Cena Pós-Créditos: Frankenstein
Era um bairro periférico, a rua era mal iluminada, principalmente em frente à casa, onde o poste mais próximo estava queimado. O único movimento visível era de cães que latiam para o carro que estacionava alguns metros antes do lugar alvo.
Leônidas desceu do veículo com a arma em punho, sem se preocupar se seria visto. Conferiu o endereço mentalmente, tendo plena certeza de que se tratava daquela residência murada. Havia cerca elétrica ao redor, logo não seria possível pular. Bateu no portão. Cada poro do corpo do ruivo transpirava ansiedade; sede de vingança seria finalmente saciada... com sangue!
Não houve resposta. Tentou o trinco.
Estava apenas encostada. Franziu o cenho, intrigado. Por que ela deixaria o portão destrancado em um lugar perigoso como aquele?
Não era de sua conta, os deuses estavam ao seu lado! Adentrou o lugar com a mão firme, apertando com tanta força o cabo da arma que chegava a ferir a pele. As luzes da casa estavam ligadas. Ouvia um som de piano sendo tocado vindo de dentro.
Toque seu réquiem, desgraçada!
Tentou a porta. Aberta. Seu coração estava prestes a explodir, sua felicidade era indescritível. O interior da casa destoava da parte externa, era repleta de quadros, bem decorada, com mobília também cara. Mas foi o cheiro forte de gasolina que chamou a atenção de Leônidas. Olhou para o piso úmido sob os pés e seus olhos passearam por toda a extensão da sala, indo em direção à entrada da cozinha, passando pelas duas portas, a que vinha o som de piano e uma porta amarela.
Por que diabos ela teria jogado gasolina pela casa? Decidiu não perder mais tempo; avançou em direção à porta, com a arma destravada em punho.
Deteve-se com um grito abafado; a pressão no abdome e uma potente corrente elétrica paralisaram sua musculatura o fizeram desabar no chão. Foram infinitos sete segundos de dor. Enquanto tentava com todas as forças se recuperar do choque e se mexer, foi aos poucos entender o que estava acontecendo: Seus pulsos estavam sendo amarrados, uma mão feminina pegava a pistola caída no chão. Sentiu-se ser puxado e encostado em uma superfície macia, que logo constatou ser o sofá.
E logo sua visão turva foi se tornando nítida, revelando a silhueta antes embaçada à sua frente, amarrando seus tornozelos.
Ariel guardou o taser no bolso da calça jeans, objeto do tamanho de um smartphone. Acocorou-se diante do olhar colérico do ruivo barbudo. O queixo do homem tremia de fúria; dentes estavam à mostra como um cão raivoso.
— Sua raiva toda é por ter sido enganado ou por estar diante da assassina de seu filho?
— Então você não está sozinha, sua puta! — seus olhos avermelhados fuzilaram a porta do quarto.
Ariel levantou-se, impassível, andando até a porta do quarto e abrindo-a. Desligou o aparelho de som que reproduzia o som de piano.
Leônidas tremeu mais ainda de ódio. Enganado como um rato! Uma maldita ratoeira! Aquela desgraçada o havia apanhado tão facilmente!
Ela vinha da cozinha agora, arrastando um banco. Postou-o diante dele e sentou-se, acendendo um cigarro. Havia gasolina na porra da casa inteira e ela acendia um cigarro? Que espécie de maluca ela era?
— Eu vou esfolar você viva! Eu vou torturar você cada segundo, durante muitos, muitos dias!
Ariel o olhava com tênue pesar, sentindo que ele realmente teria coragem de cumprir a ameaça. Conhecia aquele ódio, conhecia aquela sede de vingança.
— Você vai morrer aqui, e não há nada que possa fazer — disse ela em tom calmo, quase conformador. — É um ciclo. Eu fui um monstro criado por seu filho, você é meu monstro, eu criei você. Você é meu Frankenstein.
— Você matou meu filho! Você... — as lágrimas de desespero escapavam pelos olhos cheios de dor. — Você torturou meu filho, sua vaca maldita!
— Seu filho me torturou. E matou meu filho.
Leônidas aparentou estar surpreso, mas não incrédulo. Ela prosseguiu?
— Foi pelo que ele fez comigo que virei o monstro que está diante de você. Somos dois monstros. Monstros devem morrer.
— Ele torturou você e matou seu filho?
— Sim. Ele me estuprou junto com outros amigos. Matei cada um deles, mas seu filho foi um dos piores, o incitador do estupro.
Leônidas baixou o olhar, pensativo.
— Sei como deve estar se sentindo. Eu mesma planejei minha morte. Na verdade, meu plano era deixar você me matar — disse entre tragos no cigarro. As cinzas caíam perigosamente no chão molhado. — Deixar que me torturasse, que fizesse o que fiz com seu filho. Todos merecemos punição por nossos atos, mas eu mudei de ideia...
Leônidas continuava em silêncio, olhando para o chão.
— O destino resolveu ser complacente comigo, descobri que vou ser mãe. O direito que seu filho me tirou... Então resolvi ter a criança, recomeçar, longe daqui. Bem longe... — olhou para o barbudo cabisbaixo e silencioso, e por um segundo, sentiu pena dele. — Vou matar você com uma injeção letal indolor. Não vai ter que sofrer, como...
A risada macabra de Leônidas a interrompeu. O homem ergueu a cabeça com um olhar insano, transformando a risada em uma gargalhada medonha.
— O imbecil nem foi competente o suficiente pra matar você? Eu sempre disse a ele que se fizesse merda tinha que enterrar, e bem fundo, pra não feder. O que ele faz? — riu mais alto. — Puxou pra idiota da mãe dele, burra e inconsequente. Ela mereceu cada surra que dei nela. Ele devia ter apanhado mais também. Vê o que dá não educar os filhos direito? Acabam arrancando os olhos dele!
Ariel olhava-o com os olhos arregalados, muda com a reação dele.
— Mas pelo menos uma coisa ele fez certo... estuprar uma vagabunda como você, um lixo humano e evitar que se prolifere... Foi um feito e tanto de meu filho. Mesmo ele estando no inferno queimando agora, estou muito orgulhoso, pois sei que ele está com seu bebezinho nos braços lá!
Ariel cerrou o punho dolorosamente.
— E o lixo que carrega em seu ventre vai apodrecer antes de consiga concebê-lo! Vai apodrecer junto com ele! Vai pagar por matar MEU ÚNICO FILHO! — berrou.
— Mudei de ideia — ela disse levantando-se e dando mais uma tragada. Andou até porta amarela e destrancou-a.
Leônidas respirava profundamente, o corpo inteiro trêmulo, embargado por um misto de sentimentos negros, que o corroíam como ácido. Tudo que queria era matar aquela mulher. Como queria...
Ela surgiu arrastando algo. Logo ele percebeu do que se tratava...
Era um corpo.
— Eu a mantive viva todos esses dias, para o caso de mudar de ideia quanto a morrer junto com você.
Leônidas estava com os olhos vermelhos vidrados no corpo que era agora deixado sobre o carpete vinho. Só então constatou que ela estava viva, embora visivelmente dopada, os olhos fundos, avermelhados e abertos, mas o olhar morto, sem foco; os lábios estavam secos, a cabeça movia-se debilmente.
— O que está acontecendo aqui, sua doente?
— Tenho um leque de drogas para manter alguém vivo em estado semivegetativo. Tive que bancar a enfermeira e limpar essa infeliz todos os dias e alimentar, mas valeu a pena. Ela vai morrer em meu lugar.
O cigarro de Ariel já tinha se extinguido, mas Leônidas não via onde ela poderia tê-lo jogado, e ela obviamente o apagara antes ou jogara em lugar seguro. Saiu de volta ao quarto da porta amarela e voltou com o galão de gasolina e uma bolsa de viagem no ombro. Leônidas observou-a horrorizado despejando o líquido inflamável sobre a mulher caída, e logo em seguida sobre ele. Fechou os olhos e para tentar proteger-se da chuva de gasolina sobre ele.
— As cordas vão se desfazer com o fogo. Vai se debater tanto que vai ajudar a corda a se desfazerem — o tom de voz de Ariel tornou-se cruel: — E sim, eu mudei de ideia sobre sua morte ser indolor. Quero que sinta seu corpo inteiro arder, seus olhos derreterem, sua alma implorar para que morra logo... — acendeu mais um cigarro, aproximando-se de Leônidas, o rosto a um palmo do dele. — Você tem os olhos de seu filho...
Leônidas esticou a cabeça num berro, como um animal preso tentando morder a presa. Ariel ergueu-se a tempo, caminhando em direção à porta da frente, que trancaria antes de sair. Olhou para Renata no chão, para Leônidas em pânico, retorcendo-se no chão e gritando.
Chega de monstros nessa história.
Deu mais uma tragada e jogou o cigarro no chão, trancando a porta ao sair.
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Espero que tenha valido a espera.
Já sabiam de quem era o corpo antes de lerem o capítulo?
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