Capítulo 61: Que Comecem os Jogos
Saint Luna, 01 de maio de 1991
Quarta-feira - 05:11 P.M.
Depois que Chris foi embora, Seline, Alice e eu explicamos detalhadamente tudo para Josephine. Ela parecia prestar bastante atenção e compreender bem sobre o assunto.
— Desde quando você é uma bruxa satânica? Como é? Já mataram crianças para rituais? — Seline fazia diversas perguntas toscas de uma vez, complicando Josephine de responder cada uma.
— Não, nunca matamos crianças para rituais. — Respondeu sem olhar para ela, enquanto mexia em um livro grande e empoeirado.
— Você também tem um grimório? Que incrível! — Disse Alice animada.
— Como vamos ao inferno se o portal dele fica em Saint Luna? Estamos a duas horas de lá. — Perguntei, atraindo totalmente a atenção da garota.
— Existem diversos portais para o inferno. Todos ficam nos túmulos das pessoas que Lúcifer possuiu, e há vários por todo o mundo.
— E por onde vamos?
— Estão preparadas? — Josephine perguntou, sem nem responder a minha pergunta.
Tudo ao redor girou, e em questão de segundos, aparecemos em um cemitério sem nem ao menos termos saído do lugar.
— O que você fez? — Seline perguntou assustada, olhando ao redor e estranhando.
— Teletransporte. Agora vamos, temos muito o que fazer ainda.
O tempo começava a escurecer aos poucos, indicando que em alguns minutos a noite chegaria. O cemitério em que Josephine nos transportou era todo gramado, não havia muitas pessoas além de um guardinha.
— Este é o túmulo do antigo. — Falou apontando para uma lápide simples, com duas flores vermelhas murchas.
— E como entramos? Vamos escavar ou algo do tipo? — Seline perguntou se aproximando com cuidado.
— Vamos abrir a passagem. — Josephine respondeu como se fosse óbvio. — Provavelmente vai ter algum guardião, mas vai ser fácil passar por ele.
— Da última vez um cão infernal nos atacou. Achei que pudesse ser o único guardião da passagem pro inferno. — Disse Alice.
— Nem sempre. Existe aquele e milhares daquele.
Josephine se abaixou e moveu uma cruz presa na lápide, assim como Alice e eu fizemos em Saint Luna. O chão começou a tremer e a se abrir aos poucos, até formar uma enorme cratera quente.
Ao redor, as pessoas pareciam não notar. Era como se não estivéssemos ali, ou talvez eles não pudessem ver. Ouvimos um uivo vindo do chão e a sombra de um ser muito grande.
Josephine, como uma bruxa satânica, usou magia negra para prendê-lo em uma bolha escura. Foi tão fácil, em vista do que Alice e eu passamos.
Ela pulou lá dentro sem se importar com o que houvesse, nem perigos. Essa garota era completamente louca, mas esperava que soubesse o que estava fazendo.
Pulamos naquele buraco logo depois dela, e o teto em cima de nós se fechou. O cão enorme estava preso e seus latidos eram graves e altos, mas parecia não conseguir se mexer.
— O que vamos exatamente fazer aqui? — Perguntei tentando lembrar nosso objetivo.
— Cumprir a profecia.
Parei de andar quando ela citou "profecia". Seline e Alice pararam um pouco na minha frente, e Josephine se virou para me encarar.
— Que profecia? — Questionei.
— Lucy não contou? — Josephine perguntou confusa, e eu neguei com a cabeça. — Há alguns séculos rolava uma profecia entre as bruxas pagãs dizendo que haveria uma tríade de Hécate que alcançaria o poder máximo, capaz de dominar ambos os lados da magia. Nenhuma das tríades conseguiu, inclusive as parentes de vocês, que acabaram perdendo os poderes. Lúcifer, ou Leifhel, no seu nome humano, vem tentando dominar a magia há muito tempo, antes de vocês sequer existirem. Agora o problema só está maior porque vocês estão aqui, e ele sabe que até agora foram a tríade mais forte e determinada. — Falou se virando e voltando a andar. — A única capaz de derrotar ele.
— Como assim a tríade mais forte? — Alice perguntou perplexa enquanto seguia a garota.
— Por exemplo, a maioria das tríades só consegue começar a dominar a magia depois do ritual de iniciação do Halloween. Vocês conseguiram antes desse ritual, mas não quer dizer que não vão precisar passar por ele.
— O que vamos fazer nesse ritual?
— O mesmo que já fizeram, querida. Vão matar um homem impuro.
— Eca. — Disse Seline em voz baixa.
Cruzei os braços ao passar por aquela caverna fria e escura. O lugar parecia um túnel, era úmido e caía gotas do teto. Na entrada estava quente, como se houvesse apenas fogo, mas aqui dentro era tudo diferente.
— Como vamos adquirir essa outra magia? — Perguntei caminhando logo atrás delas.
— Vão encontrar com uma pessoa.
— Que pessoa?
— Vão ver quando chegarmos. — Respondeu sem dar muitos detalhes, então dei de ombros.
Pareceram horas de caminhada, que até para mim era cansativo, começamos a ouvir alguns gritos apavorantes. Eram como se as pessoas ao redor gritassem por socorro, ajuda, era agoniante!
— Ignorem os gritos, são apenas almas. — Josephine avisou, quando chegamos no final daquele corredor.
Ao redor, a caverna se ampliou. Era um lugar enorme e escuro, haviam algumas árvores mortas e um riacho curto com água. Resolvi acreditar que aquilo não fosse água de verdade, então não me aproximei muito.
— Aqui por acaso tem muitos demônios espalhados? — Seline perguntou, expressando medo da voz.
— Sim, bastante. Há vários tipos de demônios e todos eles vão tentar vocês, e também vai haver muitas ilusões. Não acreditem em nada no que vêem, o inferno é tão vivo quanto o diabo.
Passamos por aquele riacho de água e entramos em um tipo de passagem fora daquela parte. Na nossa frente estava um homem com um sobretudo escuro e o rosto completamente desfigurado. Ele usava luvas nas mãos, e se eu não estivesse no inferno, diria que ele era elegante.
— Olha, temos visita mortal. — Falou como um homem normal, mas no fundo a sua voz ecoava apavorante.
— Queremos falar com a rainha — Josephine deu um passo à frente, e o homem a encarou.
— O que uma bruxa tão bela faz com essas pagãs? — Perguntou, ajeitando seu sobretudo.
— Não interessa, meu filho. Eu quero saber como chegar na rainha!
— Ela fica no centro do inferno, que é para onde as almas mais cruéis vão. — Disse sem problema algum.
— Por que deveríamos acreditar que você está nos ajudando? — Perguntou Seline desconfiada.
— Esse é Vassago. — Disse Josephine. — É um demônio, um príncipe do inferno capaz de revelar o passado, o presente e o futuro. Desoculta magias que foram ocultadas e respondem perguntas que lhe forem solicitadas.
— Pelo visto andou estudando sobre mim. — Respondeu animado. — Antes de qualquer coisa, quero que saibam que não sou a favor da Estrela da Manhã.
— Mas você disse que não deveríamos confiar em absolutamente nenhum demônio daqui? — Alice sussurrou perto de Josephine.
— Mas eu não sabia que Vassago era real. — Afirmou dando de ombros. — E então, vai nos ajudar?
— Na verdade não, mas vou desejar boa sorte. Cuidado com os sete, não caiam em tentação ou será tarde para vocês. Devem agir com sabedoria e com a razão, não se deixem levar pela emoção.
Antes de qualquer resposta vindo da nossa parte, o demônio desapareceu. Josephine nos olhou um pouco incrédula, dando até um certo medo.
— Vamos continuar. — Comentou, seguindo o caminho.
Os gritos desesperadores diminuíram e o lugar ficou em total silêncio, o que me assustou mais que os gritos. Havia uma enorme escadaria, na qual Josephine começou a subir. Não fazíamos ideia de onde aquilo nos levaria.
— Nossa, que sono. — Alice comentou, diminuindo o ritmo dos seus passos e parando para bocejar.
— Vamos, Alice. Não podemos ficar paradas! — Seline insistiu, puxando a garota para que ela não ficasse para trás.
— Só um minuto. Eu preciso parar agora. — Falou, sentando-se no chão e deitando na parede. Ela fechou os olhos, e nem com Seline cutucando ela acordou.
— O que deu nela? — Perguntei voltando e me aproximando.
No final da escada, um homem com a aparência idosa e com certa dificuldade para subir. Seus olhos eram amarelos, e ele transmitia uma energia diferente naquele lugar.
— Ah, não! — Expressou Josephine, segurando Alice pelos ombros. — Vamos tirar ela daqui agora, e não olhem para trás!
Ajudei Josephine a segurar Alice do outro lado, e começamos a correr rapidamente subindo pela escadaria. Um cansaço extremo bateu em mim, mas então me lembrei do que Vassago havia falado anteriormente.
Não caia em tentação!
— Preguiça! — Falei ofegante, lutando contra o sono. Parecia que eu estava no filme "A Hora do Pesadelo", correndo do Freddy Krueger.
Quando a escadaria terminou, Josephine tentava acordar Alice em todas as tentativas, e finalmente a garota despertava aos poucos.
— Só mais cinco minutos, tia! — Respondeu sonolenta, prestes a cair no sono novamente.
— ALICE, VAMOS SAIR DAQUI!
Seline deu um grito, fazendo Alice dar um pulo de susto. Ela olhou ao redor, confusa e pensativa, e então se deu conta do que estava acontecendo.
— Não importa o que aconteça, não parem. Mantenham-se dispostas e corram o mais rápido que conseguirem. — Josephine falou se afastando da escadaria em que viemos.
— Na verdade, quanto mais rápido corrermos, mais o nosso corpo vai se cansar. E então, seremos alvo fácil. — Alice avisou tranquilamente. — Vamos tentar despistá-lo, mas sem gastar energia.
Concordamos e andamos como num passeio em um jardim. Viramos alguns corredores sem correr, até chegarmos em um enorme lugar escuro e com névoa. Haviam várias pessoas sentadas em bancos, olhando para frente como se estivessem vazias. Uma ou outra corria desesperadamente de um lado para o outro, na tentativa de fugir do inferno.
— Aonde estamos? — Perguntei.
— Provavelmente as almas que acabaram de chegar. Elas não fazem ideia do que está acontecendo, e nem sequer lembram que morreram. — Josephine respondeu, passando na frente de cada um.
— E o que acontece depois com eles? — Seline perguntou enquanto a seguia.
— Eles vão ser torturados, vão pagar pelos crimes que cometeram. Vão viver sofrendo eternamente, revivendo o mal que fizeram a outras pessoas.
— Nada mais justo.
O homem não nos seguia mais, por sorte. Pelo menos não perdemos tempo com diálogos, ele apenas tentou nos "tentar", assim como Vassago nos alertou. Agora faltavam apenas seis.
Passamos por uma porta grande, e logo depois aparecemos em um tipo de restaurante. Minha barriga roncava de fome e eu nem havia percebido, pois já estávamos lá embaixo há um bom tempo.
Havia cozinheiros por todo lado, e uma mesa repleta de comida fresca e sobremesa. Era como se fosse um sonho, mas tudo estava lá, o cheiro, aquela sensação de paraíso.
Mas eu estava no inferno.
Não caia em tentação.
Seline puxou meu braço para que tentássemos sair dali, e se não fosse por isso, eu já teria caído em tentação há muito tempo. Era algo incontrolável, ainda mais que a preguiça.
— Preste atenção, Jesse! Olhe direito! — Me avisou, apontando para a mesa farta.
Havia apenas alimentos podres, animais vivos, água suja e outras coisas nojentas acompanhado o cardápio. Não diria que aquele era o significado de tudo, pois a gula vinha acompanhada de uma vontade intensa de comer mais do que o desejado. Talvez fosse um aviso de que tudo em excesso faz mal.
Continuamos a andar até saírmos daquele ambiente macabro. Ouvi sons de relinchos de cavalo, mas não conseguia ver nada. Estávamos agora em um tipo de jardim, cujas gramas estavam mortas. Josephine, mas a frente, diminuía seus passos.
— Aonde estamos? — Alice perguntou.
— Eu não sei. — Respondeu de forma preocupada, se virando na nossa direção.
— Como assim não sabe?
O som de cascos batendo no chão se aproximava ainda mais. Na minha opinião, o inferno seria quente e repleto de fogo e larva, mas era totalmente diferente.
O inferno não era exatamente o lugar cruel e torturante. O inferno era um lugar comum, o que diferenciava era o que havia lá dentro. Demônios, entidades, seres gritantes e almas torturantes.
— Vocês também estão ouvindo isso? — Perguntei, com medo de não estar ficando tão louca.
Eu realmente já estava cansada, com sono, com fome, minhas pernas doíam e eu estava com vontade de fazer xixi. Há quanto tempo estávamos lá?
— Eu também estou ouvindo, e creio que não seja algo muito bom. — Disse Josephine preocupada. — Precisamos nos esconder!
E então, começou a correr pelo jardim. A seguimos no mesmo instante, mas pouco tempo depois ela parou. Estávamos em um penhasco, o chão havia chegado ao fim e lá embaixo só havia um riacho que aparentemente era comum.
— O QUE SERES MORTAIS FAZEM NO NOSSO REINO? — Um homem montado no cavalo, gritou a alguns metros de distância.
Seu rosto era vermelho, queimado. Havia um pequeno chifre acima da sua cabeça e ele vestia roupa de couro, acompanhado de vários outros como ele. Era uma legião.
— E então, pulamos? — Perguntei, mas era tarde demais.
Josephine havia pulado sem ao menos hesitar.
Espero que tenham gostado. Vote no capítulo se você gostou e comente suas opiniões sobre o livro! Sz
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