Capítulo 39: O Inferno na Santidade
Sangue jovem, o céu odeia um pecador
Mas nós vamos trazer o inferno do mesmo jeito.
– Raise Hell - Dorothy
Saint Luna, 18 de Fevereiro de 1991
Terça-feira - 01:02 P.M.
Eu literalmente senti que estava no inferno.
As chamas ardiam nos pulmões de todos que estavam presentes, mas eu não senti nada. Nenhuma dor, nenhuma falta de ar ou nenhuma sensação de estar sendo queimada. Era como se o fogo fosse apenas uma ilusão.
Jesse e Alice ficaram junto das outras pessoas enquanto tentavam se esconder do fogo. Os bombeiros tentavam abrir as portas e janelas, mas todas pareciam estar lacradas.
Eu tinha o visto. Tive certeza absoluta de que aquilo era apenas um jogo macabro e psicológico, e dessa vez, o assassino não era o culpado.
— Por que você está fazendo isso? — Questionei firme ao passar pelo fogo e ir a outro corredor, onde o fogo não chegava. Havia uma sala aberta e enorme que não tinha nem vestígios de fumaça.
— Você é mais esperta do que eu imaginei, Breyner. — Disse uma voz firme sentada em uma cadeira alta, e então ele se virou e me encarou. — Mas vejo que não é tão sensata assim. Diria ser burrice, mas acho que você sabe disso.
— Deixo a "burrice" de cortesia para você. — Digo fazendo aspas com as mãos. — O que você quer matando várias pessoas dentro de uma igreja?
— Eu até contaria, mas seria fácil demais você e suas amigas tentarem me impedir. Aí eu teria que matar vocês, mas então eu ficaria sem ter diversão extra.
Stephen se levantou da cadeira e me observou friamente. Ele vestia uma blusa social de manga e jeans comum, como se fosse um cidadão qualquer ou um pai de família.
— Você é estúpido naturalmente ou fez faculdade? — Perguntei e ele riu imaginando que eu tivesse dito uma piada.
— Eu amo o seu humor, Breyner. Parece até a sua mãe. — Comentou dando uma pausa e fazendo uma expressão pensativa. — Sua mãe biológica.
— Você fala como se conhecesse bem a Mariyah. — Afirmei com convicção e ele deu de ombros. — Isso não vem ao caso. Pare de incendiar a igreja. Muitas pessoas vão morrer por sua culpa!
Ele me ignorou e se aproximou aos poucos, com o típico olhar de alguém que uma hora ou outra iria me matar.
O fogo que antes não estava aqui, se formou como um círculo ao redor de Stephen. Ele estava ainda mais poderoso que antes, e então eu percebi qual era seu objetivo nisso tudo.
— Você está fazendo um ritual, e quer matar as pessoas da igreja porque faz parte. — Falei com certeza e ele sorriu de lado. — Para isso você usou o assassino como uma distração, dando a entender que foi ele quem causou o incêndio.
— Menina esperta. — Admitiu. — Por isso é minha favorita.
— Você alucinou Anne Watson para ganhar tempo e distrair as meninas e eu para que viéssemos até você.
— Sim. Continua. — Pediu.
— E provavelmente usou o misterioso serial killer para fazer com que ficássemos mais nesse caso e não tivéssemos tempo de aprender a dominar a magia negra, dando mais tempo a você de terminar seu mirabolante plano.
Stephen riu mais uma vez. Aquele cara parecia ter um senso de humor ácido, mas ninguém imaginaria que ele é um maníaco sedento por poder.
— E agora vai tentar impedir? — Debochou, e de repente, uma forte ventania passou por nós. O som de gritos vindo da frente da Igreja, ficou cada vez mais alto.
Eu não respondi sua pergunta, só segui minha intuição. Stephen não podia matar dezenas de inocentes por puro poder, e óbvio, eu sabia que pela primeira vez estava sozinha com Stephen.
Há um tempo eu estive frente a frente com o serial killer no meio da escola, agora estou de frente para um serial killer mágico dentro de uma igreja.
Stephen estava mais concentrado que antes, e o fogo ao seu redor começava a ganhar uma tonalidade azul. Ele estava com os olhos fechados e a ventania ao nosso redor não parava.
— Por favor, Hécate. Me ajude! — Supliquei em voz baixa, esperando que ela fosse me ouvir assim como nos ouviu quando meu pai morreu.
— Não adianta. Você não percebe que Hécate não está e nunca esteve nem aí para vocês? — Afirmou, mas eu o ignorei.
Uma sombra escura se voltou contra o céu, o que eu pude nitidamente enxergar pela janela. Não estava mais claro, mesmo estando em pleno meio- dia.
— Um eclipse solar. — Falei comigo mesma ao ver o sol sendo totalmente tampado pela lua.
Não estava previsto em lugar algum que aconteceria um eclipse solar hoje, ainda mais em pleno inverno. Eu tive certeza que era um sinal da ajuda que eu tanto precisava.
— Ex Spiritum In Tacullum — Projetei as palavras que surgiam na minha mente como flashbacks, como se eu já as conhecesse e não soubesse. — En Terrum Incendium — O fogo ao redor de Stephen se apagava aos poucos, e ele me olhava atordoado e confuso. — Phasmatos Salves A Distum.
— O que você está fazendo? — Indignou-se quando o fogo se extinguiu de vez.
— Acabando com o seu show de talentos, não está vendo? — Ironizei despertando sua raiva.
Na sua mão, uma pequena brasa de fogo começou a surgir conforme seu ódio aumentava. Ele pretendia lançá-lo contra a minha direção, mas eu senti que podia ter controle sobre todo o fogo, sendo ele normal, sendo ele infernal.
Hora ou outra o eclipse acabaria, e era isso que mantinha a força que me ajudava. Stephen estava em um momento pensativo, hora perfeita para eu (tentar) atacar.
Era estranho que sempre que eu estava em perigo, algo me ajudava despertando forças diferentes em mim. Não sentia que era como poderes vindo apenas da deusa, porque quase sempre eu não sentia sua presença. Era algo muito maior, algo como o fogo que a magia de Hécate me ajudou a controlar hoje.
Sentindo veneno correndo nas minhas veias, a ventania que corria contra Stephen, agora estava a meu favor.
Me virei para tentar impedir o fogo vindo da frente da igreja, mas Stephen criou uma parede invisível que bloqueou minha passagem. Olhei pela janela e notei que a lua estava saindo da posição do sol, o que me dava alguns poucos minutos.
— Não tente insistir! — Avisei ferozmente. — Você não tem saída, Stephen.
— Se eu não tiver saída, você também não vai ter. Se eu morrer, você morre também. — Ele fechou os olhos e começou a sussurrar palavras em latim. — Quod in viribus a tenebris to join sanguinem meum sanguinem Seline Breyner. Pertinent ad vitam et mortem est morte alterius.
— O que você está fazendo? — Perguntei tentando interromper ele, mas pareceu não funcionar. — STEPHEN!
Quando ele abriu os olhos, a ventania parou. Seu olhar estava mais leve, como se algo tivesse aliviado em si. Como se ele estivesse seguro das suas escolhas.
Não tive mais tempo para tentar invocar alguma força mágica, então peguei a primeira coisa que vi ao meu lado: um atiçador de brasa.
Me aproximei o mais rápido que pude e enfiei o atiçador de brasa no seu ombro, já que ele se desviou quando notou minha intenção. Ele deu um grito e posicionou a mão onde eu tinha acertado, e estava sangrando.
Quando percebi, uma dor forte atingiu o meu ombro também e começou a sangrar. Stephen me olhou vitorioso e sorriu de lado, então me afastei.
— Você criou uma ligação entre nós! — Gritei segurando meu ombro fortemente, tentando pressionar o sangue. — DESGRAÇADO!
— Você esperava o que? Que eu ficasse parado enquanto você absorvia poder da lua? Eu não sou idiota, garota!
Gritou com raiva e eu fiquei calada. O sol já brilhava no topo do céu novamente, e o eclipse já havia acabado.
Eu perdi uma chance à toa. Joguei fora a benção de Hécate, poderia ter feito muito mais se Stephen não tivesse criado essa maldita ligação entre nós.
— Stephen Gabes.
Uma voz grossa e sombria sussurrou e ecoou pela sala, fazendo eu me arrepiar. Era uma voz carregada de medo, ódio, dor, angústia, pecado. Uma voz carregada com tudo de ruim que habita na Terra.
— Você falhou na única missão que eu te dei. Você é fraco e inútil e ainda foi impedido por uma adolescente grotesca! — Falou e no mesmo instante, Stephen se ajoelhou e fechou os olhos.
— Me perdoe, mestre. Prometo que não acontecerá novamente, a garota não vai ser um problema. Nem suas amigas.
Cruzei os braços e olhei indignada para Stephen. Achei que fosse a favorita dele. O fogo começou a surgir novamente pelos cantos daquele cômodo. Eu não ouvia mais gritos vindo do templo, e minha intuição dizia que todos haviam conseguido escapar. Ouvi uma batida na porta e uma voz masculina.
— Aqui é o Corpo de Bombeiros de Saint Luna. Se houver alguém trancado neste cômodo, dê um sinal.
Stephen e eu ficamos calados, mas o fogo estava se espalhando mais rápido pelo quarto. Morreríamos, obviamente.
— Por que você não nos matou quando teve oportunidade? O que estava esperando? — Sussurrei me aproximando de Stephen, que ainda estava no chão.
— Você é muita chata. — Respondeu no mesmo tom. — Não matei porque eu não quis!
— E por que você não quis? — Insisti e ele abriu os olhos e me encarou. — Ainda temos chance de sair daqui. Não que eu me importe com você, mas se você morrer, eu morro junto!
— Meu Senhor não pode ser impedido. Se sair daqui, vamos morrer de qualquer jeito! — Afirmou começando a entrar em choque.
— Que tipo de Jesus é esse? — Questionei.
— Não é Jesus. — Ele deu uma pausa e continuou. — É o diabo. O diabo em pessoa.
A sombra de um homem alto e com chifres surgiu do canto direito do cômodo. Na porta, os bombeiros batiam na esperança de alguém responder, mas ninguém respondia.
— Vamos sair daqui. — Insisti mais uma vez, mas ele não reagiu.
Me levantei do chão e dei um passo na frente daquela criatura. Stephen segurou no meu pulso tentando impedir, mas eu o encarei e me soltei da sua mão.
— Não sei exatamente o que você quer de mim e das minhas amigas, mas saiba que estamos fora. Pode ficar com Stephen o quanto quiser, eu não ligo, mas não me meta nos seus problemas!
— Seus problemas? — Questionou a sombra. — Você é o problema! Como pretende adquirir poderes de magia negra, sendo que quem comanda a magia negra inteira sou eu?
Ele tinha razão. Esqueci que para deter Stephen e seus planos malignos, a tríade precisaria adquirir a magia negra, e a magia negra vinha de algo bem ruim. Mas, agora eu sabia que Stephen era o menor dos problemas.
— Depois de Stephen, saiba que você é o próximo! — Ameacei com um pouco de medo, e Stephen me olhou incrédulo.
— Você está ameaçando o Senhor do inferno? Saiba que suas ações terão consequências.
— Você não passa de um Jesus do mal. — Admiti e puxei Stephen do chão. — Vamos sair daqui.
— Espere. — Pediu, me parando.
— O que foi agora? — Perguntei estressada.
— Saia daqui agora. Deixe que eu lide com o diabo sozinho. Apenas fuja e vá para perto das suas amigas.
Pediu quase como se insistisse. Não foi um pedido para que salvasse sua própria pele, mas senti com tom de preocupação. Talvez eu estivesse ficando louca.
O fogo estava cada vez mais próximo, impedindo de sairmos pelas portas ou janelas.
— Mestre, eu estou à sua disposição. — Afirmou e segurou meu braço.
Por um momento acreditei que ele fosse me fazer de oferenda para satanás (ele provavelmente negaria, mas isso não vem ao caso), mas ele criou uma espécie de portal, que me levou diretamente para fora da Igreja.
O que havia acontecido lá? Parecia que essa criatura das trevas tinha total controle sobre meu arqui-inimigo Stephen Gabes, mas isso não era bom agora, já que estávamos ligados.
— Seline? Onde você estava? Você está bem? — As meninas correm na minha direção e me abraçam.
Não consegui explicar na hora o que havia acontecido, porque nem eu mesma sabia. Havia algo a mais naquilo, mas não sentiria pena de Stephen. Ele matou meu pai.
De uma coisa eu sabia: Stephen estava por trás do assassino para nos distrair e concluir um ritual. Mas do que se trata esse ritual? E a pergunta que não quer calar. Quem é o assassino manipulado por Stephen?
Espero que tenham gostado. Vote no capítulo se você gostou e comente suas opiniões sobre o livro! Sz
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