Capítulo 34: A Filha da Discórdia
Saint Luna, 16 de Fevereiro de 1991
Domingo - 10:42 P.M.
A polícia chegou na casa de Sharon alguns minutos depois que alguém ligou. Seline contou tudo o que Nora e ela conversaram alguns minutos antes do apagão. Alexander se aproximou sozinho enquanto Seline contava exatamente o que havia acontecido.
— Ela não era cúmplice do assassino. — Disse de maneira fraca. — Mas era ameaçada por ele.
— Isso não faz sentido. Ela não te ameaçou no primeiro dia de aula? Ela não mandou afogarem você? — Perguntei totalmente confusa com a situação. — Lucy e eu investigamos o assassinato de Audrey há alguns dias, e Lucy disse que Nora namorava David e odiava Audrey por causa que os gêmeos tinham uma relação muito forte.
— Eu não acredito em nenhuma palavra que vem da boca de Lucy. Ela é uma mentirosa! — Afirmou Jesse se pondo a frente.
Estávamos do outro lado da rua, ao lado da casa de Sharon. A ambulância estava parada na porta da casa enquanto o corpo de Nora era retirado. Alguns policiais haviam chegado no lugar, e provavelmente todos nós seríamos levados para dar depoimento.
— Por que você diz isso? Ela não é a sua irmã? — Perguntou Alexander um pouco perdido no assunto.
— Eu sou adotada, Alex. Meus pais morreram há um tempo e eu nunca conheci os biológicos, e então Lucy apareceu exatamente no mesmo dia do assassinato de Audrey e disse que era minha irmã. — Simplificou para que o garoto acompanhasse. — Eu desconfiei e fui ao orfanato para saber mais sobre minha antiga família, e eu soube que todas as minhas irmãs morreram em um incêndio. Eu não tenho irmãs.
O clima ficou um pouco pesado, ainda mais porque Seline e eu nem sabíamos dessa história. Eu acreditei na palavra de Lucy e me deixei levar pelas suas teorias.
— Então tudo o que ela me disse pode ter sido mais uma mentira inventada. — Afirmei indignada e me sentindo burra. — E até agora ela não apareceu.
— É porque ela é o assassino. Eu tenho certeza! — Jesse falou de forma neurótica. — Ela sabe de coisa demais e é uma mentirosa.
Algumas pessoas iam embora de pouco em pouco, mas amanhã provavelmente todos teriam que dar o depoimento. O detetive se aproximou de nós aos poucos e parou ao lado do filho, Alexander.
— Boa noite. Vi que a festa não foi muito boa. — Comentou informalmente. — Amanhã todos darão depoimento sobre o que aconteceu, mas não se preocupem, sei que ninguém aqui é responsável por isso.
— Pai, sabe quem é o assassino? — Alex perguntou e o detetive o olhou.
— Ainda não. Por isso, amanhã vamos pedir o depoimento de todos que estavam na festa. — Disse, e depois se aproximou de Seline. — Sei que sua cabeça está cheia demais pelo o que aconteceu na sua família, então não precisa dar depoimento algum se não quiser.
— Não tem problema, senhor Butler. — Seline forçou um sorriso. — Eu contribuirei com todas as informações possíveis.
— Meninas, liguei para Mariyah vir buscar vocês. — Comentou dando alguns passos para a direção oposta. — Alex, sei que você não quer deixar Sharon sozinha depois do assassinato na casa dela, mas sua irmã também está sozinha em casa. Não demore.
O garoto concordou desconfortavelmente e seu pai logo se juntou aos policiais. Seline certamente não se sentia bem com aquilo, ainda mais porque todos imaginávamos que ia rolar algo entre os dois. Aparentemente, Alexander e Sharon eram bem íntimos.
— Acho melhor resolvermos isso outro dia. Tenho que ir. — Alex se despediu e virou as costas, indo para longe de nós.
— Quanta coisa aconteceu em menos de um mês. — Comentou Seline de forma drástica. — Nos conhecemos, descobrimos estarmos na linhagem de uma tríade, eu descobri que era adotada e que minha mãe verdadeira era a minha diretora, meu pai morreu...
— Eu descobri uma irmã que não é irmã, e sim uma possível assassina. — Completou Jesse.
— Seline foi afogada, passamos por um assassinato, e em menos de quatro dias, por outro. — Mencionei como se fosse o mais importante.
— Por que a gente? — Questionou Seline.
Era uma pergunta que ninguém sabia responder. Poderia ser qualquer uma, mas Hécate nos escolheu como herdeiras da sua linhagem de tríades, por algum motivo, mas escolheu.
— Oi, meninas. O que eu perdi?
Lucy se aproximou observando a cena de catástrofe, como se não soubesse de nada. Ninguém a respondeu. Ela parou na nossa frente e nos encarou desconfiada, mas Jesse não resistiu e logo a interrogou.
— Quem é você? — Questionou Jesse num tom irritado. — Eu sei que você não é minha irmã de verdade. Sei que todas minhas verdadeiras irmãs morreram queimadas em um incêndio. O que quer de nós?
— Tudo bem, eu sabia que hora ou outra vocês iriam descobrir.
Falou com naturalidade, como se o que ela fez não fosse nada demais. A ambulância já tinha partido com o corpo de Nora, e na casa só restavam alguns policiais e Alex que apoiava moralmente Sharon, que parecia bem chocada com a morte da amiga.
— Então fala. Quem é você? — Perguntou Seline se pondo ao lado de Jesse.
— Meu nome é Lucy... Whitmore. — Jesse a fitou ainda mais confusa, esperando Lucy terminar de falar. — Eu morri no dia onze de agosto de 1873.
— Dá para ser mais específica? — Perguntei atraindo sua atenção para mim.
— Eu sou uma Whitmore, fazia parte de uma tríade mais antiga de Hécate, e então eu morri. — Falou suavizando a voz. — Vocês precisam conhecer a minha verdadeira forma.
Lucy começou a andar sem explicação, e então nós resolvemos segui-la. Ela poderia nos matar a qualquer momento, nem a conhecíamos, mas eu sentia que ela precisava dizer mais.
— Meu pai era um Whitmore, e minha mãe... — Ela parou de andar no meio da rua e se virou para nós, mas não era mais ela. Pelo menos não a aparência. — Ela não importa.
A garota na nossa frente, agora tinha a aparência de dezessete ou dezoito anos. Ela tinha a pele morena e bronzeada, parecia até ouro. Seus olhos eram castanhos e seu cabelo um pouco bagunçado e ondulado, sua boca era carnuda e bonita.
— O que? — Questionou Jesse atordoada com a sua mudança. — Você também já foi da tríade? Se você morreu há mais de um século, o que faz aqui?
— Deixa eu contar a minha história. — Lucy me interrompeu e começou a falar. — Eu vivia aqui na cidade com meu pai como quaisquer pessoas. Não tínhamos uma boa condição financeira, na escola eu sofria tanto pela minha cor quanto pela minha condição. E então, Hécate apareceu para mim e me ajudou a treinar a arte da magia.
A essa altura, Jesse queria estrangular a garota. Ela praticamente se afirmou uma garota perversa, ela afirmou não ser o que dizia ser.
— Você não me respondeu. — Falou Jesse, perdendo a paciência.
— Fiz as pessoas acreditarem no que eu queria que elas acreditassem. Fiz todos os que me humilharam verem o que realmente eram.
— Igual fez com a gente ao citar falsas teorias sobre o assassinato de Audrey? — Seline se manifestou com as perguntas, mas Lucy manteve-se calma.
— Hécate me revelou ser a segunda fase da lua. A lua cheia, o símbolo da mãe, a proteção. Mas eu não protegia os outros, eu protegia a mim mesma e a minha família. Minha tríade era composta por uma LaRue e uma Breyner, mas o final delas foi trágico.
— VOCÊ NÃO ME RESPONDEU! — Gritou Jesse. — Você é a assassina?
— Eu? Claro que não! — Lucy se defendeu. — Mas sei quem foi. Talvez eu tenha o guiado para uma leve vingança contra seus antigos colegas, mas eu não incentivei, não mandei assassinar ninguém e nem planejei nada.
— Por que não nos diz? — Insisti em súplica e ela me olhou com pena.
— Porque faz parte da evolução de vocês como bruxas. A deusa tríplice precisa reconhecer o esforço de vocês, precisa as colocar em foco. Sei que vocês têm muito mais capacidade de resolver um simples caso de assassinato, e isso as preparará fisicamente e mentalmente para enfrentarem Stephen e o que há de pior para vir.
— Lucy... — Me aproximei um pouco assustada. — Por que não nos disse antes?
Lucy riu baixo como se o que eu tivesse dito fosse uma piada, mas logo se controlou e ficou séria novamente.
— Porque eu queria ver a discórdia, meu bem. Queria colocar fogo no parquinho e também... — Ela suspirou antes de continuar. — queria fazer amizades como a do meu tempo. Eu sou guiada pela discórdia, não pela falsidade.
— Por favor, não apareça mais para a gente. Suma da nossa vida. — Sugeriu Jesse mais calma. Senti uma pontada de decepção vindo dela, não sei porquê.
Todos esperávamos apenas o positivo de Lucy, mas estávamos cegas demais para perceber a verdade. Primeiro ela apareceu exatamente no dia que Audrey foi assassinada, depois contou coisa demais que sabia e ainda fingiu nos ajudar, sendo que no final ela já sabia de tudo.
— Eu queria ter a chance de ajudá-las de uma maneira que eu não fui. — Admitiu com sinceridade. — Mas eu entendo.
— Como você se tornou imortal? — Seline perguntou antes do clima ficar mais tenso.
— Meu marido me envenenou, uma história bem similar com a da mãe da Alice. — Disse olhando para mim. — mas fui alertada por minha mãe, que na realidade estava se divertindo com a situação. Bem, eu fiquei muito doente e quase morri, e em uma noite meu adorável esposo subiu em cima de mim e me estrangulou, mas eu consegui empurrar ele e sair correndo. Estava chovendo muito nesta noite, mas ele não desistiu. Quando ele conseguiu me alcançar, me jogou no chão e pegou uma pedra que estava ao seu lado e acertou minha cabeça. — Deu uma pausa como se estivesse tendo más recordações. — Ele me atingiu duas vezes e fugiu, mas Nix, Hécate e Astéria concordaram que eu era uma ótima serva. Astéria ordenou às estrelas a me tornarem imoral, e cá estamos nós.
Ninguém falou absolutamente nada. Lucy estava sendo sincera, mesmo que fosse da pior forma. Ela já foi uma jovem bruxa como nós, aprendeu muita coisa e sofreu também. Mas ela não tinha o direito de entrar em nossas vidas e mentir.
— Acho que Mariyah está vindo. — Seline apontou para um carro vermelho vindo de longe em nossa direção.
— Preciso ir. — Lamentou Lucy e olhou para Seline. — Antes disso, preciso contar uma última coisa.
A olhamos esperando que ela fosse falar algo importante, mas ela simplesmente soltou a bomba.
— Seline, o Alex namorava a Sharon mas eles transam às vezes. — Ela olhou pra mim. — Alice, quando Jasper disse que seus pais o forçaram a se casar, ele estava se referindo à Seline. — Lucy sorriu perversamente. — Adeus!
E então, quando Mariyah parou o carro ao nosso lado, ela desapareceu.
— Filha da mãe!
Sussurrou Seline antes de entrarmos no carro. O clima estava bem tenso, ainda mais por eu acabar sabendo que Jasper se referia o tempo todo à Seline. Ainda bem que eles não concordaram com o casamento, se não eu ia surtar.
— Vocês estão bem, meninas? — Questionou Mariyah nos olhando pelo retrovisor.
— Não, mãe. A gente está na merda. — Confirmou Seline de braços cruzados, ao seu lado no banco carona.
— Eu soube do assassinato. — Falou mantendo os olhos na estrada. — Vou levar vocês para casa.
— Mãe, elas podem dormir lá hoje? — Pediu Seline inusitadamente, e Mariyah a olhou curiosa.
— Se a tia delas deixarem, claro!
Jesse e eu nos olhamos. Seline queria fazer alguma coisa, e queria o mais antecipado o possível.
— Podemos passar na minha casa? Preciso pegar uma roupa. — Disse Jesse, mas eu sabia que a "roupa" que ela queria pegar, era o grimório.
— Claro. Quer passar em casa também, Alice? — Sugeriu de forma simpática. Nunca mais a veria como diretora, e sim como uma tia responsável.
— Pode ser. — Dei de ombros olhando para a estrada enquanto o carro seguia em uma velocidade média.
A madrugada seria repleta de mistérios e descobertas, e finalmente teríamos novas respostas sobre o nosso real objetivo.
Espero que tenham gostado. Vote no capítulo se você gostou e comente suas opiniões sobre o livro! Sz
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