Capítulo 64: A Hora da Sua Morte
Inferno, 38 horas depois
Gritos altos de pavor e agonia eram ouvidos por todo lado, mas meus olhos ainda se mantinham fechados. O meu corpo ardia e minha cabeça doía como se fosse explodir, e eu não fazia ideia de onde estava.
Em um momento eu estava com minhas amigas em uma floresta macabra no inferno, no outro, eu estava em uma caverna clareada por chamas, sozinha, com pessoas sendo torturadas ao meu redor.
— POR FAVOR, DEUS! ME TIRE DAQUI, ME PERDOE!
Uma mulher gritava enquanto chorava, e quando abri os olhos, vi ela um pouco mais distante, presa em uma corrente que aparentemente pegava fogo. Sua garganta estava cortada, e faltava-lhe uma de suas pernas.
— Deus? Você está no inferno! Esse é o preço que se paga por ter assassinado uma criança inocente, sua imunda!
Um demônio com o corpo deformado, queimado, gritou na sua frente com a voz arranhada. Ele pegou uma barra de ferro e a colocou sobre o fogo por alguns segundos, e depois a enfiou aos poucos na boca daquela mulher.
Virei a cabeça para não ver aquela cena, mas presumi onde estava. Era um tipo de sala de tortura, onde as pessoas que foram para o inferno pagavam pelos seus crimes, e o crime daquela mulher foi matar uma criança. O inferno às vezes é justo.
— A famosa Jessica Whitmore, ou como chamam, Jesse.
Reparei um homem de sobretudo se aproximando aos poucos de mim. Ele estava com a expressão calma, nem parecia que estava no inferno.
— Quem é você? — Perguntei com dificuldades, tentando ignorar os gritos ao redor.
— Sou uma pessoa que quer apenas ajudar. Você quer sair daqui? Eu tenho a solução, e não é muito difícil.
Ele se abaixou até ficar da minha altura, e soltou as correntes que prendiam minhas mãos. Suspirei de alívio, tocando-as e as sentindo doloridas.
— Obrigada. — Agradeci, e ele deu de ombros.
— Você pode sair daqui tão rápido que nem vai perceber, é só eu estalar os dedos. Viverá anos e anos, será campeã olímpica em tiro com arco, ajudará sua tia em hospitais e o melhor de tudo, poderá assumir quem você é de verdade, Jesse.
— Como assim? — Perguntei confusa com o papo de assumir meu verdadeiro eu.
— Você sabe muito bem, o primeiro passo é aceitar. Enfim, você topa?
Pensei um pouco antes de aceitar. Eu estava no inferno, não poderia simplesmente acreditar em qualquer coisa fácil que não tivesse algo em troca.
— Qual o preço?
— Simples e bom. Apenas abandonar esse mundo da magia, ser uma pessoa comum e sem preocupação. E também... sabe, deixar suas amigas.
— Eu nunca vou deixá-las. Sinto muito desapontar, mas eu não aceito.
Ele revirou os olhos como se já tivesse feito aquilo milhares de vezes, e respirou fundo. O homem se levantou e me encarou de cima, onde eu ainda estava sentada.
— É uma pena que sua lealdade não valha de nada se suas amigas não a valorizam.
Me apoiei na parede e levantei do chão, olhando desconfiada para o homem, que parecia não se importar.
— O que quer dizer com isso? — Perguntei.
— Veja você mesma.
Como se fosse real, a imagem de Alice e Seline surgiu na parede próxima. Elas estavam sentadas em lugares sujos, e ambas presas. As duas estavam cansadas e assustadas, e o homem de sobretudo estava fazendo a mesma proposta para ambas.
A de Alice era extremamente tentadora, tudo o que ela mais sonhava. Eu não esperava que ela fosse aceitar, mas para a minha surpresa, ela aceitou. Seline demorou para aceitar, mas de tanta insistência do homem, ela enfim se rendeu.
— Isso não é real, não pode ser!
O homem me olhou como se quisesse dizer, "eu avisei". Aquilo não poderia estar acontecendo, mas aconteceu. Não era tarde demais para aceitar a minha parte da proposta, mas eu não iria fazer aquilo, mesmo que elas já tivessem feito.
— E então? — Perguntou se virando para mim.
— Esquece isso, cara. Eu não vou aceitar, mesmo sendo tentador demais.
— Oh, que pena.
Sem ninguém ou nada encostar em mim, minha consciência apagou novamente. Quando acordei, vi que não estava mais naquela parte. Eu estava em um lugar confortável e quente, era um quarto bem familiar.
Uma garota animada entrou carregando algumas caixas e as colocou na cama. Ela pegou certos objetos do quarto e os guardou na caixa, empilhados um por um.
— Crystal?
Chamei, mas ela não ouviu. Senti como se eu não estivesse realmente ali, mas eu tinha certeza de que aquilo era real. Alguém bateu na porta, e Crystal correu para abrir, revelando uma pessoa.
— Jesse? O que faz aqui? — Perguntou surpresa, dando espaço para entrar.
Aquela não era eu, e sim alguém se passando por mim. Eu sentia que alto iria acontecer e envolveria Crystal no meio de tanta tortura. Por que o inferno precisava incluir outras pessoas nisso? Já não me bastava?
— Não encoste nela! — Ameacei para minha outra eu, e ela olhou fixamente para mim como se conseguisse enxergar.
A Jesse falsificada sorriu para Crystal ao entrar na casa e se sentou no lugar mais próximo, sem dar muito detalhe.
— Resolvi matar a saudade e vim te ver. — Respondeu animada também e os olhos de Crystal indicaram dúvida.
— Estranho, você nunca me visitou assim e... não avisou. — Respondeu sentando-se longe, mas ainda curiosa.
— Surpresa! — A outra Jesse disse se levantando e dando leves passos até Crystal. — Além disso, eu tenho um presente para você.
— Que presente?
A outra Jesse colocou a mochila na sua frente e a abriu lentamente, tirando uma flecha pontuda lá de dentro. Ela apontou para Crystal como se não fosse nada demais, porém aproximou a ponta afiada até próxima da garota.
— A sua morte.
Crystal se levantou e quando ia começar a correr, uma sombra escura a segurou pelo pescoço. Ela começou a se sufocar, e seus pés batiam pelo ar sem nenhum apoio.
Tentei pegar algo para jogar em mim mesma, mas minha mão não passava. Parecia um fantasma preso nessa dimensão, mas eu ainda estava viva.
— Pelo amor da deusa, ajude-a! — Supliquei, mas não obtive respostas.
Talvez a deusa tríplice não me ouvisse aqui do inferno, então seria uma tentativa em vão.
Acompanhei a cena em que a Jesse jogou Crystal contra a parede, que bateu com força e caiu no chão. Ela estava confusa com tudo o que acontecia, e certamente com decepção.
— Por que você está fazendo isso, Jesse? — Perguntou com a voz chorosa, e a Jesse se aproximou.
— Porque eu te odeio, Crystal. Nunca tive paciência para seus dramas ou o seu jeito mimado. Você é fútil, garota. Nem no que em que eu fui estuprada você me ajudou, o que mais eu poderia esperar? — Falou cuspindo as palavras e esfregando a ponta na flecha no pescoço dela. — Agora que eu ganhei poderes, minha vingança chegou.
O que aquele demônio dizia? Eu nunca achei Crystal nada daquilo, e esperava no fundo do meu coração que ela soubesse e não caísse naquele papo. Por outro lado, ela era humana, não havia muito o que fazer.
— Você não é a Jesse. — Sussurrou, me fazendo olhar surpresa.
Eu estava quase surtando por ver minha melhor amiga quase morrer, sem fazer nada por estar presa no inferno. Quando ela afirmou que não era eu, o demônio a olhou confuso.
— Claro que sou eu, querida. Quem mais seria? — Ela apertou a flecha mais ainda na garganta de Crystal, fazendo escorrer gotas de sangue.
Crystal não respondeu, ela fez algo que me surpreendeu. Com força, puxou uma cadeira próxima e a jogou contra Jesse, que caiu e soltou a flecha por alguns segundos. Em rápidos movimentos, ela correu notando que a outra já havia se levantado e corria atrás dela, mas então Crystal puxou o tapete assim que Jesse passou.
— Um demônio!
Quando a outra Jesse tentou sair, ela não conseguiu. Era como se uma barreira invisível a prendesse em uma pequena parte da sala, mas notei um símbolo estranho e grande no chão. Crystal puxou um tipo de arma debaixo de uma prateleira e apontou para Jesse do mal, com o dedo no gatilho.
No mesmo momento, o demônio assumiu sua forma natural. Como os outros, ele tinha o corpo queimado, a língua afiada e dois pequenos chifres na cabeça.
— Como soube? — Perguntou furioso, rangendo os dentes e tentando sair da barreira.
— Eu não sou burra, eu sei que vivo em um mundo de demônios e bruxas, e sei que a Jesse e suas amigas são. Sei também que fui sequestrada por um homem que não era normal, mas aparentemente não era do bem. Eu não estava totalmente desacordada e aquilo me intrigou, então deixei armadilhas espalhadas pela casa para caso algo como isso fosse acontecer. Surpresa por eu não ser mais tão lerda quanto antes? Haha, querida. Pode me chamar de caçadora de demônios agora, vadia!
Eu queria gritar de emoção, pois um peso enorme saiu de mim. Crystal estava mudada, mas no fundo era a mesma. Então, ela atirou. Imaginei que não fosse uma bala normal, pois queimou a pele do demônio como ácido e o fez agonizar. A garota pegou um telefone próximo e discou alguns números, e minutos depois um homem apareceu na casa dela, trazendo uma Bíblia, água benta e cruzes.
Houve um longo processo de exorcismo naquele lugar, mas eu não pude acompanhar, pois meu corpo foi levado a outro lugar.
Você venceu dessa vez, Jesse, mas a próxima é inevitável.
Uma voz horrível sussurrou para mim, e quando olhei ao redor, percebi que estava em uma prisão.
— Eu não tive culpa. Tudo isso foi culpa sua, Jesse! Por quê com você foi tão natural e na minha vez de fazer vingança com as pessoas que me fizeram de saco de pancadas, eu tive que ser preso?
Por trás das grades, vi Dylan com seu uniforme de presidiário. Ele segurava uma corda, e não sei onde conseguiu uma, mas laçava ela.
— Culpa sua, Jesse! Que nos deixou morrer!
Meu corpo se arrepiou com o sussurro que passou por mim, com a voz idêntica a de Nora. Ao redor, outras falavam a mesma coisa, e eu sabia que era David, Audrey e Tyler juntos.
— Não, não! Eu não pude fazer nada!
Meu olhos vidraram no que Dylan pretendia fazer. Ele subiu na cama e pendurou a corda em um ferro no teto, e então a colocou no pescoço.
— DYLAN, NÃO FAÇA ISSO! — Gritei, mas foi uma tentativa inútil.
— Tudo culpa suaaa!
As vozes ao redor de mim cantarolavam e riam de mim, conforme meu desespero aumentava. Dylan não poderia simplesmente fazer isso, ele não poderia acabar com a própria vida.
— Não é ele que acabou com a própria vida. Você acabou com a vida dele e do pai dele, que já está a sete palmos do chão. Jessica Whitmore não passa de uma assassina! Egoísta!
Tampei os ouvidos com as mãos para tentar evitar de ouvir, mas não conseguia. Fechei os olhos chorando, e tentei não ver o que Dylan fazia, mas mesmo de olhos fechados eu ainda enxergava.
Em seu último suspiro, Dylan Hendrix se jogou da cama e começou a se debater, deixando sua vida escapar pelos dedos. Era tarde demais, pois seus olhos se fixaram em mim antes de partir, como se a última coisa que tivesse visto fosse eu.
Os fantasmas ao redor continuavam rindo e debochando, e por mais que eu tentasse, ainda conseguia ouvir. Sentei no chão e encostei na parede, apertando bem os olhos.
— JESSE!
Com o grito ecoando pela caverna, abri os olhos e vi que voltei até a sala de tortura. Ainda havia pessoas gritando e sendo torturadas, mas ao menos eu estava intacta.
— Tudo culpa minha. — Repeti comigo mesma, deixando as lágrimas escorrerem. — Me perdoem!
— Jesse, vamos sair daqui!
Levantei a cabeça e surpreendentemente vi Alice e Josephine juntas, naquele lugar. Ergui a sobrancelha ao ver que Alice estava junto, pois tinha certeza de que ela havia aceitado a proposta.
— Alice? Achei que tivesse aceitado a proposta daquele homem. — Falei me levantando com a ajuda de Josephine.
— Eu também achei que... — Começou mas olhou confusa para o chão. — Foi tudo uma ilusão!
— Tudo bem, meninas. Vamos conversar mais tarde, mas agora precisamos dar o fora daqui antes que mais demônios malucos nos vejam! — Disse Josephine eufórica, me puxando para fora daquele lugar.
Espero que tenham gostado. Vote no capítulo se você gostou e comente suas opiniões sobre o livro! Sz
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