Capítulo 11
Yoon Ji Hye caminhava a passos firmes na direção do palácio com um capuz cobrindo sua cabeça e boa parte de seu rosto. A dona de uma casa de kisaengs não tinha qualquer vergonha de andar na rua, mas sabia exatamente que tipo de rumores seu rosto conhecido visitando o palácio poderia desencadear e preferia evitar isso. Afinal, estava ali a trabalho.
A bela e poderosa comandante das guerreiras de Omlai pagara bem por discrição e informações precisas e Ji Hye se permitiria ser chamada de qualquer coisa, menos de incompetente.
Nos portões do palácio, a cortesã parou e, com cuidado para que os guardas vissem o mínimo possível de seu rosto, disse as palavras que Nia Okonjo a instruíra a reproduzir. Palavras omlai, cujo significado os guardas byeol conheciam tão bem quando Ji Hye. Nenhum deles fazia a menor ideia do que a kisaeng estava dizendo.
Mas as palavras foram cuidadosamente pronunciadas e os guardas trocaram os olhares confusos que Nia previra, logo antes de um deles se afastar e deixar o colega encarando uma Ji Hye que tentava ignorá-lo, até que viu Nia se aproximando com passos incrivelmente leves para uma mulher tão imponente, o guarda que fora buscá-la quase correndo para acompanhá-la.
Ji Hye não escondeu o sorriso satisfeito que a deixou parecendo sexualmente perigosa. As palavras estranhas tinham funcionado, afinal.
Nia atravessou os portões abertos do palácio e não diminuiu os passos, fazendo Ji Hye segui-la até que os guardas não pudessem mais ouvi-las sem nem estranhar o gesto da guerreira.
O tempo todo, Ji Hye observava a mulher de pele negra, olhos grandes e lábios cheios, pensando no tamanho do desperdício que era alguém como ela dedicar a vida toda a proteger outras pessoas quando poderia ter uma vida de riquezas em uma posição mais agradável, como a dela própria. Mas a cortesã sabia que nem todas gostariam de fazer o que ela fazia para ganhar a vida.
— Pronto, aqui podemos falar com privacidade — declarou Nia, lançando um olhar desconfiado para os guardas que tinham ficado parados nos portões do palácio.
— A senhorita disse que qualquer informação sobre o mensageiro morto do rei seria útil, desde que fosse precisa e confiável.
Nia apenas assentiu, os olhos semicerrando de preocupação por um único instante.
— Bem, parece que o mensageiro real não trabalhava só para o rei — continuou Ji Hye.
— Parece? — Nia levantou uma sobrancelha em expectativa e a kisaeng não sabia dizer se a comandante estava criticando a palavra que sugeria incerteza ou se estava apenas interessada em saber mais sobre o assunto.
Como já pretendia fazer isso e fazia parte do acordo entre as duas, Ji Hye apenas prosseguiu:
— Existem provas e algumas testemunhas que, infelizmente, não abririam a boca para uma guerreira omlai por vontade própria de que o falecido mensageiro real trabalhava secretamente para Wang Hee Jin. — Esperou até que os olhos pensativos de Nia demonstrassem que esta tinha encontrado em sua mente a resposta para quem era Wang Hee Jin antes de continuar: — Repito, infelizmente minhas testemunhas negarão qualquer relação com isso até a morte, mas o mensageiro foi visto visitando a tia do rei várias vezes antes de ser encontrado morto.
A kisaeng viu e ficou admirada com a forma com que os olhos da estrangeira endureceram.
— Posso confiar na veracidade dessa informação? — Nia perguntou, obviamente já pensando no que faria a seguir.
A guerreira estava tensa e, apesar de determinados e firmes, seus olhos pareciam distantes.
— Sim. Eu e minhas meninas nos certificamos de confirmar, mas as testemunhas...
— Não preciso que suas testemunhas me contem a história. É claro que eles confiam mais em você do que em mim. Foi por isso que fizemos nosso acordo. — As últimas palavras saíram acompanhadas de um sorriso predatório que a cortesã se sentiu impelida a retribuir. Apesar de ser uma guerreira e não se envolver em certas questões sobre relacionamento pessoal e prazer, a comandante sabia como o mundo funcionava. — Só preciso me certificar de que não vou cometer uma injustiça.
Desta vez, Ji Hye abriu um sorriso confiante.
— Isso eu posso garantir — declarou a kisaeng.
Era tudo o que Nia precisava ouvir. Depois de agradecer e dispensar Ji Hye, a guerreira se dirigiu ao salão real, a mente agitada pensando no quanto ela gostaria de simplesmente resolver a questão naquele momento, com suas próprias mãos. Entretanto, tinha prometido a Malaika que tentaria se comportar e seguir as leis byeol, mesmo que todos os seus instintos gritassem para que apenas encontrasse a tia do rei e livrasse o palácio e o mundo de sua presença desprezível.
Era por Malaika, também, que Nia se dirigia agora para o rei byeol, e não para a princesa omlai a quem servia há anos. Malaika não precisava de mais uma preocupação, não enquanto não pudesse fazer nada para resolvê-la. Nia estava determinada a levar a questão a alguém com autoridade suficiente para erradicar o problema e, com isso, poupar a cabeça já cheia da princesa. Se esse plano, que seguia o desejo da princesa de que a comandante controlasse seus impulsos agressivos, não funcionasse, porém, Nia estava determinada a solucionar tudo com as próprias mãos, independentemente das consequências sociais. De qualquer forma, Malaika não precisava ser perturbada tão perto do casamento, já que a comandante tinha tudo sob controle. Ou teria em breve.
Sua presença foi anunciada para o rei quando chegou à sala do trono e Nia aguardou até que recebesse permissão para entrar, suas mãos passando pelas flechas na aljava nas costas e sua mente contando-as quase inconscientemente.
Foi obrigada a deixar o arco e a aljava cheia do lado de fora do salão, contudo, e abriu mão deles sob os olhares desconfiados dos guardas que tinham medo de que ela ameaçasse o rei. Mesmo que ela nunca tivesse demonstrado tal intenção, nenhum deles podia esquecer quão perto ela estivera de atingir a cabeça de um eunuco no dia de sua chegada.
Nia teria sorrido diante do medo que aqueles homens sentiam dela se as circunstâncias fossem diferentes, mas estava focada no que precisava dizer ao rei e em como garantiria uma resposta adequada dele.
— Nia, que surpresa vê-la! — Taeyang começou a cumprimentá-la quando avistou Nia entrar, mas algo no jeito como ela andava, com os cachos negros balançando às suas costas a cada passo e o rosto negro muito sério, o fez parar. — Aconteceu alguma coisa?
— Vossa Majestade... — Nia deu alguns passos na direção dele, mas hesitou por um instante, só voltando a se aproximar quando Taeyang fez um gesto indicando que ela deveria. — É um assunto delicado.
— Se é importante o suficiente para trazê-la até aqui deste jeito, não deve se conter.
Taeyang tentou controlar a expressão para não parecer fraco e desesperado na frente da guerreira poderosa, mas não podia ignorar seu coração acelerado e sua cabeça enchendo de pensamentos sobre o que poderia ter acontecido com sua doce Malaika para deixar a comandante da guarda dela tão transtornada.
Além disso, ela precisava ir direto ao assunto para que ele descobrisse o que poderia fazer para ajudar, já que a comandante estava ali com ele, e não junto da princesa.
— Tenho motivos para acreditar — Nia começou depois de um instante de hesitação em que respirou fundo — que o equívoco da mensagem real entregue em Omlai foi proposital. — Quando Taeyang franziu o cenho, ela continuou, fazendo-o arregalar mais os olhos castanho-claros a cada palavra: — Acredito que ele estava seguindo ordens para nos incitar a viajar quando não deveríamos e enfrentar o perigo que ainda rondava a estrada.
Apesar de o ataque à comitiva de Malaika na estrada não ter sido mencionado nos últimos dias, ele ainda assombrava os pensamentos do rei. Taeyang poderia ter perdido a noiva a quem estava tão apegado agora e, só de pensar que algo ruim poderia ter acontecido a ela, seu corpo todo estremecia de indignação e medo. Mas pensar que aquilo podia ter sido proposital e que alguém – alguma pessoa sem coração de Hanbyeol, em vez de alguns bandidos sem escrúpulos – poderia ter planejado um ataque calculista como aquele à inocente e gentil princesa estrangeira que era sua noiva deixava-o furioso.
Como alguém de seu povo poderia ter tamanho descaramento? Mas, principalmente, como a comandante omlai tinha chegado a essa conclusão?
— Espere, Nia. Por que pensa isso? — perguntou Taeyang, tentando controlar os nervos e raciocinar com clareza.
Observando o rei com atenção, Nia procurava entender o que se passava na cabeça do homem através de seus olhos e suas expressões enquanto dava um passo à frente.
— Vossa Majestade há de convir que as circunstâncias da nossa chegada e do que aconteceu na estrada, logo após a morte do antigo rei, não foram normais. — Taeyang apenas fez um gesto com a cabeça, concordando com ela. — Tínhamos pensado ter sido apenas um erro, afinal mensageiros podem cometer erros. Mas e se o erro foi de propósito?
— Nia. — A voz de Taeyang estava dura por causa do nervosismo. Quanto mais ela falava, mais a mente dele trabalhava e isso não parecia saudável. — Disse que tem motivos para acreditar nisso, o que significa que não é mera especulação. Vá direto ao ponto.
A comandante retesou a postura, ficando ainda mais ereta e intimidadora.
— Parece haver provas de que o mensageiro seguia ordens de outra pessoa além de Vossa Majestade.
— Parece haver?
— A informação chegou até mim, Majestade, e é baseada em provas.
— Quem é seu informante? — perguntou Taeyang depois de esperar que ela continuasse por um minuto inteiro.
— Majestade...
Havia um alerta na voz da guerreira e algo parecido com diversão. A mulher não estava disposta a contar como tinha conseguido aquela informação nem com quem. Parecia se divertir com o fato de Taeyang pensar que conseguiria arrancar a informação dela e avisar a ele para não tentar fazê-lo.
— Droga, Nia! Como posso saber se é verdade se não souber como ou quem chegou a essa informação?
Quando vários instantes se passaram sem que Nia dissesse sequer uma única palavra enquanto o encarava duramente, o rei suspirou. Ele podia jurar que era possível ler na expressão e na tensão de todo o corpo da guerreira as palavras essa não é a parte importante.
— O que pretende fazer, então? — Taeyang perguntou outra vez, resignando-se com o fato de que, mesmo que a mulher tivesse ido até ele, pretendia fazer as coisas do jeito dela até o fim.
— Em Omlai, eu teria confirmado a informação imediatamente e cuidado do culpado — começou Nia com um dar de ombros tão despreocupado que o rei sentiu um calafrio. Ela não poderia ficar tão calma cuidando de alguém nos termos que ele imaginava, poderia? — Mas fui convencida de que, em Hanbyeol, as coisas são feitas de outra maneira. E que Vossa Majestade é o melhor e maior juiz.
Taeyang ouvia com atenção, sentindo honra e gratidão pela confiança que a comandante guerreira estava depositando nele, mesmo que ela obviamente quisesse arrancar a cabeça de alguém dos ombros com seu arco naquele exato momento. Mas tentou mascarar seus sentimentos até ouvir tudo o que ela tinha a dizer, já que o comportamento dela ela levemente desafiador.
— Acredito que a questão mereça uma investigação adequada, sob ordem de Vossa Majestade, tão minuciosamente quanto possível — terminou Nia.
Abrindo um pequeno sorriso em concordância, Taeyang assentiu antes de perguntar:
— De quem suas fontes dizem que o mensageiro recebia ordens? Além de mim, é claro.
Se a acusação da guerreira tivesse a menor possibilidade de ser verdade, ela estava certa. O assunto merecia uma investigação. Afinal, se a alegação se provasse verdadeira, estavam tratando de uma tentativa de assassinato à noiva do rei.
Mas Taeyang não conseguiu evitar que seus olhos se arregalassem e seu queixo caísse às próximas palavras de Nia.
— Da princesa Wang Hee Jin.
— Como disse?! — Taeyang se mexeu desconfortavelmente no trono. — Não pode estar insinuando que...
— Devo informá-lo, Majestade, de que, se as leis de Hanbyeol não puderem resolver a questão e erradicar o perigo à vida de Sua Alteza Malaika, então terei que fazer uso das leis de Omlai.
Informar. Se Taeyang não investigasse e, posteriormente, punisse devidamente o culpado pelo ataque a Malaika, Nia agiria de acordo com os próprios princípios. Não havia outras condições para isso. A guerreira agiria e ninguém poderia impedi-la. Simples assim.
E o perigo deveria ser erradicado, fosse como fosse. Se não acontecesse pelas mãos de Taeyang e seus guardas, aconteceria pelas de Nia. E, ao olhar para a comandante naquele momento, o rei tinha certeza de que ela sequer hesitaria em cumprir o aviso. Porque não era uma mera ameaça, era um aviso, direto e simples.
— Eu entendo e... concordo, eu acho, ao menos em parte, mas... — O rei fez uma pausa, ainda desconfortável, recusando-se a acreditar que aquilo poderia ser possível. — A minha tia?
— Foi a informação que eu recebi, Majestade. — Nia parecia irredutível. — É mais um motivo para a investigação ser tão necessária.
Suspirando, Taeyang se rendeu. Ele não podia negar a necessidade de investigação e, por mais que não quisesse acreditar que um membro da família real podia estar ligado a algo tão terrível, também queria descobrir a verdade.
— Pode confiar em mim, comandante — declarou Taeyang. — A investigação começará imediatamente. Mandarei o responsável procurá-la caso precise de mais detalhes.
Nia apenas levantou uma sobrancelha, divertida, antes de se retirar. Nada garantiria que ela daria mais informações sobre suas fontes, mas não daria motivos para o rei mudar de ideia.
As guerreiras treinavam sob o olhar atento e perspicaz de Imani Akunyili desta vez. A comandante líder da guarda do príncipe herdeiro gostava de observar as poderosas guerreiras nativas de sua nação. Ela havia treinado algumas delas pessoalmente.
— Avaliando meu trabalho, Imani? — perguntou Nia, aproximando-se e parando ao lado da veterana.
Imani olhou para Nia, seus olhos grandes, redondos e escuros, sob sobrancelhas naturalmente arqueadas tinham um brilho afetuoso e os lábios franzidos em um sorriso denunciavam o que denunciavam seu orgulho pela comandante mais jovem. Nia Okonjo, sua pupila prodígio.
— Elas parecem tão boas quanto se eu mesma as estivesse treinando — comentou Imani com um olhar despreocupado sobre os ombros para as guerreiras que agora estavam atrás dela. — Já você, eu não tenho oportunidade de observar em ação há algum tempo. Eu soube do incidente na estrada, porém. Fico feliz de saber que todos saíram ilesos.
Nia fez uma careta. Se levasse as palavras da veterana ao pé da letra, precisaria discordar, afinal algumas guerreiras tiveram arranhões e outros ferimentos. Mas Imani estava certa, o fato de que ninguém da comitiva tinha morrido merecia comemoração. Mesmo com as habilidades das guerreiras de Omlai, esse feito nem sempre era possível.
Nia assentiu respeitosamente para a mulher que a havia treinado e ensinado cada detalhe que sabia. A comandante Okonjo não tinha se tornado quem era sozinha, isso aconteceu porque foi uma aluna atenta e determinada da grande comandante Akunyili e fez questão de aprender tudo o que esta tinha para ensinar enquanto a seguia para todos os lados.
A relação de mestre e aprendiz, porém, não impediu que as duas se tornassem amigas e alfinetassem uma a outra de tempos em tempos.
— Isso mostra o quando progredimos desde que eu assumi o comando — comentou Nia em tom de provocação, olhando de lado para a veterana, já esperando a reação dela.
Imani levantou uma sobrancelha ao perceber o desafio oculto naquelas palavras. Então sorriu, os olhos brilhando com malícia.
— Quer dizer que vai me dar a oportunidade de vê-la em ação, Nia?
— Melhor. Vou dar a oportunidade de testar minhas habilidades você mesma.
Em um acordo silencioso, as duas se dirigiram ao centro do pátio de treinamento, chamando a atenção de todas as guerreiras que treinavam e dos guardas que observavam e descansavam nas laterais. Acostumadas com os embates repentinos das duas líderes em Omlai, as guerreiras apenas se afastaram silenciosamente, levando seus equipamentos e colocando-se ao redor do pátio, formando uma arena limpa para que as duas comandantes pudessem se locomover livremente.
Young Chul, que estivera discutindo com alguns de seus homens sobre a última ordem do rei, viu quando Nia entregou o arco e a aljava cheia de flechas a Ayla e fez um sinal com a cabeça para Hadiya, abrindo mão da arma que era quase parte dela.
Mas Nia era uma das pouquíssimas guerreiras omlai que usava arco e flechas e, de longe, a melhor delas. O que elas estavam prestes a fazer devia ser justo e um arco tornaria tudo rápido demais, além de tirar a diversão e o propósito.
Quando Nia voltou ao centro da arena improvisada, Imani, já em frente a ela, deu um sorriso rápido e um aceno de cabeça para Hadiya, o que fez Chul ignorar a conversa da qual devia participar para observar a cena abertamente, curioso para saber o que aconteceria a seguir.
Imani puxou sua adaga da bainha protetora em sua cintura, uma lâmina fina de apenas três centímetros de largura e vinte de comprimento, separada do cabo por uma guarda onde brilhava uma safira, demonstrando pela cor que tinha sido um presente de Kayin. Os dedos da guerreira rodearam o cabo de hastes que se curvavam em direção ao pomo arredondado com habilidade, deixando óbvia a prática adquirida após anos de uso do objeto, e ela levantou o braço, apontando a lâmina para sua oponente, em posição de luta.
Em frente a ela, a alguns passos, a adaga de Nia foi retirada da bainha presa à bota de couro. A pedra de âmbar no pomo brilhada ao sol, indicando que o objeto era um presente inestimável de Malaika para sua principal protetora, cujos dedos ágeis rodeavam naquele momento o cabo leve e cavo em formado de trança que terminava na guarda com um elegante entalhe de raiz de árvore, para abrir-se em uma lâmina com quatro centímetros de base que se afinava ao longo de seus quinze centímetros de comprimento, mais curta que a da oponente.
A postura de Nia para luta levava sua perna esquerda para trás enquanto a direita ficava flexionada à frente do corpo, com os dois braços dobrados nas laterais, o direito mais alto, pronto para atacar, e o esquerdo logo atrás, para a defesa.
Não foi preciso um sinal externo para que as duas mulheres começassem uma dança mortal, ainda que envolvente. Pernas e braços eram usados sem restrição, chutes e socos sendo trocados tão rápidos quando os ataques das lâminas brilhantes. Nenhuma das duas tinha medo de se ferir ou à oponente, a rigidez da concentração sendo aplacada pela agilidade dos corpos treinados.
Imani saltou em direção a Nia, a lâmina longa mirando o rosto da mais jovem, mas um chute preciso de Nia, enquanto esta girava a perna no ar, derrubou a veterana com um tombo, obrigando-a a rolar pelo chão de pedra para fugir da adaga rápida de Nia, que não hesitou nem um instante para direcioná-la ao peito da amiga.
Outro ataque de Imani combinou socos e investidas com a lâmina, levando Nia a dar alguns passos para trás enquanto se defendia e obrigando-a a usar uma das pernas como apoio atrás do corpo, escorregando sobre as pedras do chão enquanto as duas mãos se juntavam em formato de X à frente do rosto, que brilhava com o suor, à medida que nenhuma das duas pretendia desistir do embate de força bruta.
Então, a primeira lâmina voou em direção a elas, que se separaram com um salto para trás cada uma, adotando diferentes posições de defesa, os músculos rijos à espera. A adaga favorita de Hadiya, de base larga, que afinava ao longo de seus 25 centímetros de comprimento, e com guarda delicada que se curvava nas duas extremidades por mais alguns centímetros em direção ao fio, dando a impressão de que possuía três lâminas, atingiu uma das colunas do pavilhão de treinamento, permitindo que todos vissem o brilho verde da esmeralda no pomo.
O presente que Nia tinha dado à amiga anos antes estava sendo usado contra ela em mais um detalhe costumeiro nos embates contra Imani. As duas comandantes lutavam com força e agilidade enquanto Hadiya atirava suas adagas contra elas, um alerta constante de que, por mais intensa que uma luta pudesse ser, ainda era necessário dar atenção aos arredores.
Poucos segundos se passaram até que Nia e Imani voltassem a se atacar, os olhos concentrados, os músculos rígidos, os movimentos fluidos, enquanto Hadiya caminhava até a adaga que tinha sido presente de Nia, para tirá-la da coluna. Sem olhar, a guerreira Obasanjo atirou outra lâmina – de desenho ainda mais delicado que a anterior com guarda fina em formato de quatro lâminas curvadas apontando para as extremidades e conectadas por um rubi no centro, indicando que era um presente de Malaika – na direção das combatentes, ainda retirando a primeira de onde estava presa.
O embate continuou por mais algum tempo, acompanhado pelos olhos admirados e o silêncio concentrado de guerreiras e guardas, até que Nia e Imani estivessem ofegantes, o suor escorrendo pelos semblantes das duas enquanto Hadiya dava gargalhadas esporádicas à sua volta, não tão secretamente animada com as habilidades delas.
Chul estava hipnotizado pela visão à sua frente, apesar de estar determinado a nunca admitir que o brilho da pele negra e suada de Nia ao sol o atraía ou que dentro de seu peito crescia uma vontade de cuidar dela e presenteá-la com carinhos e... algo mais depois de todo aquele esforço.
Os olhos de Nia encontraram os dele por um único instante enquanto ela e Imani recuperavam o fôlego e, apesar de o capitão manter as feições neutras com muito esforço, a guerreira ainda viu algo em seus olhos amendoados que foi capaz de acender algo dentro dela. Algo que a impulsionou a atacar Imani com energia renovada e finalmente conseguir neutralizá-la, apesar de a veterana não ter sido sequer arranhada por sua lâmina.
O dia do casamento tinha se aproximado mais rápido do que Taeyang percebera. Seria realizado na manhã seguinte e Taeyang não conseguia dormir, com os nervos à flor da pele.
Ele não entendia bem seu nervosismo. Como sua noiva, Malaika já era sua. Ninguém podia tocá-la ou desrespeitá-la e ela não deixaria essa posição, já que a decisão era dele. Mas havia certa segurança em ser esposa do rei que não existia como sua noiva.
Porém, acima de tudo, como marido, Taeyang poderia tocá-la, o que não podia fazer agora. É claro, ele poderia ter roubado um beijo ou dois durante os momentos que passaram juntos, mas um beijo roubado e escondido não era o mesmo que a liberdade de ter Malaika em seus braços, de visitar os aposentos dela quando quisesse e passar a noite inteira conversando ou apenas admirando-a sem que ninguém pudesse interrompê-los ou censurá-los.
Só de pensar em todas as diferenças entre a vida de solteiro e de casado, todos os pelos de Taeyang ficavam arrepiados. Bastava pensar em Malaika e ele se tornava um bobo sorridente e ansioso que ele mesmo quase não reconhecia.
Um farfalhar de folhas atrás dele lhe chamou a atenção e o fez parar em meio à caminhada que decidira dar para acalmar a mente agitada. Ao olhar para trás, o rei se surpreendeu ao encontrar Lee Mi Suk perto demais dos aposentos dele para uma dama honrada.
— Senhorita Mi Suk, o que faz aqui? — perguntou Taeyang, virando-se completamente para ela. Queria estar preparado para o que fosse. Ele não estava sozinho, mas os eunucos e os guardas não estavam perto o bastante para abordá-la por ele. Aliás, seria interessante saber como ela tinha conseguido passar por todos eles.
— Eu imaginei que Vossa Majestade estaria... agitado demais para dormir esta noite — respondeu a jovem, a voz doce e melodiosa talvez um pouco doce demais.
— De fato, meus pensamentos estão ganhando do cansaço, mas...
— Finalmente repensando sobre o que realmente significa o casamento de amanhã, talvez? — Mi Suk se aproximava devagar enquanto falava, os passos leves como os de um felino, os movimentos deliberadamente lentos.
— O que quer dizer? — perguntou Taeyang, confuso.
Para começar, ela não devia estar ali. Não havia qualquer honra para uma mulher ao se aproximar tanto dos aposentos de um homem, mesmo se esse homem fosse o rei da nação, e ele estava noivo ainda por cima. Estava para se casar na manhã seguinte. Com uma mulher que o deixava em completo estado de alerta e tensão, em um sentido deliciosamente bom, se ele tivesse que ser sincero.
Já Lee Mi Suk despertada nele um alerta diferente, uma desconfiança, como se ele fosse um antílope indefeso com uma leoa à espreita.
Taeyang encarou a nobre, os olhos buscando no rosto dela uma confirmação do perigo que ele sentia.
— Bem, talvez Vossa Majestade tenha decidido que esse casamento não é realmente de seu agrado e...
— Espere um pouco. — Taeyang a interrompeu, sacudindo a cabeça por um único segundo como se quisesse clarear os pensamentos. Afinal, ele estava nervoso, não surdo. — Está insinuando que eu não vou me casar amanhã?
Então Mi Suk tocou o braço dele e Taeyang sentiu um arrepio de nojo. Ele nunca imaginou que reagiria negativamente ao toque ou à aproximação de uma mulher, mas quando os dedos finos e brancos de Mi Suk tocaram seu braço, tudo o que ele sentiu foi repulsa, ao mesmo tempo em que uma imagem de Malaika sorrindo pulsava em sua cabeça.
Ele deu um passo para trás, para longe da nobre, mas ela falou como se nada tivesse acontecido, sua voz parecendo o ronronar de um gato:
— Talvez Vossa Majestade tenha decidido que prefere... uma modelo diferente como rainha...
— Sinto desapontá-la, senhorita Lee... ou melhor, na verdade não sinto nem um pouco, mas eu estou feliz com meu casamento amanhã pela manhã. Estou ansioso por ele, inclusive. — A voz de Taeyang, geralmente gentil, estava dura, quase ácida, e seu corpo tremia com a indignação pela mera insinuação de que Malaika não era boa o suficiente para ele.
— Talvez Vossa Majestade apenas precise provar...
— Eu vou ignorar o que acho que a senhorita está insinuando, pelo bem de sua dignidade e honra. Acredito que esteja na hora de a senhorita ir para casa. Seu pai deve estar esperando-a. — A sugestão pareceu uma ordem irrevogável saindo dos lábios do rei, a natureza altiva dele surgindo como em poucas vezes em sua vida, e, com um olhar, Taeyang encontrou seus guardas, sendo preciso apenas um gesto para que fosse livrado da presença da jovem.
4398 palavras
Conheça Imani Akunyili:
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