Sonhos de vida no pesadelo da morte - Parte II
ATO V
— Pai — chamo, minha voz ecoando por entre a infinita obscuridade. Em resposta, nesse vácuo, uma luz suave e reconfortante começa a brilhar, sua presença trazendo conforto.
— Não se preocupe, Vida. Papai ainda está aqui — ouço, aliviando o pequeno Ózis, que um dia fui, perdido na caverna envolta em sombras.
Sinto a calma dominar meu corpo ao segurar sua mão. — Por que viemos aqui? — pergunto, sem medo algum no coração. Com Máterum ao meu lado, não tinha o que temer; o medo, estranho distante.
— Algo que fiz para ti está no fundo desta caverna — ele informa, guiando-me através do labirinto subterrâneo.
De repente, sinto sua presença desvanecer, sua mão se soltando da minha.
— Pai — chamo, com a incerteza começando a se infiltrar em minha voz. — Pai? — O grito se perde nas sombras, e o frio desesperador se apossa de mim.
De repente, un pequeno objeto colide contra o chão, emitindo sucinto clarão e, nele, vejo a sombra de Máterum se afastar, abandonando-me na depressão da caverna.
— Não me deixe... — murmuro em desespero.
Como uma pintura antiga e querida que lentamente se desbota sob a chuva, a escuridão da caverna, antes manto de conforto na presença de meu pai, se transforma em abismo de isolamento. Essa escuridão se funde com a que está por trás de minhas pálpebras fechadas, as fronteiras entre o passado doloroso e o presente incerto se embaralhando como as cores de um quadro em desintegração.
— Não me deixe sozinho — suplico.
— Talvez, seja melhor assim — profere uma voz diferente, mais clara e presente. Esta pertencendo a Léteru, com o som da sua voz me instigando a abrir meus olhos para o momento presente.
— Como assim? — questiono, minha voz ainda carregada com o eco daquela antiga dor, mas agora voltada para o deus à minha frente. Deito-me com a mão sobre o peito, apertando-o, como se pudesse conter a dor que se alastra por dentro.
— É bom que pensem que está morto, não acha? — Léteru supõe, deslizando a mão dentro da bolsa de areia com casualidade.
— Por que seria? — questiono, sentindo incômoda rigidez nas panturrilhas.
— É simples — ele retruca, sacudindo a bolsa de areia, sua voz mantendo tom de conversa trivial, apesar do peso do assunto. — Não sei exatamente em que você e seus irmãos estão envolvidos, mas pela maneira como te encontrei, está claro que é perigoso.
— E é — admito, minha voz ganhando firmeza. — Mas não tenho escolha. Estamos em guerra. E é uma luta que preciso enfrentar.
— Por quê? — ele questiona, interrompendo o movimento com a bolsa, sua calma flertando com o desdém.
— Porque se eu desistir, estarei abandonando meus irmãos. E serei parcialmente responsável por cada deus que cair nesta guerra — respondo, minha respiração pesada carregando o peso de minha decisão.
— Deuses morrerão de qualquer maneira, desistindo ou não — ele responde, suas mãos deixando a bolsa de areia e se aproximando de mim, cobertas pelo pó vermelho.
— Sim, infelizmente morrerão — reconheço, fixando meu olhar no seu. — Mas tenho o poder de minimizar as mortes. Não posso desperdiçar isso. Mesmo que custe minha vida — afirmo, enquanto ele passa a mão sobre o ferimento em meu abdômen, a areia vermelha tocando minha pele.
Observo Léteru, cujo rosto é adornado por um sorriso estranho, um que não alcança seus olhos. — Isso não demorará muito — ele diz, matando o sorriso. — Não foi capaz de salvar nem o próprio braço. Como acredita que poderá salvar os outros deuses?
Ele coloca as mãos sobre meu abdômen, um gesto que parece sentenciar minha incapacidade, sua expressão como a de um juiz que já determinou o veredito antes do julgamento.
Incapaz de suportar tal desdém, reajo instintivamente. — Tira a mão de mim! — Exclamo, afastando suas mãos com um movimento brusco. Uma sensação de queimação surge onde ele tocou, como se a incredulidade de Léteru fosse veneno que penetrasse minha pele.
Léteru se cala, seus olhos fixos em suas mãos com areia vermelha, sem retirar os olhos delas, volta a falar: — Olha seu abdômen! — Sua ordem é firme, quase imperativa.
Obedecendo, olho para baixo e fico estupefato com o que vejo. O ferimento profundo em meu abdômen, que até então sangrava, começa a se fechar diante dos meus olhos. Os vasos sanguíneos se contraem, e um coágulo se forma, estancando o fluxo de sangue.
— Como? — pergunto, surpreso, tocando a área que, até segundos atrás, era uma ferida aberta.
Observo mais atentamente e percebo os sinais da fase inflamatória. A pele ao redor do ferimento se avermelha e esquenta, um indicativo claro de que meu corpo está lutando contra a infecção e limpando a área danificada.
— Achei que soubesse que a areia vermelha ajudava na regeneração de ferimentos — Léteru observa, suas mãos descendo lentamente ao lado do corpo.
— Eu sabia — respondo, ainda surpreso com a rápida cicatrização. — Mas nunca tinha testemunhado cura tão acelerada — respondo, retirando a mão do ferimento, que agora está em plena fase de proliferação. Posso ver a derme se reconstruindo, as células se multiplicando em um ritmo frenético, formando novos tecidos. A epiderme, a camada mais externa da pele, começa a se fechar sobre a ferida, como cortinas se fechando ao final de um espetáculo.
— Provavelmente, devem usá-la erroneamente — Léteru comenta casualmente, alisando a mão na bolsa de areia. — Posso continuar? — ele pergunta.
Com aceno, concedo permissão, e ele volta a aplicar as mãos em meu abdômen.
Enquanto ele trabalha, a fase de remodelação se inicia. O novo tecido, inicialmente rosado e flexível, aos poucos vai adquirindo a textura e a resistência do tecido normal. As fibras de colágeno se reorganizam, tornando a área mais forte.
— Incrível. Como aprendeu a usá-la tão bem? — pergunto, ainda maravilhado com a eficácia da cura.
— Fui ensinado — responde Léteru com um prolongado silêncio. — Esta técnica se chama Zói. Aprendi-a há muitos anos e fui a aprimorando com o passar das décadas.
Ele tira as mãos e caminha até outra grande bolsa jogada no chão. — Isto é para você — anuncia, retirando da bolsa um braço de cristal arcririsiano.
Encaro o braço, fascinado e apreensivo ao mesmo tempo. — Um braço de arcríris? Não pretende...
— Sim — interrompe, espalhando areia vermelha no coto onde ficava meu braço esquerdo. Sinto queimação moderada, mas não desvio o olhar.
— O que vai fazer? — pergunto, receoso.
— Espera e verá — responde Léteru com sorriso misterioso, encaixando habilidosamente o braço de arcríris no meu coto. Com delicadeza, ele cobre a junção com mais areia vermelha. — Espera alguns minutos e depois mexa.
Fico olhando para o lugar onde meu braço costumava estar, agora ocupado por um membro de cristal cintilante. É belo, sem dúvida, mas também é estranho e um pouco assustador.
— Como fez um braço de arcríris? — pergunto, sentindo leve formigamento no coto, como se estivesse ganhando vida própria. Minha voz trêmula, não totalmente devido à admiração. Há medo ali, hesitação. É parte de mim agora. Uma parte feita de cristal.
— Vivemos em Arcríris. O que não falta aqui são cristais coloridos. Além de que não foi muito difícil esculpir um braço, só demorado. E o que mais tenho é tempo — diz Léteru, pegando e espalhando mais areia vermelha no coto e no braço de arcríris.
Respiro fundo, tentando acalmar a ansiedade dentro de mim. É uma segunda chance, uma oportunidade de ser inteiro novamente, mas também é um lembrete constante do que perdi, do que foi tirado de mim.
Observo suas mãos trabalharem com destreza que beira o sobrenatural. É como se ele estivesse tecendo tapeçaria mágica entre mim e aquele braço cristalino.
Sentado na cama de areia vermelha e forquis, sinto o conforto incomum, mas acolhedor que ela proporciona. É uma sensação que contrasta com a dureza que esperaria da junção de areia e cristal, mais parecendo um abraço suave e reconfortante. Meus olhos percorrem a cabana enquanto Léteru aplica areia vermelha no coto de meu braço.
Com um momento de calma, meus olhos se fixam em Léteru, e realmente o vejo. Ele é um deus de pele branca, lisa e sem falhas, esticando-se sobre a estrutura óssea finamente modelada de suas clavículas e ombros, que se destacam com elegância discreta. Seu cabelo castanho escuro cai em ondas e caracóis que fazem sombra a sua testa, dando-lhe um ar de nobre descuidado.
Seu rosto é uma obra de simetria e suavidade, com traços que parecem ter sido moldados com cuidado poético. Seus profundos olhos castanhos claros são como poços de água límpida, refletindo inteligência aguçada e alma antiga, enquadrados por sobrancelhas arqueadas bem definidas. O maxilar é vagamente pontiagudo, enquanto suas maçãs do rosto retas e bem definidas acentuam a profundidade de seus olhos. Seu nariz é reto, e sua testa é ampla e clara, e suas orelhas, parcialmente pequenas, se alinham de forma harmoniosa com o resto de sua face.
O corpo de Léteru, embora esguio, é definido, com músculos delineados sob a pele, e cada movimento que ele faz é fluido e preciso, revelando força e agilidade que desmentem sua aparência delicada. Seus lábios, pequenos mas bem desenhados, se curvam em sorriso sereno e confiante enquanto ele trabalha, como se estivesse sempre em paz consigo mesmo, independentemente do mundo ao seu redor.
Neste momento, enquanto observo Léteru, sinto uma onda de gratidão e admiração por este deus que, com mãos tão habilidosas e coração gentil, está me dando uma segunda chance.
A cabana, embora modesta, é um santuário de tranquilidade e ordem em meio ao ambiente selvagem de Arcríris. Cada centímetro dela respira a presença de Léteru. As paredes de madeira, , envelhecidas pelo tempo, conferem ao espaço ar rústico e acolhedor. Não há janelas, o que torna o interior da cabana um lugar de reclusão e foco, iluminado suavemente pela luz que se filtra através das frestas da única porta da construção.
Perto de mim, vejo várias bolsas, cada uma repleta da mesma areia vermelha que Léteru usa agora. Ele as trata com respeito reverente, como se cada grão fosse precioso.
Ao lado da cama, um baú de madeira robusto guarda verdadeiro arco-íris de cristais arcririsianos. Cada cristal, cuidadosamente lapidado, brilha com sua própria cor e luz, refletindo a habilidade e a paciência de Léteru.
No lado oposto da cabana, um armário de madeira abriga peças aleatórias de armadura. Algumas são simples, outras são incrustadas com detalhes em cristal que cintilam à medida que movo o olhar. Ao lado do armário, espadas e adagas de cristal arcririsiano estão exibidas na parede, cada uma um testemunho do passatempo de Léteru e de sua habilidade como artesão.
Tudo aqui, desde as paredes da cabana até o braço de cristal que agora é parte de mim, foi trazido à existência pelas mãos de Léteru. Este é o seu domínio, um lugar onde ele é tanto curador quanto criador, um santuário que ele construiu peça por peça em meio ao caos do mundo exterior.
— Suas habilidades seriam de grande ajuda na guerra — admito, com o coto agora pulsando em ritmo que parece dançar com meu coração.
— Seria? — ele responde, limpando as mãos. — Talvez. Ou não.
— Tenho certeza que sim. Mas parece estar se escondendo?
— Me escondendo? Eu não me escondo — diz, pondo a bolsa de areia no ombro. — Só não tenho nada contra o Primordial ou, contra nenhum outro deus. Apenas desejo viver em paz — deixando-a próximo a parede junto de outras bolsas.
— Qualquer hora a guerra baterá em sua porta e você terá que escolher seu lado.
— Sei disso. Contudo, até lá, pretendo não deixá-la entrar.
— Não posso te julgar. Só espero que escolha o lado certo. Seria penoso nos enfrentarmos em campo de batalha.
— Torço para que isso nunca aconteça — diz Léteru, retirando um pouco de areia vermelha sobre o braço de arcríris. — O suficiente! Mexa o braço!
Obedeço incrédulo e, lentamente, começo a mover o braço de cristal. É surpreendente. Sinto cada articulação, cada movimento fluido e natural.
— Estou... Estou realmente movendo este braço. É como um milagre. Isso é surreal. Sinto como se fosse meu próprio braço, mas é cristal! — exclamo em minha mente, admirando o novo braço de cristal arcririsiano, que brilha com luz suave e acolhedora.
— Ainda bem que gostou! Ainda o fiz com coloração cerúleo, semelhante à de seus olhos para combinar — alega Léteru com baixo riso.
— Obrigado por tudo, Léteru — digo com gratidão.
Árvore Forquis – árvore de madeira distintamente amarronzada, enriquecida visualmente por pequenas manchas laranjas espalhadas perto da base de sua robusta raiz. Conhecida por sua resistência ao fogo.
ATO VI
— Tenho que ir — informo, enquanto me levanto com esforço. Sinto uma dor aguda, mas tolerável, diferente da agonia esmagadora que senti da última vez. — Meus irmãos devem estar me procurando. — A urgência pulsando em cada palavra que digo.
Léteru, visivelmente alarmado, move-se rapidamente para bloquear minha saída, posicionando-se diante da porta. — Ainda está muito ferido! — adverte ele. — Se você se machucar novamente, não sobreviverá.
Encaro-o com firmeza, minha voz firme mas calma. — Eu sei disso — respondo. — Mas preciso voltar para casa. Meus irmãos devem estar desesperados, procurando por mim.
A palavra “casa” parece atingir Léteru de forma peculiar e nostálgica, e por um momento, ele parece se perder nesse pensamento.
— Onde seria? — ele pergunta, finalmente.
— Zaranler — respondo, observando Léteru, que permanece imóvel, relutante em se afastar da porta.
— Melhor se sentar — ele comunica com expressão séria. — Tenho algo importante para te contar, e não é boa notícia.
— Me deixe passar! — exijo, sem paciência, empurrando Léteru para o lado.
Nesse momento, batida inesperada na porta paralisa minha saída. Léteru se vira rapidamente, a surpresa evidente em seu rosto.
— Deve ser teu amigo — comunica Léteru, caminhando até a porta com ar mais calmo. Sua mudança de comportamento é quase desconcertante, como se ele soubesse exatamente quem está do outro lado.
— Amigo? — pergunto, confuso e ansioso.
— Não te contei? Há alguns dias, um deus passou por aqui procurando por você. — Léteru explica enquanto destranca a porta. — Você ainda estava desacordado, então ele decidiu esperar até você acordar. Ele até me ajudou a criar o seu braço.
Com suspiro profundo, tentando controlar as emoções dentro de mim, ponho a mão na maçaneta e abro a porta.
O ar frio da noite entra pela porta entreaberta, e meus olhos encontram a figura familiar.
— Zulfiqar! — exclamo, minha voz carregada de surpresa e alívio. Contemplando-o passar pela porta, não consigo conter a emoção e o abraço com força, sentindo alegria que irradia por todo o meu ser.
Zulfiqar retribui o abraço, e sinto sua emoção trêmula. — Que bom ver você bem. Passei tanto tempo te procurando que quase perdi as esperanças — Zulfiqar confessa, sua voz trêmula.
— Não se livrará de mim tão facilmente, Zulfiqar! — respondo, sorrindo amplamente, feliz por reencontrar alguém tão familiar, ainda que Zulfiqar.
Ele me afasta gentilmente para me olhar melhor, seus olhos percorrendo meu estado. — O que aconteceu com você? — pergunta ele, preocupado, observando o recém-adquirido braço arcririsiano e meus cabelos, antes belíssimos e loiros, agora desgrenhados e cortados de maneira aleatória e disforme.
— Fui atacado por um dos planetas-vivos — respondo, tentando manter a voz estável.
— Este símbolo no teu abdômen... — proclama a voz maligna em minha cabeça, mas luto contra a lembrança.
— Ele era extremamente rápido e forte. Se não tivesse cortado parte dos meus cabelos para escapar de um dos ataques dele, estaria morto agora — explico, desviando o olhar.
— Foi ele quem fez isso com você? — Zulfiqar pergunta, observando a cicatriz de dois círculos cerrados entrelaçados no meu abdômen, sua expressão intensamente preocupada.
— Isso não importa agora — respondo, batalhando para não lembrar, para não deixar a dor daquele momento me consumir. — Precisamos voltar para casa e reencontrar nossos irmãos! Sem dúvidas, ficarão aliviados quando...
— Você não contou? — interrompe Zulfiqar, olhando para Léteru com olhar penetrante.
— Ia contar, mas você apareceu de repente! — Léteru se defende.
— Contar o quê? — pergunto, minha mão direita involuntariamente apertando o braço de arcríris, que começa a formigar incessantemente.
Fico preocupado com a expressão tensa de Zulfiqar, e aperto a articulação do braço para aliviar o formigamento, buscando algum conforto enquanto aguardo a resposta.
Zulfiqar respira fundo, sua expressão se tornando sombria. — Zaranler... — ele começa, com breve pausa — Nossa casa foi destruída.
— O quê?! — exclamo, sentindo como se o chão desaparecesse sob meus pés. Abaixo os braços, esquecendo completamente do formigamento. Meu rosto empalidece e meus olhos se arregalam em choque, incapaz de processar a realidade dessas palavras. — E nossos irmãos? — pergunto, minha voz trêmula e desesperada, as mãos instintivamente se fechando em punhos apertados ao lado do corpo.
— Não sei. Estava aqui te procurando quando o planeta explodiu. Mas tenho esperança de que tenham sobrevivido — Zulfiqar responde, sua voz firme, mas seus olhos revelando profunda preocupação.
— Isso foi culpa minha — murmuro, sentindo onda de culpa me submergir, — se eu tivesse acabado com aquele maldito, teria voltado a Zaranler com os cristais de arcríris e ajudado nossos irmãos contra Máterum — presumo, minha respiração acelerando. — Assim, você também nunca teria perdido seu tempo me procurando, e agora podíamos estar...
— Mortos?! — interrompe Zulfiqar, colocando a mão sobre meu ombro com firmeza, como se tentasse me ancorar à realidade. — Máterum deve ter usado uma nova criação e os planetas-vivos para destruir Zaranler. Se nós estivéssemos lá, poderíamos ter sido capturados — ele continua, olhando profundamente em meus olhos. — Tenho fé de que nossos irmãos e amigos estão a salvo.
— Se eles fugiram da explosão, onde eles poderiam ter ido? — pergunto, tentando focar na situação atual, apesar do choque da perda ameaçar me engolir.
— Dívum — responde Léteru, com clareza que denota um raciocínio rápido e lógico.
— Dívum? — questiono, ainda tentando absorver todas as informações.
— Sim — Léteru continua, — antes de Zaranler explodir, com certeza ocorreu uma batalha entre seus irmãos e Máterum, e se eles realmente fugiram, foi porque deviam estar muito fracos. O planeta mais próximo de Zaranler é Primárium, porém é governado por Máterum; ou seja, os mais próximos seriam Arcríris e Dívum. Dívum é a melhor escolha, visto que Arcríris é bem inóspito — ele explica, em tom que evidencia sua capacidade de pensar estrategicamente.
Impressiono-me com seu rápido e perspicaz raciocínio.
— Não concordo — contesta Zulfiqar, sua expressão séria e pensativa, enquanto cruza os braços e inclina a cabeça levemente. — Meu palpite é Gáudium.
— Típico de Zulfiqar discordar de pensamentos inteligentes — penso, esperando seus argumentos.
— Improvável, Gáudium é o planeta mais longe de Zaranler — Léteru rebate rapidamente, seu tom prático refletindo sua confiança na própria lógica.
— Por isso mesmo — Zulfiqar responde. — Dívum, por ser o planeta mais “perto”, seria o mais óbvio, e Máterum poderia prever isso. Gáudium, sendo o mais distante, seria a escolha mais segura e estratégica. Além disso, Gáudium tem defesas naturais que dificultariam qualquer tentativa de invasão por parte de Máterum.
Léteru balança a cabeça em desacordo, mas sua expressão revela uma ligeira hesitação. — Não faz sentido — insiste ele, gesticulando com as mãos como se tentasse reforçar seu argumento. — Se eles tivessem escolhido Gáudium, eles passariam por Arcríris e avisariam a você e Ózis de que estão a salvo.
— Talvez eles tenham achado arriscado demais, dado que o planeta é grande demais para me localizar em tão pouco tempo — Zulfiqar argumenta, sua voz firme e convincente. — Eu mesmo demorei semanas para encontrar Ózis. Eles poderiam ter enviado uma mensagem codificada que nós ainda não interceptamos.
Léteru suspira resignado, seus ombros caindo ligeiramente. — Provavelmente tenha razão — admite, seu tom calmo e sua expressão neutra, como se estivesse decidido a não gastar mais energia na discussão, reconhecendo a validade do ponto de Zulfiqar, mas ainda mantendo sua própria opinião intacta.
— O que acha, Ózis? Qual planeta? — Zulfiqar me pergunta, voltando-se para mim, seus olhos fixos nos meus, como se tentasse ler minha decisão antes mesmo que eu a verbalize.
Pensando por alguns segundos, sinto o peso da decisão em meus ombros. As palavras de Léteru são lógicas, e Dívum parece a escolha mais apropriada. Entretanto, uma parte de mim, talvez a parte que anseia por um pouco de esperança em meio ao caos, deseja confiar em Zulfiqar outra vez. Respiro fundo, e com determinação renovada, escolho por fim: — Gáudium. Vamos a Gáudium — afirmo, com uma clareza e firmeza que surpreende até a mim mesmo. Nesse momento, sinto que minha decisão não é apenas um palpite, mas um compromisso com o caminho que escolhemos seguir.
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