Capítulo 9
Oi pessoal, finalmente consegui postar ainda no domingo e nem é tão tarde! kkkk O capítulo ficou muito longo e fiquei horas tentando achar uma parte para dividi-lo, mas desisti. Vou postar longo mesmo. Espero que gostem das revelações desse capítulo, que não são poucas. E muitas outras ainda estão por vir. Quero agradecer em especial a duas amigas que pegaram no pé a quase todo minuto durante essa semana para eu escrever, vocês são as culpadas de meus atrasos, mas também são as culpadas que consegui postar no dia certo dessa vez rsrsr. Adoro vocês MonikaCostaV e lsamanthan. Como sempre, peço que votem, comentem e convide os amigos para lerem as aventuras de Aédris. Sei que muitos já estão indicando aos seus amigos e agradeço muito por isso. Adoroooo vocês! ^_^
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Símbolos? Para mim são letras. Letras de verdade. Finalmente. Não sou burra afinal. Apenas não tinha encontrado as letras certas antes.
Ajoelho-me diante da rocha quase em uma reverência. Passo meus dedos sobre as letras familiares enquanto procuro por mais inscrições.
- Você realmente consegue ler o que está escrito aí? –pergunta Vanshey mais uma vez.
- Sim, é tudo tão claro para mim. –levanto-me para encarar Vanshey e não fico surpresa ao ver Lorde Kadrahan ao seu lado. – Vocês não entendem nada mesmo?
- Essa inscrição está nessa rocha há milênios. Muito antes de o castelo ser construído. –informa. – Meu pai trouxe os melhores eruditos do mundo, mas nenhum deles foi capaz de dizer que língua é essa e muito menos de traduzir o seu significado.
A expressão no rosto de Lorde Kadrahan é indecifrável. O Duque e o Coronel Eres também se aproximam.
- Eu ouvi direito? Consegue mesmo ler o que está escrito aí, jovem Aédris? –pergunta o duque.
- Sim, diz "Guerreiros Darätzsalah...". –começo, mas sou interrompida.
- Ela acha que sabe. Mas só porque não há ninguém para contradizê-la, não quer dizer que esteja certa. –Lorde Kadrahan com sua delicadeza de sempre quando se trata da minha pessoa.
- Guerreiros Darätzsalah? –o Coronel Eres parece incrédulo.
- Temos que ir. Não temos tempo para especulações.
- Mas...
- Ou vai me dizer que está vendo um livro inteiro nessa rocha? –a ira em sua voz é latente. –A cada instante que desperdiçamos aqui é um minuto a mais que Myris tem que sofrer nas mãos dos cernis.
Dito isso, ele nos dá as costas e segue em direção ao seu cavalo.
Nem eu tenho argumentos contra isso. Os outros o seguem calados. Até mesmo Vanshey. Dou uma última olhada para a inscrição na rocha e os sigo também.
Quando me aproximo de Rius, vejo que Laashii está dando orientações para um guarda colocar mais uma trouxa nela. As outras meninas correm para me abraçar antes que eu tenha tempo de descobrir do que se trata.
- Pedi para o meu pai me deixar usar calças como você. –diz a pequena Lena.
- E eu pedi espadas como as suas. –é a vez de Liz.
- Se você me dizer como consegue comer tanto e não engordar, já fico feliz. –Lessa.
Aceito os abraços de forma desajeitada.
- Calças são mesmo mais confortáveis, Lena. E quando essa missão terminar, te ensinarei a usar espadas, Liz. Quanto a comer e não engordar, deve ser porque uso meus punhos sempre que posso, Lessa.
Não desencorajo nenhuma das meninas. Talvez assim o duque perceba que não sou uma boa influência para suas filhas e desista da ideia absurda de me ter como nora.
Ganho sorrisos radiante das três e depois finalmente consigo chegar a Rius onde Laashii me espera.
- O que tem nessa trouxa? –pergunto logo de cara.
- Presentes. –responde com um sorriso angelical nada convincente.
- Que tipo de presentes?
- Vestidos.
Começo a tirar a trouxa de cima do lombo de Rius.
- Não posso aceitar.
- Por que não?
- Primeiro porque não gosto de vestidos. Segundo, mesmo se eu gostasse, eles não são nada práticos em uma missão.
- É uma pena. –Laashii solta um suspiro dramático. – A principio eu quis te dar alguns dos meus, mas como você é mais alta e as meninas também queriam te dar vestidos de presente, as costureiras tiveram que trabalhar a noite inteira costurando especialmente para você.
- Você fez as pobres mulheres trabalharem a noite inteira? –isso me deixa zangada.
- É claro que elas ganharão dois dias de folga por isso. –se apressa em esclarecer, já que deve ter notado que fiquei indignada. – E receberão uma gratificação extra em moedas de ouro.
- Acho bom mesmo.
- Mas o árduo trabalho delas será desperdiçado se você não aceitar o presente. –completa com ar de pura lástima.
Laashii com certeza vai garantir um lugar no conselho real um dia se continuar com essa lábia. Devolvo a trouxa ao lugar que estava.
Ela me abraça satisfeita.
- Cuide bem do meu irmão. –ela pede depois que subo em Rius.
Prefiro não responder. Ela pode interpretar qualquer resposta que eu dê do jeito que bem entender. E eu definitivamente não quero ter a Laashii espalhando a sua versão dos fatos.
Um pouco mais distante, vejo Larcan abraçando o pai e depois as irmãs. Laashii corre para se juntar a eles.
Apenas aceno para o duque, sem dar a ele a chance de se despedir de mim com mais um dos abraços da família. Olho para o céu e vejo que Tov já está com Dras em suas costas, fazendo cambalhotas no ar para assustar o volun. Assim que montarmos acampamento a noite, Dras não me escapa. Lanço um último olhar para aquela família que me recebeu com tanto carinho e incito Rius a correr para alcançarmos os outros.
Voltamos a rotina de nossa jornada, parando apenas alguns minutos para comermos alguma coisa durante o almoço e alimentarmos os animais, para logo em seguida voltarmos a correr. Logo a linda paisagem verdejante dos arredores do Ducado de Vanshey fica para trás.
Quando finalmente anoitece, decidimos montar acampamento em um campo aberto. É mais seguro para nos prevenir de outro ataque de bandidos assassinos. O local escolhido não possui nenhuma árvore, apenas uma vegetação rasteira, mas ainda estamos seguindo o curso do rio que margeava o ducado. O que me garante mais um dia de banho. Mas sei que em algum momento, não contarei com a mesma sorte.
Cada vez estamos mais ágeis para armarmos nossas barracas e não demora muito para o acampamento estar pronto para passarmos a noite.
Lorde Kadrahan manda alguns dos homens verificarem o perímetro e também manda Tov sobrevoar os arredores para termos certeza que não fomos seguidos pelos mascarados.
Entretanto, pela forma aterrorizada que o grandalhão, líder deles me olhou, duvido muito que tenham nos seguido. Algo me diz que ainda estão correndo e na direção oposta. Lembrar disso me deixa irritada. O grandalhão sem dúvidas me conhece e o mais intrigante de tudo, ele me teme mais que uma assombração. Se eu não tivesse me comprometido com essa missão, nesse momento estaria atrás daquele bando, para arrancar dele o que sabe sobre mim.
Continuo procurando por Dras, mas novamente não o encontro em parte alguma. É impressão minha ou ele está me evitando?
A fogueira é acesa, ao modo tradicional, já que Dras ainda não apareceu. Rius também já sumiu para suas escapadas por liberdade. Só Tov voltou do seu voo de vigilância e trouxe consigo uma enorme ave que como sempre devora aos meus pés.
Os homens estão conversando alegremente enquanto comem e Vanshey pela primeira vez não se senta ao meu lado para uma refeição, porém não está muito longe. Ele certamente está apenas me dando um pouco de espaço para refletir sobre suas palavras da noite anterior.
Depois que termino de comer meu terceiro pão apimentado com doce de priss, estou prestes a levantar para procurar Dras mais uma vez, quando o Coronel Eres se senta ao meu lado e pede:
- Senhorita Aédris, poderia me dizer exatamente o que dizia a inscrição?
Sinto a atenção de Lorde Kadrahan se voltar em nossa direção. Ele está conversando com Fins a poucos metros de nós. Ele continua a conversa, mas sei que seus ouvidos estão atentos.
- Dizia "Guerreiros Darätzsalah nunca morrem. Vivem para sempre". –respondo. – Vi sua expressão quando falei sobre os Guerreiros Darätzsalah. Já ouviu falar sobre eles, Coronel Eres?
- Por favor, pode me chamar apenas de Eres. –ele coloca os cotovelos nos joelhos e apoia o queixo nas mãos pensativo. – E sim, já ouvi falar sobre eles.
De repente sinto o chão tremer sob meus pés. Tudo está tremendo ao meu redor. Um cheiro fétido contamina o ar, tornando difícil respirar. Reconheço esse cheiro, não me lembro de onde, mas sei o que significa. Bestas. Khrratz! Eles não estão sozinhos. Preciso correr. Avisar os outros. Eles nos separaram de propósito.
Com as cimitarras em punho, corro o mais rápido que posso. Vanshey é o primeiro que avisto. Sua expressão é de puro horror quando uma sombra enorme paira a sua frente. A besta deve ter uns seis metros de altura, com oito pares de olhos no que acredito ser sua cabeça. É difícil saber, pois a coisa não tem pescoço. A boca da fera tem pelo menos três fileiras de presas afiadas e é capaz de engolir alguém inteiro. Há espinhos pontiagudos saindo de todo seu corpo. Seus membros são longos e com garras letais. A coisa hora rasteja, hora fica em pé sobre os membros inferiores. Vanshey não tem chances contra a besta. Está encurralado entre ela e a muralha de pedra. Mas ele luta bravamente. Se esquiva de suas garras várias vezes e tenta atingir sua carapaça com golpes de espada.
Então ele me vê, e nesse segundo de distração a besta o acerta com sua cauda, a única parte do corpo da criatura que não tem espinhos, mas deve pesar o suficiente para esmagar um homem. Ele é arremessado contra a muralha e seu corpo cai no chão completamente imóvel. Sangue escorre em cascata de sua cabeça. A besta se prepara para devorá-lo. Preciso fazer alguma coisa. Em uma tentativa desesperada, miro nos olhos da criatura e arremesso minhas cimitarras. Elas se cravam em alguns dos olhos da besta e a criatura fica desorientada por um momento, se movendo sem direção certa. Me esquivo de seus movimentos incertos para chegar até Vanshey. Tenho que tirá-lo de lá antes que a besta se recupere.
Ele está completamente imóvel e não consigo sentir sua respiração. Ele não pode estar morto. Me recuso a aceitar.
- Você não pode morrer, está me ouvido Larcan? –grito furiosa. –Abra os olhos, temos que correr, você não pode morrer!
Antes que eu consiga saber se ele está vivo ou morto, sinto o bafo podre sobre mim e a besta me agarra fechando as garras ao redor do meu corpo. Entretanto, ao invés de me esmagar em sua pata ou me fatiar com suas garras, ela me arremessa pelo ar a muitos metros de distância de onde Vanshey está.
Ao cair no chão, ouço um estalo seguido de uma dor horrível no joelho esquerdo. Engulo um grito de dor. Tenho certeza que o quebrei. A criatura rasteja em minha direção. Pelo menos consegui desviar a atenção dela de Vanshey. Talvez depois de me devorar, ela se sinta satisfeita e desista dele. E se ele ainda estiver vivo, talvez consiga fugir dela.
Tento me levantar, mas a dor em meu joelho torna isso impossível e só me resta aceitar a minha morte iminente. Vejo os dentes afiados vindo em minha direção, mas no último segundo, alguém se coloca a minha frente.
Lorde Kadrahan cai de costas sobre mim. Sua espada cravada na garganta da besta. A criatura tomba para o lado. Todo seu peso está sobre mim. Com muito esforço arrasto-me para sair debaixo dele. A dor em meu joelho cada vez pior. Devo minha vida a Lorde Kadrahan mais uma vez. Olho para ele. Há sangue, muito sangue nele. Ele não se mexe. As presas que deveriam ter me engolido atravessaram sua armadura e rasgaram seu peito de ponta a ponta. Não. Não. Não!!!!
Com dificuldade, sento-me e coloco sua cabeça em meu colo. Passo meus dedos sobre seu peito e minha mão é encharcada com o seu sangue.
- Não, você não pode me deixar! –lágrimas incessantes escorrem pelo meu rosto. – Por favor, não morra!
Ele não respira. Uma dor profunda se apodera do meu peito. Um desespero sem fim começa a tomar conta de mim.
- Você não pode morrer! –grito em meio ao choro compulsivo. – Não pode! Por favor, não morra!
Dedos de ferro seguram meus ombros e me sacodem.
- AÉDRIS! AÉDRIS! –grita uma voz furiosa que já conheço tão bem. – Desperte, Aédris!
Meus olhos se focam na figura em pé a minha frente. Lorde Kadrahan me encara com olhos cheios de raiva, mas tudo o que minha mente e meu coração registram é que ele está vivo! Ele está vivo! Atiro-me em seus braços.
- Você está vivo! Pensei que tinha perdido você! –o abraço forte sem intenção de soltá-lo e ainda chorando copiosamente. – Você salvou a minha vida, mas morreu em meu lugar!
Ele não me abraça de volta. Seus braços estão suspensos no ar. Sinto seus músculos se tencionarem entre meus braços, ele prende a respiração, mas ouço seu coração batendo acelerado.
Ao poucos meu cérebro identifica o que aconteceu. Tive outra visão do futuro. E agora minha mente está de volta ao presente, no acampamento, de pé abraçada a Lorde Kadrahan perto da fogueira com todos os guerreiros nos olhando. Tento em vão controlar meu choro, mas as lágrimas não param de cair. Nem me lembro de já ter chorado antes. Pelo menos desde que Snotra me encontrou, tenho certeza que não.
Lorde Kadrahan me afasta bruscamente.
- Você só pode ter ficado louca. –sua voz é gélida. – Eu nunca arriscaria a minha vida para salvar a vida de uma bruxa.
Ele me dá as costas e segue rumo a sua tenda.
- Senhorita Aédris, pode nos contar o que viu em sua visão? –pede o Coronel.
Vanshey está ao meu lado antes que eu perceba. Meu primeiro impulso é abraçá-lo também, mas chego a conclusão que não é uma boa ideia. Ele me entrega um lenço e um cantil de água.
Seco minhas lágrimas com o lenço e bebo o cantil inteiro antes de começar a falar. Conto tudo a eles. Tudo sobre o que vi, sobre a besta monstruosa e como Lorde Kadrahan e Vanshey foram mortalmente feridos. O Coronel Eres me questiona sobre quem são os tais "eles" que nos separaram de propósito e se havia mais de uma besta, mas não sei a resposta. E se vanshey ficou assustado quando narrei sua possível morte, não demonstrou.
- Irei contar ao General. –Eres diz depois que termino meu relato. –Precisamos tomar as providências necessárias para evitar que essas tragédias aconteçam.
Ainda quero saber o que o coronel sabe sobre os Guerreiros Darätzsalah, mas acho que esse assunto pode esperar. Suspiro resignada.
Eres e mais alguns soldados seguem para a tenda de Lorde Kadrahan. Os demais se juntam em pequenos grupos para discutirem todas as formas que conhecem para matar os mais variados tipos de bestas.
Olho ao meu redor, mas Vanshey não está mais por perto. O encontro distante das barracas alisando a crina de Rius. Tov brincando com o rabo dela como sempre, mas ela parece nem se importar, já que tem Vanshey lhe acariciando o pescoço. Dras está encolhido dormindo com a cabeça apoiada em sua mochila perto deles. Ele me escapou de novo. Penso em acordá-lo, mas preciso conversar com Vanshey.
- Você parece passar mais tempo com Rius do que com seu próprio cavalo. –digo em tom de brincadeira. – Cuidado, pois ele pode ficar com ciúmes.
- Tudo o que ele quer quando me vê é um torrão de açúcar, ao contrário de Rius que parece prestar atenção em tudo o que digo.
- Ela é mesmo uma ótima ouvinte. Não é à toa que é a minha melhor amiga. –respiro fundo. –Vanshey, eu queria...
- Você realmente o ama tanto assim?
Definitivamente não era desse jeito que eu queria começar essa conversa. Aliás, esse tópico nem seria abordado seguindo o meu roteiro.
- Sabe, quando ouvi você gritando meu nome, dizendo que eu não podia morrer e pouco depois começou a chorar desesperada implorando para que eu não a deixasse. –ele frisa a palavra "eu" ironicamente. –Cheguei a acreditar que realmente se importava comigo. Por um momento nem me importei com a possibilidade de morrer, a alegria de saber que você sentiria a minha falta desesperadamente era maior.
- Vanshey... –começo de novo, mas ele não me deixa falar.
- Mas não era por mim que você estava chorando como se sua vida tivesse acabado também. –a tristeza na voz de Vanshey mexe com algo dentro de mim. – Era por ele. Você implorou para que ele não morresse, para que não a deixasse. Enquanto para mim, você apenas deu uma ordem para que eu não morresse.
Ele sorri, mas seu sorriso não alcança seu olhar triste.
- Então apenas obedeça e não morra. –digo sem pensar.
Rius relincha alto como se estivesse me dando uma bronca.
- Rius parece se importar mais comigo do que você. – agora ele ri de verdade. – Bom, por enquanto acho que terei que me contentar que você se importa o suficiente para não querer que eu morra.
- É claro que não quero que você morra. –digo irritada sem saber com o que exatamente.
- Só não entendo como pode amá-lo se ele sempre a trata tão mal. –ele parece reconsiderar e completa. – Pelo menos na maioria das vezes.
- Eu nunca disse que o amo. –faço uma careta. – Isso é coisa da sua cabeça.
Vanshey arqueia as sobrancelhas em sinal de descrença.
- Está bem, talvez eu sinta uma paixãozinha cega, mas está muito longe de ser amor.
É tão fácil falar com Vanshey. Nunca pensei que estaria conversando essas coisas com outra pessoa um dia, muito menos com ele.
- Farei de tudo para que você supere seja lá o que for que sente por ele. –diz se aproximando perigosamente.
- Irei superar. –digo com mais convicção do que realmente sinto. – Sei que o coração dele pertence a princesa.
- É o que dizem e realmente quero acreditar que ele ama a minha prima, mas...
- Prima?
- O que é um duque se não o irmão de um rei? –pergunta ele divertido com a minha surpresa. –Meu pai, o Duque Karus, que obviamente ainda não sabe o nome, é o irmão mais novo do Rei Tratus. Matou essa aula de história?
- Provavelmente. –uma curiosidade me vem a mente. – Por que suas irmãs não estudam com você no Centro de Aprendizagem da Cidade da Corte?
- Porque o Ducado de Vanshey possui o segundo melhor Centro de Aprendizagem de todo o reino. –diz sem falsa modéstia. – Também estudei lá a maior parte da minha vida.
- E por que...
- Disse ao meu pai que queria estudar na corte quando soube que você estudaria lá.
Ele está cada vez mais perto. Sei o que pretende e uma parte de mim diz que não é uma boa ideia. Por outro lado, seria assim tão ruim?
Hesitante, ele ergue a mão direita e coloca uma mecha do meu cabelo atrás da minha orelha. Ele já está tão perto que sinto sua respiração em meu rosto. A mesma mão que ajeitou meu cabelo, agora delicadamente ergue o meu queixo. Meu coração dispara em meu peito, mas não sei dizer se é porque quero o beijo ou porque a voz da razão diz que estou prestes a cometer um grande erro. Esse será o meu primeiro beijo ou já fui beijada antes? Ele fecha os olhos e inclina a cabeça, enquanto eu olho para seus belos lábios cada vez mais próximos dos meus. O que eu queria conversar com ele mesmo? Sou incapaz de lembrar.
Desisto de pensar se estou cometendo um erro e fecho meus olhos também. Quase sinto o roçar de seus lábios, mas um relincho alto nos assusta e nos afastamos. Rius está relinchando muito alto e sem parar. Dras acorda assustado e dispara bolas de fogo para todos os lados. Vanshey e eu temos que nos abaixar para não sermos atingidos. Tov com a maior calma do mundo simplesmente dá uma patada na cabeça do volun para ele acordar de vez.
- Mestra Rius! Mestra Rius! Dras ajudar no perigo. Dras ajudar! –diz volun se colocando em uma engraçada posição de ataque.
- Não há perigo nenhum, Dras! –Vanshey diz muito irritado. – E por pura sorte você não colocou fogo em uma das barracas.
- Qual é o problema, o que aconteceu? –pergunta Fins que veio correndo para o local onde estamos seguido de vários outros guerreiros.
- Nada. –respondo. –Rius se assustou com alguma coisa e acabou assustando Dras também que disparou bolas de fogo sem querer.
- E o que assustou Rius? –pergunta Lorde Kadrahan abrindo passagem entre seus homens. – Pode perguntar isso a ela, Dras?
Epa!
Dras olha para Rius que solta um relincho baixo dessa vez e apenas acena com a cabeça.
- Mestra Rius dizer que uma abelha a picou.
Será mesmo? Momento muito oportuno para uma abelha aparecer. Mas nem Rius e nem Dras teriam motivo para mentir. E será que cavalos mentem?
- Uma abelha? Picadas podem ser perigosas para um cavalo. –Vanshey é pura preocupação com Rius. –Dras, pode iluminar aqui? Preciso tirar o ferrão. Pergunte a ela onde foi?
Dras faz o que Vanshey pediu e aponta para o dorso esquerdo de Rius.
- Fins, verifique com mais alguns homens se nenhum lugar começou a pegar fogo nos arredores. –ordena Lorde kadrahan. – Não quero acordar com minha tenda em chamas.
Ele se vira e nos deixa. Fins e outros guerreiros prontamente começam obedecer a Lorde Kadrahan, os demais voltam para suas cabanas.
- Achei! –Vanshey diz. – É um ferrão enorme! Vai ficar tudo bem, garota. Vou cuidar de você. –se voltando para mim, pergunta. – Tem algum remédio que podemos usar para aliviar a dor dela?
- Claro, eu vou pegar.
Corro em direção a minha barraca. Dras fica com eles, mas Tov me segue quase entediado.
Depois que cuidamos de Rius, evito ficar a sós com Vanshey novamente. Digo que já estou com muito sono e arrasto Dras comigo.
Quando estamos apenas o volun e eu em minha barraca, exijo:
- Dras, onde encontrou a pedra que trouxe para mim?
- Dras não poder contar. –ele diz com muita tranquilidade. – Dras fez juramento das Sete Luas e Suas Divindades.
- Mas Dras, é muito importante. Eu preciso saber. –imploro.
- Dras gostar muito de Mestra, mas Dras gostar muito mais da cabeça de Dras no pescoço.
Excelente argumento.
- Dras com sono. Dras dormir. –ele dá um bocejo longo para enfatizar. – Dormir bem, Mestra.
- Boa noite, Dras. –digo derrotada.
O volun sai para dormir ao ar livre, como faz todas as noites. Ele costuma dizer que gosta de dormir sob a luz do luar.
Os dias que se seguem são carregados de tensão. Todos estão à espera que a qualquer momento bestas horrendas surgirão do nada para nos atacar. Eres disse que não tem conhecimento de nenhum local com muralhas na região que estamos e Lorde Kadrahan confirma que realmente não há nenhuma. Aparentemente ele conhece muito bem o caminho que estamos seguindo.
A tropa já me aceitou completamente e sempre antes de dormir, pratico luta e duelos de espadas com eles. A jornada finalmente se tornou mais divertida para mim e por fim acabo deixando de lado a visão que tive. Talvez ela não aconteça. Sempre há uma primeira vez para tudo.
Também passei a evitar Vanshey a maior parte do tempo, pois não quero correr o risco de sucumbir a tentação. Pelo menos não antes de colocar meus sentimentos em ordem.
A única nuvem negra nos meus dias é Lorde Kadrahan, que anda mais rabugento do que nunca. Seu mau humor está no ápice e até mesmo seus homens o evitam sempre que podem. E eu continuo sendo o principal alvo de seus acessos de raiva.
Já estou há quase três dias sem tomar um banho decente quando finalmente temos a sorte de encontrar um laguinho para nos banhar. O problema é que estamos no meio de nossa parada rápida para o almoço e quando sugiro nos demoramos um pouco mais para podermos nos banhar, é como se tivesse dito para dormimos o dia inteiro.
- Não temos tempo a perder, bruxa. –o escárnio em sua voz é presente em cada sílaba. – E definitivamente não estou disposto a desperdiçar nenhum segundo para satisfazer as suas vontades.
- Qual é o seu problema? Tenho certeza que não sou a única por aqui que quer um banho! –olho ao redor em busca de apoio, mas ninguém se manifesta. – Uns minutos a mais não fará diferença.
- Todos os minutos são preciosos, pois a vida de Myris...
- Talvez se você tivesse protegido melhor a mulher que ama, ela não estaria agora nas garras dos malditos cernis e nenhum de nós teria que ser arrastado nessa missão suicida! – esbravejo sem pensar.
Vejo a cor sumir de seu rosto e no mesmo instante arrependo-me de minhas palavras.
- Eu... Desculpe-me. Não tive a intenção de...
- É claro que teve a intenção. –sua voz soa mais cortante que uma lâmina. – É isso que as bruxas fazem. São sempre cruéis e vis. Só se importam em satisfazer as próprias vontades. Não se importam com ninguém mais além de si mesma.
Trocamos olhares de ódio por alguns segundos, então ele sobe em seu cavalo e dispara em uma velocidade absurda que nunca vi antes. Os guerreiros o seguem sem questionar. Vanshey entre eles. Provavelmente até ele deve achar que fui muito cruel em minhas palavras.
Olho para o lago e sua água turva. Os dois sóis ardentes sobre a minha cabeça tornam a água ainda mais tentadora. Bom, pelo menos agora tenho o lago só para mim e não preciso tomar banho de roupa. Começo a despir-me ansiosa pelo frescor da água.
Demoro um pouco para alcançá-los e se Rius não fosse tão veloz provavelmente não teria conseguido. Tov os acompanhou a certa distância e se não fosse por ele teria me perdido. Eles mudaram a rota da direção que havíamos decidido tomar anteriormente. Sem querer dar o braço a torcer, não pergunto nada a ninguém quando estou entre a tropa novamente.
A paisagem ao nosso redor volta a ser árida e montanhosa, mas ao menos dessa vez temos um pouco mais de verde, com algumas árvores aqui e ali. Há até mesmo flores coloridas em alguns lugares, mas nenhuma que eu seja capaz de identificar. Vanshey com certeza é capaz de dizer o nome de cada uma delas. E elas exalam um adorável aroma silvestre no ar.
Mais tarde, à noite, decido não treinar com os outros, pois quero fazer valer por mais tempo o banho que tomei. E alguma coisa me perturba. Sinto que entre os mil e um assuntos que fervilham em minha mente estou deixando passar alguma coisa importante. Buscando um pouco de silêncio para pensar melhor a respeito, decido ir para minha barraca comer sozinha a minha sopa de legumes, mas ao chegar nela encontro um dos guerreiros sentado no chão ao lado da entrada.
- Entur? –pergunto. A essas alturas já decorei o nome de todos.
Entur é o mais velho dos guerreiros da tropa. Tem alguns fios grisalhos entre os cabelos castanhos e uma barba aparada também grisalha. Seus olhos são castanhos e tem um nariz torto que parece já ter sido quebrado mais de uma vez. Uma cicatriz avermelhada que começa no canto de seu olho esquerdo perto do nariz e se perde no meio da barba perto da orelha, o faz parecer muito perigoso. E há muitas outras cicatrizes espalhadas em seus braços musculosos.
- Jovem Aédris, perdoe-me por estar aqui sem ser convidado, mas gostaria de conversar com você. –diz com um sorriso amigável.
- Tudo bem. –sento-me ao lado dele no chão e começo a tomar a minha sopa. – Sobre o que quer conversar?
- Vim lhe pedir para não julgar tão severamente Lorde Kadrahan. –quase engasgo com essa.
- Eu? É ele que me julga mal o tempo todo.
- Vou lhe contar a estória dele, para que possa compreendê-lo melhor. –Entur pensa um pouco. – Bom, pelo menos a parte da estória que sei.
Agora ele tem a minha total atenção, embora eu não tenha ideia do porquê ele quer que Lorde Kadrahan seja compreendido por mim.
O meu silêncio o encoraja e ele começa:
- Lorde Kadrahan é o único filho de Lady Sahane. A filha mais nova do Conde de Meehtryus. O Conde tem três filhos mais velhos e sendo a única mulher, ela sempre foi a menina dos olhos dele. –Entur solta um longo suspiro antes de continuar. –Lady Sahane sempre foi conhecida por sua beleza, simpatia e inúmeras outras virtudes. Príncipes de todos os reinos queriam desposá-la e todos disputavam por sua atenção, mas ela sempre se manteve fiel aos seus princípios de se casar por amor. E embora o conde quisesse muito ter um príncipe como genro, ele sempre respeitou a vontade da filha.
Tov aparece e começa a lamber a sopa da tigela em minhas mãos. Nem ligo.
- Mas um dia, para o total desapontamento de seu pai, Lady Sahane lhe deu a notícia que estava esperando um filho fora dos laços sagrados do matrimônio. –o olhar de Entur está perdido em lembranças. – Em um primeiro momento, o conde acreditou que sua filha tinha sido forçada a algo que nunca permitiria sem ser casada, mas ela negou. Disse que se entregou por amor. E é claro que seus irmãos ficaram furiosos e tentaram arrancar dela o nome do homem que a desonrou, mas ela nunca revelou o nome do pai de seu filho.
Um filho bastardo e daí? Não foi o primeiro e com certeza não será o último. Como saber desse fato me fará entendê-lo melhor, ainda não sei.
- Como era de se esperar, Lady Sahane foi excluída de toda a sociedade e vista como uma vergonha e mau exemplo por todos. Muitos pais em situação semelhante teriam expulsado a filha de suas vidas, mas o conde amava a filha acima de qualquer erro que ela tivesse cometido e acolheu ela e a criança em seu ventre. –seu sorriso agora demonstra orgulho do conde. – Seus irmãos não ficaram nada satisfeitos e alegando que ela era uma vergonha para a família, praticamente obrigaram o conde a confinar Lady Sahane dentro dos muros do castelo. Mas ainda assim Lady Sahane, mesmo grávida e posteriormente com um filho continuou recebendo pedidos de casamento, muitos deles de homens nobres que estavam dispostos a assumir mãe e filho, tamanho era o fascínio que ela exercia sobre todos.
Aposto que Entur foi um desses homens que estava disposto a aceitar o filho de outro homem. É evidente pela forma como ele diz o nome dela que ele a amava e talvez ainda a ame até os dias de hoje.
- Ela se casou com algum deles?
- Não. –ele reponde com um sorriso triste. – Talvez porque nunca acreditou que nenhum deles fosse realmente capaz de amar seu filho, mas acho que a verdade é que ela nunca deixou de amar o pai da criança.
Há uma mágoa profunda em suas palavras.
- E o que aconteceu quando Lorde Kadrahan nasceu? -pergunto o incentivando a continuar.
- Como sua mãe, ele era uma criança que fascinava a todos que o conheciam. Era uma criança adorável.
O que essa família tem para fascinar a todos de forma tão cega? Penso, irritada.
- Mas não era apenas por seu carisma natural que ele fascinava as pessoas. –diz quase como se tivesse respondendo ao meu pensamento. – Desde muito pequeno ele era um bom menino. A criança com o coração mais generoso que conheci em toda a minha vida. Estava sempre brincando com os filhos dos empregados e sempre dava seus brinquedos para eles. Os defendia, os ajudava em seus afazeres, era realmente uma criança boa.
E quando ele se tornou esse ogro? Pensando bem, a fama que ele tem por todo o reino é de ser um homem justo e generoso. Obviamente ele somente se transforma em um ogro odiável comigo.
- Logo ele virou o queridinho de seu avô e passou a ser a única alegria de sua mãe. –continua Entur alheio as minhas divagações. – E como o Conde e o Rei sempre foram grandes amigos, o pequeno Kadrahan e Nars acabaram se tornando melhores amigos desde crianças.
Entur passa as mãos nos cabelos e respira fundo, como se buscando forças para dizer o que viria a seguir.
- Infelizmente, quando o pequeno Kadrahan ia começar sua vida escolar, a caravana que o levava a cidade da corte para estudar, foi atacada e ele levado por bárbaros. –sua tristeza é palpável. – Lembro-me que ele estava muito ansioso para aprender as letras, mas não fui capaz de protegê-lo. Ganhei muitas dessas cicatrizes naquele dia, mas foi em vão. O Conde e o Rei mandaram seus melhores homens por todo o reino na busca pelo menino, mas nunca o encontraram. Assim como sua mãe nunca mais foi capaz de sorrir depois que o perdeu. Ela chorava dia e noite por seu filho desaparecido.
- Que horror! –falo realmente triste. – Nenhuma mãe merece passar pela tristeza de perder um filho.
Por um momento penso se em algum lugar tenho uma mãe sofrendo pelo meu desaparecimento. Será que ela ainda procura por mim?
- Os anos passaram e nunca encontraram nenhuma pista do paradeiro do menino e muitos acreditavam que ele já estava morto. Mas um dia, muitos ciclos de luas depois, o jovem Kadrahan que você conhece bateu a porta do castelo, se apresentando como Kadrahan Medrahan, filho de Lady Sahane Medrahan e neto de Pargys Medrahan, o Conde de Meehtryus.
Agora a estória está ficando realmente interessante. Quero me aproximar mais de Entur para ouvir melhor, mas Tov está dormindo de barriga para cima com a cabeça apoiada em meu colo.
- Lady Sahane o recebeu de braços abertos. Dizia ter certeza desde o momento que colocou os olhos nele que era mesmo o seu filho que tinha voltado. –mais um longo suspiro. – É claro que o conde e muito menos seus tios não acreditaram assim tão facilmente nele. Sempre foi de conhecimento geral o desaparecimento do menino Kadrahan e ao longo dos longos ciclos de luas muitos impostores tentaram se passar por ele. E o fato do jovem Kadrahan se negar terminantemente a dizer qualquer coisa sobre o tempo que passou desaparecido, também não ajudou.
- Ele não contou absolutamente nada?
- Tudo o que ele disse foi que, ou o aceitavam sem perguntas sobre o passado ou ele simplesmente iria embora novamente para nunca mais voltar.
Algo realmente terrível deve ter acontecido para ele se recusar a contar até mesmo para a própria família.
- E eles simplesmente concordaram com os termos dele?
- Não foi bem assim. O príncipe Nars fez alguma pergunta de quando eles eram crianças que apenas os dois sabiam e ele soube responder. –Entur diz. – E a palavra de um príncipe é lei. Até mesmo os tios e seus primos tiveram que aceitá-lo depois que o príncipe declarou que seu melhor amigo estava de volta.
O menino podia ter contado a alguém o que quer que fosse e esse alguém podia ter se passado pelo neto do conde, mas acho melhor não comentar. De algum modo também tenho certeza que Lorde Kadrahan não é um impostor.
- E Lady Sahane, ela...
- Sim, ela está viva e vive no Condado de Meehtryus.
- Mas depois de tanto tempo separado dela, por que Lorde Kadrahan a deixou lá? Por que não a trouxe para viver em Barian com ele?
- Ela não quis e ele só aceitou o cargo de Capitão da Guarda porque queria ficar perto de Myris. Acho que eles se apaixonaram a primeira vista. Ou melhor, eles se conheceram quando crianças, mas sabe o que quero dizer. E Sahane não queria ser uma vergonha para o filho que ficou noivo de uma princesa.
- E ele sente vergonha da mãe?
- É claro que não. –responde com veemência. – Mas ele sabe como as pessoas podem ser maldosas e não quis sujeitar a mãe a qualquer tipo de humilhação por parte do esnobes da corte. Ele sempre a visita de tempos em tempos.
- E você o segue por todos os lados para protegê-lo e assim tentar conquistar o coração da mãe dele?
- É mais do que isso. –ele admite sorrindo. – Realmente quero protegê-lo. Se eu tivesse sido capaz de protegê-lo quando ele era menino, nenhum dos dois teria sofrido tanto.
- Acho que ele sabe se defender muito bem sozinho.
- Além dessa estória, há algo que poucos sabem. –prendo a respiração. – Logo que o jovem Kadrahan voltou, ele sofria de pesadelos terríveis. Somente a mãe era capaz de acalmá-lo. A lembrança de vê-lo naquele estado, ainda me atormenta. É como se sua alma tivesse sido despedaçada, como se estivesse a beira da insanidade. Algo terrível aconteceu com ele. Algo tão terrível a ponto de lhe devastar a alma. Então ele reencontrou Myris e ela lhe devolveu a paz que ele tanto precisava.
- E eu o acusei de não ter protegido a mulher que lhe devolveu a paz ao coração. –por isso o magoei tanto. Sinto-me péssima.
-Desconfio que seja lá o que for que ele sofreu ao longo dos ciclos de luas, tem a ver com bruxas e essa seja a razão para que ele a trate tão mal, senhorita Aédris.
- Está bem, tentarei ser mais condescendente com ele. –penso por um segundo. – Mas por que a minha opinião sobre ele importa?
- Por que ele não é tão indiferente a você quanto tenta parecer. Você é uma bela mulher e qualquer jovem como ele se sentiria atraído. E é isso que quero que entenda. Não passa de atração. Você não deve criar falsas ilusões. Myris é a mulher certa para ele. Enquanto ela traz paz ao coração dele, você só irá despertar os pesadelos do jovem lorde.
Ele se levanta.
- Sei que é uma boa pessoa e tomará a decisão certa de se manter afastada. –diz isso e vai embora.
Maravilha! Entur deve mesmo amar Lorde Kadrahan como seu próprio filho e quer garantir que a bruxa má, no caso eu, não despedace o coração de seu filhinho. Como se eu tivesse alguma chance.
- Mestra! Mestra! Acorde!
- Dras, ainda não amanheceu! –resmungo me virando para o outro lado.
- Mas já vai amanhecer, venha, Mestra.
- Não quero outro bichinho de estimação... –reclamo ainda sonolenta.
- Mestra se arrepender se não vier.
Minha curiosidade me vence e depois de calçar as botas, o sigo. Tov nos acompanha parecendo estar tão irritado quanto eu por ter sido acordado tão cedo.
Subimos uma pequena colina um pouco distante das barracas. O primeiro sol começa a despontar no horizonte e quando ele surge completamente, fico de queixo caído.
Estou diante da mais bela paisagem que já devo ter visto na vida. Montanhas de todas as cores estão diante de meus olhos, como se os próprios deuses tivessem usados pincéis para traçar linhas transversais ao longo das montanhas. Perco o fôlego diante de tanta beleza. Assim que a vida sempre deveria ser. Cheia de cores.
O caminho além das montanhas coloridas nos leva a um povoado tão cheio de cores quanto as montanhas. Parece que chegamos durante algum festival, nas ruas as pessoas cantam e dançam em roupas igualmente coloridas, algumas nos olham curiosas, mas a maioria parece nem se importar com nossa presença.
O povoado é repleto de casinhas simples e de todas as cores. Há flores nas janelas, crianças correndo e a alegria paira no ar como se fosse algo tangível. Fico imediatamente encantada pelo lugar. Será que consigo convencer Snotra a viver aqui um dia? As ruas são estreitas e por isso temos que controlar os cavalos a darem passos lentos. A animação das pessoas é contagiante e logo os guerreiros começam a desmontar e se juntarem a festa. Até mesmo eu sou incapaz de resistir a melodia da música, ao som das gargalhadas. Quando dou por mim, já desci de Rius e estou dançando entre as pessoas. E eu nem gosto de dançar. A multidão está cada vez maior. Deixo-me levar sem rumo por elas.
Tem algo errado. Não vejo Rius, Tov e nenhum dos outros. Consigo me livrar da maré de pessoas e acabo em uma ruazinha com casas velhas, cheirando a mofo e claramente abandonadas. Sigo pela rua e chego no que deve ser o fim da vila. Há somente um terreno amplo e árido a minha frente cercado por uma enorme muralha.
Khrratz! Preciso encontrar Vanshey. Lorde Kadrahan deixou claro que nunca arriscaria sua vida por mim, então não preciso me preocupar com ele. Vanshey é a minha prioridade. Consegui recarregar minhas flechas no ducado e não as tirei das costas desde a minha visão. Infelizmente elas sumiram. Não sei como, mas sumiram. Estou somente com minhas cimitarras, exatamente como na visão. Malditos aldeões. Foram eles. Separaram-nos de propósito e sei que não estão sozinhos. O chão treme e o cheiro de podridão que invade minhas narinas quase me sufoca. É muito pior que na visão. Começo a correr na direção que sei que encontrarei Vanshey.
A besta horrenda de minha visão já está diante dele. Ele bravamente começa a lutar contra ela e está usando algo na cabeça. Um elmo? Ele me vê, mas dessa vez não se distrai. Parte para cima dela mirando sua garganta. Mas infelizmente a fera é mais rápida e consegue se esquivar de seu golpe. E é aí que as coisas se complicam para o meu lado. A cauda da besta me atinge e sou arremessada para longe. Choco contra a muralha, mas dessa vez tento proteger meu joelho. Não sinto nada quebrar, mas a minha cabeça bateu com muita força na rocha, sangue escorre pela minha nuca e estou muito tonta. Com a pancada forte na cabeça, acabei soltando minhas cimitarras que caíram em algum lugar longe de mim.
Tento me levantar, mas o mundo está fora de foco. Um homem, ou algo que parece ser um homem surge diante de mim. Ele não tem boca e nem nariz, mas tem três olhos negros no centro de onde deveria ser sua testa. Sua pele é amarela e há espinhos por toda a parte de seu corpo. Na ponta de seus dedos, garras enormes estão em posição de ataque e prontas para me fatiar. Essa coisa não estava na minha visão.
Quero me levantar e lutar, mas a dor lacerante em minha cabeça torna isso impossível. Então tudo acontece de novo. Vejo garras afiadas vindo em minha direção e no último segundo alguém se coloca a minha frente.
Sinto o peso de Lorde Kadrahan caindo sobre mim. Sua espada está atravessada na criatura que jaz diante de nós. O amparo em meu colo e vejo cinco cortes de uma ponta a outra de seu peito que atravessaram sua armadura como se ela fosse feita de manteiga. E há sangue em toda parte.
- Mentiroso! –grito sentindo as lágrimas já escorrendo pela minha face. –Você disse que não arriscaria a sua vida por mim! Abra os olhos, cretino mentiroso!
Ele abre os olhos com dificuldade, sua respiração está fraca, mas ainda respira. Teria sorrido de alegria se não fosse pelo o que disse a seguir.
- Larcan.
Zarmey! Me odeio por isso, mas me esqueci completamente de Vanshey. Olho ao redor e vejo que ele ainda está lutando com a besta, está cheio de ferimentos e visivelmente cansado. Não irá conseguir continuar lutando por muito mais tempo.
A tontura diminuiu, preciso ajudá-lo, estou prestes a me levantar, quando algo que vejo me paralisa no mesmo lugar ainda com Lorde Kadrahan em meus braços. Vejo Rius correndo a toda velocidade em direção a besta. Ela se coloca entre Vanshey e a fera. E algo surpreendente acontece. Sua forma começa a mudar. Garras surgem no lugar das patas, seu corpo cresce cada vez mais e ela fica do tamanho da fera se tornando uma também. Seu novo corpo é bípede com músculos por toda parte. Cinco chifres enormes saem de sua cabeça e seu focinho alongado possui mais dentes afiados que a besta. Rius é mais ágil que a criatura, mas a fera consegue cravar os dentes em seu ombro direito. Ela urra de dor, mas contra ataca usando os dentes também. As duas rolam em uma luta feroz cheia de urros e rosnados. Rius por fim consegue cortar a garganta da besta, mas em seu último suspiro, a fera perfura a barriga de Rius com um de seus espinhos. A besta tomba inerte para o lado e Rius também cai no chão voltando a diminuir de tamanho.
Depois de me certificar que Lorde Kadrahan continua respirando, ainda um pouco zonza, vou até Rius. Vanshey está muito ferido, mas está de pé ao lado dela, tão surpreso pelo o que acabou de ver quanto eu. Aos poucos ela começa mudar de forma mais uma vez, mas não é para forma de um cavalo que ela volta quando a transformação termina.
Diante de nós, deitada e ensanguentada, há uma linda garota de longos cabelos loiros com mechas marrons.
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