Alvorada: O refinamento da floresta - Parte I
ATO I (Críngu)
Observo o campo esverdeado à minha frente, onde a grama macia se estende como um manto sob meus pés. O ar está impregnado com o doce aroma das rosas e orquídeas que florescem por todo lado, suas fragrâncias encantadoras me envolvem, transportando-me para um mundo de tranquilidade e beleza natural. O vento suave, ao soprar, carrega consigo o sussurro das folhas das árvores próximas, orquestrando uma sinfonia natural que acalma a alma.
Bucu, erguendo-se do gramado, fixa seus olhos esmeralda, brilhantes e penetrantes, em mim. Sua pele de tonalidade oliveira, marcada pela exposição ao sol e ao vento, é o perfeito contraponto para seus traços fortes e bem definidos. O queixo proeminente e os lábios finos e firmes dão a ele um ar de seriedade.
Seus cabelos negros, caem em camadas desordenadas sobre a testa, enquadrando uma expressão que raramente revela o que esconde por trás de seu olhar afiado. Seu corpo, embora coberto por uma armadura leve, deixa entrever um porte esbelto mas firme. Ele é uma silhueta de potência tranquila, cuja presença é tão sólida quanto o chão que pisa.
— Quer mesmo lutar contra mim e Gálidus sozinho? — Ele pergunta. Sua sobrancelha erguida em um arco perfeito adiciona uma camada de curiosidade à sua expressão já intensa.
Ele veste uma armadura que é uma extensão de sua ligação com a natureza; suas placas verdes imitam a robustez e a cor das folhas frescas, realçadas por veios marrons que se entrelaçam como cipós selvagens ao longo de seu tronco e braços. Os ombros são adornados com um emaranhado de folhagem viva, dando a impressão de que a própria floresta forjou essa proteção para ele. As luvas são robustas e terminam em seus dedos livres, permitindo que a destreza de suas mãos seja mantida sem sacrificar a defesa. Elegante e formidável, a armadura equilibra a leveza do crescimento natural com a necessidade de proteção na batalha.
— Não se preocupem comigo — respondo, permitindo que um sorriso confiante ilumine meu rosto. — Estou aqui para prepará-los para a guerra iminente. Até lá, o foco de vocês devem ser total no treinamento. — Minha voz carrega um tom de seriedade, consciente da gravidade da tarefa que assumi. — Como não pude acompanhar Ózis a Arcríris e Zulfiqar está ocupado, cabe a mim treiná-los.
Enfrentar dois deuses sozinho seria uma façanha arriscada para muitos, mas Críngu, não é um deus comum. Seus dias intensos em Salacrum, onde cada treino moldou seu corpo e espírito, forjou uma resistência e velocidade excepcionais. Longe de ter um físico corpulento, seu corpo é esculpido em linhas atléticas e definidas, um reflexo de uma disciplina férrea.
As lembranças dos treinamentos com os deuses originais, principalmente com Ózis e Tanri, inundam sua mente. Foi lá que adquiriu o estimado poder da telecinese, uma habilidade que poucos deuses possuem.
— Diferente de Zulfiqar, meus treinos são combates intensos, que persistem até a exaustão total ou ferimentos graves — relato, com uma voz firme. Observo o bocejo de Gálidus, não com irritação, mas com a compreensão de que palavras não bastarão. Com um gesto assertivo da mão, decido: — Chega de palavras. Vamos nos aquecer, ajustar as armaduras e escolher as armas.
Diante de nós, três armas repousam.
A primeira é um chicote longo de cipó, sua superfície entrelaçada com uma carapaça de ébano resplandecente, evidenciando sua robustez e flexibilidade mortal.
A segunda, uma manopla também feita de cipó, compartilha a mesma carapaça escura do chicote. Ela é adornada com três garras retráteis, também cobertas de ébano, que se projetam.
Por último, e em minha opinião a mais formidável, está a Kurasi. Este longo cipó, um pouco mais curto que o chicote de ébano, é feito de um cipó branco impressionante. Na sua extremidade, um bastão de alaúpo se destaca, coroado por uma grande lâmina curva de cristal arcririsiano preto.
— Escolham sabiamente — encorajo Bucu e Gálidus.
Com uma escolha decidida, eu tomo a Kurasi. Gálidus se apropria da manopla de ébano, seus dedos flexionando as garras retráteis com familiaridade. Bucu, por sua vez, agarra o chicote, fazendo-o estalar no ar.
O amanhecer começa a romper, lançando os primeiros raios de luz sobre o campo de treino. Uma brisa suave do sul sopra, acariciando as flores que formam uma fronteira natural entre mim e meus oponentes. Eu me posiciono, minha armadura de cipó de ébano se moldando ao meu corpo como uma segunda pele, permitindo liberdade de movimento. Os pés descalços tocam suavemente o gramado, conectando-me à terra que nos sustenta.
Bucu, impaciente, provoca, agitando seu chicote com uma habilidade nata, cortando o ar e criando uma melodia sutil, mas ameaçadora. — Chega de enrolação — diz ele, a expectativa brilhando em seus olhos esmeraldinos.
Gálidus, com uma confiança que beira a arrogância, acrescenta: — Convenhamos, acho que só um de nós vai precisar lutar. — Seu porte é imponente, sua pele parda exibe uma tonalidade terrosa, como se esculpida das profundezas da terra, destacando-se sob o quadro de sua armadura que se assemelha a placas de folhas secas. Seus olhos castanho-claros, com uma leve tonalidade amarelada, demonstram uma prontidão para o combate. Seu cabelo curto e desalinhado emoldura um rosto de traços fortes e decididos, a linha da mandíbula bem definida destacando-se em contraste com a suavidade de seus lábios, que se curvam em um sorriso de desafio.
Avanço um passo, empunhando a Kurasi com força. O cipó branco se enrosca nos meus braços, proporcionando um suporte firme. Fechando os olhos, mergulho em um momento de introspecção profunda, buscando uma sintonia perfeita com a arma em minhas mãos.
— Venham! — Desafio com voz forte, abrindo os olhos para encarar os deuses diante de mim. Há um brilho feroz em meu olhar, um reflexo da força latente que agora domina minha presença.
Os deuses se entreolham por um momento, analisando a determinação em meus olhos. Eles percebem que este não é um mero exercício de treinamento; é uma lição de vida ou morte.
Gálidus, com um sorriso de reconhecimento, acena com a cabeça, aceitando o desafio silenciosamente. Seu corpo se tensiona, pronto para o embate. Bucu, por outro lado, exibe uma expressão mais ponderada, mas seus olhos brilham com uma chama de entusiasmo enquanto manipula seu chicote com destreza.
Imersos em um círculo de concentração, preparamo-nos para desatar o conflito que se anuncia, cada um ciente do poder e da habilidade do outro.
Árvore Alaúpo – Árvore de madeira, cipós e folhas brancas. Criada por Bucu. Sua madeira é conhecida por sua resistência, capaz de suportar alguns golpes de um machado gigante de cristal arcririsiano.
ATO II
Bucu, assumindo a postura de combate, avança com o chicote em suas mãos rasgando o ar com um estalo feroz. A cada movimento, ele deixa marcas profundas na grama, como cicatrizes na terra. Suas feições retesadas em uma expressão de pura concentração, olhos esmeralda focados inteiramente em mim.
Meus reflexos se aguçam ao extremo, esquivando-me dos golpes com agilidade, saltando ágil para o lado, sinto o vento gerado pelo chicote passar perigosamente perto, quase beijando minha pele. Em resposta, giro a Kurasi, a lâmina de cristal preto cortando o ar, enviando uma onda de energia letal em direção a Bucu.
Ele, por um triz, bloqueia o ataque com o chicote, o impacto fazendo seus pés deslizarem na grama, deixando um rastro de terra revirada e pequenos fragmentos de vegetação destruída. Um traço de surpresa marcando suas feições, com um leve rasgo de sangue escorrendo da palma de suas mãos, resultado do choque violento.
No instante em que Bucu é lançado para trás, meu foco se volta para Gálidus, que se prepara para entrar na luta. Disparo o bastão da Kurasi com uma violência assustadora contra Gálidus, com olhos arregalados pela surpresa e um grito preso na garganta, mal consegue levantar a defesa antes de ser atingido em cheio no abdômen. O som do impacto é um estalo horrível, misturando-se com o estalar de suas costelas. Ele é arremessado para trás com uma força descomunal, seu corpo colidindo contra uma árvore. A violência do choque faz com que a árvore se contorça, folhas caindo como uma chuva verde ao seu redor.
Gálidus cai ao chão, um grito de dor abafado escapando de seus lábios. Seu corpo imóvel, o abdômen cianótico e ensanguentado. Ele luta para respirar, cada sopro um tormento, enquanto tenta em vão se levantar, suas mãos trêmulas agarrando-se à terra em busca de apoio.
Bucu, absorvendo o choque de ver Gálidus derrotado, lança-se em minha direção, o chicote em suas mãos cortando o ar com uma violência impressionante. Seus movimentos são tão rápidos que parecem apenas borrões no ar. Veias pulsantes sob sua pele oliveira revelam o esforço feroz que ele emprega em cada ataque, enquanto gotas de suor brilham em sua testa.
Subitamente, Gálidus, empurrando os limites de sua dor, emerge das sombras numa tentativa desesperada de ataque furtivo. Seu punho, carregado com toda a força que consegue reunir, mira minha nuca com a intenção de encerrar o combate com um único golpe brutal. Contudo, percebo o movimento e, num giro ágil, desvio no último instante. Meu contra-ataque é um tapa rápido, mas severo, na nuca de Gálidus.
— Muito devagar — zombo, com um sorriso confiante em meus lábios, enquanto meu corpo se esquiva do chicote de Bucu com miúdos, mas precisos passos.
Esquiva após esquiva, em um lapso, uma distração mínima, um dos golpes raspa meu ombro, deixando um rastro de sangue. O corte é superficial, mas a dor é um aviso claro: qualquer descuido pode ser fatal.
O sorriso de Bucu se torna um esgar de triunfo ao ver o sangue.
Gálidus, impulsionado pela humilhação do tapa, avança com uma fúria maior. Seus movimentos são velozes, um vulto de ataques que busca me nocautear.
Em meio aos movimentos de esquiva no de combate, minha concentração é absoluta. Meus movimentos são automáticos, resultado de anos de treinamento árduo. Mas, por trás de toda batalha, há um foco; o desta é: ensinar Bucu e Gálidus.
Bucu lança seu chicote em arcos mortais, sua expressão rígida. Cada estalo do chicote é ameaçador, mas eu me movo fora do alcance de cada golpe, uma entidade escorregadia na brisa da manhã. Meus pés mal tocam o chão, evitando cada ataque com maestria.
Gálidus, por outro lado, é um furacão de força bruta, seus golpes são como armas de guerra, desferidos com uma velocidade surpreendente. Sua pele brilha com o suor do esforço, e seus olhos demonstram um desejo ardente de me acertar, mas eu deslizo para fora de seu alcance, minha antecipação e experiência me mantendo sempre um passo à frente.
Nessa fuga de violência, eu me pergunto sobre a verdadeira lição deste combate. — Eles são fortes, sem dúvida — penso, enquanto desvio de mais um ataque feroz. — Mas também são orgulhosos. Tenho que fazê-los superar essa arrogância e aprender com suas derrotas.
Minha agilidade e habilidade surpreendendo os dois deuses, que, apesar de darem seu máximo, são incapazes de acompanhar minha velocidade.
Enquanto me movo, um pensamento me acompanha: estou aqui para ensiná-los, para moldá-los em guerreiros mais completos. Cada esquiva, cada golpe, ou humilhação, é uma lição para eles, um exemplo do que significa ser um guerreiro não apenas com o corpo, mas com a mente e o espírito.
Com um movimento fluído, me impulsiono à frente, giro o corpo enquanto brando a Kurasi com força e direciono um golpe horizontal em direção a Bucu. O impacto do bastão de alaúpo é devastador, colidindo contra a armadura de Bucu com uma força que parece capaz de despedaçar montanhas.
Bucu, pego de surpresa, mal tem tempo de reagir. O choque do impacto faz seu corpo voar pelo ar como uma folha ao vento. Seu corpo gira descontroladamente no ar antes de se chocar contra a árvore. O impacto é tão brutal que o tronco da árvore estala e rachaduras se formam na sua superfície. Seu corpo desliza lentamente para o chão, um rastro de sangue manchando a casca da árvore.
Eu observo e me aproximo lentamente do local onde Bucu jaz. Com a respiração ainda pesada devido ao esforço do combate, contemplo Bucu derrotado. — A guerra é assim. Não espere moleza em um combate real — digo, minha voz impregnada de um tom severo, ressoando com a autoridade de um guerreiro experiente. Minha expressão é uma máscara de gravidade, olhos fixos em Bucu, querendo que ele compreenda a realidade cruel e impiedosa da guerra.
Bucu, ainda lutando para manter a consciência, levanta ligeiramente a cabeça, seus olhos encontrando os meus. — Essa é apenas uma das muitas lições duras que a batalha tem a ensinar — acrescento, enfatizando cada palavra, desejando que elas penetrem sua mente.
Gálidus, em pé, observa a cena. — Leve isso a sério — ele murmura, mais para si mesmo do que para Bucu, reconhecendo a profundidade e a seriedade do treinamento. Sua expressão se enraivecendo ao perceber que a árvore que Bucu colidiu foi a mesma que ele havia colidido, e que isso não foi coincidência, e sim uma amostra do quão irrelevante está sendo essa luta para mim.
— Isso é o que você chama de treinamento, Críngu? — ele brada, suas mãos cerradas em punhos, o corpo tenso prestes a atacar. Seus olhos refletindo sua indignação e a dor da derrota. — Está brincando conosco! — ele continua, a voz aumentando em intensidade. — Você... você está apenas nos humilhando. Isso é algum tipo de jogo para você? — A acusação é afiada.
Permaneço imóvel, enfrentando a tempestade emocional de Gálidus com uma calma imperturbável. — Não é um jogo, Gálidus — respondo, minha voz um contraponto firme à sua fúria. — É uma preparação para a realidade da guerra. Se não conseguirem lidar com isso aqui, como esperam sobreviver no campo de batalha real?
Gálidus respira fundo, tentando controlar sua ira, mas a tensão em seu corpo não diminui. Ele me encara, tentando encontrar alguma falha em minha lógica, mas a verdade das minhas palavras é inegável. A dureza do treinamento é um reflexo da brutalidade da guerra, e embora suas palavras estejam impregnadas de raiva, há uma compreensão relutante começando a tomar forma em seus olhos.
Então, Gálidus decide agir ao invés de continuar com as palavras, ele avança, mas eu sou mais rápido e, assim que ele percebe, já estou diante dele. Minha mão direita se estende como um chicote agarrando o pulso de Gálidus com uma pressão esmagadora. Seus olhos se arregalam com surpresa, a dor irradiando pelo seu braço enquanto suas veias saltam sob a pele.
Com um giro ágil, posiciono-me atrás dele, usando seu próprio impulso contra ele. A manopla de ébano de Gálidus, agora em minha mão. Com um movimento fluido, torço seu braço para trás, imobilizando-o. Gálidus solta um grito abafado de dor, sua resistência se desvanecendo sob o domínio da minha técnica.
Pressiono a manopla contra suas costas, as garras afiadas perfurando a armadura e penetrando a carne. O sangue começa a se infiltrar pelas fendas da armadura, tingindo a grama verde embaixo de nós. Gálidus tenta se debater, mas a pressão que exerço é implacável, cada tentativa de fuga apenas aumentando a dor e o dano.
Ele olha para mim por cima do ombro, os olhos brilhando com um êxtase eufórico. — Críngu... — ele sussurra, a voz entrecortada pela dor. — Isso... isso é lutar — um sorriso torto, quase masoquista, se forma em seus lábios, revelando um entendimento perverso do verdadeiro significado do combate.
Eu o encaro com um vislumbre de respeito, mas mantenho minha voz fria, um eco da dura verdade da guerra. — Não, Gálidus, não é. Isso é o que acontece quando a arrogância encontra a realidade — assevero, cortando qualquer ilusão de glória na dor. — Se isso fosse guerra de verdade, sua fraqueza já teria custado sua vida.
Com um último movimento brusco, desarmo Gálidus completamente, lançando a manopla para longe. Ele cai no chão, respirando com dificuldade. De pé, meu olhar é impiedoso, um espelho da dura realidade que cada guerreiro deve enfrentar.
Observando Bucu e Gálidus, derrotados e atordoados, percebo o peso do momento. Eles estão diante de uma realidade que desafia tudo o que achavam saber sobre batalha e força. Encaro-os com seriedade e impaciência, respirando profundamente antes de começar meu sermão, sabendo que o tempo é curto e a lição crucial.
— Escutem atentamente! — Brado com autoridade. — Vocês foram tolos e pagaram o preço pela arrogância. Seus poderes são reais, mas a falta de disciplina e o desrespeito pela estratégia os levaram à derrota.
Aponto um dedo acusador para Bucu e Gálidus. — Vocês subestimaram não apenas a mim, mas também as habilidades que poderiam salvar suas vidas. — A frustração e a decepção são claras em minha voz. — O fato de eu ter treinado arduamente não me torna invencível, mas um aprendiz de meus erros. Ser um verdadeiro guerreiro não é medido apenas pela força bruta, mas pela sabedoria e discernimento que exerce ao aplicar seu poder.
Aproximo-me de Bucu e Gálidus, olhando diretamente em seus olhos: — A guera que enfrentaremos em breve será mais rigorosa que este treinamento. Lá as batalhas não vão ser tão indulgentes quanto este treino. Não haverá espaço para segundas chances ou lições no calor da guerra — cada palavra é dita com uma intensidade que busca incutir a gravidade da situação em suas mentes.
— Vocês precisam aprender a usar suas habilidades com cautela e inteligência. Se agirem como fizeram aqui, suas vidas serão curtas em combate. Vocês deixaram suas emoções comandarem seus movimentos, e isso foi o seu maior erro — meu tom é severo, mas necessário. — Gálidus, sua raiva cega foi sua ruína. Você achou que com ela superaria minha técnica. Você me subestimou e isso o sentenciou a derrota, e o sentenciaria a morte se de fato estivéssemos em uma luta de verdade — sua expressão é séria, mas a dura realidade da situação se assenta em seu âmago.
E então, me volto para Bucu. — Em uma guerra, cada movimento pode ser o último. Não adiantará nada dar seu máximo em seus golpes, se eles não tiverem foco algum. Seus ataques, embora rápidos, foram previsíveis. Velocidade sem estratégia é inútil. — Suas feições mostram uma compreensão relutante.
— Vocês precisam aprender a lutar com a cabeça, não apenas com os punhos. — minha impaciência é visível, mas mantenho a calma interior, sabendo que a dureza é o caminho para que eles compreendam a crueza da guerra.
Parado diante de Bucu e Gálidus, vejo o peso de minhas palavras se aprofundando em seus olhos. Eles estão quebrantados, seus corpos e orgulho feridos, mas é crucial que entendam a seriedade do que vem pela frente. — Não tenho tempo para fraqueza — digo. — Lutar ao lado de vocês é minha escolha, mas é essencial que estejam à altura do desafio que enfrentaremos.
— Eu não tenho tempo para ensinar tudo o que aprendi ao longo das décadas — continuo, minha voz se tornando mais grave. — Mas uma coisa eu vou lhes dizer: a arrogância é um inimigo mais perigoso do que qualquer deus.
Faço uma pausa, deixando que a realidade dessas palavras os atinja.
— Reflitam sobre este treino. Aprendam com seus erros e talvez, apenas talvez, vocês possam se redimir em nosso próximo embate — aconselho. — Não esperem clemência de mim. Na guerra, não haverá espaço para a fraqueza.
Me afasto, deixando Bucu e Gálidus absorverem as duras palavras. No silêncio que segue, sinto a oportunidade de uma mudança de atitude, uma premonição do conflito que se aproxima. Na minha mente, uma resolução se firma: — Agora a redenção só dependerá da disciplina e do esforço deles. Mas é meu dever conduzi-los com firmeza nesse caminho — penso, decidido a moldar Gálidus e Bucu em guerreiros dignos dessa guerra iminente.
ATO III
Após o treino no campo esverdeado, as sombras das árvores se alongam, acompanhando silenciosamente o avanço das estações. A grama, outrora marcada pelo embate feroz, agora se regenerou, uma metáfora sutil para a transformação que se operou em nós.
Nas manhãs frescas que seguem, Bucu e Gálidus emergem das névoas da alvorada com uma nova postura. Em seus olhares, a impetuosidade juvenil deu lugar a uma maturidade forjada na fornalha dos dias árduos de treinamento.
Nosso campo de batalha diário se tornou um lugar de silenciosa compreensão, onde cada movimento era um diálogo, cada golpe uma lição. Bucu, que outrora brandia seu chicote com uma fúria indomada, agora articula estratégias com a tranquilidade de um rio que conhece seu leito. Gálidus, cuja raiva era seu combustível, encontrou na calma um novo aliado, tornando-se uma tempestade contida, pronta para desabar com precisão.
A adrenalina nos envolvendo, enquanto o campo de batalha se torna palco no embate final.
Assumo uma postura imponente. Minha confiança transparece em meu olhar penetrante. Estou pronto para enfrentar meus adversários novamente, ansioso para testemunhar se eles serão capazes de superar suas falhas anteriores.
Bucu e Gálidus, cientes da minha força, trocam um olhar determinado, preparados para enfrentar juntos o que quer que venha a seguir.
Com uma explosão de violência, inicio o combate, desencadeando uma série de ataques poderosos com a kurasi, testando a resistência e a astúcia dos meus oponentes.
Bucu e Gálidus, agora mais refinados em suas técnicas, esquivam-se com uma destreza impressionante. Bucu, em particular, empunha seu chicote com maestria, lançando-o em minha direção. Desta vez, a velocidade vem acompanhada da precisão e não consigo esquivar.
O chicote se enrola em meu braço, a carapaça de ébano rasgando a armadura e a pele, levando um pouco de meu sangue junto com os pedaços arrancados da armadura.
Do outro lado, Gálidus, observando meu momento de vulnerabilidade, prepara-se para avançar. Suas manoplas, transformadas em garras mortais, miram meu torso. Cada golpe desferido com uma fúria controlada, porém consigo desviar da maioria, mas um deles me atinge em cheio no flanco. Sinto as garras rasgarem minha pele, um calor úmido e pegajoso se espalhando rapidamente pela minha cintura, o sangue fluindo livremente, uma assinatura vermelha da violência.
Com um grunhido de dor, reajo instintivamente, lançando um soco devastador em direção a Gálidus. Meu punho encontra seu rosto. E seus olhos se reviram enquanto seu corpo é arremessado no ar, girando descontroladamente antes de cair pesadamente no chão.
Volto-me para Bucu, que sem demora me ataca com uma série de chicotadas, cada uma mais rápida e letal que a anterior. Desvio, giro, salto, mas sou surpreendido por Gálidus que retoma mirando um soco em meu peito. O golpe é veloz, mas me esquivo desviando sua mão, porém essa fração de segundo de distração é tudo que Bucu precisa, atingindo-me nas costas com o chicote, deixando um rastro ardente de sangue e carne rasgada.
O grito que escapa de minha garganta, não é de dor, mas de desafio, e avanço. Bucu e Gálidus, entretanto, apresentam uma sintonia perfeita entre si. Suas habilidades, uma vez brutas e indisciplinadas, agora se entrelaçam de maneira única, permitindo que eles prevejam os meus movimentos e coordenem seus ataques de forma impecável.
Bucu, com a astúcia de um estrategista, manipula o campo de batalha como um mestre marionetista, dividindo a minha atenção entre duas ameaças. Luto para manter a vantagem, mas a estratégia de Bucu é astuta; ele usa Gálidus como uma distração, permitindo que o chicote se enrole em meu bastão, neutralizando a kurasi.
Rapidamente, tento me desvencilhar, mas Gálidus aproveita a oportunidade. Suas garras rasgam minhas panturrilhas, desenhando linhas de dor aguda que fazem meu sangue jorrar em arcos escarlates sobre a grama. O chute em minhas costas é um golpe de misericórdia, jogando-me de joelhos diante de Bucu.
Antes que possa reagir, Bucu desfere uma joelhada com uma força que parece partir o próprio ar. Sinto meu nariz se quebrar, o sangue quente e viscoso escorrendo pelo meu rosto, misturando-se ao sabor metálico em minha boca. Minha visão se turva, o mundo gira, e a Kurasi escapa de minhas mãos trêmulas.
No chão, enquanto a escuridão se aproxima, meus últimos pensamentos são de orgulho. Bucu e Gálidus aprenderam bem, tornando-se guerreiros formidáveis. E mesmo na derrota, sinto uma satisfação profunda.
Eles estão prontos.
Gálidus
Bucu
Críngu
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