Capítulo 47
"Mesmo na parte mais sombria de mim.
tenho medo de dizer isso.
Ainda há uma luz que brilha
Abaixo cada passo ao longo do caminho”.
( Cut me- Chris Medina).
As férias de verão foram maravilhosas, a vida seguiu seu curso e eu já estava na expectativa de como seria meu último ano na escola.
O problema era que os textos que eu li no mural da escola e numa conta anônima do Instagram que me seguia mexiam comigo ainda. E eu me odiava por amar tanto os textos desse escritor que não conhecia.
O último texto do Coração de granada me deixou muito pensativa. Era um poema sobre um amor impossível. Eu como sou fã de Camilo Castelo Branco, entendi rápido a referência a aquela história de amor trágica.
Aquela conta seguiu o meu perfil “apenas uma garota” e alguns textos nossos pareciam sincronizados. Ele sempre curtia e comentava meus textos e eu fazia o mesmo com os dele.
Não sabia até quando a gente ficaria assim no anonimato ou porque eu gostava desse mistério sobre ele, pois nas poucas vezes que nos falamos por direct, ele me parecia ser um garoto bacana, e que dizia que sofria pela garota que ele amava e que estava longe dele.
Eu o encorajei a lutar por ela, e lhe dei dicas para testar se a menina ainda gostava dele. Quando o amor resiste ao tempo, ele é capaz de suportar qualquer coisa ou adversidade. Esse é o verdadeiro amor.
Nathan nem fazia ideia que eu tinha esse perfil de poesias e frases, não quis falar nada porque temia que ele não entendesse. Era melhor manter segredo por via das dúvidas, sei lá, apenas quis que aquilo fosse algo apenas meu.
Quando as aulas retornaram todo mundo estava agitado falando das férias escolares ou das viagens para aproveitar o carnaval.
Eu seguia com as minhas consultas a cada quinze dias na terapeuta, e Nathan ia comigo quando podia. E conseguia notícias da Cat porque Noah me mandava por Whatsapp porque ela ainda não tinha me desbloqueado.
Eu ainda sentia falta dela, sentia saudades da sua risada, da sua companhia, da sua amizade, e era duro saber que a gente estava na mesma sala, mas fazia questão de sentar longe de mim e não me dirigia a palavra. Eu esperava que antes da formatura a gente recuperasse o tempo perdido.
À medida que o primeiro trimestre ia terminando, todo mundo ficava maluco com as provas, os trocentos trabalhos, mas o pior de tudo era o trabalho de conclusão que seria apresentado para a banca. No meu curso a gente teria que levantar dados de uma empresa já existente e criar sugestões de melhorias para ela. Eu já tava pirando com meu grupo, que não incluía a Cat claro, ela preferiu fazer com outras pessoas.
As meninas eram devagar demais para seguir os meus cronogramas de datas e eu não queria atrasar nenhuma entrega de material para nossa orientadora. O que me fez discutir com elas algumas vezes. Perdi as contas de quantas vezes surtei com elas por deixarem tudo para a última hora. Elas disseram que eu era certinha demais e muito controladora, mas não liguei, só queria que tudo desse certo, acaso estava errada?
Estava absorta olhando as anotações em vermelho da orientadora quando meu namorado apareceu e se sentiu ao meu lado na mesa do refeitório.
— Tudo bem aí?
— Ah, desculpa. Tenho tanta coisa pra alterar no TCC que nem te vi chegar.
— Tá muito tensa, não quer relaxar depois?
— Bem que queria me divertir com você. Mas não posso hoje. Tenho que me dedicar ao trabalho. Se depender delas estou ferrada. Tenho que ajustar esses gráficos da pesquisa de campo.
— Eu posso te ajudar se quiser.
— Você não tá enlouquecendo com o seu?
— O meu é mais difícil que o seu, eu tenho que criar uma empresa do zero e não posso errar em nada, nem na estrutura, nem nas contas. Não que esteja diminuindo o grau do seu, mas você me entende. Então como meu grupo adiantou muita coisa, estou tranquilo. Já fizemos os ajustes que o orientador pediu
— Que sorte a sua! Queria eu não me sentir tão sobrecarregada.
— Por isso mesmo você precisa de ajuda. Posso te auxiliar pra terminar mais rápido. O que precisa? — ele colocou a mão dele sobre a minha.
— Além das alterações no texto, preciso melhorar as propostas de melhoria. Tenho que criar o logo pra loja porque ainda não tem e não sou tão boa em design assim.
— Eu fiz curso de web designer e sei mexer um pouco no Photoshop. Posso tentar fazer alguma coisa se quiser tentar.
— Sério, não sei porque não te conheci antes. Você é o cara mais incrível do mundo. — dei um beijo no rosto dele, e ele me roubou um selinho.
— Tá doido? E se nos pegam aqui?
— Não ligo de ir pra diretoria se for porque demonstro amor por quem gosto.
— Você é muito fofo. — ele me ajudou a guardar meus cadernos e meu trabalho na pasta amarela. E fomos embora juntos.
— Tá tranquilo pra enfrentar as provas agrupadas em breve? Tô tão maluca que não sei como vai ser. Acho que o estresse com o trabalho tá acabando comigo. É muita pressão. A professora é bem exigente e não admite erros. Também não sei como vai ser apresentação da banca.
— Você vai se sair bem, acredito nisso. Quanto a mim, bom, estou um pouco preocupado porque não sou muito bom em história e filosofia, mas fora isso tô de boa.
— Eu te ajudo a estudar se quiser.
— Será que consigo estudar com uma namorada assim tão gata ao meu lado? Difícil me concentrar. — ele me abraçou.
— Faz um esforço. E como vai me ajudar com meu trabalho, é justo que te ajude a estudar.
— Está bem, vou amar ter mais um pretexto pra passar um tempo com você, minha linda.
Fomos na sorveteria depois do colégio e tomamos um Sunday de chocolate. Estar com ele era sempre muito bom. Ele era paz, calmaria e amor.
Por causa da correria com os estudos, tivemos que dar um tempo das festas porque esse ano seria mais corrido, mais difícil, a coisa ia apertar. Ainda mais com um trabalho de peso que valia nota pra muitas matérias técnicas.
A nossa vida passou a ser escola e casa e vice-versa. Algumas vezes ainda demos escapadas para o cinema, museu, parques e livrarias aos fins de semana, mas nada além disso.
Isso me deixou agoniada e me senti com vontade de beber pra aliviar a minha pressão. Passei a fazer isso escondida, consumindo os vinhos e cerveja da minha mãe quando ela não estava em casa.
Eu acreditava que era só para me distrair do estresse e inicialmente era algo esporádico, mas de repente, não sei em que momento se tornou uma necessidade e quando não bebia me sentia nervosa e ansiosa.
Quando surgia algum feriado a gente ia para o boliche ou para o karaokê, e no Tokyo eu me esbaldei. Várias vezes saí de lá carregada pelo meu namorado e numa dessas vezes levei um belo esporro da minha antiga melhor amiga.
Ela me acompanhou até em casa porque Nathan precisou ir embora mais cedo porque seu irmão teve uma crise e precisava dele.
Cat me ajudou a descer as escadas e me jogou debaixo do chuveiro com roupa e tudo. O que me deixou furiosa naquele dia.
"O que deu em você? Por que está fazendo isso? Quando Noah me contou o que estava fazendo nesses encontros no karaokê não acreditei, precisei ver com meus olhos."
"Por que quer me dar lição de moral? Você não liga pra mim".
" Não? E o que estou fazendo aqui, merda? Tenho medo que você sofra se continuar assim. Não percebe que tá viciada em álcool?"
" Tá viajando! Eu só bebo pra me divertir"
" Você tá muito diferente da minha melhor amiga. Nunca pensei em te ver assim com essas roupas e nesse estado."
" Só porque tô usando decote? Pareço vadia?"
" Tá sendo uma porque não percebeu que tá acabando com você mesma. Garotas que bebem são um prato cheio pra abusadores, tonta".
" Nenhum cara vai chegar perto de mim, Nathan não vai deixar".
" Ele é seu guarda-costas, não é? Mas não liga pros sentimentos dele, sua egoísta. Ele sofre em te ver assim, só não fala nada".
"Você tá um pé no saco, hein? Há meses não fala comigo e quando volta a me dirigir a palavra é pra me detonar".
" Cacete! Falo isso porque sou uma idiota, mas me preocupo com você. Já vi que não dá pra conversar até você ficar sóbria. Toma o banho aí que vou fazer um café bem forte".
Com muito esforço eu saí do banheiro enrolada na toalha e tropecei até chegar no quarto. Tomei o café que ela fez pra mim e me deitei pra dormir depois que ela saiu. Minha mãe tinha ido pra um show de um cantor que ela gostava e quando retornou pude ouvir as duas conversando porque meu quarto ficava perto da escada.
Quando minha mãe veio me ver estava uma fera comigo. Desceu a lenha e puxou minha orelha.
"Quando você disse que poderia me decepcionar, não imaginei que chegaria a tanto. Você usou meu dinheiro pra comprar bebida escondido no bar dizendo que era pra mim, fiquei sabendo pelo seu Gumercindo. As suas roupas fedem a bebida pesada. Eu não pensei que se afundaria assim".
" Não posso me divertir? A senhora pode né? Que chatice!"
" Eu te amo, Estela. Mas odeio te ver assim. Quando você bebe fica fora de si. Não sabe beber pra socializar só, você bebe por outros motivos, é uma fuga e isso é perigoso. Tem que falar isso pra sua terapeuta".
" Droga! São duas da manhã e você está enchendo minha cabeça com sermões. Tô cansada. Quero voltar a dormir".
Minha mãe encheu os olhos de lágrimas, mas não disse mais nada. Saiu do quarto e bateu a porta com tudo.
Chorei por saber que eu a magoei naquele dia, mas era verdade que eu ainda era uma garota quebrada em mil pedaços e não sabia quando iria me recuperar. Deveria me sentir bem e feliz, mas não foi assim. As minhas emoções continuavam oscilando, e as compulsões queriam me dominar nos momentos de alto estresse.
A porcaria da ansiedade estava fora de controle de novo.
Nathan percebeu que eu precisava me desligar e eu não queria que ele me visse vomitar de novo, como já aconteceu outras vezes. Apesar de estar bem bêbada naquela noite, eu me lembrava das palavras da Cat e imaginei que ele merecia um tempo comigo longe de preocupações.
A mãe dele alugou um sítio em São Roque por uns dias para espairecer e foi uma ótima forma de eu também descansar. Fui com ele para esse lugar e me permiti recarregar as minhas baterias no interior de São Paulo.
O ar puro, os cavalos, a quadra de esportes, a piscina, a sala de jogos, e a natureza me fizeram muito bem naquele fim de semana. Até minha mãe foi conosco porque a chefe dela lhe deu folga, já que estava doente e queria ficar sozinha em casa.
O outono estava terminando, mas deu pra aproveitar bastante esses dias longe da loucura da cidade grande.
Era o que eu precisava pra me acalmar.
E naqueles dias eu não senti tanta vontade de beber. Foi aí que entendi que realmente a minha necessidade de beber estava ligada a alguma emoção forte, algum gatilho talvez e pra resolver isso segui o conselho da minha mãe sobre a importância de investigar pra entender a raiz daquilo, não podia ter quinze anos e já estar viciada em álcool, ou podia?
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