Capítulo 46: Mamãe Está de Volta
Saint Luna, 18 de março de 1991
Segunda-feira - 10:01 P.M.
Eu não conseguia raciocinar nada direito. Marcus estava pálido no chão, nenhum feitiço funcionava para curá-lo e a ambulância estava demorando para chegar. Acabei de aprender que quando alguém perde as energias, seu corpo inteiro era afetado, como se ele estivesse doente.
— Seline? O que aconteceu aqui? — Ouvi uma voz se aproximando e me levantei do chão, onde estava sentada encostada no carro.
— Alex? Como você... — Antes de perguntar como ele soube do pai dele, Alexander me interrompeu.
— Eu tenho acesso ao rádio dele e ouvi você chamar a ambulância.
Alex se aproximou do pai dele e se abaixou no chão, com a respiração pesada e nervoso. Ele tocou no pai e suspirou de alívio por ver que ele ainda estava vivo.
— Sinto muito. — Falei sem nem ter muito o que dizer.
— O que aconteceu aqui? — Perguntou virando seu olhar na minha direção. Seus olhos azuis estavam tensos e marejados, e aquilo me deixou bem mal por ele.
Eu não podia falar sobre o real motivo daquilo tudo. Bruxas ou demônios sugadores de energia não era algo tão natural que devesse ser contado para alguém, mas mesmo assim eu não queria mentir para ele.
— Eu não sei. Quando estava indo para casa, acabei encontrando ele caído no chão e chamei a ambulância. — Falei omitindo parte da verdade.
— Por que você estava na rua uma hora dessa? Não soube sobre o possível tornado que estava a caminho de Saint Luna?
— Tornado? — Perguntei confusa e me lembrei de tudo aquilo poderia ser passado como algo natural aos olhos das pessoas. — Ah, sim. Eu precisava buscar uma coisa na casa da Alice, acabei perdendo a hora.
Antes que ele pudesse falar mais alguma coisa, por sorte ouvimos o som das sirenes da ambulância virando a esquina. Ela se aproximou e os paramédicos desceram e colocaram Marcus numa maca, logo levando-o para dentro do carro.
Alex e eu entramos atrás e seguimos em silêncio até o caminho do hospital, enquanto víamos os paramédicos tentando reanimar Marcus.
Mariyah não tinha a mínima ideia do que estava acontecendo, e provavelmente me mataria por chegar tarde em casa. Eu não tinha culpa.
Depois de alguns minutos, chegamos ao hospital e os médicos logo levaram Marcus para uma sala e permitiram a entrada de ninguém. Alex precisou ir até a recepção resolver algumas coisas sobre documentação e eu fiquei esperando em pé, angustiada andando pelo hospital.
— Seline? O que faz aqui a essa hora?
Me virei para ver quem falava comigo e suspirei de alívio ao ver que Elizabeth estava de plantão. Ela não parecia cansada, vestia seu uniforme branco e estava com um fichário nas mãos.
— Ah, que bom que você está aqui! — Me aproximei dela totalmente angustiada. — Eu preciso te contar uma coisa, preciso de conselhos!
— Você parece nervosa. — Afirmou me olhando seriamente. — Vem, vamos para outro lugar.
Liz me levou até uma sala que estava vazia, onde havia armários com bastantes remédios e uma mesa vazia. Ela fechou a porta atrás de nós e me encarou preocupada com o meu estado.
— Hoje aconteceu uma coisa horrível. Tivemos que prender um demônio sugador de energia que eu acabei soltando sem querer, esgotamos o pouco de poder que tínhamos. — Falei tentando não ficar tão nervosa com aquilo. — Cada dia que passa eu sinto que é mais lento, não sei o que está acontecendo comigo e nem o que vai acontecer, mas já sinto as consequências disso sobre mim antes mesmo de acontecer alguma coisa. Eu não consigo dormir direito faz dias, tenho medo disso tudo, não só dos mistérios sobre o mundo da magia em que estamos entrando, e sim da realidade!
— Tudo bem, se acalme. Quer se sentar? — Liz puxou uma cadeira para mim e eu me sentei, tentando me acalmar.
— Até o ano passado eu vivia normalmente com meus pais na minha mansão, praticava natação e violino e minha única preocupação era fugir para as festas de madrugada. Agora preciso lidar com um assassino solto na escola, com um maníaco que matou meu pai e com seres que eu nem conheço direito!
— Seline, é normal tudo isso que você está passando. Não normal para uma bruxa iniciante, mas normalmente para qualquer tipo de pessoa. — Elizabeth começou a falar e eu fiquei quieta para ouví-la. — Acho que o que você tem é ansiedade. Recomendo você a se afastar um pouco desse caso de assassinato ou de tentar virar noites pesquisando sobre o mundo da magia. Pode também buscar ajuda psicológica quanto ao cotidiano, ainda mais pela sua perda recente. — Ela suspirou enquanto falava comigo. — Não sou especialista, mas como bruxa da antiga tríade, posso ver que está sendo mais difícil para você lidar com essas coisas do que com as outras meninas.
Fiquei quieta enquanto ouvia cada palavra de Elizabeth. Ela era uma das pessoas mais sábias para se ter uma conversa, e eu agradeço profundamente ao universo por ter feito eu me encontrar com ela naquela noite. Refleti por alguns segundos tudo o que ela havia passado, e cheguei à conclusão de que realmente o melhor a se fazer seria me afastar do que me causa problemas.
— As vezes sinto que se fizer isso, vou estar sendo fraca. Tanto para minhas amigas quanto para mim mesma.
— Não tem problema em ser fraca às vezes. Ninguém é forte o tempo todo, ser fraco é sinal de humanidade. — Ela falou até baterem na porta e chamarem por ela. — Preciso ir ver como o senhor Butler está. Talvez eu consiga ajudá-lo e curá-lo com as energias dele. Apenas faça o que é melhor para você, e qualquer coisa você pode vir falar comigo. — Ela deu um sorriso leve e abriu a porta, saindo da sala e me deixando sozinha.
Assim que ela saiu, me levantei da cadeira e saí também, indo até a sala de espera e vendo Alex sentado em uma das cadeiras, batendo os pés no chão de nervosismo e com as mãos no rosto.
— Tem notícias? — Perguntei me sentando ao seu lado, olhando-o preocupada.
— Disseram que ele estava quase morto e eu só vou poder vê-lo amanhã dependendo do estado que ele estiver. — Avisou tirando a mão do rosto e olhando para mim. — Obrigado por chamar a ambulância.
— Foi o mínimo que eu pude fazer. — Disse baixo e dei de ombros. — Espero que ele fique bem logo.
— Eu também. — Confessou no mesmo tom que eu e se virou para frente. — Vocês tiveram mais alguma pista sobre o misterioso assassino da nossa escola?
Alex estava claramente tentando mudar de assunto, mas aquele assunto era a última coisa que eu queria pensar. Ele não sabia o que se passava na minha cabeça naquele exato momento, então tentei deixar para lá e responder normalmente.
— As meninas estão achando que pode ser um dos garotos que persegue um aluno chamado Dylan Hendrix por terem histórico agressivo e citarem uma frase para ele parecida com a que vimos na parede aquele dia. — Falei como algo não tão importante. — Mas acho que não quero me deixar levar com isso. Prefiro que a polícia cuide disso, isso não é um assunto no qual eu quero me meter.
— Entendo. — Falou e deixou no ar um silêncio constrangedor. — Você está bem?
Ergui a sobrancelha com sua pergunta, um pouco surpresa por ele querer saber como eu estou. Queria poder responder "estou bem na merda, e você?", mas não queria parecer grossa, ignorante ou algo do tipo. Depois do enterro do meu pai, nossos encontros não foram muito agradáveis e nem produtivos.
— Estou confusa e cansada, mas bem. E você?
— O mesmo. — Ele olhou o relógio de pulso e depois me olhou. — Está tarde. Quer que eu te leve embora?
— Não precisa. Eu vou pedir um táxi. — Me levantei da cadeira e o olhei de forma calma. — Você precisa ir embora também, descansar.
— Eu vou. Daqui a pouco.
— Você não tem uma irmã pequena em casa?
— Tenho, mas ela sabe se virar sozinha em casa.
— Alexander! — Falei repreendendo seu comentário.
— Tudo bem, eu já vou. — Ele se levantou e revirou os olhos.
— Acho que quem vai precisar te levar embora sou eu, seu irresponsável! — Brinquei quebrando o clima e soltando um sorriso dele.
— Já que você insiste.
Quando fomos embora, o táxi deixou ele em casa primeiro e logo depois a mim. Levei uma bronca de Maryiah por ter chegado tarde em casa, mas ela logo compreendeu por ser problemas que envolveram o grimório. Tomei um banho pesado, mas não comi nada pela falta de fome, porém Mariyah preparou um chá para que eu pudesse me acalmar e dormir melhor.
Quando fui deitar, notei que já era uma da manhã. Fechei os olhos e dormi sem dificuldade alguma, pela primeira vez em muito tempo.
Saint Luna, 19 de março de 1991
Terça-feira - 10:24 A.M.
A manhã se passou e eu nem percebi. Tive uma conversa com Jesse e Alice sobre querer dar um tempo desses mistérios, como Elizabeth sugeriu, e elas reagiram melhor do que eu esperava.
O sinal havia tocado para o intervalo e eu estava indo procurar as meninas, mas outra coisa me chamou a atenção. Havia um homem com terno preto acompanhado de dois seguranças, todos andando na direção da diretoria. Os segui e observei até o corredor, quando eles entraram na sala em que minha mãe estava.
— Ah, tanto faz! — Me indignei por notar algo estranho e caminhei até a sala da minha mãe, abrindo a porta aos poucos. — Mãe? Está tudo bem?
Ela estava sentada na cadeira e o homem de terno estava na sua frente. Mariyah parecia um pouco atordoada e quase não notou minha presença.
— Seline, pode voltar mais tarde? Preciso resolver uns assuntos. — Pediu com certo rancor enquanto olhava para o homem.
— Tudo bem. — Saí da sala e fechei a porta, mas não pude deixar de ouvir o final da fala do homem.
— (...) senhora Breyner, o conselho de educação decretou e não há o que ser feito. Sinto muito. (...)
O que o conselho de educação havia decretado de tão grave? Será que era algo relacionado aos assassinatos recentes? Seja lá o que fosse, não era bom nem para ela e nem para o resto de nós.
Andei pelo corredor e voltei, curiosa para saber daquela situação. Vi Alexander virar o corredor e entrar no que eu estava, com um olhar preocupado e tenso. Temi que algo houvesse acontecido com seu pai, como consequência do ocorrido na noite anterior, mas o problema era bem maior.
— Alexander? Aconteceu algo com seu pai?
— Não, foi muito pior! — Admitiu andando na minha direção. — Ela está aqui! Ela voltou para Saint Luna sem explicação nenhuma!
— O que? De quem você está falando?
— Eu estou falando da desgraçada que deixou meu pai sozinho comigo e com minha irmã, sem explicação alguma! — Falou tenso e com raiva. — E ela está aqui na escola, eu não sei o porquê!
Antes de responder, ouvi a porta da sala da minha mãe se abrir e os homens saírem. Alex e eu nos olhamos preocupados, pois Mariyah não estava com uma cara boa.
— Sinto muito, Mariyah. — Falou o homem de terno e apontou com as mãos abertas para uma mulher que chegava em passos lentos para perto deles. — Essa é Natalie Butler, a sua substituta.
A mulher apertou a mão de Mariyah como cumprimento, e Mariyah não disfarçou nem um momento de que estava a fuzilando com o olhar.
Natalie era bem diferente do que eu imaginava como mãe do Alex. Ela parecia jovem, era magra e tinha os cabelos ruivos escuros. Seus olhos eram castanhos, alta e usava roupa social. Não dava para negar que era uma mulher linda, mas totalmente diferente de Alexander.
— Não se preocupe, Mariyah. Vou assumir quaisquer responsabilidade sobre esse assassinato e tomarei regras mais rígidas, já que as suas pareceram não funcionar. — Falou com uma risada fria no final.
— Para você é senhora Breyner. — Minha mas corrigiu e soltou sua mão da dela. — Boa sorte, vai precisar.
Mariyah se afastou e deixou eles conversando e terminando de resolver seus assuntos. Natalie olhou para Alex e deu uma leve acenada, no qual ele ignorou totalmente.
— Essa mulher vai fazer um inferno aqui! — Alex afirmou com total certeza. — Por que teve que voltar justamente quando meu pai está internado?
Viajei nos pensamentos ao olhar direito para Natalie. Ela me dava flashbacks de alguém no qual tive contato recentemente.
— É ela. — Sussurrei para mim mesma.
— Ela quem?
Aquela era a mulher cujo demônio usou seu corpo para atacar Marcus. Sei que aquele demônio se alimentava das energias negativas de alguém, e com certeza Natalie era a mulher do poço de energias negativas. Isso dava para sentir de longe!
— Você disse que sua mãe faria um inferno aqui. — Falei e ele concordou com a cabeça. — Então vamos trazer o verdadeiro inferno para ela.
Estava disposta a não deixar Natalie atrapalhar nossas vidas. Nem da minha mãe, nem a de Alexander, nem das minhas amigas e nem das minhas. Faríamos um inferno para ela antes que ela fizesse um para nós.
— Eu topo. — Alex concordou perversamente, o que me dava a certeza de que teríamos um trabalho duro pela frente.
Espero que tenham gostado. Vote no capítulo se você gostou e comente suas opiniões sobre o livro! Sz
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