiou no sofá. — A ideia que minha avó e eu tivemos foi espalhar um tipo de cura rápida pelo ar, mas só funcionaria com a ajuda de um avião que sobrevoasse pela a cidade soltando o pó mágico.
— Pó mágico? — Jesse questionou confusa, e desde que eu cheguei, aquele foi o primeiro sorriso que vi Nantai dar.
— Novatas. — Sussurrou e olhou na direção de Stephen. — Você precisa ir até o inferno e pedir ajuda de Lilith. Ela pode nos ajudar com a prisão que vamos usar com Lúcifer, garantir que o plano dê certo. — Vocês dois, o que ainda fazem aqui? Vão, fechem o portal!
Quando dei conta que Nantai falava comigo, endireitei minha postura e olhei para Chris, esperando sua confirmação.
— Vamos. — Disse começando a caminhar na direção da porta, mas Seline segurou sua mão antes que saísse.
— Por favor, Chris. Tome cuidado com o que vai acontecer, eu preciso que você volte vivo e traga Crystal com você. — Pediu nervosa, e ele se virou para ela.
— Olha, eu diria que Crystal sabe se defender bem melhor que eu. — Falou e se aproximou de Seline, dando um beijo no topo da sua cabeça. — Vou voltar bem, eu prometo!
E assim, deixamos a cabana novamente. Eu tinha uma forte sensação de esperança a cada passo que dávamos, e nem sabia exatamente onde ficava esse portal que teríamos que fechar.
— Onde fica esse portal? — Perguntei caminhando ao seu lado.
— No cemitério. — Disse Chris respirando fundo. — É impressão minha ou o gelo está derretendo?
De início eu pensei que ele estivesse dizendo algo em metáfora, mas então notei que não nevava mais, porém, o frio ainda era intenso. Um sol fraco aparecia aos poucos no céu, fazendo toda a neve no chão derreter com cuidado.
— Elas estão conseguindo! — Disse animada, lembrando-me que Lucy e as gêmeas estavam responsáveis pelo fim do curto inverno.
Não demorou muito para que chegássemos ao cemitério, mas ainda não havíamos entrado. Notei uma borboleta marrom passando pela minha frente, mas não dei muita atenção. Chris caminhou na minha frente, e eu acabei me distraindo com outra borboleta da mesma cor que voava ao redor de mim. O que estava acontecendo?
Tropecei em algo no chão, mas não caí. Me abaixei e olhei o objeto de madeira com uns símbolos e pinturas estranhos, que mais parecia um formato de animais. Segurei o objeto sem saber o que era, e quando isso aconteceu, minha realidade mudou.
Vi tudo ao redor pegando fogo, gritos de desespero e Lúcifer parado com um sorriso vitorioso. Foi tudo tão real, que só me dei conta de onde estava quando Chris me chamou.
— Você vem?
Joguei o objeto no chão e entrei no cemitério, com o corpo tremendo e em choque. Aquilo era surreal e real ao mesmo tempo, algo que fosse como uma previsão do que iria acontecer.
— "Borboletas marrons anunciavam tragédias que afetavam os amigos"
Espero que tenham gostado. Vote no capítulo se você gostou e comente suas opiniões sobre o livro! Sz
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