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Capítulo 25

  3400 palavras

Alerta de gatilho. Massacre

•••

Dezesseis anos atrás

 O distrito Shaka estava barulhento naquela noite, as poucas ruas iluminadas perderam a segurança depois da revolta dos Guerreiros, um grupo que tomou aquele lado da cidade indo contra as autoridades, naquele tempo, os moradores de Shaka ficavam dentro de suas casas temendo o que poderia acontecer após a revolta, porém, nem todos os moradores temiam. Uma garotinha de olhos castanhos e cachinhos no cabelo grudou o rosto na janela, esperando ver algum dos Guerreiros, ela esperou seus pais dormirem para ficar observando a rua. Nisso, três pessoas passaram de moto, uma delas era uma mulher, a garotinha sorriu, vendo que existia meninas naquele temido grupo.

— Vocês ouviram sobre a tal pressão no centro? — Perguntou a mulher, acendendo um cigarro.  Aqueles que acompanhavam era dois homens, um de máscara preta e cheio de tatuagens, e o outro alto com uma arma pendurada nas costas.

— Querem nos matar. — Afirmou o mascarado.

— É melhor avisar as pessoas, vai acontecer um banho de sangue nesse lugar. — O alto alertou, tomando o cigarro da mulher.

— Temos que avisar o chefe, ele vai saber o que fazer. — Responde a mulher, ligando a moto e deixando os companheiros para trás.

  A garotinha que observava a cena engoliu em seco, mesmo que não entendesse o rumo daquela conversa, sabia que não era coisa boa, assim, ela correu para o quarto, assustada. Sua irmã mais nova dormia na cama que elas dividiam, a garotinha deitou ao lado de sua irmã, se cobrindo inteira. 

 No dia seguinte, a mãe delas foi até o quarto, a mulher se aproximou da cama e se jogou no colchão. A mais nova das meninas gargalhou sendo acordada assim, já a mais velha ficou nervosa e cruzou os braços.

— Que saco! — Ela gritou, irritada. Sua mãe riu e puxou ela e a caçula para um abraço.

— Vocês precisam ir pra aula, nada de ficar dormindo. — A mulher as segurou, tirando as duas da cama, ela sempre teve uma força admirável.

— Mamãe, ontem eu aprendi as cores, e também os números, mas só sei contar até quinze. — Contou a mais nova, correndo de um lado pro outro. 

— Que bom, Catrina. — Ela passou a mão no cabelo dela, amorosa. — E você, Bárbara?

— Estou aprendendo divisão. — Respondeu ela, sonolenta. Sua mãe riu. 

— Continue se esforçando. 

  As três seguiram para o banheiro, as meninas precisavam tomar banho antes de ir para a escola, alguns minutos depois, as meninas estavam tomando café da manhã e com o uniforme escolar, prontas para a aula, quando o pai delas encontrou na cozinha.

— Bom dia, princesas do papai. — Rafael abraçou suas meninas, elas riram.

— Papai, eu sei contar até quinze! — Falou Catrina, segurando o homem pela mão, ele sorriu. 

— Você é muito esperta, neném. — Ele beijou o topo da cabeça dela e virou sua atenção para sua filha mais velha, que estava encarando a tigela de cereal. — O que houve, Bárbara?

— Papai, o que é um banho de sangue? — Perguntou ela, vendo o cereal boiar no leite. O homem arregalou os olhos, surpreso.

— Onde ouviu isso? — Questionou ele, nervoso. Bárbara engoliu em seco, sabia que não devia observar os Guerreiros, então fez o que achou melhor, mentiu.

— Na TV. — Disse, encarando seu pai, o homem suspirou e ajoelhou do lado dela.

— Significa que as pessoas vão se machucar, é algo triste, não quero que fale isso de novo. — Seu pai a encarou, ela assentiu.

— Tudo bem, papai, desculpe.

— Não se preocupe, boa aula pra vocês. — Ele sorriu e beijou o rosto das duas antes de ir trabalhar. 

  Durante aquele dia, Bárbara estava pensativa, não podia falar que viu e ouviu a conversa dos Guerreiros, mas também ficou com medo do tal banho de sangue. Ela suspirou frustrada, sem saber o que fazer. No intervalo da aula, encontrou Matheus, no ano passado, eles eram da mesma sala, porém, sempre brigavam um com outro, por isso os colocaram em salas diferentes, o que funcionou, porque eles não brigavam mais. 

— Bárbara, sua mãe fez sanduíche? Eu tenho torta, quer trocar? — Ele perguntou, tirando o pedaço de torta da sacola. A menina assentiu, entregando o sanduíche embrulhado em um papel.

— Vamos. 

— O que você tem? — Perguntou ele, confuso.

— Você sabe o que é um banho de sangue? — Questionou Bárbara, encarando o pedaço de torta.

— É o que os vilãos fazem! Vi isso em um filme. — Respondeu Matheus, mordendo o sanduíche. 

— Os vilãos? — Ela arregalou os olhos, pasma. — Então os Guerreiros são heróis... 

— Do que você está falando? 

— Nada, vamos comer. — Ela bufou, mordiscando a torta. 

  No final da tarde, Bárbara caminhava pelas ruas do distrito Shaka segurando as alças da mochila, acenava para as pessoas que conhecia e continuava o trajeto para casa, ainda preocupada com o tal banho de sangue, a menina temia o que poderia acontecer, mas o que uma criança poderia fazer?

  Ela virou uma esquina, notando motos com caveiras estampadas, Bárbara arregalou os olhos, parando de andar. 

  "Já vai começar o banho de sangue?" Bárbara pensou, correndo pela outra rua para chegar em casa mais rápido. Enquanto a menina tentava alcançar sua família, sentiu alguém segurar seu braço. Ela se desesperou, tentando se soltar, quis gritar, mas a pessoa tampou a boca dela.

— Você é a garotinha que me observou ontem, não é? — Era a mulher do grupo Guerreiros, Bárbara esperneou, mas a mulher a segurou com mais força. — Fica quieta, menina!

— Se você não me soltar, eu vou furar seus olhos! — Ela gritou, fazendo a mulher gargalhar.

— Para com isso, não vou te machucar. Sou Ramona, qual seu nome? — Perguntou, soltando a menina. 

— Mamãe sempre me avisou a não falar com estranhos. — Bárbara cruzou os braços, irritada.

— Ela te ensinou a observar os outros também? — Ironizou ela, fazendo a menina a empurrar.

— Me deixa em paz! — Ela gritou, correndo novamente. 

— É melhor ir embora antes que aconteça algo ruim com a sua família. — A mulher aconselhou, deixando a garota para trás.

  Bárbara chegou em casa atordoada, seria possível uma coisa dessas? Achou que fosse morrer. Sua mãe a encontrou com os olhos arregalados, Bárbara correu para ela, abraçando sua cintura.

— O que foi, querida? — Perguntou a mulher, segurando sua filha.

— Mamãe, vamos embora daqui! Vamos embora agora! — Ela chorava, molhando a blusa de sua mãe. 

— Alguém machucou você? — Questionou, se abaixando na altura dela. 

— Não, mas pode machucar você, o papai, e a Cat, vamos embora! — Continuou Bárbara, assustada.

— Não temos para onde ir, filha, essa é nossa casa. — Disse a mulher, abraçando sua menina novamente. — Ninguém vai machucar a gente, vamos ficar bem. Confia em mim.

  Bárbara escondeu o rosto na blusa da sua mãe, querendo acreditar nessas palavras. As duas entraram na casa e a garota tentou esquecer essa história, mas não funcionou. No jantar, Bárbara observou seus pais e sua irmã, ela mal tocou nos legumes do prato e espalhava o purê com a colher lentamente. Algo tirava sua fome e sua concentração, pela primeira vez na vida, ela não acreditou no que sua mãe disse. Na hora de dormir, Bárbara se remexia na cama, fazendo sua irmã acordar.

— Para de se mexer. — Reclamou Catrina, coçando os olhos.

— Desculpa, vai dormir. — Bárbara se virou, evitando conversar com sua irmã. A menina entendeu, voltando a dormir.

  Bárbara respirou fundo e saiu da cama, a menina correu para a janela, vendo se tinha alguém passando, porém, ouviu uma explosão vindo da outra rua. Seus pais apareceram na sala em seguida, assustados.

— Querida, você se assustou com isso, né? — Sua mãe correu na sua direção, a segurando rapidamente. — Vem, sua irmã deve estar chorando. — A mulher a guiou, mas seu pai tentou sair de casa, nisso, Bárbara correu para impedir seu pai de sair.

— Não, pai! — Ela gritou. — Fica aqui, se você for, eu vou chorar!

— Que isso, Bárbara? — Ele perguntou, se abaixando na altura dela. — Fica calma.

— Não! Não vai! — Bárbara continuou gritando, desesperada.

— Tá bom, calma, fica calma. — Ele a pegou no colo, tentando acalmar sua filha, porém, eles ouviram o choro de Catrina no quarto.
A menininha veio correndo, com o rosto molhado de tanto chorar.

— Oi, querida. Vem com a mamãe. — A mulher abriu os braços, fazendo sua filha pular em cima dela. — Foi só um susto, nós estamos aqui. — Ela a apertou contra si, tentando acalmá-la.

   Porém, uma outra explosão aconteceu, eles se abaixaram.

— Ana, vai pro nosso quarto com as meninas, eu vou... — O homem se levantou, mas sua esposa segurou a mão dele.

— Fica comigo, por favor. — Ela pediu, ele assentiu e eles correram para o quarto. Poucos minutos depois, a confusão parecia ter piorado, as pessoas gritavam desesperadas pelas ruas, motoqueiros faziam ronda, buzinando e mandando as pessoas ficarem dentro de suas casas. 

 Bárbara grudou seu rosto na janela e viu homens que não pareciam com os Guerreiros, eles tinham um uniforme preto e o rosto coberto com panos escuros. A garota arregalou os olhos, vendo um dos Guerreiros levar tantos tiros que o chão virou uma poça vermelha, foi ali que ela descobriu o que era um banho de sangue.

  Bárbara sentia seu coração disparar a cada morte que presenciava da janela do quarto dos seus pais, sua mãe tentava fazer Catrina parar de chorar e seu pai empurrava o guarda-roupa para a porta do quarto, tentando manter sua família segura. Bárbara percebeu que alguns dos tiros estavam atingindo as casas, ela sentiu um calafrio percorrer seu corpo e apertou a cortina, então viu uma bala atravessar o vidro de uma janela e gritos desesperados vindo daquela casa em seguida.

  Uma mulher suja de sangue saiu da casa chorando e gritando, ela dizia algo sobre ver seu filho morrer e empurrou um homem de uniforme, aquele que atirou na casa, porém, ele a derrubou no chão e atirou no rosto dela. Nesse instante, Bárbara foi para trás, tropeçando nos próprios pés e caiu.

— Querida — Seu pai se aproximou dela, e fechou a cortina. — Olhe pra mim, quer ouvir o papai cantar? — Perguntou ele, Bárbara concordou com a cabeça. — A casinha branca que o meu amor me deu, era tão linda que refletia a luz, foi ali que nosso amor nasceu e vai ser ali que ele vai viver, meu coração pra sempre será seu porque você me deu... a nossa casinha branca.

  Mesmo com a canção do pai, Bárbara não parava de tremer, parecia que havia perdido o controle do seu corpo, ela abraçou seu pai e implorou aos céus pela vida deles.

   Horas depois, o tiroteio parecia ter acabado.

  Eram cinco da manhã quando eles saíram do quarto, ninguém conseguiu dormir, mas fingiram por algum tempo, Bárbara foi a primeira a correr para a janela, querendo ver o que tinha acontecido, a menina sentiu seu rosto molhar quando notou seus vizinhos jogados na calçada com tiros no corpo, ela segurou o pijama, tremendo e sentindo algo apertar seu coração. Ela passou a mão pelo rosto e olhou para seus pais, nem poderia imaginar como seria sua vida sem eles.

— O que faremos agora? — Perguntou Ana, preocupada.

— Não sei, vamos esperar mais, tenho medo do que pode acontecer. — Rafael afirmou, vendo o medo no rosto da sua esposa.

— Isso nunca aconteceu antes, será que vai continuar? — Questionou ela, abraçando Catrina.

— Talvez sim, temos que... — Antes que ele terminasse a frase, ouviram um som de algo sendo quebrado na cozinha. Bárbara correu para junto deles, querendo impedir que se aproximassem do lugar.

— Vamos voltar para o quarto! — Ela pediu, soluçando, seu pai afirmou com a cabeça, mas não foi para o quarto, ele seguiu para a cozinha, Bárbara escapou da mãe e foi na direção do pai, nisso, um homem de uniforme preto apareceu na sala, eles se assustaram e Bárbara olhou nos olhos dele, temendo pela vida, sem esperar sequer um único movimento, ele atirou no pai das meninas. Bárbara começou a gritar, fazendo sua mãe aparecer na sala, ela viu a cena e correu na direção da filha, percebendo que o homem apontou a arma na direção de Bárbara, ele atirou e a bala acertou o peito de Ana, que caiu na frente de menina. Bárbara começou a chorar descontroladamente, abaixou na direção dos pais e gritou até quase ficar sem voz, o homem de uniforme tentou segurar ela, mas alguém pulou nas costas dele. Bárbara levantou e olhou para cima, era aquela mulher, a Ramona.

— Fuja! — Gritou a mulher, segurando o pescoço do homem. Bárbara seguiu para o quarto, tropeçando nos próprios pés, abriu a porta e pegou sua irmã no colo, Catrina tentava se soltar e perguntava sobre os pais, mas Bárbara ignorou, correndo para fora da casa.

— Cadê a mamãe e o papai? Não quero ir! Me solta! — Catrina chorava e empurrava Bárbara, porém, a mais velha a segurava com mais força e continuava calada.

  Após estar na calçada, ela a colocou no chão e segurou a mão dela, correndo novamente pelas ruas.

— Eles vão encontrar a gente? Bárbara... — Soluçou Catrina, olhando para trás. A mais velha suspirou e negou com a cabeça.

— Somos só nós. — Respondeu, mantendo o ritmo. Catrina soltou a mão dela e correu na direção da casa. Bárbara franziu a testa e a alcançou, segurando-a pelo braço.

— Não quero ir sem eles! — Esbravejou a mais nova, tentando se soltar a todo custo.

— Temos que ir, Catrina, eu não estou brincando! — Bárbara gritou, nervosa.

— E nem eu, quero a mamãe e o papai! Para de ser chata e vamos até eles.

— Eles vêm depois, agora vamos! — Bárbara a puxou, e correu novamente, atravessaram duas ruas, tentando lembrar de alguém que morava perto, nisso, ela lembrou de Matheus e apressou os passos para a casa dele.

  Bárbara avistou a casa do amigo e se aproximou da porta, parecia vazia, então empurrou a entrada e a porta abriu, assim viu Matheus aparecer na sala, ele veio correndo e perdeu um pouco do sorriso quando as reconheceu.

— Bárbara? — Perguntou ele, confuso.

— Quem está aí, filho? — Marina, a mãe do menino, surgiu. Ela encarou o rosto de Bárbara e parecia saber o que tinha acontecendo. — Meninas? Vocês estão machucadas? — Questionou, se aproximando.

— Não, Marina, os meus pais... eles... — Bárbara tentou, mas as lágrimas caíram sem sua permissão. A mulher puxou as meninas para um abraço.

— Vocês não estão sozinhas. — Marina apertou as meninas contra si, tentando acalmá-las, mas a verdade era que imaginar o que poderia ter acontecido com seus amigos de infância fez ela chorar como uma criança.
— Matheus, leva a Catrina para descansar um pouco, vai, filho. — Pediu ela, o menino obedeceu, deixando ela com Bárbara.

  Marina cobriu a menina com uma manta e deu um copo de água com açúcar para ela, depois que chegou, Bárbara não disse nenhuma palavra e tremia descontroladamente. Seus olhos pareciam focados demais, entretanto, ela não prestava atenção em nada.

— Bárbara, seus pais...

— Mortos. — Admitiu a menina, olhando para o nada.

  Marina colocou a mão na boca, sentindo as lágrimas descendo, ela se lembrou dos bons momentos com seus amigos e fechou os olhos, percebendo que os perdeu para sempre.

— Meu marido também. — Confessou ela, Bárbara a encarou pela primeira vez.

— Você tem eu, não precisa chorar. — Bárbara deu sua água com açúcar para Marina, que sorriu e segurou o copo.

— Obrigada.

  Batidas na porta fez as duas se entreolharem assustadas, Marina se levantou, correndo para a janela. Era um dos motoqueiros, ela respirou fundo antes de abrir a porta.

— Não vou te machucar, mas isso não vai acabar tão cedo, por isso estamos tirando algumas famílias daqui, vocês precisam ir para Zâmbia, estarão seguros lá. — O mascarado da outra noite entregou uma carta para Marina. — Prometi pro Henrique que ia ajudar a família dele, então não me agradeça.

— Ele continuou lutando até o final, não foi? — Marina pegou a carta, secando as lágrimas.

— Ele falou o seu nome antes de morrer. — O motoqueiro respirou fundo e a deu as costas. — Boa sorte. — Ele desceu as escadas e correu na direção da moto. Bárbara, que observava a cena calada, chegou em uma triste conclusão, jamais seria feliz novamente. 

  No centro da cidade, Isabel Machado, comissária da polícia da metrópoles, acompanhava o caso através de uma cobertura do jornal. Ela assistia a destruição daquele pobre distrito sem expressar sequer uma reação, a ruiva suspirou aliviada quando anunciaram a morte do líder dos Guerreiros, ela se levantou da cadeira, indo pegar uma taça de vinho. Junto dela estava Jean Sales, capitão do esquadrão que executou o massacre, e o governador da metrópoles, Escobar Martins. Aquela última reunião era o final de uma aliança que começou há meses, antes de sonharam com o massacre. Como responsável pela segurança pública, Isabel via o crescente movimento de revolução dos Guerreiros, em pouco tempo, eles tomaram o distrito Shaka e avançava para outros, a pressão do congresso para que alguma atitude fosse tomada fez com que Isabel conversasse com Escobar.

— Eles estão te pressionando? — Questionou o negro, encarando a vista da metrópoles. Ela assentiu.

— Eles têm medo que um grupo terrorista como eles dominem a cidade, temos um nome pra zelar. — Isabel afirmou, apática.

— Isso vai ser uma tragédia, um escândalo. Acha que o congresso vai apoiar?

— Eles não vão saber, o massacre foi uma briga de facção, os Guerreiros contra qualquer outra que existe na cidade, podemos até inventar um nome, não me importo. — Explicou, impaciente. — E brigas dessa gente acontecem o tempo inteiro.

— Tem razão, mas precisamos de alguém que pense como nós para executar essa missão. — Disse Escobar, encarando a ruiva ao seu lado. Ela sorriu.

— Eu tenho a pessoa ideal — Isabel se virou, pegando uma pasta. — Esse é Jean Sales, conhecido por seus trabalhos nas forças militares há dez anos, ele tem um grupo também, é um mercenário. Perfeito para uma missão como essa. 

— Ele deve servir, se der problema cortamos o mal pela raiz, se é que me entende. — Insinuou Escobar, direto. Isabel concordou com a cabeça.

— Vou chamá-lo.

  No dia seguinte, os três estavam reunidos para acertar os detalhes da missão, Jean exigiu uma alta recompensa pelo trabalho, a maior que já viu, mas aceitou fazer parte e não se importou com o que teria que fazer em si, apenas pediu o desejado para a missão, perguntando sobre como deveria ser feito, não questionou o motivo para estarem o contratando para isso. 

— Há algo mais que querem que eu faça? — Jean perguntou, fechando a maleta com a metade do pagamento. 

— Precisa parecer que foi uma briga entre facções, o congresso e a população precisam acreditar nisso, o futuro da metrópoles depende dessa missão. — Intimou Isabel, Jean assentiu.

— Limpe aquele distrito, há bandidos, ladrões e terroristas, eles sujam a cidade com seus males, poluem a vista com sua miséria, faça o que tiver que fazer, e não esqueça de entrar nas casas, os Guerreiros podem se esconder nelas. — Explicou Escobar, sem expressão alguma. Jean ergueu a sobrancelha, ordem dada é ordem cumprida. 

— Como quiser. 

  Agora, os três brindavam o sucesso da missão e como a mídia e as autoridades estavam lidando com o caso, mais uma briga entre grupos rivais, eles cumpriram o acordo.

— Parabéns, senhor Sales, foi melhor do que imaginei. — Falou Isabel, sorridente.

— Obrigado, senhora Machado, fiz meu trabalho. — Ele acenou.

— Vou dar minha declaração mais tarde, sou o governador e preciso lamentar pela vida daqueles que morreram, mas quem se importa com um monte de porcos imundos? — Escobar riu,  fazendo seus companheiros rirem também. 

— Darei minha entrevista também, vou até passar algo nos olhos para parecer mais abatida, assim passa verdade. — Isabel revirou os olhos, cansada. 

— Bom, eu vou sair da metrópoles por alguns meses, viajar um pouco. — Anunciou Jean, deixando sua taça na mesa, e ajeitando seu casaco.

— Faz bem, aproveite seu descanso, você merece. — Escobar sorriu.

— Isso, divirta-se, e obrigada. — Os três se despediram naquele dia, evitando sequer pensar no dia do massacre.

  Enquanto isso, em uma casa improvisada no distrito Zâmbia, Bárbara vomitava pela segunda vez naquela noite, a menina lembrava da morte dos pais e seu estômago embrulhava, não conseguia segurar e tudo que comia era jogado na privada, Bárbara se lembrava do cheiro de sangue, dos gritos e dos corpos deles no chão da sala, ela abriu a torneira, lavando o rosto e secando na toalha mais próxima. Se olhou no espelho e parecia que tinha algo diferente no seu rosto, mas não sabia dizer o que era. Ela negou com a cabeça, exausta de tanto vomitar e voltou para o quarto que dividia com Catrina. 

  A menina deitou ao lado dela, mas para sua surpresa, sua irmã estava acordada.

— Eles não vão voltar, não é? — Perguntou Catrina, chorando.

— Não, eles morreram, eu vi isso acontecer. — Contou Bárbara, colocando a mão no rosto da irmã.

— Talvez o pai do Matheus cuide deles. — Catrina disse e sua irmã assentiu, segurando as lágrimas.

— Claro, eles estão bem onde estiverem, durma. — Mandou Bárbara e virou para o outro lado, não deixando sua irmã ver seu choro, ou qualquer expressão de sofrimento que ela tivesse depois daquele dia. 

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