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Serendipidade - Parte II

ATO IV

A benigna emoção é abruptamente fragmentada por tremor violento que percorre a gruta. O chão sob meus pés se agita violentamente, e fissuras se formam, rasgando a pedra.

Sinto onda de pânico ao ver fenda disforme se abrir diante de mim, engolindo a estabilidade do solo.

Comandado pelo instinto de sobrevivência, meu corpo reage antes mesmo que minha mente possa processar completamente a situação. Com salto desesperado, busco refúgio na parede mais próxima, na esperança de encontrar apoio seguro. No entanto, para meu horror, a parede, feita da mesma pedra-mole que antes manipulava com curiosidade, desmorona ao toque das minhas mãos. A textura maleável, que antes era fonte de fascínio, agora se torna a causa do meu desespero. E sem nada para me agarrar, sou tragado pela fenda que se abre.

A queda é vertiginosa, e meu coração dispara com a adrenalina. O impacto, ao contrário da minha queda anterior na gruta, é brutal e imediato. Sinto golpe duro contra minha cabeça, mas, por sorte, a pedra-mole amortece parcialmente o impacto, salvando-me de fim mais trágico. Não obstante, o resto do meu corpo não tem a mesma sorte, e dor torturante irradia por todo o meu ser.

Enquanto luto contra a desorientação, ergo meus olhos com dificuldade e avisto a silhueta de um deus me observando do alto da fenda. Sua figura é nebulosa, sombra imponente delineada contra a luz fraca que se infiltra na abertura. Essa visão enigmática é a última coisa que vejo antes de ser envolvido pela sombra da inconsciência, uma sombra fria e silenciosa que me arrasta para longe da realidade e da dor.

ATO V

Vultos de memórias rondam o vácuo do inconsciente, ejetados de buraco branco e dispersas em buraco negro.

Deslumbres de um futuro do passado, onde a constante é nula, pausada pela inexistência do tempo.

Treze névoas negras, densas como a noite sem lua, emergem do vazio. Cada uma porta uma silhueta semelhante a dos deuses. Uma delas se destaca, movendo-se com lentidão, como se deslizasse sobre a superfície de um lago tranquilo. Aproximando-se, cada vez mais definida em minha visão turva.

Essa silhueta enigmática, envolta em névoa, posiciona-se diante de mim. Seu rosto oculto pelo véu escuro, mas sua voz, um sussurro reverente e firme, transpassa a obscuridade: — Abra os olhos, pai de todos[CG1] [CG2]  — clama o rosto coberto pela névoa negrume. Seus lábios invisíveis, mas sua voz denota devoção a minha presença.

Guiado por impulso atemporal, estendo minha mão trêmula e toco a névoa que envolve seu rosto. No instante em que meus dedos a atravessam, uma luz brilha, como o nascer do sol rompendo a noite e seu rosto toma a semelhança de meu rosto.[CG3] 

Essa oração, súplica silenciosa, irradia uma luz cálida, dissipando as sombras que me cercam. Assim, com esforço quase esquecido, abro os olhos e sou confrontado com a visão do céu. Ele está retalhado por fina rajada solar, corte afiado e brilhante rasgando o azul profundo, enviando uma cascata de chamas em minha direção.

Movido pela adrenalina, ignoro a dor e me levanto para longe da luz inclemente do sol, que rasga o céu novamente, uma lâmina de fogo ameaçadora. Com salto desesperado, arranco meu corpo do solo, manobra instintiva que mal me salva da rajada solar impiedosa.

Meus olhos, já ardendo sob o ataque implacável do sol, se fixam na entrada da gruta, um refúgio precário. Minhas pernas, embora trêmulas e cobertas de suor e poeira, me impulsionam em direção à salvação prometida. Mas o destino, cruel em sua ironia, lança outra rajada. Esta, um flagelo de luz e calor, encontra meu braço de arcríris.

Sinto o cristal do meu braço ferver,  mas, em vez de causar estragos diretamente, o braço age como prisma, refletindo e amplificando a luz solar num espetáculo de cores deslumbrantes. A luz solar concentrada, torna-se um feixe explosivo de energia pura, disparando contra a entrada da gruta, eviscerando-a em explosão violenta, lançando pedras e detritos pelo ar; cascata de destruição bloqueando meu caminho.

Piorando a situação o impacto abre mais espaço na atmosfera para centenas de rajadas solares, contudo me mantenho esquivo velozmente.

Em meio ao caos, com o desespero corroendo cada fibra do meu ser, uma voz surge. — Por aqui! — ecoa o grito rouco de um deus, emergindo de buraco oculto, um refúgio inesperado próximo à entrada devastada da gruta.

Com os músculos gritando em agonia, corro em direção ao deus. Enquanto avanço, fino fio, mas mortífero, de luz solar raspa a lateral da minha costela, como navalha incandescente. A sensação é cruel, lascando a carne e deixando rastro de sangue quente que escorre pela minha pele, manchando o chão sob meus pés.

A dor é quase insuportável, mas a vontade de sobreviver supera o tormento, e com esforço, ignoro o fogo que consome meu lado, mantenho-me de pé, e finalmente alcanço o deus.

—Vamos! — Ele me comanda com urgência. Com mãos firmes e calejadas, ele me agarra e me puxa para dentro do buraco, um movimento ágil que me arranca do inferno.

Ao tapar a entrada, ele sela nossa fuga, nos envolvendo em escuridão reconfortante.

No interior do buraco, alívio avassalador me invade. — Obrigado — murmuro, minha voz um sussurro rouco de gratidão e exaustão. Enquanto meus olhos se ajustam à penumbra, observo a figura do deus que me salvou.

Sua figura imponente, emanando uma aura de perigo, apesar de seu ato de ajuda. Seu rosto marcado por cicatrizes, o legado de um sobrevivente neste lugar hostil, e sua cabeça calva reflete o brilho tênue que se infiltra no buraco escuro onde ele se esconde.

Sua pele pálida, realça a escuridão ao redor, e as veias salientes em seu pescoço e têmporas sugerem vigor selvagem contido. Sua vestimenta é composta de trapos, rasgado e sujos, que um dia poderiam ter sido vestes robustas.

Com minha respiração ainda pesada e irregular, lanço olhar interrogativo ao desconhecido. — Quem é você? — A pergunta sai áspera, arranhada pela exaustão e pela dor. Meus olhos, ainda se adaptando à penumbra, fixam-se na gargantilha de ferro que circunda seu pescoço; um anel ameaçador de pontas afiadas, tão perto da sua pele que parece uma armadilha mortal aguardando o menor deslize.

Sua figura, imponente mesmo na semiescuridão, permanece imóvel por um instante. Seu olhar é inescrutável, pesando minhas palavras e intenções. Quando ele fala, sua voz é uma surpresa, desprovida da agressividade que eu esperava. Em vez disso, ela carrega um timbre calmo, quase reflexivo. — Bergarian — ele responde, seu nome soando como sentença final.

Estendendo seu braço em minha direção, um gesto de ajuda, Bergarian me surpreende ainda mais. Seus movimentos são controlados, cada músculo parecendo ciente do perigo inerente à sua própria força. O olhar que ele lança sobre mim é profundo, como se ele estivesse lendo cada pensamento por trás da minha expressão aturdida.

O receio me domina ao observar a proximidade mortal das lâminas de sua gargantilha à sua pele. Há algo nele, uma junção de perigo contido e serenidade fria, que me faz hesitar.

Estendo a mão trêmula para aceitar a ajuda de Bergarian, mas sou traído por onda de dor súbita e avassaladora. A dor retorna, em agonia de sofrimento que torce meu corpo em arco de tormento. Cada fibra do meu ser se contrai, e me vejo lançado em espaço de dor insuportável.

A raiva provocada pela dor me consome, transformando-se em uma força cega e descontrolada. Com punhos cerrados, começo a golpear o chão implacavelmente, cada impacto um grito mudo contra o sofrimento que me devora. Meus golpes são desesperados, uma tentativa fútil de redirecionar a dor que me rasga por dentro.

Mas sou rapidamente imobilizado por Bergarian. Suas mãos agarram meus pulsos com uma força esmagadora. Luto contra seu aperto, mas é inútil. Meus movimentos frenéticos são facilmente contidos pelos braços dele, fortes como colunas de pedra, que me mantêm firmemente no lugar.

A despeito do meu estado descontrolado, sou incapaz de me mexer sob a força imponente de Bergarian. Seus músculos, tensos e definidos, resistem a cada uma das minhas investidas frenéticas.

Seu corpo, alto e musculoso, ostenta músculos calejados e definidos. O torso repleto de cicatrizes e contusões, coberto por sujeira e suor. As pernas, como troncos de árvores, suportam o peso de seu ser com firmeza.

Apesar da aparência bruta, há uma leveza perigosa em seus movimentos, uma economia de gestos que sugere se controlar para não quebrar meus pulsos enquanto me segura.

À medida que a dor começa a se acalmar em meu corpo, Bergarian percebe a mudança sutil em minha respiração e postura, e com a compreensão de minha recuperação gradual, ele relaxa seu aperto firme, libertando meus pulsos. Seus olhos, tão penetrantes quanto sua força, observam-me com vigilância silenciosa.

 — Isso deve ajudá-lo — diz ele, sua voz com tom cauteloso.

Com movimentos que exibem a surpreendente delicadeza, Bergarian se abaixa e enche a palma de sua mão com areia vermelha.

Ele se volta para mim, e com gesto suave, começa a espalhar a areia sobre as feridas abertas em meu corpo. Cada grão de areia toca minha pele como um bálsamo, estranhamente frio e calmante. A areia se funde com minhas feridas, cada partícula se entrelaçando com a minha carne, iniciando um processo de cura.

Enquanto a areia vermelha toca minha pele, sinto sensação refrescante se espalhando, amenizando o calor abrasador das queimaduras e cortes.

Meus olhos assistem grão a grão cair sobre meu torso, enquanto meu corpo permanece imóvel. Após o último grão, meu olhar se volta a Bergarian, seu rosto é um mapa de sua vida tumultuada. Sua pele, esticada sobre a estrutura óssea proeminente, é marcada por sulcos profundos, fruto da exposição constante às intempéries e às agruras do ambiente. Sua testa larga é um pergaminho de linhas de expressão, enquanto cicatriz notável atravessa a sobrancelha esquerda, talvez uma lembrança dos raios solares.

Seus olhos, dois abismos negros, parecem absorver a luz, revelando a vida de quem já viu mais do que sua cota de horrores. Cercados por pesadas pálpebras que já desceram sobre inúmeras visões de desespero. As maçãs do rosto são altas e salientes, cobertas por pele que parece esticada sobre o crânio, e as sombras que nelas se formam são como cavernas escuras.

Seu nariz torto pelo acúmulo de fraturas mal curadas. Seus lábios, finos e firmes, apertados em linha reta que denota desdém, embora não demonstre isso em seus gestos. A mandíbula é quadrada e forte, coberta por barba rala e irregular, mais um sinal de desleixo do que de estilo. O queixo, marcado por corte recém curado, complementa a impressionante e temível presença deste deus.

Com a pequena fagulha de alívio gerada pela areia vermelha, sou capaz de mexer os lábios, um esforço que parece exigir toda a minha concentração. — Onde... estou? — Minha voz emerge frágil e trêmula.

Bergarian observa meu esforço com olhar penetrante. Ele estende a mão novamente, um convite mais do que uma ordem, sua expressão ainda indecifrável.

Com esforço tremendo, alcanço seu antebraço. Sua força é imediatamente aparente, pois sou erguido com facilidade. Sua pegada é segura, mas gentil, como se ele estivesse consciente da minha fragilidade momentânea. Em pé, ainda sinto a fraqueza percorrer meu corpo.

Bergarian, sem dizer uma palavra, se vira e começa a caminhar em direção a um corredor estreito. O espaço é tão confinado que é impossível andar ao seu lado. Sigo-o, meus passos incertos e trôpegos, ainda tentando compreender o ambiente e a situação em que me encontro.

— Aonde está me levando? — Pergunto-me. Apesar da incerteza, continuo a segui-lo.

Chegamos a área que parece o fim, um beco sem saída que promete apenas mais confinamento. Mas Bergarian se posiciona diante da parede de pedra aparentemente intransponível. Suas mãos firmes pressionam contra a rocha fria e, inesperadamente, a parede cede sob sua força bruta, deslizando para o lado com grunhido de pedra contra pedra, revelando passagem secreta que se abre para o mundo exterior.

Ao vislumbrar a cena do lado de fora, meu fôlego é roubado pela magnitude do caos. Tornados colossais, como gigantes enfurecidos, arrasam florestas inteiras, suas bases engolindo árvores e terra em um frenesi de destruição. A natureza desencadeada em sua forma mais selvagem e indomável se desenrola diante de nossos olhos.

E acima, o Sol, um tirano celestial em seu poder máximo, derrama seu calor inclemente sobre um deserto de superfície vitrificada. O solo, outrora parte de um ecossistema vibrante, agora é um espelho do céu, refletindo a luz solar impiedosa em exibição de calor e luz que distorce o ar ao redor.

Fico parado, encarando a desolação que se estende à nossa frente, um assombro me inundando.

Bergarian, por sua vez, permanece imperturbável diante da visão apocalíptica. Seus olhos varrem o horizonte, analisando cada detalhe do pandemônio diante de nós. Há calma em sua postura, como se ele já tivesse, não só acostumado, mas sobrevivido a esse caos.

Encarando a vastidão tumultuada que se estende à nossa frente, minha voz emerge incerta, quase perdida no rugido dos elementos. — O que aconteceu com este lugar? — As palavras mal conseguem exprimir o assombro e a incredulidade que sinto diante da paisagem caótica do local.

Bergarian volta-se para mim. Seus olhos, que parecem ter testemunhado incontáveis catástrofes, mantêm-se frios e distantes. — Nada — ele responde, sua voz um reflexo de sua postura, alheia perante o caos ao redor. — Kedrano sempre foi assim, o resto de Gáudium que mudou.

Sua revelação de que Kedrano permaneceu inalterado enquanto o resto de Gáudium transformou-se, atinge-me profundamente.

Eu nunca tinha pisado neste planeta, obedecendo cegamente as ordens de Máterum, sem nunca questionar a verdade por trás de suas afirmações.

Então, Máterum estava certo... — reflito, a verdade golpeia com força, dissolvendo as ilusões que eu havia alimentado.

Lembro-me das palavras de Máterum, cuja autoridade era inquestionável em tempos passados, descrevendo a biosfera de Gáudium como um lugar de condições extremas, mais inóspitas do que Arcríris. No entanto, quando cheguei a Gáudium com Zulfiqar, encontrei mundo que desmentia as histórias ameaçadoras de Máterum. Tinha visto um planeta pacífico. E as palavras de Máterum, que eu julguei serem exageradas ou mesmo falsas, revela-se como verdade no caos de Kedrano.

A revelação de Bergarian agita minha mente, e rapidamente reformulo minha pergunta em busca de mais respostas. — O que aconteceu com o resto de Gáudium. — Minha mente gira com possibilidades, tentando imaginar o que poderia ter transformado um planeta inteiro.

Bergarian, cuja presença imprevisível me deixa em constante estado de alerta, me encara com intensidade que me faz estremecer por um instante. Há algo em seu olhar que sugere uma capacidade de violência latente, um perigo sempre presente. No entanto, quando ele fala, sua voz é surpreendentemente calma, um sereno contraponto à ameaça implícita de seu olhar. — A deusa de olhos magenta — ele revela. — Ela mudou tudo.

Antes que eu possa processar completamente essa informação ou formular outra pergunta, Bergarian se vira, sua figura desaparecendo de volta na escuridão da caverna.

— Espere! Para onde você está indo? Quem é essa deusa? O que ela fez? Bergarian — Chamo atrás dele, minha voz ecoando contra as paredes de pedra.

Mas ele não responde. Deixando-me com sensação de estar sendo deixado para trás, sem escolha a não ser segui-lo. — Quem é essa deusa de olhos magenta? E como ela mudou Gáudium? — Questiono-me.

Ao chegarmos a interseção labiríntica, Bergarian para e se vira para me encarar. Seus olhos cravam-se em mim, inescrutáveis e profundos. — Siga por este caminho — ele instrui com voz grave. — Lá encontrará seu retorno para Jaskínia.

— Não vai vir comigo? — Inquiro, confuso.

Ele responde com palavra seca, — Não — enquanto dá um passo em minha direção. Sua aproximação é ameaçadora, uma sombra que se projeta sobre mim. — Não conte a ninguém sobre mim — ele adverte, sua voz tão indiferente quanto seu olhar intenso. A intimidação física que emana dele é contraditória com o aparente desinteresse em sua voz.

— Não vejo benefícios em contar — respondo, tentando manter a compostura apesar da crescente tensão.

Bergarian mantém sua expressão inalterada. Então se vira, afastando-se de mim, partindo sem mais palavras.

— Espera! — Eu chamo, — Quem é essa deusa de olhos magenta? — Mas Bergarian continua a se afastar em silêncio.

Quando sua silhueta não é mais vista, um eco percorre da escuridão aos meus ouvidos. — Logo você saberá — ouço sua voz distante sussurrar, um segredo carregado pelo vento. Essas palavras se fixam em minha mente, repetindo-se como um mantra enigmático enquanto faço meu caminho de volta a Jaskínia.

ATO VI

Ao alcançar o final do corredor, sou recebido pela luz deslumbrante do dia, e por breve momento, sua intensidade me ofusca, forçando-me a piscar até meus olhos se acostumarem com a abrupta mudança do escuro para o claro.

Ao momento que minha visão se aclara, percebo que estou no limite de um precipício. A altura é impressionante, quase irreal. O solo parece estar a uma distância infinita, um abismo que se estende até o confim da minha visão.

Aproximo-me da borda, olhando para baixo, sem hesitação, minha mente avaliando calmamente a situação. A altura não me intimida; pelo contrário, oferece uma perspectiva única e uma sensação de liberdade que poucos podem apreciar. Um deslumbramento me preenche ao encarar a vastidão que se abre diante de mim. O vento sopra com força, fazendo meu cabelo dançar ao seu redor, e sinto o gosto da liberdade misturado com o perigo.

— O que eu faço agora? — murmuro para mim mesmo, a voz quase engolida pelo eco do vento. A única opção que me resta é uma descida arriscada pela face da montanha. Uma tarefa perigosa, mas necessária.

Respiro fundo e examino a rocha à minha frente com olhar analítico e, preparo-me para a longa descida.

Sento-me na beirada do precipício, com minhas pernas balançando no vazio,  dou-me ao luxo de um momento para apreciar a vista expansiva antes de me concentrar na tarefa à frente.

Olho para trás uma última vez e, com cuidado para não perder o equilíbrio, viro-me. Apoio minhas mãos firmemente no solo duro da montanha, sentindo seu grão irregular sob meus dedos. Com a perna estendida para trás, busco com o pé saliência na rocha que possa servir de apoio.

Localizo a saliência próxima com o pé, e testo sua firmeza antes de transferir meu peso para ela.  Meu corpo se move com cuidado, e minha respiração se torna rítmica, acompanhando cada pequeno avanço.

Início a descida sem pressa. A descida é para mim um exercício de habilidade e estratégia, onde avalio cada nova pegada e cada novo ponto de apoio com olhar crítico. A altitude elevada é apenas mais um elemento da paisagem, fator que acrescenta ao desafio, mas que não afeta meu equilíbrio nem minha determinação.

Enquanto desço lentamente a montanha, a questão sobre a deusa de olhos magenta persiste em minha mente, como uma sombra pairando sobre cada passo cauteloso que dou. — Quem é ela? Como ela alterou a paisagem de Gáudium? Que poder de criação ela possui para transformar um planeta inteiro?  — Essas questões ecoam em minha mente, criando labirinto de incertezas. — Ela é uma entidade cuja influência parece transcendente. Com sua ajuda, talvez possamos ganhar essa guerra — reflito.

A imagem de seus olhos magenta, embora nunca vista por mim, parece arder em minha imaginação. Há algo sobre ela, aura de mistério e poder, que me faz hesitar. — Por que ela mudou Gáudium? Qual é o seu objetivo com isso? Será que ela já é uma aliada de Máterum? — No momento em que essa última dúvida me atinge, sinto tremor involuntário percorrer meu corpo, uma reação física à angústia da incerteza.

Paro momentaneamente, agarrando-me a saliência na rocha, enquanto a gravidade dessa possibilidade pesa sobre mim.

Meu coração bate mais rápido, não pelo esforço físico da escalada, mas pela ansiedade que essa pergunta traz. Meus dedos, firmemente ancorados nas irregularidades da pedra, apertam involuntariamente, como se tentassem encontrar alguma certeza no sólido abraço da montanha. A ideia de enfrentar uma força desconhecida e potencialmente alinhada com meu pai injeta uma dose de adrenalina em minhas veias.

Respiro fundo, afastando o nervosismo que ameaça desequilibrar minha concentração e, levanto o olhar para o caminho à minha frente, buscando retomar o foco.

Com novo senso de urgência, continuo minha descida.

Conforme desço, a imagem de Bergarian insiste em se infiltrar em meus pensamentos, tão persistente quanto as sombras que se alongam com o entardecer.

— Bergarian. — Murmuro para mim mesmo, minha voz quase se perdendo no sussurro do vento.

Lembro-me de seu comportamento, sua força silenciosa e, acima de tudo, seu aviso final: "Não conte a ninguém sobre mim". — Há algo em sua presença que sugere que ele está profundamente enraizado nos acontecimentos de Gáudium. Ele é mais do que aparenta, deus solitário ou estrategista no jogo do destino? — Enquanto pondero, meu movimento hesita por um instante, meu pé buscando apoio seguro na rocha abaixo.

Diante da advertência final de Bergarian sobre se manter oculto ao mundo, sinto-me envolto em dilema. Por um lado, a natureza secreta de Bergarian e sua insistência em manter-se oculto levantam inúmeras questões sobre suas intenções e o papel que desempenha no caos de Gáudium. — Há mistério em torno dele que me parece crucial, talvez até perigoso, e questiono-me se ocultar sua existência de Zulfiqar é uma precaução necessária. — A ideia me assalta enquanto encontro novo ponto de apoio na rocha.

O vento sopra mais forte, como se tentasse arrancar de mim as dúvidas e incertezas. Minha testa se franze em concentração, e eu pauso por um momento, olhando para o vazio abaixo, refletindo sobre as consequências de cada possível escolha.

Retomo minha descida, movido por resolução ainda incerta, dilema que oscila em minha mente como onda magnética desorientada. Com cada apoio calculado na rocha, sinto a necessidade de equilibrar minhas escolhas com a mesma precisão e cautela.

Por outro lado, ao manter Bergarian em segredo, carrego o peso dessa decisão sozinho. — A sugestão me atinge junto com rajada de vento, fazendo-me vacilar em meu avanço cuidadoso.

Zulfiqar, apesar de todas as nossas recentes divergências e do véu de desesperança que o envolve, permanece como aliado crucial e seu conhecimento e entendimento podem ser fundamentais. — Não revelar a existência de Bergarian a ele pode significar negar peça chave que elucidaria os mistérios de Gáudium e o paradeiro da deusa de olhos magenta — suponho, ponderando que as implicações dessa omissão possa ser visto como traição.

Não quero ser como Zulfiqar — Afirmo, com uma convicção que soa mais alta que qualquer montanha.

Ao expressar essa negação, balanço a cabeça levemente, gesto inconsciente que quase me custa caro. Meu pé escorrega por um momento, perdendo o apoio seguro que havia encontrado. O coração salta em minha garganta, uma onda de adrenalina me inundando enquanto meu corpo reage instintivamente.

Por um triz, evito queda que poderia ser fatal. Meus dedos encontram nova saliência na rocha, agarrando-se com força desesperada.

Respiro fundo, sentindo a batida acelerada do meu coração e o suor frio que se forma em minha testa. Essa pequena falha serve como lembrete da importância do foco e da presença no momento. Cada passo que dou, cada decisão que tomo, não deve ser apenas uma reação instintiva, mas uma escolha ponderada e intencional, que deseje eu ou não terá suas consequências.

Concentro-me intensamente em cada movimento, sentindo a textura da rocha sob meus dedos, a firmeza de cada apoio para meus pés. Essa atenção meticulosa se estende aos meandros dos meus pensamentos, cada passo um reflexo da ponderação interna que me consome.

As palavras de Bergarian, "Logo você saberá", ressoam em minha mente com clareza cristalina. Elas se misturam com o som da minha respiração e o ocasional deslizar de pequenas pedras deslocadas pelos meus movimentos. Essa frase promissora, sugerindo que talvez haja um momento mais adequado para todas as revelações. — Manter Bergarian como segredo por agora pode ser uma estratégia para proteger tanto a Zulfiqar quanto a mim mesmo de um perigo ainda desconhecido — penso, enquanto ajusto minha pegada em saliência mais estável.

 A descida, embora fisicamente exigente, torna-se quase secundária diante das cogitações que me ocupam. Sinto o cansaço se acumulando em meus músculos, no entanto, é um cansaço que também traz clareza, forçando-me a manter foco que transcende o físico.

Além disso, pressentimento, ou intuição oculta, surge dentro de mim, um guia silencioso sugerindo cautela. Essa sensação, essa voz interna, me diz que as informações que possuo são delicadas, potencialmente perigosas, e devem ser manejadas com cuidado. Sinto essa intuição como uma corrente subterrânea, influenciando cada decisão que tomo, cada passo que dou na descida.

Com a resolução formando-se firmemente em minha mente, decido manter as recentes descobertas em segredo de Zulfiqar, ao menos por ora. À medida que faço essa escolha, paro momentaneamente minha descida. Minhas mãos seguram firmemente saliência na rocha, sentindo a aspereza sob meus dedos, enquanto pondero sobre as consequências dessa decisão.

Observo o terreno abaixo, respirando fundo. — Ele já está abalado pela desesperança e pelo peso da nossa situação atual. — Reflito, meu olhar perdido na vastidão que se estende abaixo de mim. A ideia de compartilhar as novidades sobre a deusa desconhecida potencialmente poderosa e suas possíveis implicações me deixa preocupado. Imagino Zulfiqar, já carregando tanto fardo, e como essa informação poderia afetá-lo.

Visualizo a possibilidade dessa revelação o desestabilizar ainda mais, talvez até desencadear nele curiosidade imprudente ou desejo desesperado de encontrar solução rápida para nossos problemas. Essa preocupação se reflete em meu semblante, uma expressão de seriedade e cuidado tomando conta do meu rosto.

Não, não posso arriscar. Pelo menos não até entendermos mais. — Declaro para mim mesmo. Há um peso em meu coração ao tomar essa decisão, uma responsabilidade que escolho carregar sozinho por enquanto.

Pausando a descida novamente por um momento, olho para baixo e me surpreendo ao perceber o quanto já me aproximei do solo. A distância que parecia tão grande no início agora está quase vencida.

Tomando fôlego, sinto a brisa fresca passar por mim, trazendo sensação de clareza à minha mente exausta. Preparo-me para enfrentar os últimos metros da descida que me separam do solo.

Mas uma coisa é certa: a existência dessa deusa muda tudo, e precisamos estar preparados para o que isso significa para nós — As palavras saem de mim com decisão convicta. Obstinado a encontrar a deusa de olhos magenta e torná-la nossa aliada antes de Máterum, meus dedos encontram apoio mais frágil na rocha, simbolizando o terreno incerto dessa aliança.

Agora perto o suficiente do solo, minhas mãos soltam a montanha, confiando na habilidade do meu corpo para me guiar na queda controlada que se segue. — E se for uma inimiga... — O pensamento surge involuntariamente, uma preocupação latente que paira em minha mente enquanto meu corpo desce em direção ao chão, clamando para que não seja.

O ar se agita ao meu redor, e por um momento, sinto a gravidade do que essas palavras significam. — Terá que ser eliminada — concluo com peso no coração, sabendo que tal decisão poderia ter consequências imensuráveis.

Meus pés tocam o solo com firmeza. Fico de pé, sentindo a solidez da terra sob mim, sensação de retorno e de realidade que me traz de volta ao presente.

Olho ao redor, absorvendo a vastidão do cenário que me cerca, ciente de que cada passo a partir de agora carrega com ele o peso das minhas decisões e das revelações vindouras.

No silêncio que se segue, existe apenas o som da minha respiração, profunda e ritmada, e o sussurro suave do vento, criando harmonia serena que envolve todo o espaço ao meu redor.

Permaneço imóvel por um instante, permitindo-me absorver a quietude do momento, uma pausa necessária para reunir meus pensamentos e forças.

Levanto meu olhar para a montanha, gigante imponente que acabei de desafiar e, com suspiro, viro-me, direcionando minha atenção para o caminho de volta ao ponto de encontro com Zulfiqar, pronto para enfrentar o que vier.

Begarian

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