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Frosarla - Parte I

ATO I (Zilevo)

A neve cobre o local como manto espesso e implacável, sinto cada floco gelado como uma lâmina contra minha pele. A cada minuto nesse local, minha respiração se torna cada vez mais fraca, os passos pesados e arrastados em direção a Frosarla. Da minha boca seca e congelada saindo somente a fumaça glacial, que se dissipa rapidamente no ar cortante.

Quanto mais próximo do objetivo, mais meu corpo parece se transformar em gelo puro.

Estou à procura da árvore primordial, mas meus olhos, já quase cegos pela forte nevasca que enfrento no caminho, só conseguem discernir o branco imaculado da neve.

Acho melhor voltar, não estou aguentando mais este frio — penso, sentindo a dor aguda do frio morde minha pele.

Indeciso, pondero se volto para meus irmãos ou se continuo à procura da possível existência da árvore forla. Até ouvir alto rugido, semelhante ao que escutei após ter me livrado da nevasca.

— GRRR-OU!

Desta vez, o som é mais alto e claramente mais próximo, como se a fonte do rugido estivesse ao meu lado. No entanto, meus olhos, embaçados e lacrimejantes pelo vento gelado, não observam nada de hostil no aberto campo de neve.

— GRRR-OU!! — O rugido se repete. Cada vez mais perto.

Não é o som estrondoso e penetrante que me assusta, mas sim o seu tom familiar, que ressoa em minha mente como eco distante.

Será que realmente é ele? — reflito, inundado por desesperada esperança. — HÓNKER! — grito, esquecendo os conselhos de Tanri. — SOU EU! ZILEVO! APAREÇA! NÃO TE MACHUCAREI!

— GRRR-OU!!!

O rugido dessa vez vindo do alto, como se estivesse reverberando sobre minha cabeça.

— HÓNKER! SOU EU...

Surpreendido por monstro humanoide assustadoramente grande que se ergue da neve como uma tempestade viva, socando meu torso com uma força brutal, arremessando-me para longe. Rolo severamente na neve, sentindo cada partícula gelada cortar minha pele enquanto sou enterrado sob o manto branco.

— Ow! O que um monstro desse faz fora de Salacrum?! — exclamo em minha mente, levantando-me aos poucos do chão, tirando a neve grudada em meu rosto, como areia molhada.

Analisando a criatura, percebo sua envergadura colossal, com quase o dobro do tamanho de Córpulus. Sua presença é quase sobrenatural, como se fosse uma manifestação do próprio inverno. A criatura veste armadura amarronzada que parece forjada a partir do próprio gelo, revestida por cristais de gelo que cintilam nos ombros, joelhos e costas, como estalactites pendendo de uma caverna gelada. Seu rosto é protegido por imponente elmo com dois chifres quebrados que sugerem batalhas anteriores, e através das aberturas do elmo, posso ver apenas seus olhos verde-escuro...

Esses olhos! Eu...

— GRRR-OU! — Ruge a colossal criatura, interrompendo-me com rugido tão ressonante que posso sentir em meus ossos.

Com agilidade surpreendente para seu tamanho ela corre em minha direção, saltando velozmente contra mim, mas com astúcia, esquivo, desembainho minha adaga rapidamente e a cravo no peitoral da criatura, escalando-a e perfurando sua carapaça.

Ela se golpeia furiosamente no peito na tentativa desesperada de me derrubar, mas retiro a adaga e me desprendo da criatura antes que seus golpes possam me atingir.

— HÓNKER, SOU EU! — exclamo, reconhecendo os olhos de esmeralda da criatura, levantando-me com os braços abertos, expondo-me de forma indefesa, torcendo para que Hónker se lembre de mim.

Ele me observa em silêncio, sem atacar, como se estivesse processando minhas palavras.

— SOU EU, IMORTAL. ZILEVO — insisto.

            Ao ameaçar me aproximar da criatura, sou agarrado por sua gigantesca mão, que me aperta com força, esmagando-me como papel. Sinto o ar sendo expulso dos meus pulmões, a dor aguda em cada costela.

Sem escolha, finco a adaga na manopla da criatura, rugindo de dor e me soltando.

— Não quero te machucar, Hónker — anuncio, enquanto desvio habilidosamente da investida furiosa de seu corpo maciço.

Agilmente, salto em seu pé e começo a perfurá-lo repetidas vezes.  Ele tenta me socar, mas me movo com rapidez, pulando por cima de sua agigantada mão e usando-a como apoio para impulsionar-me até seu abdômen, onde cravo a adaga profundamente, levando a besta ao chão.

Fico em pé sobre o abdômen da colossal criatura e, com um movimento firme e decidido, cravo a adaga em seu peito.

— GRRR! — ela grita de dor, debatendo-se furiosamente para tirar-me de cima de si, mas me seguro rapidamente na adaga cravada.

Levantando-se furiosa, a criatura se joga com o peito no chão, tentando me desalojar, mas velozmente salto para longe no último instante, e me escondendo na neve.

— Grrr-ou! — ruge a criatura, com seus olhos vasculhando o branco ao redor.

— Tenho que arrumar alguma forma de derrotá-lo. — penso, arrastando-me furtivamente pela neve, evitando ser detectado.

— Grrr-ou!! — ela ruge intensamente, golpeando aleatoriamente a neve à sua volta.

Aproveitando o momento, salto ferozmente da neve em direção à criatura e enterro a adaga violentamente em suas costas, levando-a ao chão.

— HÓNKER! SOU EU! — grito, desesperado para que ela me reconheça.

— Grrr... — ela murmura, quase num sussurro.

Então, misteriosa voz surge inopinadamente do horizonte esbranquiçado.

— Sai de cima dele! — demanda a voz.

Direcionando os olhos à voz, contemplo uma figura que destaca contra o branco da neve. Sua pele é parda, contrastando com seus olhos verde-escuros. Seu corpo é magro, quase etéreo, com cabelos pretos e curtos que dançam ao sabor do vento gelado.

— Quem é você? — pergunto, minha voz tingida de cautela enquanto me aproximo.

Observo seu corpo esguio e o rosto esquelético, marcado e severo, com olhos que parecem espelhar a tempestade em curso.

— Não é da sua conta, filho de Máterum — ele responde, sua voz tão fria quanto o ambiente ao nosso redor.

Subitamente, sou atingido pela mão da criatura, que me arremessa rudemente na neve.

— Não se esforce, Hónker! — Exclama o deus à criatura.

Hónker? Sabia... Arf! Sabia que era você! — digo enquanto me levanto. — Por que não se lembra de mim? Eu não sou seu inimigo Hónker — desabafo em meus pensamentos.

Antes que possa reagir, o deus se move com uma velocidade surpreendente, socando meu abdômen e, em movimento fluido, arrebatando minha adaga e a lançando para longe.

— Não se preocupe, Hónker, ele não te ferirá de novo — assegura o deus, seus olhos nunca deixando a criatura.

Investindo contra mim, desvio dos socos com movimentos precisos, revidando com forte chute no abdômen dele. O deus, porém, mostra-se mais ágil, pulando para trás e retornando com soco direcionado à minha barriga. Bloqueio o golpe com as duas mãos, empurrando seu pulso para baixo e, com movimento ligeiro, acerto o peito do deus com a palma da mão.

— Jamais feriria Hónker — afirmo, me afastando do deus e, por acaso, esbarrando na adaga caída na neve.

— Mentira! Se não tivesse aparecido, teria matado ele... — ele alega, caindo ofegante de joelhos, a mão pressionada contra o peito como se tentasse conter uma dor profunda.

Colocando a mão no peito, o deus se levanta cambaleante, cada movimento claramente lhe custando muito. Ele avança em minha direção, os olhos fixos nos meus.

Reajo rapidamente, agachando-me para pegar minha adaga, que brilha friamente na neve, e com rapidez perfuro a barriga do deus. Ele cai indelicadamente sobre mim, um gemido de dor escapando de seus lábios.

Com cuidado, mas firmemente, coloco-o deitado na neve, a adaga ainda cravada em sua barriga, o sangue vermelho-vivo contrastando de forma chocante com o branco puro ao nosso redor.

— Desculpa-me, mas me obrigou a isso — digo, me afastando ao ver Hónker se aproximando. — Hónker, lembre-se de mim — comando, olhando profundamente nos olhos da colossal criatura, buscando algum sinal de reconhecimento, algum vestígio do vínculo que tínhamos.

— Raw! — ele ruge, um som profundo e doloroso que reverbera no ar gelado.

Com gentileza que contrasta com seu tamanho e aparência feroz, Hónker pega o deus ferido e o coloca no colo com cuidado quase paternal. Ele vira as costas para mim, cada passo que dá levando consigo uma parte de meu coração que pensei ter reencontrado, porém perdendo outra vez pela crueldade do destino.

Abandonar? Eu nunca te abandonaria, Hónker! — declaro, minha voz carregada de desespero e amor, enquanto observo a figura deles se distanciando na vastidão branca e implacável que nos envolve.

— Hónker... espera! — comanda o deus ferido, sua voz fraca mas impregnada de autoridade, fazendo Hónker virar-se novamente para mim. — Se ama tanto Hónker, por que não o procurou após ter se libertado de Salacrum? — ele pergunta, gemendo com a adaga roçando em sua carne.

— Do que está falando? Nem sabia que Hónker estava vivo — relato, me aproximando cautelosamente, cada passo ressoando com a incerteza que suas palavras semeiam em mim.

— Solta-me, Hónker! — solicita o deus, sua voz um sussurro que, de alguma forma, carrega um peso imenso.

Ele se levanta com dificuldade, retirando a adaga do abdômen com expressão de dor contida.

— Se tinha tanta certeza da morte, por que o chamou de Hónker antes de saber que ele estava vivo? — ele questiona, cambaleando em minha direção, seu abdômen ensanguentado pintando a neve por onde caminha de vermelho profundo e sombrio. — Vai me dizer que foi apenas por causa dos olhos? — Questiona, caindo bruscamente com a cara na neve, levantando a mão com a adaga, um gesto silencioso pedindo para que Hónker não se aproxime.

— Meus irmãos me contaram recentemente que Hónker poderia estar vivo e que o encontraria próximo a Frosarla — respondo, minha voz firme, mas os olhos fixos no deus.

— Não acha estranho teus irmãos terem informação tão valiosa quanto essa... — ele murmura, levantando-se custosamente com a adaga na mão, — mas te contarem só agora, depois de uma década de abandono? Não se pergunta sobre mais o que seus irmãos escondem de você? — Movendo-se lentamente até mim. Seus lábios carnudos se apertando em uma linha fina, sinal claro de sua desaprovação.

— Não desejo continuar com esta luta, mas não hesitarei em te matar caso continue — comunico, com o deus parando em minha frente, seus olhos como poços escuros, insondáveis.

— Do mesmo modo que sei seu nome desde o momento em que te vi, Zilevo, também sei das verdades sombrias que seus irmãos omitem de você — ele sussurra, soltando a adaga na neve e apoiando uma das mãos em meu ombro, seu toque frio como a morte.

— Verdades sombrias? — pergunto, não escondendo a curiosidade com tais palavras.

— Você não aparenta ser mal, Zilevo. Poderia ter me matado há muito tempo, mas preferiu me ouvir — reconhece o deus com fraqueza que não se reflete em seus olhos penetrantes.

— Talvez, eu devesse — respondo, a tensão perceptível entre nós.

— Assim, pega a adaga e me mata — desafia o deus, retirando a mão e fechando os olhos, como se estivesse se entregando ao destino. — Sei que não fará isso — sua voz, de repente, ressoa na minha mente, clara e límpida como um lago tranquilo.

— Tem razão, não te matarei — proclamo, colocando a adaga na bainha.

Sem mais o que fazer, apenas observo o deus virar-se e ir em direção de Hónker.

— Espera! Que verdades sombrias são essas que meus irmãos escondem de mim? — interrogo, mas sendo ignorado completamente pelo deus

— Leva-me para casa, Hónker — pede o deus. Suas palavras são frígidas, e ele me trata como se eu fosse mero expectador.

Vê-lo se afastar com Hónker sob seu comando é como um punhal em meu coração. Parte de mim, parte que pensei ter reencontrado neste reencontro amargo, está sendo arrancada e levada embora neste momento. Sinto vazio crescer dentro de mim, frio e implacável como o gelo ao meu redor. É uma solidão que pensei ter deixado sentido apenas com minha despedida de Lésnar, mas aqui está ela, retornando com uma força devastadora.

O deus, então, para por um momento, como se sentisse o peso de minha angústia. Ele se volta lentamente para mim, seus olhos sombrios encontrando os meus com uma intensidade que me faz estremecer.

— Se quiser realmente saber, siga-me e saberá — ele diz, sua voz calma, mas carregada de um aviso implícito.

Vida de luz, escondida em obscuridade. Caverna sombria de pequenas partes iluminadas nas quais decide por ficar. Não se permitindo explorar. Não conhecendo seu lar. Não escutando as verdades sombrias que o farão avançar.

 

ATO II

— Estou curioso com tal história — respondo, esfregando celeremente as mãos, cuja pele se arrepia à medida que o frio intensifica. Meus olhos fixos no deus, ansioso por saber como Hónker sobreviveu.

O ambiente ao nosso redor é desolador, vasto manto de neve branca sob céu cinzento e implacável. O vento uiva, carregando consigo cristais de gelo que picam a pele como agulhas.

— Há nove anos, o poderoso Máterum veio subitamente me visitar, em sua companhia trouxe você e uma deusa — o deus conta, sua voz serena rivalizando com o ambiente hostil.

— Eu!? — exclamo, a surpresa fazendo minha voz tremer tanto quanto meu corpo.

— Sim — ele atesta, calmamente. — Seu pai estava bastante receoso, proclamando que estava atrás da árvore Forla e de que precisava urgentemente dela, senão perderia seu coração e sua pequena.

Pequena!?  Espera — interrompo-o com inquietação fervendo em minha mente. — A deusa de que fala possuía olhos escuros e cabelos ruivos?

— Exatamente — responde com leve fraquejar na voz. — No início, não entendia suas palavras. Mas logo, interpretei que era assim que ele os chamava. Ainda assim, não captava seu impreciso objetivo. Naquela época, desconhecia o tal nome Forla, reconhecendo após Máterum contar sua ímpar fisionomia de madeira púrpura e folhas escuras.

Ele pausa a fala e pede para que Hónker o deixe seguir o caminho por si só, aparentando estar melhor desde a última vez que caminhou sem ajuda, mostrando que a dor do ferimento se amenizou em prol do frio que estancou pequena parte do sangramento.

— Após me contar a fisionomia de Forla, o guiei até a árvore no centro de Frosarla. Foi neste momento que Máterum mostrou enfim seu excepcional poder. Adentramos em Frosarla sem único problema; o frio, por mais cruel que fosse, nem nos afetou — continua com admiração. — Isso criou forte dúvidas nos meus pensamentos. Por que o Primordial, o ser mais poderoso existente, pedira minha ajuda; mero deus de Vosmártica, ao invés de ele mesmo simplesmente criar nova árvore Forla? — questiona.

— Resuma, por favor, estou ainda confuso de como poderia está aqui em Vosmártica com Máterum e Lésnar, se há nove anos foi o ano que eu e meus irmãos nos libertamos de Salacrum  — imploro, a ansiedade tornando minhas palavras quase um sussurro.

— Temos bastante tempo até chegarmos à minha casa; até lá, tudo será esclarecido. Então, escute primeiro! — ele ordena. — Quando retornamos de Frosarla com as Peben da árvore Forla, lembro-me especificamente do murmúrio dito por Máterum:

“Coração doente. Contaminado pela repugnante praga do ódio. Exterminando todo divino sentimento do amor. Torturando-o com os remanescentes bons momentos amorosos que sobrara”

— E o que isso significa?

— Ainda não entendo o significado de suas palavras — ele admite, e enquanto fala, gota de sangue escapa de seu nariz, um vermelho vivo contra a palidez de sua pele. — Entendo como se tivesse me dito que se sentia doente, pois depois de seu murmúrio, anunciou que não era mais tão poderoso quanto fora séculos atrás, experenciando seu poder de criação diminuir com o passar das décadas — ele continua, limpando o sangue.

Então Máterum não é mais poderoso quanto fora — reflito, afundando um dos pés na neve profunda e cristalina que cobre o solo. Sinto o frio morder através de minhas pernas, mas é a revelação que realmente faz meu coração gelar.

— Toma cuidado por onde pisa — o deus adverte. — Estamos perto de Frosarla; nosso pior inimigo aqui é o ambiente.

Ele se aproxima, estendendo a mão para me ajudar, mas seus olhos permanecem distantes, como se estivessem focados em um passado longínquo.

— Como disse há poucos minutos, essa lembrança ocorreu no mesmo ano de sua fuga de Salacrum, mais especificamente, alguns dias depois — ele retoma, parando de andar e apoiando as mãos em Hónker, como se buscasse forças. — Desculpa! Contarei o resto depois, estou cansado demais para continuar...

— Não! Chega de enrolação! Me fala agora, ou procurarei Forla sem sua ajuda! — exclamo, a frustração fazendo minha voz vibrar no ar gelado. — Percebo a tensão em seus olhos — penso. — Precisa de mim tanto quanto eu de você. Do contrário, jamais seria tão receptivo com um deus estranho que conheceu desmaiado há uma década.

— Arf! Tudo bem! — ele concorda, ofegante, tirando os braços de Hónker e continuando a caminhar. — Durante a jornada com Máterum à Frosarla, Máterum mencionou que, após saber que seus filhos haviam fugido de Salacrum, achou você e Lésnar caídos à beira da morte em uma das celas de Salacrum. Por isso, ele decidiu abandonar Malbork imediatamente e os trouxe a Vosmártica sem hesitar, por julgar que poderia perdê-los — ele revela.

— Não entendo — aviso com memórias guerreando na mente. — Não posso dizer que é mentira, pois não tenho lembranças de como fui capaz de fugir de Salacrum sozinho com Lésnar. Cogitava que alguns de meus irmãos tivessem me resgatado. Por isso nunca pensei em perguntar.

— Uma das verdades sombrias que teus irmãos guardaram de você — ele informa, interrompendo o andar e virando-se para me encarar diretamente. — Hónker, derruba aquelas árvores! Montaremos um pequeno acampamento para passar a noite.

— Mas...

— Não se preocupe — ele me interrompe, suavizando a voz. — Continuarei a história — completa, sentando-se no chão coberto de neve, observando enquanto Hónker cortando árvore próxima. — Máterum, após cuidar de você e Lésnar, ao invés de levá-los de volta a Primárium sabendo que poderiam revoltar-se contra ele, decidiu teletransportá-los a Zaranler, onde estavam seus irmãos.

Portanto, Máterum sabia onde estávamos todo tempo! Se ele sabia onde estávamos, porque demorou nove anos para nos mandar sua mensagem? — questiono, minha voz carregada de incredulidade e desespero, não esperando que o deus tivesse resposta para tal questionamento.

— Não sei! — ele responde. — Porém sei que tanto Máterum quanto você, não queriam dar início a esta guerra.

Enquanto ele fala, seus olhos se desviam de mim e se fixam em algo ao longe. Sigo seu olhar e avisto Hónker, retornando através do manto de neve que cobre o terreno, carregando árvore grandiosa sobre o ombro como se fosse mero galho.

— Francamente, não ansiava por esta guerra. Contudo, agora só a terminarei quando Máterum for morto por minhas mãos! — declaro, com fúria e melancolia gladiando na voz. As recordações de Lésnar me torturam, sabendo que nunca mais a terei de volta.

— Por que tanta raiva do seu progenitor? O que ele fez de tão cruel, além de ter te aprisionado por míseras décadas em Salacrum por um crime que você e seus irmãos consumaram? — o deus interroga, levantando-se indignado.

— Ele matou a deusa que eu mais amava... Sua tão querida pequena! — expresso rigidamente, minha voz tremendo apesar do esforço para mantê-la firme. Sinto meus punhos se fecharem involuntariamente, como se pudessem conter a descomunal mágoa que ameaça transbordar.

Nesse momento, silêncio ensurdecedor se estabelece entre nós.

O deus, percebendo a profundidade da minha dor, volta a se sentar lentamente, seus olhos agora carregados de compreensão tardia e sombria. Ele se cala por alguns segundos.

— Perdão, não tinha ideia — desculpa-se o deus, sua voz agora suavizada pelo pesar.

Solicitando em seguida, com gesto quase imperceptível de sua mão, que Hónker montasse o pequeno acampamento.

— Um ano após sua vinda a Vosmártica, Máterum regressou e trouxe consigo três peculiares deuses e quatro monstros, sendo um deles Hónker. E me pediu que eu cuidasse de suas novas criações.

— Qual era o nome desses deuses? — pergunto, indo ajudar Hónker. Ele me arremessa grande pedaço do tronco, que intercepto com dificuldade.

— Marine, Atênura e Dêbole. Mas não se atenha a isso. O que de fato importa para você é o que Máterum me falou após seu pedido — alega, levantando-se e deitando no pequeno monte de neve deixado por Hónker.

— E seria? — questiono, colocando o pedaço de tronco na neve.

— Máterum me contou que Hónker teve parte das memórias apagadas.

Por isso não se lembra de mim! — exclamo, olhando para Hónker, que me ignora. Sinto pontada aguda no peito cada vez que ele desvia o olhar. — Por que Máterum fez isso?

— Ele me informou que não era capaz de matá-lo, mas também não era capaz de mantê-lo vivo em Salacrum, uma vez que Hónker o lembrava de seus amados filhos. Desse modo, resolveu trazê-lo a mim. Apagando sua memória para que não retornasse em sua busca.

Primeiro aprisiona os filhos, depois mata Lésnar, agora descubro que apagou a memória de Hónker — exponho dentro da caverna escura de meus pensamentos, onde cada palavra ressoa e amplifica a fúria que cresce dentro de mim.

Finalizando o acampamento com Hónker, sinto o frio da noite se intensificar, mas é o gelo em meu peito que realmente me preocupa.

— A noite está agressiva, Zilevo. Amanhã te contarei mais e verá que Máterum nem sempre foi o vilão na história de sua vida — comunica, fechando os olhos antes que o impedisse com perguntas.

De qualquer forma, no fim, a história não importará. Seguirei com a ânsia de afogar Máterum no sangue de todos os deuses que mais ama — reflito, cada palavra impregnada com o veneno do ódio correndo em minhas veias.

         Por que se esforçam tanto com a finalidade de aparentarem estarem felizes, se no fundo estão deveras tristonhos? Atestam que estou doente, conquanto, são eles que adoecem com a suposta e temporária felicidade, que quando se vai deixa somente rastro de angústia e solidão. Deuses simples e bondosos em gaiolas. Deuses cruéis e funestos livres e amados. Este é o infeliz mundo onde vivo. Este é o feliz mundo onde renasço.

 

ATO III

A cabana, à primeira vista, parece uma mera ilusão, uma miragem em meio ao vasto manto branco da neve que cobre a paisagem. Situada em uma clareira, onde a neve parece ter sido delicadamente afastada, como se a natureza tivesse feito reverência à sua presença. As paredes da cabana, feitas de alaúpo tão puro, quase se fundem com o ambiente ao redor. A luz do dia ao passar por ela reflete tons suaves de azul e prata, criando efeito cintilante que lembra o brilho de cristais sob o sol.

A estrutura da cabana é simples, mas sua beleza está na sutileza de sua existência. De longe, pode ser facilmente confundida com uma elevação de neve ou monte de gelo. Todavia, quando próxima, percebe-se a solidez de suas paredes e a firmeza de sua construção. O telhado, ligeiramente inclinado, coberto por fina camada de neve, reflete a luz do céu, tornando-o quase indistinguível do horizonte.

Ao redor da cabana, pequenos montes de neve acumulam-se, formando padrões ondulados que parecem dançar com o sutil sopro do vento. A entrada, porta de madeira rústica, contrasta com a transparência das paredes.

Ao se aproximar, deusa de pele branca e estrambóticos olhos rosa-choque, tão intensos que cintilam, abre a porta da cabana. — O que aconteceu? — Pergunta a deusa.

Observando o deus ferido e desacordado nos braços de Hónker, ela pede que ele me entregue o deus e entre. Hónker, incapaz de entrar na cabana devido à sua estatura colossal, fica ao lado de fora.

Ao entrar, juntos, colocamos o deus na cama.

— Quem é você? — A deusa pergunta, sua atenção voltando-se para o ferimento do deus. Tocando delicadamente a borda da ferida.

— Zilevo — respondo, assistindo-a se movimentar pela cabana, pegando instrumentos e materiais desconhecidos para mim.

— Obrigado por trazê-lo ainda vivo até mim — expressa, com destreza impressionante, amarrando seus longos cabelos castanho-avermelhados. — Meu nome é Atênura — ela se apresenta, ajoelhando-se ao lado do deus com agulha de cristal arcririsiano prateado e folhas de alaúpo nas mãos.

— O que está fazendo? — pergunto, observando-a enfiar a agulha com comprida linha na ferida abdominal do deus.

— Estou suturando o ferimento — ela responde com calma, seus olhos focados no trabalho. Cada movimento que ela faz é preciso, a forma como a agulha desliza pela pele, o fio seguindo um padrão que parece minimizar a cicatrização.

Fico impressionado com sua habilidade e, quando ela termina, limpa o local da sutura com pano embebido em algum líquido. — Isto é o suficiente até Dêbole e Marine retornarem com as Peben.

— Peben? Tenho procurado por elas. Onde posso encontrá-las? — pergunto, a curiosidade evidente em minha voz.

Atênura levanta um dedo, pedindo paciência. — Não precisa se preocupar com isso agora. Meus irmãos estão trazendo as Peben de Frosarla. E, como agradecimento por ter ajudado Xâmobe, compartilharemos algumas contigo.

Antes que pudesse agradecer, chilro melodioso preenche o ar, desviando minha atenção.

Pequena criatura alada de penas albinas e olhos magenta pousa graciosamente no dedo estendido de Atênura.

— Que criatura fascinante é essa? — pergunto, encantado com sua beleza delicada.

Com olhar sereno, Atênura responde: — Este é Birxyno. — Ela acaricia suavemente a cabeça da criatura, que fecha os olhos em contentamento. —Ainda bem que está em forma de canário — fala estranhamente, não mexendo os lábios.

Franzo a testa, confuso. — Canário? — interrogo, não entendendo o que significava.

— Hm? Aaah! Sim! Birxyno é o nome do meu canário — responde sorridente. — Pela sua reação imagino que você não esteja familiarizado com isso.

Antes que processe a informação, Birxyno voa em minha direção, pousando suavemente em meu ombro. Sinto sensação agradável quando ele roça sua miúda cabeça contra minha bochecha.

Atênura observa a cena com expressão de leve surpresa, seus olhos se estreitando um pouco. — Isso é raro. Além de mim, Birxyno nunca é tão afetuoso. — revela, e o mais surpreendente é que, novamente, seus lábios não se movem ao dizer isso.

— Como faz isso? — interrogo, sentindo uma estranha sensação, como se sua voz estivesse ecoando diretamente em minha mente, sem passar pelos meus ouvidos.

Ela inclina a cabeça levemente, parecendo genuinamente confusa. — Como faço o quê?

Estou prestes a questionar sobre sua habilidade incomum quando, de repente, seus olhos se fecham lentamente e sua respiração se torna mais profunda. Uma energia diferente, algo que nunca senti antes, emana dela.

— O que você está fazendo? — questiono, minha curiosidade aguçada.

Ela abre os olhos, e expressão de acusação toma conta de seu rosto. — Foi você que o feriu! — Ela exclama, e antes que eu possa reagir, retira pequena faca de sua bolsa. A lâmina de cristal arcririsiano prateado brilha sob a luz, e ela avança rapidamente em minha direção.

A surpresa me paralisa por um momento, mas logo reajo, agarrando seus pulsos com firmeza e evitando que a lâmina me atinja. Nossos olhos se encontram, e vejo raiva e confusão nos dela.

— O que você está fazendo?! — questiono, usando minha força para imobilizá-la. Com um movimento rápido, pressiono seu rosto contra o chão e arremesso a faca para longe, garantindo que ela não possa alcançá-la.

Ela luta brevemente, mas logo se acalma sob meu aperto. Percebendo sua expressão se acalmando, decido soltá-la. Ela se levanta lentamente, mas ainda com expressão defensiva.

— Como você soube disso tão de repente? — pergunto, ainda tentando entender sua súbita agressão.

Sem aviso, Atênura com agilidade surpreendente, desfere um soco em minha direção. Rapidamente, desvio e, aproveitando seu movimento, a derrubo no chão, imobilizando-a com meu pé em seu ombro.

Ela respira com dificuldade, mas depois de um lento piscar de olhos, sua expressão se acalma. — Espera! Me desculpe... — ela diz, a voz trêmula. — Agora entendo que Xâmobe te trouxe aqui por vontade própria.

Ainda segurando-a firmemente, tento processar tudo o que acabou de acontecer. — O que está acontecendo? — penso, sentindo-me extremamente confuso com todas as maluquices repentinas.

— Me solta! — Atênura exclama, sua voz carregada de frustração. — Não atacarei mais.

Solto-a lentamente, mantendo olhar cauteloso. — Se tentar algo assim novamente, não hesitarei em te imobilizar de vez. — aviso.

Ela suspira, passando a mão pelos cabelos. — Xâmobe provavelmente não mencionou, mas tenho o dom de ver o passado.

Arqueio uma sobrancelha, intrigado com a repentina revelação. — Isso é um poder incrível! Como isso funciona? Você pode ver qualquer momento do passado?

Ela balança a cabeça suavemente. — Não exatamente. Posso ver fragmentos do passado, mas não escolho quais momentos ver. Eles vêm até mim, geralmente os mais emocionalmente carregados ou significativos.

Pondero por um momento. — E como veio a ter esse poder?

Ela puxa duas cadeiras de madeira, sentando-se em uma e indicando para que eu ocupe a outra. — Não foi algo que adquiri. Nasci com ele. Quando Máterum nos encontrou, ele profetizou que eu e meus irmãos seríamos sublimes deuses de proezas lendárias. — Ela diz isso com tom distante, como se as palavras de Máterum não tivessem grande valor para ela.

Sento-me, ponderando sobre suas palavras. — Espero que essas “proezas lendárias” não sejam em nome de Máterum. — murmuro mais para mim mesmo.

Atênura suspira, parecendo se perder em memórias distantes. — No início, era difícil controlar. Eu era constantemente bombardeada com visões do passado, muitas vezes de momentos dolorosos ou traumáticos. Mas com o tempo, aprendi a controlar melhor minha habilidade.

— E há limitações? — indago, tentando entender completamente seu dom.

— Sim — ela confirma. — Como disse, não posso escolher os momentos que vejo. E também há um limite para o quão longe no passado posso ver. Além disso, ver o passado é fisicamente e emocionalmente desgastante. Não posso fazer isso com muita frequência ou por muito tempo.

— Ainda assim, por que você? Por que nasceu com esse dom tão único?

— Máterum falara que...

Atênura está prestes a responder quando a porta da cabana se abre abruptamente, revelando deusa de pele alva e olhos turquesa. A semelhança fisionômica com Lésnar é tão impressionante que por um momento, meu coração dispara, e sinto nó na garganta.

— Quem é você? — a deusa pergunta, sua voz carregada de surpresa enquanto fecha a porta atrás de si.

— Zilevo — respondo, minha voz um pouco trêmula. — Cada detalhe dela, desde a curva de seus lábios até a postura, me faz lembrar de Lésnar. É como se estivesse vendo um reflexo dela. — reflito.

— O que aconteceu com Xâmobe? — ela questiona, claramente preocupada, seu olhar voltando-se rapidamente para o deus ferido.

Atênura, percebendo a urgência da situação, intervém. — Explicaremos mais tarde. Agora, você trouxe alguma das Peben?

— Não conseguimos... — a deusa começa, mas minha mente está em outro lugar.

Não consigo tirar os olhos dos lábios dela, tão parecidos com os de Lésnar. Uma onda de nostalgia e desejo me atinge. — Ela é tão parecida com você, Lésnar — penso, quase perdido em memórias, enquanto observo a deusa se acomodar na cama de Xâmobe.

Uma lembrança repentina me invade, transportando-me para aposento diferente, iluminado por suave luz dourada. Lésnar está lá.

Marine

Atênura

Xâmobe

Hónker

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