2 ◦ A 5º Chama
EAÊ, PUNKERS?!
Pessoal, obrigada de verdade por estarem dando atenção a esta fic. Como eu já disse antes, ela é um plot antiguérrimo (talvez o meu primeiro plot com o BTS), então escrevê-la está sendo particularmente especial para mim. Espero conseguir envolver vocês com a história desses novos Jikooks, e com as tramas dos romances secundários (um dos casais ainda é segredo, haha).
Para ser bem concisa nestas notas iniciais (porque já demorei demais para trazer esta att), vou apresentar a vocês algo importante para entender algumas piadinhas deste capítulo: Já ouviram falar de GREASE? É um musical, tipo High School Musical, lá do final da década de 70 que fez muito sucesso e marcou o cinema. Nele, os personagens usam roupas bem memoráveis, como essas vestidas pelo ator John Travolta:
Agora que já estão cientes do básico, saibam também que: O cap tem umas 7K palavras, não é nem pequeno e nem grande demais, é leve e ㅡ TANTANTANTAAAM ㅡ os Jikook vão se encontrar pela primeira vez!
Não se esqueça de deixar o seu ⭐VOTO⭐, por favor💜 Comentários são sempre bem-vindos, agradeço desde já por todos eles! Escute a playlist e entre na vibe dos anos 80 (o link está no meu mural). BOA LEITURA, GOSTOSOS!!
#MariposaPunk
[ 2 ◦ A 5º Chama ]
ㅡ Ah, o garotão voltou! ㅡ disse a entidade meio-humana, meio-mariposa, sentada na poltrona do quarto do hotel em que acordei naquela manhã, tomando um café quente numa xícara elegante enquanto me lançava um sorriso debochado.
Depois que saí correndo e me deparei com uma Sant'Angela versão "anos 80", e o imenso telão anunciando que haveria um show do Arrebol ㅡ minha banda preferida que tecnicamente deveria estar morta ㅡ, dei meia-volta e retornei ao quarto onde aquela loucura começou.
Um pouco hesitante, andei até a cama e me sentei na extremidade do colchão. Franzindo o cenho, encarei o meu estranho visitante e o analisei de cima a baixo. Ele parecia ser uma pessoa normal, exceto pelas suas roupas chamativas dignas do RuPaul's Drag Race.
ㅡ Você é realmente uma mariposa? ㅡ Foi a primeira pergunta que saiu pela minha boca. Eu ainda estava chocado.
Jin pousou a xícara na mesinha ao lado da poltrona e descansou a cabeça sobre um punho fechado.
ㅡ Sim e não. ㅡ Ele respondeu. ㅡ Já ouviu falar sobre mariposas serem espíritos? Digamos que essa crença popular tem um fundo de verdade... Eu sou seu guia espiritual, ou seja, sou um fantasma. Os vivos me veem apenas como uma mera mariposa, mas você pode me ver tanto de um jeito quanto de outro porque estamos na mesma sintonia.
ㅡ E-então realmente... estou morto? ㅡ Senti minhas mãos ficando frias de horror.
ㅡ É. Tecnicamente, você está mortinho da silva. ㅡ Jin me olhou com pena por dois segundos, antes de voltar a saborear seu café com um sorriso. Nestes entrementes, algum pensamento deve tê-lo atravessado a mente, porque, logo em seguida, ele arregalou os olhos, soltou a xícara e estalou os dedos na minha direção. ㅡ Aliás, que bom que tocou no assunto, garotão! Fique em pé.
ㅡ Oi?
ㅡ "Oi" nada. Fique em pé e olhe para mim.
Eu obedeci, porque não se desobedece às pessoas que se transformam em insetos voadores.
ㅡ Ótimo. ㅡ Jin cruzou as pernas e me avaliou. ㅡ Agora é a sua vez de se tornar uma mariposa. Vamos, pense em asas e dê um pulo.
Eu pisquei e ri de desespero.
ㅡ Você está de brincadeira com a minha cara?
ㅡ Não ouviu o que eu acabei de dizer? Os espíritos se manifestam no mundo dos vivos como mariposas. Você tecnicamente está morto, então essa sua forma humana não é permanente. Ela só vai durar algumas poucas horas do dia na Terra para que consiga fazer mudanças na realidade que lhe cerca.
"Mas que porra?", pensei, aflito.
ㅡ E-espera aí, você não me contou sobre essa última parte! Eu tenho um tempo limite por dia, é isso? Depois que ele acaba, eu automaticamente viro um inseto!?
ㅡ Isso, garotão, você é inteligente. ㅡ Jin não parecia ligar para o fato de que eu poderia ter uma síncope em sua frente a qualquer instante. ㅡ Vamos, vamos, não temos todo o tempo do mundo. Faça o que eu disse e vire logo uma mariposa. Ainda preciso te mostrar algumas coisas antes de bater o meu ponto no RH celestial.
Aquilo não podia ser real... Como diabos eu iria me transformar num inseto? Jin agiu como se fazer algo assim fosse a coisa mais normal do mundo, mas eu nem sabia direito por onde começar!
"Está bem, pense em asas e dê um pulo. Asas e pulos...", tentei uma vez, então duas vezes, até que fechei os olhos e escutei aplausos de Jin, seguidos por sua voz.
ㅡ Ah, que gracinha. Viu? Você conseguiu.
Pensei que ele estivesse debochando de mim, porque nada senti de diferente; mas, quando voltei a enxergar, reparei que os meus pés não estavam mais no chão, pois não havia pés, nem mãos, nem pernas e braços humanos, e, quando direcionei a minha visão para trás, vi asas membranosas batendo freneticamente, mantendo o meu novo corpo ㅡ uma coisinha pequena da cor de um vermelho escuro ㅡ flutuando no ar.
Foi o meu segundo grito do dia, mas, desta vez, não havia uma boca em mim para que eu vocalizasse o som do meu desespero. Senti como se estivesse gritando dentro de minha mente ainda humana.
ㅡ Aconselho a usar essa forma quando você precisar procurar por informações em locais que não puder acessar enquanto estiver no corpo normal. É bem útil para descobrir fofocas, segredos... ㅡ Jin piscou um olho para mim. ㅡ Saber o que as pessoas ao seu redor, principalmente os integrantes do Arrebol, irão fazer a seguir, vai te ajudar a cumprir a sua missão de salvamento.
"Certo, agora devolve o meu corpo!", gritei mentalmente, esperando que ele pudesse me ouvir de alguma forma.
Para o meu alívio, Jin era capaz de me escutar.
ㅡ Relaxa, garotão. Segura um pouco essa forma, porque eu quero ir a um lugar com você.
Ele estalou dois dedos e seu corpo se dissipou como poeira translúcida, restando apenas uma bela mariposa grande e verde no lugar.
"Vem comigo", a voz de Jin penetrou a minha cabeça. Eu o segui janela afora, batendo as minhas asas ridículas sem saber direito como o meu corpo miúdo estava fazendo isso.
Atravessar o céu de Sant'Angela foi a experiência mais louca da minha vida ㅡ ou semi-vida ㅡ, depois, é claro, de ter morrido e revivido quase quarenta anos antes.
De início, eu me desesperei com a altura do voo, pois tínhamos acabado de sair do quarto do hotel, localizado num dos andares superiores do prédio. Estávamos a dezenas de metros do chão. As coisas lá embaixo pareciam pequenas e distantes, e eu conseguia ver tudo num horizonte infinito, já que, naquele ano, a cidade ainda não era infestada por edifícios gigantes.
Depois de alguns minutos, permiti-me relaxar e aproveitar o passeio, porque, afinal, eu era um morto-vivo. Nada poderia ser mais absurdo do que isso.
"Aonde estamos indo!?", perguntei, tentando me manter ao lado de Jin no meio do ar. Bater asas membranosas exigia uma mecânica peculiar. Eu agora era um piloto sem avião.
"Para o show desta noite. Você precisa se encontrar com o Arrebol", respondeu ele, em minha mente.
"Show!?", se aquele corpo de inseto tivesse um coração, ele teria dado um giro dentro do meu peito. No lugar disso, eu rodopiei no ar, feliz da vida. "Arrebol fará um show hoje? O próprio Arrebol?! Ao vivo e em cores?!"
"Você viu o anúncio nos telões pela cidade mais cedo, não viu? Por isso, estamos nos dirigindo ao estádio Saint."
"Cara, não acredito!", rodopiei outra vez, repleto de ansiedade.
Ver o Arrebol pessoalmente, e não por meio de gravações antigas que não faziam jus às performances da banda, era a realização dos meus sonhos. O fã dentro de mim, aquela parte que ocupava 80% da minha alma, queria gritar e pular e abraçar alguém com muita força. Se as mariposas chorassem, eu estaria jorrando rios de lágrimas.
Após mais alguns minutos de voo, avistamos uma fila imensa de pessoas ao redor do que, naquela década, tinha o título de maior estádio da cidade.
Saint, de fato, era enorme, e comportava pouco mais de sessenta mil pessoas. Poucos artistas conseguiam lotar tantos assentos nesse tempo, e Arrebol era um deles.
Jin e eu flutuamos para o interior da imensa redoma, e pousamos no alto de uma fileira da arquibancada. Lá embaixo, as pessoas entravam e tomavam os seus lugares rapidamente. O palco estava montado na extremidade norte, com os locais de cada integrante da banda devidamente colocados. Nos telões, brilhava o símbolo clássico do Arrebol: Uma caveira arroxeada com caninos invertidos, feito dentes de um demônio, e quatro chamas no topo do crânio, cada uma representando um membro do grupo.
Sem perceber, voltei à minha forma humana. Acho que foi a emoção de saber que dali a poucos minutos eu iria ver os meus ídolos supremos. Ainda bem que não havia ninguém por perto para testemunhar isso, e todos estavam bastante ocupados encarando o palco, ansiando pela maior aparição da noite.
Ao meu lado, Jin também se transformou e escolheu um assento livre para se sentar. Depois de se acomodar, cruzando as pernas longas, ele disse:
ㅡ Antes de o show começar, vou passar algumas informações essenciais para você, garotão. Preste atenção. ㅡ Ele apontou para o assento ao seu lado, convidando-me. Sentei-me lá e tentei me concentrar nas suas palavras seguintes: ㅡ Você terá doze horas por dia para usar a forma humana, entendeu? Doze horas. Metade de um dia. Poderá aproveitar essas horas da maneira que quiser, não precisa usá-las consecutivamente, mas fique atento ao limite.
ㅡ Como vou saber que o meu tempo está acabando? Preciso ficar contando por conta própria ou algum sinal vai aparecer?
ㅡ Olhe o seu pulso esquerdo.
Fiz o que foi dito e me deparei com um relógio brilhando sutilmente na superfície da minha pele. Marcava 11:30 horas, e esse tempo estava diminuindo, como num temporizador.
ㅡ Entendi ㅡ falei, arregalando os olhos. ㅡ Preciso esconder isso, não é?
ㅡ Não. Assim como você só é ouvido por mim enquanto está na forma de mariposa, esse relógio também não será visto por humanos normais. E sobre os humanos normais, há algo importante... ㅡ Ele apontou um dedo indicador para o meu rosto. ㅡ Jamais se transforme na frente de alguém. Isso pode trazer problemas para você e causar um caos desnecessário, o que seria uma péssima mancha no meu relatório.
ㅡ Certo. ㅡ Franzi o cenho e balancei a cabeça, internalizando aquela regra. Eu teria que tomar muito cuidado. ㅡ Você disse que preciso me encontrar com a banda. Significa que ficarei ao lado deles daqui por diante?
ㅡ Sim. Manter-se próximo aos rapazes do Arrebol é a forma mais eficaz de impedir uma tragédia ao redor deles, não acha?
ㅡ Tem razão. ㅡ Engoli em seco e tentei reprimir um sorriso abobalhado ao pensar em passar os meus dias, pelos próximos meses, ao lado de Hoseok, Namjoon, Jungkook e, o meu integrante favorito ㅡ o maior baixista e compositor de todos os tempos ㅡ, Taehyung.
Eu realmente morri e devo ter vindo ao Paraíso.
ㅡ Como vou me aproximar deles? ㅡ perguntei, ansioso. ㅡ Pelo que sei, a banda tinha uma segurança muito boa durante os shows e quando aparecia ao público. Além do mais, não posso simplesmente tentar atravessar a grade que nos separa do palco e pular em cima deles gritando "Oi! Eu vim do futuro para impedir que a banda acabe tragicamente, então me aceitem do lado de vocês, uhul!".
ㅡ Sei, sei, já sei. ㅡ Jin abanou a mão direita na minha direção. ㅡ Para começar, faz parte da sua obrigação manter-se ao lado daqueles rapazes. ㅡ Ele apontou para o telão, que agora transmitia fotos dos membros do Arrebol. ㅡ Mas, tenho o dever de te ajudar no início. Hoje, por exemplo, estou pensando em colocá-lo como um dos staffs novatos. O que me diz?
ㅡ E-eu acho que é uma boa ideia... ㅡ Fiquei tão emocionado com a sugestão que o meu cérebro levou um instante para começar a trabalhar. ㅡ Espere. Não, staff não. Eles não gostam de ter muitos staffs por perto, só alguns específicos que conhecem a banda há anos.
ㅡ Sério? Que chatisse. ㅡ Jin afundou em seu assento.
ㅡ Foi uma medida do líder da banda, Namjoon, para evitar que alguém vazasse o que andava acontecendo nos bastidores. Ou, mais especificamente, que espalhassem por aí rumores sobre discussões envolvendo o vocalista. ㅡ Inclinei-me na poltrona da arquibancada e entrelacei as mãos na frente do meu rosto. ㅡ Em 83 eles processaram uma galera da equipe enviada pela gravadora por causa disso. Se eu aparecer como um staff que veio do nada, acho que não vão confiar em mim.
Jin me observou pelo canto do olho e sorriu.
ㅡ Estou entendendo o motivo de você ter sido escolhido para esta missão. Parece saber coisas muito específicas sobre aqueles rapazes.
Eu ruborizei.
ㅡ Se me der corda, posso falar deles o dia inteiro.
ㅡ Então não vou dar corda.
ㅡ Ah...
Jin soltou uma risada e deu tapinhas no topo da minha cabeça.
ㅡ Por enquanto, transformá-lo num funcionário da banda é tudo o que posso fazer para te ajudar. O resto é da sua conta.
ㅡ Certo... ㅡ Engoli em seco e voltei a encarar o palco vazio.
As palavras de Jin de repente começaram a balançar minha mente.
ㅡ Jin ㅡ eu o chamei ㅡ, isso acontece muito pelo mundo?
ㅡ Do que está falando?
ㅡ Sobre esse lance de reencarnação, de alterar a história e salvar a vida de pessoas. É tudo tão surreal... ㅡ Eu pisquei e respirei fundo. ㅡ E quanto à princesa Diana e aos Mamonas Assassinas, por exemplo? Essa galera também morreu em acidentes que poderiam ter sido evitados. Eles não vão receber uma segunda chance assim como o Arrebol?
ㅡ Ah, os questionamentos... ㅡ Jin materializou um milkshake numa de suas mãos e relaxou no assento enquanto saboreava a bebida. ㅡ Olha, garotão, eu não posso te falar muito, mas saiba que algumas coisas devem acontecer e outras não. Algumas acontecem antes da hora, e outras, na hora exata. Quem decide isso? Não sei, eu teria que perguntar para o meu chefe supremo.
ㅡ Para... Deus? ㅡ Contraí os olhos, perplexo.
ㅡ Deus, Alá, Brahma, Olorum... Enfim, muito ocupado, então, sem chance. ㅡ Jin tomou um pouco de seu milkshake, antes de continuar a explicação bizarra: ㅡ De qualquer forma, o que você pode saber, Jimin Park, é que alguns recebem ajuda sim, você só não sabe disso porque, enquanto andava por aí na sua vida pacata, via apenas o resultado já concretizado.
Virei-me para encarar o chão.
ㅡ Acho que entendi...
ㅡ Hm, quase me esqueci! ㅡ Ele estalou os dedos na frente do meu rosto. ㅡ Nem pense em tentar alterar o futuro de outras pessoas que não estejam envolvidas com o fim do Arrebol, ouviu bem? O destino delas não é da sua conta. Se modificá-lo, pode causar estragos que definitivamente não deveriam existir. Mortes são tristes, mas algumas delas provocam marcas profundas extremamente necessárias.
Internalizei mais aquela regra em meu cérebro.
ㅡ Então... Eu ter morrido depois de cair daquela ponte realmente estava no meu destino? Deveria ter acontecido em qualquer hipótese? ㅡ Estremeci com a morbidez da ideia.
ㅡ Isso aí, docinho! 22 anos é oficialmente o seu tempo limite. ㅡ Jin deu um tapinha na minha bochecha. Nada parecia abalá-lo, devia estar bastante acostumado a lidar com mortes e almas vagando por aí. ㅡ Mas veja pelo lado bom!
ㅡ Eu deveria achar um lado bom nisso? ㅡ Abri um sorriso amarelo.
ㅡ Claro! Por exemplo, olhe onde estamos. Este é um evento que você jamais poderia ter presenciado em sua vida anterior.
Ele se levantou, fez o milkshake desaparecer no ar e pôs as mãos na cintura ㅡ balançando-se o bastante para que cada brilho de sua roupa reluzisse.
ㅡ Agora... ㅡ Jin encarou o palco com um semblante impaciente. ㅡ Por que esse show está demorando tanto assim para começar?!
Franzi o cenho e observei o cenário. O céu já estava escurecendo, o palco parecia totalmente pronto e todo o estádio se via lotado de espectadores ansiosos pelo início do show. Mas não havia sinal do Arrebol.
Foi quando o meu lado fanboy trabalhou outra vez.
ㅡ Ah, merda. Viemos aqui para nada... ㅡ murmurei, murchando. ㅡ Eles não vão aparecer.
Jin piscou perplexo para mim.
ㅡ O quê? Como não? É o show deles!
Encolhi-me ainda mais no assento.
ㅡ Sim, e o que aconteceu foi uma das maiores decepções de 1984. Pelo que me lembro dos documentários que vi, eles cancelaram o show em cima da hora. Daqui a pouco alguém anunciará isso lá no palco, e isso aqui vai se tornar um inferno depois.
Fiquei em pé e comecei a procurar por uma saída. Encontrei uma no final daquela fileira de cadeiras.
ㅡ Vamos embora... ㅡ falei. Com as mãos nos bolsos da calça, saí andando naquela direção.
Saber que, em poucas horas, o país inteiro iria noticiar o que vai acontecer naquela noite me deu um gosto amargo à boca. Fiquei tão desconfortável com o pensamento que nem pensei em sair do estádio como uma mariposa mágica.
Jin levou alguns segundos para me seguir. Nós já estávamos atravessando o portão de saída dos fundos quando ele questionou:
ㅡ Essa situação não faz sentido. Por que cancelariam tão de repente?
ㅡ Você não deveria saber disso, já que é uma entidade espiritual, celestial e tudo mais?
ㅡ Sou um guia espiritual que já foi um simples humano. Eu não tenho a onipresença divina para saber de tudo o que acontece no mundo em todos os períodos da história, garotão ㅡ explicou ele, dando um peteleco em minha testa. ㅡ Agora me diga, o que houve?
Suspirei fundo e virei os olhos na direção de uma banca de revistas do outro lado da rua. Dentro da banca, o vendedor assistia ao telejornal em sua TV antiga que se parecia com uma caixa de papelão de tão grossa que era.
ㅡ Dá uma olhada lá. Parece que já vazou ㅡ falei, e nós dois nos aproximamos para ver a transmissão.
Na tela chiada, o âncora bonitão com um olhar sério anunciava que Jungkook tinha acabado de ser preso.
ㅡ O vocalista do fenômeno musical mundial, Arrebol, foi encontrado com um grupo de suspeitos de invasão e furto de lojas na avenida principal de Sant'Angela. Testemunhas apontam que o cantor tem ligações com esse grupo há algum tempo, pois são sua fonte de acesso a drogas e bebidas ilegais. A polícia acredita que Jungkook estava presente quando a onda de furtos começou na última semana...
Uma foto de Jungkook foi estampada no centro da tela. Nela, ele parecia ter acabado de sair de uma zona caótica, com os cabelos tingidos de roxo totalmente bagunçados, olheiras fundas, uma garrafa de cerveja numa mão e um cigarro na outra.
Suspirei fundo e balancei a cabeça, desviando os olhos para baixo.
ㅡ Parece que já descobriram que não haverá mais um show ㅡ disse Jin, ao meu lado. Ao longe, vindo de dentro do estádio, ecoava uma onda de vaias e gritos revoltados do público que pretendia ver a banda naquela noite. ㅡ Precisamos de um plano B, Jimin Park. Use o seu lado fanático e procure uma forma de eu te colocar ao lado desses rapazes. Não posso passar tanto tempo com você e tenho um limite para poder te ajudar.
Mordisquei o meu lábio inferior e encarei os expositores da banca. Havia uma fila cheia de revistas com fotos dos membros do Arrebol ilustrando as capas. Concentrei-me numa onde Jungkook era o centro.
Diferente da foto exposta pelo jornal, naquela revista ele parecia um rapaz de 19 anos saudável, atraente em todos os seus ângulos, vestindo roupas escuras que mostravam, com certa sensualidade, as tatuagens espalhadas pelo seu corpo, mas sem ocultar a rebeldia que lhe era inerente.
Analisei seus olhos claros e aquilinos nos cantos. Redondos, porém agudos e profundos.
"Você vai ser o meu maior obstáculo", pensei, amargo, relembrando tudo o que eu sabia sobre os últimos anos daquele vocalista.
ㅡ Eu tenho um plano B ㅡ murmurei em seguida, virando-me para Jin. ㅡ Mas só vai rolar daqui a quinze dias. Tudo bem demorar tanto assim?
ㅡ Contanto que dê certo... O que vai rolar daqui a quinze dias? ㅡ Jin arqueou uma sobrancelha para mim.
ㅡ O final de uma competição para escolher o quinto integrante do Arrebol.
🎤🦋🎤
"A 5° Chama" foi o nome dado ao programa que, no início de agosto de 1984, reuniu centenas de milhares de punkers que tinham um sonho: Fazer parte da maior banda do mundo.
Mas a gravadora Doors, grande responsável por essa empreitada, decidiu promover essa competição apenas para pôr os rapazes do Arrebol na linha. Afinal, nenhuma banda de punk que se respeite aceitaria se submeter a algo assim, pois o rock não é fabricado. Não é e nunca foi. Ele é rebelde e nasce por si próprio, pescando integrantes pela vida que compartilham os mesmos sentimentos revoltados para formar um todo insano e impactante.
Acontece que a indústria musical estava começando a ter raiva dos roqueiros asiáticos e seu vocalista perturbado. Se no século 21 já era difícil para um estrangeiro oriental se manter no topo do mercado mundial de música, avalie então a situação de um grupo de quatro homens amarelos nada convencionais explodindo as caixas de sons pelas esquinas da América em plenos anos 80.
Sim, o Arrebol estava sendo ameaçado. Se Namjoon, Taehyung, Hoseok e Jungkook não cedessem um pouco às vontades da gravadora, então a situação iria começar a ficar ruim para eles.
Sendo assim, "A 5º Chama" começou e se desenrolou como um programa de entretenimento pré-gravado, que seria editado e transmitido ao público depois do final da competição. Era uma forma de passar uma imagem "family friendly" do Arrebol para os telespectadores do país.
Toda essa situação me deixava particularmente puto ㅡ não apenas por eu ser fã da banda, como também por eu ter raízes orientais ㅡ, mas um ponto positivo é que ela me oferecia uma chance em um milhão de me aproximar dos meus ídolos de uma forma definitiva.
Então eu tinha quinze dias até o grande momento, e Jin foi bem claro ao me dizer que eu não tinha permissão de ficar vagando por Sant'Angela à toa enquanto o nosso plano não desse certo.
"Não quero arriscar sujar o meu relatório durante os seus primeiros dias sob minha tutela, garotão", disse ele. Então aproveitei esse período enfurnado no quarto do hotel para me acostumar com o que estava acontecendo comigo.
Reviver e me tornar uma mariposa durante 12 horas diárias não era nada simples, e gerou em mim uma crise existencial bizarra na qual tive longos desabafos com as formigas que entravam em meu quarto, já que o meu guia espiritual não podia ficar ao meu lado constantemente ㅡ eu estava começando a sentir falta daquele indivíduo espalhafatoso.
No resto do tempo, tentei reunir tudo o que eu sabia sobre o fim do Arrebol. Cada memória e informação retida em minha mente foi posta para fora na forma de um mural na parede, que fiz com tachinhas, barbantes e recortes. A minha intenção era traçar um plano concreto que me desse a certeza de que eu estaria lá, no momento certo, para impedir o fim.
Também dei umas estudadas. Aluguei uns filmes numa locadora próxima ao hotel e passei a comprar os jornais de bancas para entender um pouco a mentalidade daquela época. Não havia celulares e nem serviço de streaming. Sinal de internet? Haha! Como haveria, se ela ainda estava ganhando forma em 84? Sendo assim, quase tudo era alcançado de forma manual e orgânica. Eu tinha que me virar muito para conseguir alguma coisa ou informação.
Quanto às taxas do hotel, da minha alimentação e do meu entretenimento durante esse período, Jin havia me dito apenas que elas estavam sendo pagas pelo seu "chefe do RH celestial" enquanto eu não tivesse entrado em contato direto com o Arrebol. Depois de me estabilizar, seria da minha total responsabilidade procurar por grana e moradia para passar os próximos meses.
Ótimo, muito reconfortante.
Então dia 28 de setembro chegou, e, com ele, o momento decisivo.
A tal competição seria dali a algumas horas. Fiz exatamente o que havia planejado alguns dias antes, baseando-me nas minhas várias e impecáveis pesquisas sobre a década de 80.
Eu queria chamar a atenção deles. Queria parecer um astro nascido que impactava apenas por entrar num espaço. Sendo assim, enfiei botas em meus pés, vesti calças pretas apertadas de cintura alta, um cinto e uma jaqueta de couro negro, uma camisa branca enfiada por dentro da calça, e passei toneladas de gel em meus cabelos pretos para formar um topete alto.
Olhei o meu reflexo no espelho e pensei:
"Gostoso e brilhante".
Eu estava pronto.
ㅡ Para onde você acha que vai? ㅡ A voz de Jin ressoou atrás de mim logo após eu sair do hotel e começar a caminhar pela calçada.
Quando me virei, vi que, na verdade, tratava-se de Jinli, a forma feminina do meu guia espiritual.
Assim como Jin, Jinli tinha uma obsessão por roupas brilhantes e bufantes, mas elas geralmente carregavam longas saias que se arrastavam pelo chão. Os cabelos delu também ficavam maiores, num penteado mais feminino e delicado.
ㅡ Para onde você acha? Vou à competição.
ㅡ Vestindo isso? ㅡ Ela arqueou uma sobrancelha para mim.
ㅡ Tenho que chamar a atenção ㅡ respondi com um sorriso largo e confiante, e então passei uma mão pelo meu topete. ㅡ Estou usando a última moda, como pode ver.
Jinli me encarou com desgosto.
ㅡ A última moda dos anos 60? ㅡ disse, apertando as têmporas.
ㅡ O que está dizendo? ㅡ Arrumei a jaqueta e pus as mãos na cintura.
Nessa hora, uma mulher desconhecida passou pela rua me encarando intensamente ㅡ acho que ignorou Jinli por não conseguir vê-la. Ofereci a ela uma piscadela, pois eu estava irresistível com aquele topete.
ㅡ Sabe, eu pesquisei bastante antes de usar o dinheiro que você me deu para comprar estas roupas. Sei o que estou fazendo. ㅡ Enchi o peito, confiante. Adorei o fato de que aquela camisa marcava as dobras dos meus músculos. ㅡ Enfim, tive sorte de ter encontrado uma loja próxima ao hotel que vendia esta belezura. Não gostei de ter ficado tanto tempo trancado...
Jinli ignorou totalmente a minha última reclamação e continuou concentrada em meu vestuário.
ㅡ Você gastou aquele dinheiro com isso? Onde andou pesquisando sobre moda?
ㅡ Eu vi o clássico filme Grease, lançado em 78, bem recente ㅡ falei, enlarguecendo o meu sorriso. ㅡ Li que o figurino do filme marcou Hollywood.
Jinli arregalou os olhos para mim, chocada.
ㅡ Grease foi lançado em 78, mas se passa em 1960, seu idiota. Você está se vestindo como uma variação do John Travolta da época da brilhantina. É como estar usando as roupas que o seu pai vestia nos tempos de escola dele.
A minha cara caiu.
ㅡ Mas eu gostei tanto daquele filme... ㅡ Arfei, perdendo totalmente a confiança. ㅡ Tem certeza disso?
Jinli apenas arqueou uma sobrancelha, debochando.
ㅡ Posso trocar de roupa? ㅡ pergunte, encolhendo-me.
ㅡ Negativo. Já estamos atrasados. ㅡ Ela me empurrou para o beco deserto mais próximo. ㅡ Vamos. Transforme-se em mariposa. Temos que voar.
ㅡ Eu vou passar vergonha na frente dos meus ídolos? ㅡ perguntei, querendo chorar de desespero.
ㅡ Provavelmente. Mas leve para o lado bom.
ㅡ Outra vez levar para o lado bom? O que é agora?
ㅡ Eles jamais irão se esquecer de você.
🎤🦋🎤
O final de "A 5º Chama" estava acontecendo num salão privado da gravadora Doors. Se eu não estivesse no corpo de um inseto, não teria conseguido ultrapassar a segurança do andar e adentrar o recinto reservado à competição.
Enquanto planava, observei o cenário diante de mim.
Havia duas fileiras de cadeiras ocupadas por competidores. Todos pareciam nervosos e ansiosos pelo que viria, e alguns traziam consigo os seus instrumentos de música, como baquetas, teclados, baixos e guitarras. Mais adiante, um pequeno palco estava montado, com uma mesa larga e várias cadeiras. Provavelmente eram os locais do representante da gravadora, do empresário do Arrebol e dos integrantes da banda.
Quando Jinli e eu pousamos no alto de uma parede, transmiti a ela uma mensagem nervosa:
"Tem certeza de que vai conseguir me colocar no meio disso? Essas pessoas vão perceber que eu não estive aqui nos outros dias da competição..."
"Relaxa, garotão. O meu papel aqui é ajudar com alguns milagres", quase a escutei dando uma risada esnobe. "Vou acrescentar algumas imagens suas às gravações das câmeras do programa e colocar o seu nome numa lista especial. Vai ser como se você tivesse competido num lugar diferente de todos os demais", explicou ela. Isso me deixou mais relaxado.
"Agora, se esconda e volte a ser um humano. Precisa estar sentado numa dessas cadeiras quando a competição começar", Jinli exigiu.
Eu hesitei.
"Não tem como usar os seus poderes milagrosos para me dar uma roupa mais... adequada?"
"Vai logo, Jimin Park!"
E eu fui, flutuando como uma verdadeira mariposa.
Encontrei um canto vazio bem escondido e retornei ao meu corpo humano rapidamente. Meio desnorteado e fervilhando de ansiedade por dentro, caminhei até uma cadeira disponível no salão e me sentei lá. Reparei nos olhares tortos e estranhos que recebi dos meus concorrentes, mas tentei não me concentrar nisso.
Para o meu alívio, Jinli pousou em meu joelho direito. Ter sua companhia agora era um alento.
"Tem algo que ainda não entendi, garotão. Sane a minha curiosidade", escutei a sua voz em meu cérebro.
Eu respondi mentalmente:
"O que você quer saber?"
"Se essa competição aconteceu em 84, porque o Arrebol só ficou conhecido por ter quatro integrantes, e não cinco? O que aconteceu com o vencedor do programa?", as asas verdes de Jinli vibraram.
"Ah. Então...", olhei ao redor e observei discretamente os rostos dos meus concorrentes até parar num específico. "Aquele cara venceu. Ele era muito talentoso e a gravadora o amou, mas o coitado só durou dois meses dentro da banda. Ele pediu pra sair porque não suportava o comportamento do Jungkook", expliquei.
"De novo esse Jungkook? Que rapaz complicado, ein?", Jinli ronronou em minha mente, divertindo-se.
"Nem me fale", respirei fundo e entrelacei as mãos embaixo do queixo. Meus olhos se direcionaram para o palco. "Mas, nesse caso, eu o entendo".
"Como assim, o entende?", Jinli soou incrédula.
Mas o apito do início das gravações começou antes que eu me concentrasse em dar uma resposta à minha guia.
Ao meu redor, todos se enrijeceram e se ajeitaram em seus assentos. O nervosismo pairou na atmosfera. No palco, a primeira pessoa a aparecer foi Cassandra Moura, uma mulher alta e loira que estava ali para representar a gravadora Doors.
ㅡ Boa tarde, queridos ㅡ ela lançou para nós um sorriso fingido e se sentou em seu lugar atrás da mesa.
Em seguida, entrou o empresário e produtor da banda, Yoongi Min. Foi quando comecei a ter um surto interno.
Esse homem era um astro sul-coreano responsável por quebrar recordes na Ásia e abrir portas na América para artistas orientais. Tratava-se de um compositor incrível e um visionário absurdo, mesmo tendo apenas pouco mais de 26 anos. Em sua inédita carreira de empresário, ele descobriu o Arrebol quando a banda ainda só existia no fundo de uma garagem, e logo a transformou num fenômeno mundial.
Yoongi era esguio e pálido, tinha olhos estreitos frígidos, lábios finos e um rosto oval bonito. Naquele momento, vestia um casaco grosso e peludo com estampas de onça que o cobria até os joelhos.
Em silêncio, o empresário se acomodou na cadeira ao lado de Cassandra e nos observou com um olhar analítico. A minha boca secou quando ele me encarou e franziu o cenho. Provavelmente estava estranhando o meu rosto, que nunca tinha aparecido naquela competição.
"Jinli, espero que a sua mágica funcione", lancei o pensamento à mariposa em meu joelho.
"Já funcionou. Olha lá."
Avistei Yoongi fuçando uns papéis espalhados sobre a mesa, procurando por algo. A sua cabeça de repente se inclinou ao encontrar um certo documento. Depois de ler o que estava escrito, ele olhou para mim de novo e relaxou, adquirindo um semblante de compreensão.
Aparentemente, a gambiarra da minha guia espiritual tinha dado certo.
Afundei na minha cadeira, profundamente aliviado.
Dois minutos depois, o Arrebol apareceu.
A minha pressão foi lá no inferno e voltou quando visualizei a imensa figura de Namjoon, o líder e baterista, atravessando o palco e se sentando na cadeira. Ele era lindamente aterrorizante ao vivo, com seus quase dois metros de altura, músculos saltando por baixo da camiseta escura e das tatuagens em seus antebraços, olhos cinzentos de águia faminta no rosto e cabelos clareados raspados nas laterais com um pequeno rabo de cavalo nas costas.
QUE MONTANHA, era o que eu queria gritar naquele momento.
Uma curiosidade é que "Namjoon" se tratava de um codinome para ser usado com a banda, pois Alison Bass era o seu nome real, dado por sua família adotiva, um casal de empresários canadenses.
Logo depois dele, Hoseok surgiu, e foi como ser alvejado por adrenalina. Ele era alto, sorridente e soava carismático apenas por andar até o seu assento atrás da mesa. Por baixo de suas roupas caríssimas artesanalmente rasgadas e cheias de correntes, o guitarrista do Arrebol era magro e também carregava uma boa dose de tatuagens.
Hoseok Jung era um puro homem amarelo, com olhos escuros levemente monólitos, e cabelos lisos naturalmente pretos, iguais aos meus, mas descoloridos para ficarem esbranquiçados.
Eu gostava dele, gostava do seu sorriso cativante e da maneira como se comportava durante os shows, sempre tão cheio de energia com a sua técnica impecável na guitarra. Também amava o fato de que não escondia o seu lado gay, mesmo vivendo num período histórico onde a homofobia ainda vigorava de todas as formas. Um símbolo de sua resistência era o pequeno triângulo invertido rosa tatuado em uma de suas bochechas, algo que os nazistas usavam para classificar e oprimir homossexuais. Hoseok o tinha quase como uma marca de orgulho.
Ele se sentou ao lado de Namjoon e os dois se serviram com garrafas de cerveja.
O terceiro a aparecer foi um tiro no meu peito. Sem exageros, pois eu finalmente estava diante do amor da minha vida: Taehyung Kim, o baixista e compositor da banda.
Não sei se todo mundo já teve a experiência de reviver por causa de uma música, então, falando como alguém que se enquadra neste caso, saiba que é um episódio que marca a sua personalidade para sempre. Foi o que aconteceu comigo depois de ouvir uma das composições de Taehyung. Eu estava na merda, e ele me tirou dela. Desde então, tornei-me um músico. Se amo o Arrebol e o rock no geral, e se estou vivo hoje ㅡ ou quase vivo ㅡ, é por causa daquele cara.
Taehyung Kim acenou para nós, competidores, e nos ofereceu um sorriso gentil antes de se sentar na cadeira livre ao lado de Hoseok. Ele era a porra de um dos homens mais bonitos que já vi, com um rosto perfeito, olhos profundos, castanhos e cheios de cílios, pele bronzeada e cabelos ondulados amarronzados. Diferentemente de seus companheiros de banda, não tinha muitas tatuagens e piercings e nem usava roupas muito rebeldes. O estilo dele era algo mais na vibe de Kurt Cobain, com camisetas simples, jeans e moletom.
Tentei não desmaiar de emoção ali mesmo.
ㅡ Parece que o nosso vocalista está tendo problemas atrás do palco... ㅡ disse Cassandra, no microfone, depois que alguns minutos se passaram e Jungkook não deu as caras.
Ela tentava manter o semblante sublime, mas, pelas expressões irritadas e impacientes nos rostos de Namjoon, Hoseok e Taehyung, deu pra saber que o único causador da demora de Jungkook era ele mesmo e sua teimosia irrefreável.
Um instante depois, os sapatos do vocalista atravessaram o palco.
O tom roxo nos cabelos dele estava desbotado, mas as suas mechas onduladas ainda reluziam com a luz enquanto caíam até o seu pescoço, igual nas fotos da revista que vi quinze dias antes. Seus olhos verdes, marca de uma herança mestiça, nos encarou com um brilho afiado de desprezo. Em sua boca, entre os lábios finos, jazia um cigarro aceso. Ele tragou com força, liberando névoa fumacenta por onde passou.
Jungkook estava de preto dos pés à cabeça, com uma regata surrada de alguma banda do underground que revelava bastante de seus músculos delgados preenchidos por variações incongruentes de tatuagens estranhas. Ele não tinha se poupado de piercings naquele dia, as pecinhas prateadas cobriam suas orelhas, o topo de uma sobrancelha, o septo do nariz e um canto da boca.
Quando se sentou na cadeira livre, cruzou os braços e jogou as pernas para cima da mesa, cruzando-as. Por fim, arreganhou a barra das calças para revelar o que estava por baixo.
ㅡ O que está fazendo? ㅡ Hoseok o questionou, encarando-o com o canto do olho.
ㅡ Exibindo o meu novo acessório preferido. ㅡ Jungkook apontou para a tornozeleira eletrônica presa em sua perna. ㅡ É um novo jeito de rastrear criminosos. Estão colocando isso neles. Eu sou uma das primeiras celebridades a usar, olha só.
No canto oposto da mesa, Cassandra apertou as têmporas, Yoongi cerrou a boca e Namjoon afundou no assento. Taehyung balançou a cabeça de um lado para o outro, discretamente, e Hoseok revirou os olhos.
ㅡ E aí? Não vamos começar isso aqui? Seria bom apressarmos, porque tenho horário para voltar para casa. Estou de castigo. ㅡ Em seu sarcasmo, Jungkook abriu um sorriso cínico.
Namjoon flexionou a mandíbula e suspirou fundo, provavelmente contendo um acesso de raiva. Não sei como Jungkook tinha coragem de emputecer um cara daqueles.
ㅡ Okay... ㅡ O líder reuniu os papéis espalhados pela mesa num só conjunto e olhou para nós, competidores. ㅡ Vocês foram escolhidos no último encontro porque suas habilidades cativaram a gravadora. Hoje, o ganhador vai ser aquele que cativar a banda. ㅡ Ele apontou para os demais rapazes do Arrebol. ㅡ A proposta era que trouxessem uma composição de sua autoria. Espero que tenham trazido algo legal.
"Espera. O QUÊ?!", pensei, aflito, e engoli em seco.
Uma composição autoral? Eu não tinha preparado nada disso. Eu sequer fazia ideia de que tinha que trazer algo assim. Pensei que mostrar as minhas habilidades com o baixo e talvez com a guitarra seriam suficientes para improvisar uma performance legal.
Olhei para o meu joelho, em busca da mariposa verde, mas só encontrei o vazio. Jinli tinha sumido, junto com a possibilidade de eu receber mais uma ajuda mágica naquele dia. Ela havia me deixado sozinho, por minha própria conta. Eu estava ferrado.
ㅡ Chamaremos cada um pela ordem alfabética, como sempre. Empresário Min, faça as honras. ㅡ Namjoon passou os papéis para Yoongi, que os recebeu e se arrumou em seu assento para começar a chamar os candidatos:
ㅡ Vamos lá. Afonso Menez...
Eu comecei a suar frio com a mente girando dentro do meu cérebro. Observei o primeiro candidato se deslocando até o centro entre as fileiras de cadeiras e o palco. Depois de conectar o seu teclado e o microfone nas caixas de som dispostas por ali, ele começou a exibir sua criação.
Era mediana, frenética demais e com uma letra um pouco simples para os níveis do Arrebol, mas tinha boa presença.
Foi a vez do concorrente seguinte. Depois a do outro, e mais outro. Os candidatos iam se apresentando de um por um, todos trazendo algo interessante para mostrar, alguns se sobressaindo tanto com suas performances e cantorias eloquentes que roubavam olhares interessados dos rapazes da banda. Jungkook era o mais desinteressado de todos os avaliadores, mas mesmo ele teve a sua atenção conquistada quando chegou a vez de um determinado competidor.
Era o cara que originalmente havia ganhado o programa em 84, e se tornado o 5º membro do Arrebol.
Eu fiquei perplexo quando ele começou a dedilhar sua guitarra, criando um riff maneiro que abriu portas para uma sequência de cantorias firmes e high notes interessantes. A letra de sua música falava algo sobre conquistar o mundo. Deu pra notar que todos os juízes sobre o palco foram atraídos pela sua performance.
"Ai que droga", pensei, completamente nervoso. Se eu quisesse conquistar a vitória, tinha que ultrapassar aquele cara. Com nenhum preparo prévio, isso me soava um pouco impossível.
Quando a apresentação dele acabou, Yoongi e Namjoon se entreolharam com uma expressão que dizia "Acho que encontramos o vencedor". Em seguida, o empresário voltou a ler os papéis que tinha em mãos.
ㅡ Jimin Park ㅡ anunciou o meu nome. ㅡ Candidato que participou de uma competição paralela... cuja existência eu acabei de descobrir ㅡ murmurou o final. ㅡ Aproxime-se.
Com as articulações endurecidas e uma quase taquicardia dentro do peito, levantei-me da cadeira e caminhei até ficar diante do palco. Não havia nada comigo além das minhas roupas fora de moda.
Quando os meus juízes me observaram melhor, os seus rostos adquiriram semblantes chocados e entretidos. Jungkook soltou uma risada alta.
ㅡ Eu não sabia que estavam gravando outra sequência de Grease. Cara, acho que você errou a porta ㅡ disse ele, engasgando-se com uma gargalhada e tossindo a fumaça do cigarro.
Todo o resto do salão soltou risadinhas.
ㅡ Ah, deixa ele. ㅡ Por mais que também tivesse achado o comentário do vocalista engraçado, Taehyung saiu em minha defesa. Ele me olhou com um olhar solidário e perguntou: ㅡ Trouxe algum instrumento?
ㅡ Não, só minhas roupas...
Outra onda de risadas.
Discretamente limpei gotas de suor frio que escorreram pela minha testa.
ㅡ Posso pegar um baixo emprestado? ㅡ perguntei.
ㅡ Ah, você também é baixista. Legal. ㅡ Taehyung sorriu. ㅡ Pode pegar ali. ㅡ Ele apontou para um canto do salão onde jazia vários aparelhos musicais organizados para uso durante a competição.
Queria ter trazido o meu baixo novinho, recém-quitado e totalmente ajustado ao meu gosto. Porém, para o meu azar, ele tinha ficado em 2020.
Peguei um baixo qualquer entre os disponíveis e testei a sua afinação. Depois de constatar que ele já estava bom para o uso, voltei ao meu lugar com o instrumento nos braços.
ㅡ Eu... O que eu vou tocar... ㅡ Inspirei fundo, estremecendo. Merda. Merda.
O meu nervosismo devia estar bem aparente, porque a banda se remexeu em seus assentos e Cassandra Moura cruzou olhares impacientes com Yoongi.
ㅡ Rapaz, não nos diga que não tem uma composição para mostrar ㅡ disse a representante da gravadora Doors.
ㅡ Se não tiver, é melhor retornar ao seu assento ㅡ sugeriu Yoongi.
ㅡ Eu tenho! ㅡ exclamei, surpreendendo-os. Encolhi o corpo e respirei fundo. ㅡ Eu tenho uma. É uma composição antiga, escrevi quando era pequeno... ㅡ "Logo depois de me tornar fã do Arrebol", completei em pensamentos.
Compus várias coisas durante a minha juventude, mas, por causa do nervosismo, aquela era a única criação que me vinha à mente naquele momento.
ㅡ Desculpem-me, estou nervoso. Sou muito fã de vocês ㅡ balbuciei, envergonhado, enquanto ajustava o baixo no meu colo. ㅡ E eu geralmente prefiro ficar como segunda voz durante performances.
ㅡ Então é melhor sair mesmo. Não sei se notou, mas a Doors quer outro vocalista. Um capaz de me substituir quando eu fizer merda na próxima vez ㅡ disse Jungkook, mordiscando a ponta do cigarro.
Sua fala esfriou o clima no salão. Todos os competidores se remexeram, desconfortáveis e assustados com aquela informação. No palco, as faces dos demais integrantes do arrebol escureceram, e a de Cassandra Moura ficou lívida.
Eu não me surpreendi com aquilo. Já sabia, na verdade. Era por isso que Jungkook estava agindo como um verdadeiro filho da mãe naquele momento, e como um bandido em seu mais recente envolvimento com suspeitos de furto. Também era por essa razão que o cara que originalmente havia ganhado a competição não tinha durado muito tempo na banda. Jungkook não iria permitir tão facilmente que fosse controlado ou substituído.
Confesso que o admirava muito por isso, o que me levava a ter mais uma razão para insistir em salvar a vida dele.
ㅡ Não vou sair daqui ㅡ falei, apagando o meu nervosismo por um instante. Jungkook afiou os olhos na minha direção.
Com as mãos posicionadas, comecei a tocar.
Criei um clima tenso com o baixo, com notas graves que, juntas, fizeram o salão mergulhar numa atmosfera meio pesada e sombria do metal, bem diferente do estilo frenético dos competidores anteriores.
Depois que intensifiquei o ataque das cordas, abri a boca para cantar.
A letra era antiga, um pouco imatura e exagerada em algumas rimas, mas falava com sinceridade sobre a dor de um garoto que não podia confiar em ninguém depois de ser abandonado. Ela foi escrita numa época conturbada da minha adolescência que às vezes eu preferia esquecer, por isso, tocá-la na frente daqueles caras fez um sentimento de vulnerabilidade me atravessar. Então, só me restou entregar tudo de mim, a minha face mais crua, durante a performance.
"Quando olho para trás
Vejo rostos borrados
Ventos levados por um dia sem Sol
Teriam sido eles
O meu verdadeiro anzol?
Porque, onde estou agora
Naufragado em Alcatraz
É tudo tão escuro, fugaz
Sou puxado por aqueles que juraram
um lar real, de paz
Então, quando olho para trás
Pergunto se teriam sido aqueles
Os rostos borrados,
Os passados perdidos
O meu verdadeiro arrebol¹..."
Quando acabei o último refrão, escutei alguns murmúrios admirados atrás de mim e reparei nos olhares aprovadores dos meus juízes. Para o meu alívio, eu tinha conseguido conquistá-los, mas, pelo que interpretei de início, não tanto quanto o meu último concorrente.
Pensei que tivesse perdido a chance, até que Hoseok se inclinou um pouco na minha direção e falou comigo:
ㅡ A sua técnica é muito boa, e a música também, mas acho que falta algo. Eu sinceramente quero descobrir o quê.
ㅡ Concordo ㅡ disse Taehyung, olhando para mim com satisfação. ㅡ Hoseok, pega a guitarra e faz um dueto com ele.
ㅡ Podemos fazer isso? ㅡ Hoseok buscou a aprovação de Yoongi e Namjoon.
Foi Cassandra quem respondeu:
ㅡ Não faz parte do cronograma do programa...
ㅡ Vamos fazer isso ㅡ Jungkook a interrompeu de súbito, ignorando-a completamente. Sua atitude pegou todos totalmente de surpresa, inclusive eu.
Ele tirou os pés da mesa, descartou o cigarro num cinzeiro, levantou-se do assento e andou até sair do palco. Dirigiu-se aos instrumentos musicais dispostos no salão e pegou um microfone e uma guitarra.
Sustentando um semblante enigmático, Jungkook jogou a guitarra para Hoseok e se aproximou de mim.
ㅡ Você disse que estava acostumado a ser o vocal de apoio, então vamos testar o refrão dessa sua música ㅡ ele disse, lançando um olhar desafiador para mim.
ㅡ Vamos cantar juntos? ㅡ Pisquei.
"Aquilo era sério?!"
ㅡ Hm. O seu maldito refrão ficou grudado na minha cabeça. ㅡ Jungkook se virou para o guitarrista. ㅡ Ei, Hoseok, está pronto?
Depois de ajustar a guitarra, Hoseok confirmou com um polegar estendido.
ㅡ Certo. 3... 2... 1.
Então a música explodiu pelo salão. O clima pesado criado pelo meu baixo se mesclou aos agudos satisfatórios da guitarra de Hoseok, formando uma odisseia nebulosa pelos alto-falantes. Mas o que realmente transformou aquele momento num show impactante foi a voz potente de Jungkook, que reinou ao lado da minha e cruzou os ouvidos de todos com uma sequência de high notes impecáveis.
Se antes a minha música soava como algo melancólico, agora ela era depressiva, agressiva e carregada de rancor devido à cantoria intensa do vocalista do Arrebol, pois ele praticamente tinha incorporado a letra em seu modo de dobrar as notas com a garganta.
Finalizamos o refrão e respiramos fundo. Encarei Jungkook com uma pergunta no rosto.
"O que esse cara pretende fazer?", foi o que pensei.
Obtive a minha resposta em seguida, depois de visualizar um brilho ferino atravessando o olhar verde dele.
Jungkook iria me colocar na banda, disso eu tive certeza. Mas ele também iria se divertir com o meu psicológico até onde pudesse.
[ ¹Arrebol: Hora em que o Sol está surgindo ou sumindo no horizonte.]
(Ilustrei um pouquinho da última cena para que vocês, leitores, possam ter uma ideia de como imagino os Jikook de Arrebol)
Betagem do capítulo: Arctia_x e AnnaD-2 (muito obrigada pela ajuda, meus amores)
🎤🎤🦋🎤🎤
#MariposaPunk
Obrigada por ter lido! Deixe o seu ⭐VOTO⭐ antes de ir^^
E aí??? Curtiram o capítulo? Sendo bem sincera, eu estava com medo de começar a entregar algo com mais de 5K palavras. Com o tempo, acho que vou perder os meus receios e aumentar o tamanho dos capítulos (isso se vocês curtirem a ideia).
Agora, sobre o conteúdo... O ARREBOL APARECEU, IRRA. O que sentiram com essa primeira amostra dos integrantes da banda? Haha, para narrar os sentimentos do Jimin durante essas cenas, coloquei-me em seu lugar se eu estivesse diante do BTS sendo obrigada a agir normalmente. Acreditem, ele é um fanboy igual a nós, ARMYs. O coitado ainda vai pirar muito (seja de felicidade, seja de raiva por causa do Jungkook rsrs).
Eu queria acrescentar ainda dizendo para vocês começarem a prestar atenção em certos detalhes nas conversas entre o Jimin e Jin/Jinli, ou quando alguém citar o passado... Mas não vou criar paranoias nas suas cabeças tão cedo. Só curtam a narrativa, que eu vou me encarregar do resto!
Já estou trabalhando no 3º capítulo, então posso dizer que ele não vai demorar tanto pra sair quanto esta att, mas peço paciência desde já porque a minha vida é realmente lotada de afazeres (e minhas aulas já vão retornar)😭. Enfim, obrigada por tudo, gente. Vou ficar mandando atualizações pelas minhas redes sociais e entretendo vocês por lá até os próximos capítulos. BEIJÕES E AU REVOIR!
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