Capítulo 46
Estou perdido, sei que estou.
Cego para assuntos banais.
Problemas do cotidiano.
Eu já não sei como resolver”.
( Leve desespero – Capital Inicial).
Nathan se entregou enquanto cantava um dos sucessos que mais gostava do Capital Inicial, a “Leve desespero”, e era como se a canção refletisse as nossas vidas porque ambos vivemos em desesperos longe da curtição, ele tem seus fardos e eu tenho os meus, então distrações nos ajudam a aguentar para seguir em frente mesmo quando estamos quebrados por dentro em mil pedaços.
A voz afinada e aveludada dele atraiu a atenção de outras pessoas que começaram a gravar a sua performance que era excepcional, ele levava jeito pra cantar e sabia disso, não era à toa que quando a coisa apertava ele fazia bico de cantor em alguns barzinhos na cidade.
Ele foi elogiado por mim e aplaudido por muitas pessoas no karaokê. Curtimos abraçados as músicas que nossos colegas escolheram como Losing My Religion do REM com a versão da banda Lacuna Coil, e canções de Within Temptation, já que a galera ali mandava muito bem no inglês, a maioria fazia cursinho já a bastante tempo. Nós preferimos as nacionais e até músicas emo Nathan cantou como Minha estrela do Restart, o que me deixou completamente desarmada, tímida por ver que ele se declarou através da música.
Quando ele cantou o refrão me senti flutuar, foi único, fez meu coração acelerar, não esperava por algo assim. Foi lindo, inesquecível.
“Eu te amo, eu te quero.
Como uma estrela, que fez não se apagar em mim.
O amor me pegou, guardo no meu peito o que só me
faz querer sorrir com você”
Ele cantava olhando fixamente nos meus olhos iguais naquela série adolescente da Disney “Sou Luna” em que o Matteo cantou pra Luna e a deixou apaixonada por ele. Naquele momento ele era meu Matteo, e aquilo foi maravilhoso, era como um sonho. Ele merecia mais de mim e eu queria entregar, alguma coisa me impedia, ainda assim sentia que devia tentar deixar meu coração se abrir para ele.
— Ficou claro o quanto você é especial pra mim? Eu te amo, Estela. Aceita ser minha namorada? — todo mundo assoviava de animação e gritavam para eu aceitar. Não podia fazer ele passar vergonha, então aceitei.
— Sim! Você me fez reviver, me faz feliz. — e sem esperar eu o beijei, e ele segurou minha nuca e me apertou contra seu peito. Ele aprofundou o beijo como se tivesse ganhado o presente mais esperado da sua vida.
Só paramos de nos beijar quando percebemos que precisávamos respirar e viramos a sensação do local. Embora eu estivesse um pouco insegura com tudo que aconteceu, no fundo sabia que ele merecia essa oportunidade de me conquistar pra valer, ninguém melhor que ele me conhecia tão bem, e agora era esperar que esse namoro desse certo.
Aceitar o pedido de namoro de Nathan durante sua declaração na última vez que estivemos no Karaokê foi um grande impulso, mas eu não podia deixar ele passar vergonha na frente de todo mundo, e também achei que devia dar a ele uma chance de me fazer amá-lo mesmo pra valer. Ele era um cara incrível, uma das melhores pessoas que eu conhecia.
Eu dei a mim mesma a chance de recomeçar ao seu lado, e acreditei que a gente se daria muito bem tanto quanto tinha sido até aquele momento.
Na escola ele me buscava para passar comigo o intervalo, e ficava sempre abraçado ou me deixava deitar minha cabeça em seu colo e ficava fazendo carinho em meus cabelos.
Eu sentia que as meninas me olhavam com desdém, mas não me importava, já tinha passado dessa fase de ficar me preocupando com o que pensavam ou não ao meu respeito.
Algumas vezes quando havia a semana de exposição de textos no mural do pátio eu encontrava versos que acreditava que eram escritos por ele, e ficava apaixonada pelo que lia.
Outras vezes ele levava o violão e cantava pra mim no dia que a escola permitia música no intervalo, e ficávamos na área externa da escola aproveitando esses momentos. Monica, Juliana, e Matheus também amavam ouvir meu namorado cantar e faziam questão de gravar isso em vídeos.
Nas redes sociais diziam que eu era sortuda, que meu namorado era perfeito, e eu tinha que ser grata por isso. E de algum modo essas pessoas estavam certas, pois ele era maravilhoso.
Algumas vezes ele ia a festas comigo e eu acabava bebendo demais, exagerava mesmo nas doses de todo tipo de bebida que conseguiam trazer e ele tinha que me carregar porque eu tropeçava nas próprias pernas, outras vezes já fiquei solta demais e ele teve que intervir para me defender de garotos saidinhos demais, aproveitadores. E quando me contava isso eu tinha receio de acabar fazendo uma besteira e estragar o nosso lance.
Ele era muito paciente comigo e nunca me cobrava nada, parecia que se satisfazia por apenas estar ao meu lado.
Ele não reclamava pelo que acontecia, ou pelo menos eu não percebia. Muitas vezes já me deu banho e me ajudou quando tinha ressaca e acabava vomitando.
O dia seguinte à bebedeira era terrível, eu me sentia péssima e minha mãe me dava muito sermão se me encontrava passando mal. A verdade é que o álcool antes era só algo para tirar a minha timidez, mas não sei em que momento ele virou a necessidade, e também não sabia como compreender o que estava acontecendo e se estava fora de controle.
Eu me tornei tão diferente de quem eu era que não me reconhecia mais. Nathan era um namorado perfeito e me fazia muito bem, e aguentou bem os meus momentos caóticos e de impulsos por causa do meu transtorno.
Ele sabia aproveitar meus dias de animação e também se manteve ao meu lado nos dias tempestuosos até que me acalmasse.
Quando chegou o fim de setembro, o meu aniversário de quinze anos veio com ele, e não é que o garoto me fez uma bela surpresa? Me enganou direitinho me fazendo pensar que a roupa e o penteado eram apenas para um jantar especial, e no fim das contas ele fez uma festa surpresa de debutante para mim, e foi o meu príncipe. Quando eu ia sonhar em ter algo assim?
Eu usei um vestido lindo azul Tiffany de cetim e ele um smoking que o deixou um perfeito cavalheiro. O salão cabia em torno de cinquenta pessoas, o piso era bege e brilhoso e era todo branco e luminoso. Eu fui vendada até lá, então só descobri o que era quando tiraram a minha venda e aí me emocionei. Nunca ninguém tinha feito algo tão incrível pra mim.
Ali só tinha as pessoas mais achegadas e o local estava lindamente decorado com tons rosa bebê e dourado.
Dançamos valsa juntos e ele se declarou, foi lindo e eu no embalo também disse umas lindas palavras para ele. Foi um sonho realizado, uma noite perfeita.
Minha mãe estava lá juntamente com a mãe dele e outras pessoas conhecidas. Fiquei muito emocionada com o discurso dela, nunca vou me esquecer das suas palavras.
Já na escola, cada vez que topava com Caio meu coração ainda batia descompassado e eu o odiava por isso. Como um coração pode ser tão idiota assim? Por que ele insiste em sofrer? Porque ele é tão masoquista? Eu gostaria que meu primeiro amor tivesse sido o Nathan, seria muito mais fácil.
Caio e Nathan se enfrentaram algumas vezes quando estávamos no Karaokê e em algumas festas quando ele estava alterado por causa do álcool. Ele dizia que me amava e ia lutar para me reconquistar, isso deixava meu namorado furioso. Ele não era de se estressar fácil, mas Caio provocava demais. E isso dificultava as coisas.
Caio vivia cantando músicas que tinham a ver com o que a gente viveu, ele fazia questão de olhar para mim quando nos encontrava no karaokê, isso deixava Nathan maluco. Ele achava que o garoto estava sendo muito desaforado.
E isso não foi o pior, pois no colégio houve problemas também, assim que as aulas retornaram, os alunos do Grêmio e do jornal fizeram uma matéria falando sobre o colégio a negligência com relação ao assunto do bullying, e isso deixou a diretoria enfurecida, a ponto de censurarem o jornal.
Por causa disso Catarina e outros integrantes fizeram um protesto em frente a escola para que o jornal voltasse a ser como antes. As matérias eram vistas na internet, portanto toda cidade podia ter acesso, e parece que a matéria em questão chamou a atenção de superiores responsáveis pelo colégio, e para manter anos de tradição e reputação ilibada queriam censurar o que seria publicado de agora em diante, mas os alunos não aceitaram e houve um rebuliço tamanho que foram obrigados a mudar algumas coisas no colégio.
Palestras sobre bullying começaram a ser feitas, e eu me assustei com o tanto de mãos que se ergueram durante uma palestra sobre ansiedade e depressão, pelo visto não era só eu que tinha meus problemas. Muita gente que nem desconfiava, também enfrentava seus demônios e mascarava isso.
Ao menos a conscientização começou a ser feita não apenas com palestras dentro e fora do setembro amarelo, mas também fizeram peças teatrais e discutiram filmes, séries e livros sobre esses assuntos. Essa discussão foi muito benéfica e me orgulhei porque Catarina tinha sido a chama dessa revolução. Ela cumpriu o que me prometeu.
Queria que a diretoria revelasse quem foi o culpado do que houve comigo, e eles disseram que o assunto foi resolvido e o aluno foi punido, mas se reservaram ao direito de não revelar para evitar que o aluno sofresse um tipo de cancelamento ou linchamento.
Isso me deixou com raiva, e quando descobri isso por colegas que Nathan tem dentro do Grêmio, tive uma crise forte que me deixou um dia todo nervosa e chorando. Naquele dia comi uma caixa de bombom sozinha.
A comida era uma das minhas compulsões e ela se mostrava uma boa fuga para frustrações. Apesar disso, o restante do ano correu bem e mantive minhas notas como aluna regular, de uma das melhores da classe, agora eu era assim mediana, fazer o quê? Não se pode ter tudo.
No natal fomos para Ilha Bela, litoral de Santos, um dos lugares mais lindos com praias encantadoras com rochas e água bem transparente.
Eu e mamãe aproveitamos uma ceia natalina animada e feliz com a família de Nathan, como há muito tempo a gente não tinha mais.
Fizemos um amigo secreto, comemos o Peru da minha mãezinha, tomamos bastante champanhe e outras coisas, e Nathan e eu demos uma fugidinha pra ver os fogos na praia.
"Estela, os últimos meses foram maravilhosos na minha vida. Só tenho a agradecer porque você me fez feliz. Eu te amo".
Ele deu um beijo na minha testa, me abraçou contra seu peito e eu fiquei ali ouvindo os fogos no céu ao mesmo tempo em que ouvia as batidas do seu coração.
Eu queria tanto dizer que também o amava na mesma intensidade que ele demonstrava me amar, era fácil fazer declarações escritas, mas olhar em seus olhos esverdeados desejosos pelo meu amor, era bem difícil ser sincera como gostaria. Isso apertava meu coração, queria eu poder mandar nele.
Queria eu não sofrer cada vez que via Caio beijando outra garota só pra me provocar, ou quando ele dava a entender que sentia algo por mim, e ao mesmo tempo parecia brincar com meus sentimentos, por que o nosso coração não pode se apaixonar por pessoas descomplicadas?
Nathan era tão simples, tão sincero, tão meigo, amável e leal, o namorado mais carinhoso, atencioso e companheiro. Qualquer um no lugar dele não aguentaria lidar com as minhas nuances. Estava sempre em busca de adrenalina, de me divertir como se estivesse fugindo de algo obscuro dentro de mim.
Em algum lugar dentro de mim eu sabia que gostava muito de Nathan, se não fosse assim a gente não teria uma conexão tão forte como temos, mas como eu poderia manter uma relação apenas por conveniência, seria justo? Eram essas perguntas que gritavam em meu coração enquanto a gente assistia o sol nascer na praia após a festa de réveillon.
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