Capítulo 63: Brincando de Matar
Inferno, 35 horas depois.
Numa hora eu andava com Josephine e Seline, em busca de Jesse, e em outra, eu estava desacordada.
Abro meus olhos aos poucos, e quando tento me mexer ou falar, percebo que minhas mãos estavam amarradas e minha boca também. Olhei apavorada ao redor e comecei a me dar conta de onde estava.
— Senhoras e senhores, o show já vai começar. Façam suas apostas! Vocês sabem as regras, o vencedor será aquele que conseguirá sair vivo!
Alguém em um microfone anunciou, e o público nas arquibancadas da arena gritavam em euforia, pularam, batiam palmas com toda aquela situação.
— Ah, querida. Você está assustada?
Um homem que eu nunca tinha visto na vida, mas aparentemente comum, se aproximou aos poucos e se abaixou, até ficar mais próximo de mim.
— Onde eu estou? Onde estão minhas amigas? — Perguntei apavorada, e ele me olhou como se estivesse com pena.
— Elas estão bem, até demais. Você quer sair daqui, não é? — Perguntou, e eu concordei com a cabeça. — Eu tenho uma proposta. Você pode ir embora, voltar para casa e fingir que nada disso aconteceu, só que você terá que abdicar seus poderes.
— E as minhas amigas? — Perguntei prestando a atenção em sua proposta.
— Elas podem ficar, você pode ir. Pense bem na bela vida que você terá, na sua faculdade, seu emprego dos sonhos. Se tornará uma grande cientista, se casará com aquele garoto da biblioteca, terão lindos filhos! — Sugeriu, e então um brilho surgiu nos meus olhos. — O que acha? Tudo o que você sempre quis.
— Eu não vou deixar minhas amigas, por mais que sua proposta seja tentadora, eu não vou deixá-las! — Falei, e o homem assumiu uma expressão de raiva.
— Que pena, pois saiba que suas amigas não fariam o mesmo por você.
— Não acredito em você.
— Você vai passar a acreditar.
Perto de mim, vi Jesse acorrentada em uma sala escura. O mesmo homem se aproximava dela e fazia o mesmo acordo, e surpreendentemente ela aceitava. Jesse não aceitaria uma coisa daquelas, ela não seria capaz de nos deixar apenas por liberdade. Eu tinha certeza, eu a conhecia.
Depois, aconteceu o mesmo com Seline. Ela estava em uma cela úmida e suja de sangue, e este homem lhe fazia a mesma proposta. Seline demorou um pouco para aceitar, mas acabou se rendendo. Eu acreditava que ela seria capaz de fazer aquilo, mas não acreditava se realmente fez.
— Mesmo que elas tenham feito ou não, não vou me render tão fácil assim.
Ele revirou os olhos e se levantou, caminhando para longe de mim. Dois homens com trajes medievais se aproximaram e me soltaram, deixando minhas pernas e braços livres. Suspirei aliviada, mas a emoção foi rápida.
— E agora, teremos um show de horrores! De um lado, a humana bruxa pagã Alice LaRue, do outro, temos o nosso formoso príncipe Astaroth!
A multidão gritava, e de uma pequena porta embaixo da arena, uma criatura estranha saiu.
Era um demônio baixo, tão magro que deixava duas costelas nítidas pela pele. Ele usava uma coroa e tinha asas enormes com dois chifres em cada. O demônio tinha um enorme rabo grosso, sua mão era afiada e suas unhas do pé também. Astaroth segurava algo em formato de cobra na mão, estava montado em uma criatura escamosa que parecia a mistura de um cão com uma ratazana. Completamente bizarro!
Eu não podia lutar fisicamente contra um demônio, pois obviamente ele me mataria em menos de dois minutos. Por outro lado, eu não podia usar os poderes aqui, eles simplesmente não funcionavam.
— Eu não quero participar. Eu nem sei o que está acontecendo!
Astaroth se aproximou com um sorriso demoníaco e com os olhos todos escuros, e me deu uma última olhada.
— Sinta-se honrada por ser morta por um príncipe como eu, garota!
O que eu faço? Corro? Finjo desmaio?
Ele apontou sua cobra para mim e ela pulou da sua mão, começando a rastejar em minha direção. Um dos guardas lhe entregou uma lança, mas me deixaram de mãos vazias.
O animal tinha aproximadamente três metros de comprimento, ela se arrastava com os olhos fixamente em mim. Se eu corresse agora, ela me mataria facilmente.
Me abaixei aos poucos e a deixei se aproximar. O público que antes gritava, agora estava quieto, e Astaroth me olhava indignado.
A cobra se aproximou mais tranquila e subiu pelo meu braço. Ela não parecia querer fazer mal, bastava apenas eu ficar calma. Astaroth se aproximava em cima do seu animal de estimação, com sua lança apontada para mim.
— Como fizeste isso, feiticeira?
Perguntou com fúria nos olhos, e eu dei alguns passos para trás conforme ele se aproximava. A cobra ainda estava em cima de mim e ela encarava friamente o demônio. Talvez nem ela gostasse do cara, que aparentava ser insuportável.
— Eu tenho super poderes que funcionam embaixo do inferno. Hipnotizei sua cobra, posso fazer o mesmo com você e com todos!
Menti em voz alta e confiante para que todos presentes ouvissem. Quase não acreditei que Astaroth caiu no meu papo, pois ele abaixou sua lança e se expressou com medo, junto com a plateia. Seu animal deu leves passos para trás, como se também estivessem com medo.
— Pois tu fazes parte de alguma legião, jovem bruxa?
Ou os demônios eram burros demais, ou eu havia lançado uma jogada mestra, pois todos pareciam cair na minha mentira de quinta categoria.
— Não, senhor. — Respondi mantendo o ritmo da respiração. — Eu e minhas amigas estamos em busca da Rainha, e vocês não podem nos machucar pois somos suas convidadas especiais. Imagine o quão furiosa ela ficaria ao ver que fomos assassinadas? — Todos se olharam confusos e começaram a sussurrar entre si.
De longe, vi dois guardas se aproximando de mim, mas eles não pareciam tão calmos quanto os outros. Quando um deles segurou meu braço com força, a cobra pulou de mim e com uma abocanhada só, o engoliu de uma vez, espirrando sangue para todos os lados.
Agora eu entendi porque todos tinham medo dela. Ela engolia suas vítimas de uma vez só, independente do tamanho que ela tivesse. Aquele animal com certeza era diferente.
Enquanto a cobra levava seu processo para digerir um dos guardas, o outro se aproximou e me puxou sorrateiramente para fora da arena. Ninguém percebeu, pois estavam chocados olhando para o espetáculo da minha amiga cobra.
— Você mexeu com as pessoas erradas, e pode até fazer aquele bando de idiotas acreditarem nas suas bobagens, mas eu estou aqui e sei seus motivos.
E novamente fui apagada. O inferno era estranho, ele gostava de me fazer desmaiar enquanto eu estava bem.
Assim que acordei, notei que não havia se passado tanto tempo desde meu momento na arena. O guarda que me pegou não estava mais lá, e eu nem sabia bem onde estava.
Era uma rua pequena com casas iguais, sem árvores, apenas asfalto. Eu reconhecia aquele lugar perfeitamente, mesmo depois de ter se passado anos.
Dois caras com ternos cinzas e óculos cinzas se aproximavam, e da última vez que os vi, eles eram andróides. Eu estava na sala de simulação que meu pai fazia alguns experimentos quando era mais nova, e esse era o meu primeiro.
— Mate-a!
Uma voz na minha cabeça sussurrou, e eu não entendia quem ela pedia para eu matar, até notar que os dois androides traziam uma mulher com eles.
— Mãe?
Os androides a jogaram no chão na minha frente e me entregaram uma arma estranha. Minha mãe parecia pálida, não parava de tossir, assim como quando estava doente. Não era ela, não podia ser.
— Alice, onde estamos? — Perguntou chorando, com o olhar completamente apavorado. — Quem são esses? Por quê me trouxeram aqui?
— Vai ficar tudo bem, vou tirar você daqui. — Prometi, mas novamente a voz sussurrou.
— Mate-a agora! Estoura a cabeça dessa vadia!
Sem manter o controle do meu corpo, minha mão levantava a arma e desativava o gatilho, mesmo que eu tentasse fazer força para não fazer aquilo. Meu corpo estava descontrolado, outra pessoa fazia eu fazer o que eu não queria.
— Eu não vou matá-la! Você não pode fazer isso! — Insisti segurando a arma com força.
Mamãe chorava descontroladamente, e ver aquilo partia meu coração em pedaços. Eu não podia fazer aquilo, não podia assassinar minha própria mãe, sendo real ou ilusão.
Como não? Você matou seu próprio pai!
Meu pai. Será que ele também estava aqui? Morto, queimando desde o dia em que eu incendeei a casa. Nunca vou me orgulhar disso, pois independente de tudo, ele ainda era o meu pai e eu o amava. Mas ele estava louco. Foi o que me originou como uma bruxa tríade.
— MATE-A!
Fechei os olhos com força e apertei o gatilho. O som do tiro foi tão alto, que chegou a me deixar sem ouvir por alguns segundos. Senti gotas de sangue espirrando sobre mim, e só aí tive coragem de abrir os olhos.
Ela estava no chão, sua cabeça não tinha mais forma, apenas partes e sangue caindo para fora. Um desespero tomou conta de mim, eu havia ficado em um choque tão grande que nem chorar eu conseguia.
Aquilo não podia ser real, não podia!
Quando meu corpo voltou às minhas ordens, soltei aquela arma e a joguei longe. Aquele corpo já não tinha mais vida. Os dois andróides não se moveram, não reagiram e nem nada do tipo. Saí correndo para longe daquele lugar, mas as ruas pareciam todas iguais. Eu precisava sair daquele lugar, precisava acordar daquela prisão psicológica e encontrar minhas amigas.
— Vamos dar um pequeno passeio de volta ao mundo real. Vamos ver o que seus amigos estão fazendo?
No mesmo momento em que a voz na minha cabeça disse isso, o ambiente mudou de lugar. Eu estava de volta à Saint Luna, mais especificamente na biblioteca. Ah não!
Ao redor, as pessoas pareciam não conseguirem me ver. Era como se eu não estivesse ali ou fosse invisível, então significava que eu ainda estava no inferno.
Do outro lado da rua, vi Jasper entrando no seu carro estacionado e começando a dirigir. Ele estava indo para algum lugar, e eu não entendia muito bem o que a pessoa que falava na minha mente, queria que eu visse.
— Vamos jogar?
Eu ainda não compreendia muito bem o que acontecia ao redor de mim desde que fui obrigada a matar minha mãe, mas aquela parte parecia ser totalmente real.
— Por favor, deixe-o em paz! O que você ganha fazendo isso?
Segui o carro de Jasper pela pequena rua, até notar que estava indo mais rápido do que o normal. Pude ver da janela, Jasper tentando controlar o volante mas não conseguia, pois havia perdido o controle.
— Você vai ter sorte se conseguir sair viva daqui.
E de repente, uma explosão.
Meus olhos vidraram naquela parte, no tamanho do fogo que se espalhava junto com uma enorme nuvem de fumaça. As pessoas se aproximavam curiosas, ligavam para ambulância, bombeiro, polícia ou qualquer coisa.
Ele também não podia estar morto, aquilo não era real. Talvez pudesse, mas tudo parecia ser real e estar acontecendo de verdade. Eu não aguentaria se fosse.
— EU QUERO SAIR DAQUI!
Sentei no chão e fechei os olhos, totalmente em pânico. Minha cabeça girava, eu já não tinha mais noção do que era real, na verdade não tive desde que cheguei aqui. Eu preferia não ter vindo, preferia ter ficado em casa. Pelo menos nada disso teria acontecido.
Não adiantaria pedir ajuda para a deusa tríplice, pois sei que ela não me atenderia daqui. Enquanto soluçava de tanto chorar, imaginando que tudo aquilo era culpa minha, senti alguém me tocar.
— Graças à deusa eu te encontrei. Vamos sair daqui, precisamos achar as outras!
Abri os olhos e vi Josephine em pé na minha frente, estendendo a mão para mim. Uma pequena ponta de esperança surgiu em mim, e então eu me levantei com a sua ajuda.
Ela não parecia muito bem, estava com a expressão de quem tinha chorado demais, seu corpo estava completamente arranhado e parte da sua roupa rasgada. Com a ajuda de Josephine, saímos juntas daquela prisão mental em que eu estava presa.
Espero que tenham gostado. Vote no capítulo se você gostou e comente suas opiniões sobre o livro! Sz
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro