Capítulo IV - Na vergonha
Nápoles 1848
- A beleza é algo insano não é verdade Sir Alld? Poucos a possuem genuinamente.
- Não seria presunção de sua parte Voi Andretto? Porém, devo concordar. Esse quadro é magnífico. Vejo que gosta da era grego-romana.
- Eu sou um apreciador do belo. Essa tela a óleo é de Charles Meynier – "Apolo, Deus da Luz, Eloquência, Poesia e Belas Artes com Urânia, Musa da Astronomia" datada 1798. Muitos são os que querem leva-la. A um museu em Cleveland que quer a obra. Recusei obviamente.
- Entendo. A sua coleção é realmente belíssima. – concluiu Sir Alld
Depois da visita de um de seus parceiros de negocio, Antenore Andretto foi até a adega da mansão e pegou uma garrafa de vinho do porto. Subiu para o grande salão, sentou-se em uma poltrona macia, sorriu ao olhar-se para o grande espelho do lugar e pediu que seu mordomo tocasse um pouco de piano. Antenore era considerado o homem mais rico e belo de todo o Reino das Duas Sicílias.
Antenore era dono de uma fabrica de armamento em Nápoles. Naquele ano em particular, ele estava dobrando sua fortuna. Sir Alld era um inglês que viva no reino da Sardenha. Ele, a mando de nobres do local, fazia negócios para Carlos Alberto, governante de Piemonte. Uma onda de conflitos tomava conta dos territórios divididos pela Áustria. O Risorgimento.
Quando perguntado se Antenore era a favor da reforma liberalista e da unificação do reino da Itália o magnata não se posicionava, para ele, contanto que obtivesse lucro não se importava se era ou não declarado a unificação.
- Jovem mestre deseja mais alguma coisa? – perguntou Lorezo, mordomo de Andretto.
- Mande que preparem meu banho. Depois peça para que sirvam o jantar as dezoito em ponto.
- Come desiderato, jovem mestre.
Olhos verdes de Antenore estavam brilhosos. Ele nunca se sentira tão bem em toda sua jovem vida. Antenore era filho único do casal Andretto. A fábrica bélica foi deixada em seus cuidados assim que possuiu a maior idade. Ele tinha a frieza e cordialidade necessária para tocar os negócios. Sua beleza era algo que fazia sucesso entre os homens e as mulheres. Questionado por não ter uma noiva, Andretto não se preocupava. Ele dizia que viveria somente por ele mesmo.
Quando ia a direção ao banho, Antenore parou novamente para olhar o quadro que mais gostava. Ele pensava ser uma reencarnação do deus Apolo. Um sol em meio à escuridão. A beleza em um mundo caótico.
- Assim como Apolo ajudou Tróia, eu ajudo o meu povo – dizia Antenore para si. – Além de Apolo, Narciso era outra referencia. Ele também morreria por somente ficar admirando a própria imagem.
Antenore se sentia o homem mais poderoso. Porém, algo terrível aconteceu. Mais tarde naquela noite, os que eram contra a unificação dos reinos invadiram a propriedade de Andretto e colocaram fogo na mansão. Quando o jovem rico percebeu o incêndio, saiu de seus aposentos e correu para salvar o seu amado Apolo. Contudo, no meio do caminho, um pedaço em chamas do forro do teto caiu no rosto de Antenore que gritou de dor, desmaiando logo em seguida.
II
Após a noite infernal, Andretto ficou dias em observação com talas e faixas espalhadas pelo corpo.
- Foi um milagre ter sobrevivido Voi Andretto.
- Mal consigo me mexer... o que foi que me aconteceu? – Antenore ficara em coma devido a pancada. Haviam se passados quinze dias desde o incidente.
- Ocorreu um incêndio em sua mansão.O senhor foi atingido por um pedaço de madeira na região craniana. Infelizmente o sua face...
Antenore pôs a mão em seu rosto enfaixado.
- N- Não pode ser! – um leve tom de desespero atingiu a voz do jovem. –Deixe-me ver! Eu quero ver o meu rosto!
- O senhor precisa acalmar-se! – disse o médico.
- Eu quero ver! Eu quero ver agora! – Antenore estava irredutível. O médico pediu aos enfermeiros que desenfaixasse o rosto de Andretto.
Ao olhar-se no espelho, Antenore entrou em desesperou. A imagem que era refletida parecia com algum titã horrendo.
- N-N-NÃO! Não sou eu! Essa criatura não pode ser o meu reflexo! – com fúria, Antenore jogou o espelho no chão que se espatifou em pequenos pedaços.
Todos na sala olharam com pesar. Devido às queimaduras, o rosto perfeito de Antenore ficara deformado. O jovem rico não soube lidar com a realidade. Indignado, ele se encheu de fúria. Arrancou os curativos, feriu os enfermeiros e suplicou ao médico que concertasse a sua face.
- Não é possível senhor, infelizmente é uma fatalidade. – respondeu o médico com dificuldade.
- Você não entende doutor! Eu sou um apreciador do belo! A beleza é algo limpo e um guia. É como um sol. Eu sou esse sol!! Não sou essa escuridão imunda e vergonhosa que reflete no espelho. – Antenore segurava o pescoço do médico que já estava quase sem ar.
- Se o senhor não se acalmar, irei chamar a policia!
- Devolva-me doutor! Devolva-me a minha beleza. – Antenore segurou ainda mais forte o pescoço do pobre médico, até que a vida o deixou.
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