Capítulo 11
Olá, amigos! Tudo bem com vocês? Olha, juro que tentei fazer um capítulo extra para vocês, mas não parei em casa na última semana. Fui curtir Star Wars no cinema, depois tive um casamento para ir e por fim as festas de Natal. Entretanto, para compensar, até que esse capítulo ficou grandinho e está cheio de muitas revelações. Mas não pensem que todos os mistérios foram esclarecidos. Esse capítulo foi apenas a ponta do iceberg. kkkk. Quero aproveitar e pedir um favor para vocês. Quando lanço um novo capítulo, vejo que algumas pessoas correm para comentar e realmente amo isso. Amo vocês comentando a cada parágrafo. S2 Mas acho que algumas pessoas se empolgam tanto comentando, que se esquecem de votar depois. Então peço, por favor, que ao final da leitura não se esqueçam de votar. Essas estrelinhas são muito importantes para nós autores. ^_^ Muito obrigada pelo imenso carinho que recebo de vocês todos os dias. Continuem comentando, votando e convidando os amigos. Adoro todos vocês!
**************************************************************************
- Aédris, você tem que... –Rius adentra a tenda feito um furacão e me encontra olhando para as minhas mãos e Lorde Kadrahan totalmente curado. – Ah, vejo que já se lembrou dessa parte...
- Eu não me lembrei de nada. Como fiz isso?
- Não me pergunte da dinâmica da coisa. É algo que você simplesmente faz.
- Ótima explicação. –falo irritada. – Vai ajudar muito quando eu precisar usar isso de novo.
- Não precisa fazer essa cara. –ela diz se sentando ao meu lado. – Eu realmente não sei como você faz.
Rius parece sincera e não tenho porque duvidar dela. Se nem eu mesmo entendo o que fiz, como ela poderia saber?
Volto a minha atenção a Lorde Kadrahan, coloco a minha mão em sua testa e me preocupo imediatamente.
- Se o curei mesmo por que ele ainda tem febre? –pergunto aflita.
- Veneno de Nöhkarium é muito forte. Até mesmo eu demoraria mais que o meu normal para me curar. –ela também sente a temperatura dele, mas em seu braço. – O seu dom deve demorar uns dias também para expulsar completamente o veneno do organismo dele.
- Mas ele não corre mais o risco...
- De morrer? Não. Ele deve ficar mais um ou dois dias com febre e talvez tenha delírios, mas vai ficar bem. –Rius de repente olha atentamente para o meu pescoço. – Isso aí é sangue?
Levo a mão ao meu pescoço e meus dedos voltam com um sangue escuro coagulado. Quando me banhei antes de dormir, estava tão cansada que não lavei a cabeça, por isso não notei o machucado.
- Pelos deuses, Aédris! Quando é que você vai aprender a deixar de ser tão desleixada consigo mesma? –ela quase quebra o meu pescoço ao me puxar para mais perto. Depois começa a repartir meu cabelo procurando pelo ferimento.
- Por que eu deveria me preocupar se me curo rapidamente também? -Ela finalmente toca em um ponto sensível no alto da minha nunca. - Ai! Tome cuidado!
- Já disse que você não é como eu!
- Mas...
- Isso aqui foi da luta com a besta? Deveria ter levado pelo menos uns dois pontos!
- Deve ter sido quando aquela coisa me jogou contra a muralha e bati a cabeça.
Enquanto falo, ela pega alguns dos medicamentos ao lado de Lorde Kadrahan e já começa a cuidar do meu corte.
- Fico um dia ausente e você já fica andando por aí com a cabeça rachada! –ela está limpando o meu ferimento e não está sendo nem um pouco delicada.
- E já que é a minha guardiã, posso saber por que não me ajudou na luta contra os mascarados?
- O quê? Contra aqueles vermes insignificantes? –ela solta uma gargalhada debochada. – Você poderia ter acabado com todos de olhos fechados.
- Mas levei uma flechada, caso não se lembre.
- Você foi apenas descuidada e isso não a torna incapaz. –Rius que aparentemente terminou de limpar o sangue coagulado, agora avalia o machucado e simplesmente diz: – Não é tão fundo quanto eu pensei! Sua cabeça dura serviu para alguma coisa!
- Não entendo! Ai! –delicadeza realmente não é com ela. O que ela está fazendo agora? – Por que não me curei como da última vez?
Silêncio. Um silêncio prolongado demais. Rius está pensando em uma mentira para me dizer.
- Também já disse que nem eu entendo como você funciona! –ela enche o corte com a pasta para não infeccionar, espreme o sumo de folhas de zundi para cicatrizar e dá por encerrado o seu trabalho.
- Essa coisa vai melecar o meu cabelo! –reclamo, fingindo que engoli a resposta fajuta dela.
- Melhor assim. Temos que garantir que o pouco cérebro que tem não vaze pelo buraco em sua cabeça. –diz se levantando.
- Muito engraçadinha! Você bem que gostaria que isso fosse verdade. –também fico de pé e a encaro. – Assim talvez eu caísse nas suas desculpas esfarrapadas!
Ela sorri com um misto de culpa e orgulho.
- Fiz uma promessa e sabe perfeitamente que meus lábios estão selados. Não posso te dizer nada!
- É da minha vida que estamos falando! –esbravejo.
- Aédris, você nunca fez o tipo dramática! Por favor, não comece agora! – Ela se vira em direção a saída da tenda. – Vamos! Estão todos querendo saber notícias da saúde do general!
Deixo-a ir enquanto analiso as minhas opções. Quando fazemos uma promessa em nome das Sete Luas e Suas Divindades, estamos presos a ela. Se prometemos não dizer algo, de fato nenhuma palavra sai de nossos lábios. Se prometemos fazer algo, somos compelidos a fazer seja lá o que for que prometemos. Mas há formas de contornar uma promessa dessas. Só preciso fazer as perguntas certas.
Dou uma última olhada em Lorde Kadrahan antes de sair. Ele ainda está inconsciente, mas não há vestígios das garras do Nöhkarium. Ele ficará bem e o alívio finalmente toma conta de mim. Olho mais uma vez para as minhas mãos. Eu o curei. Não sei como, mas eu o curei.
Todos recebem a notícia da "cura milagrosa" de Lorde Kadrahan com muita alegria. Como já estou farta de mentiras e omissões, conto a todos exatamente como ele foi curado. Como eu o curei com as minhas próprias mãos. Como usei um tipo de magia de cura que não sabia ser capaz. Espero algum tipo de reação negativa, que voltem a me chamar de bruxa ou alguma outra ofensa qualquer, mas ninguém parece se importar com o método, apenas que seu general não corre mais o risco de morrer.
Entur depois de muito me agradecer, arrasta um dos homens e corre para cuidar de Lorde Kadrahan. Muitos fazem menção de querer ver seu general, mas Entur logo os afasta dizendo que ele precisa de descanso até a febre passar.
Os guerreiros parecem ter mais medo de Rius do que de mim no momento, mas são vencidos pela curiosidade e começam a se aproximar dela.
Agora estamos todos sentados ao redor da fogueira apagada e Rius é o centro das atenções. Vanshey está sentado do lado oposto a nós e apenas escuta calado a nossa conversa.
- Você, ou melhor, a senhorita... É verdade que pode se transformar em qualquer animal ou fera? –pergunta Oris.
- Sim, por isso é melhor nunca me irritar. Posso me transformar em uma fera gigantesca e te engolir inteiro. –sua voz é monótona como se estivesse constatando um fato e não brincando.
- Mestra Rius ser muito brava! –confirma Dras que está sentado ao lado dela. – Nunca, nunca irritar Mestra Rius.
- E você sabia o que ela era esse tempo todo e não me disse? –pergunto ao mesmo tempo em que o suspendo no ar pelas orelhas enormes.
- Dras bonzinho, Mestra! Dras não poder contar! Dras fez promessa!
O solto e ele vai se esconder atrás de Vanshey.
- Dras esquecer, Mestra muito, muito mais brava e perigosa que Mestra Rius!
- Acho que todos nós devemos tomar cuidado! –Fins diz em tom de brincadeira. –Temos duas belas mulheres extremamente perigosas convivendo entre nós de agora em diante!
- Quantas vezes vou ter que repetir, seu filhote mal educado? –Rius ralha com Tov que está as suas costas brincando com seus longos cabelos que vão até a cintura. – Crina ou cabelos, você não pode brincar com eles!
Tov a ignora completamente, já que pelo menos no momento não corre o risco de levar um coice.
- Acho que agora você não inspira muito medo nele! –Vanshey comenta sorrindo finalmente entrando na conversa.
- Vou fazê-lo ter medo em um minuto se ele soltar um único fio do meu vestido com essas unhas!
Rius fica de pé e apenas sua mão direita começa a mudar. Fica maior, a pele muda para um marrom avermelhado, com textura grossa e de seus dedos começam sair garras enormes que formam uma espécie de mini jaula ao redor de Tov. Ele se encolhe todo e definitivamente fica assustado.
- Acho que realmente não devemos irritá-la. –Fins fala para Oris com olhos arregalados.
Os outros guerreiros que estavam ao nosso redor de repente acham alguma coisa para fazer e se afastam. Se Rius queria causar medo, conseguiu.
Nosso grupo de conversa agora consiste apenas de Fins, Oris, Vanshey, Gonn, Jilliabi, Rius, Dras e eu. Um Tov enjaulado também.
- Senhorita Aédris, acho que temos uma conversa pendente. –diz Eres se aproximando e sentando ao meu lado na grama cheia de orvalho.
Olho para ele por uns segundos tentando me lembrar de qual conversa pendente ele se refere. Há muitos assuntos em minha cabeça, mas finalmente me lembro. Realmente havia algo me perturbando. Como se esses dias todos eu tivesse esquecido algo muito importante, então digo:
- Guerreiros Darätzsalah!
As garras de Rius se retraem e Tov vem correndo e deita a cabeça no meu colo. Incerteza paira no olhar de Rius e não tenho dúvidas que ela está decidindo se deve ou não interromper Eres. Por fim ela suspira resignada e volta a se sentar.
- Confesso que também estive evitando retomar essa conversa por receio de estar enganado. –começa Eres. – Afinal nada sobre a senhorita faz sentido, mas talvez agora a senhorita Rius possa preencher as lacunas que não entendo.
Rius faz uma cara de quem diz "não vou atrapalhar, mas também não vou ajudar". Veremos.
- O que sabe sobre os Guerreiros Darätzsalah, Eres? E o que eles podem ter a ver comigo em sua opinião?
- Os primeiros Guerreiros Darätzsalah surgiram durante a criação de nosso mundo e dizem ter uma força sobrenatural. Dizem que um único Guerreiro Darätzsalah vale por cem homens. Eles são extremamente fortes, excelentes em combate corporal e peritos em todos os tipos de armas.
- E eles ainda existem nos dias de hoje?
- Sim, dizem que eles são guerreiros nômades e vivem em todas as partes do mundo. Que são divididos em vários clãs, mas que todos atendem ao chamado de um único líder.
- E o que eles são? Mercenários, assassinos, ladrões?
- O que sei é que eles aparecem em tempos de guerra, sempre ajudando o lado mais fraco se sua causa for justa. –o Coronel sorri. – Alguns acreditam que eles são enviados dos deuses para proteger os mais necessitados e por isso dizem que são imortais. Outros acham que eles não passam de mercenários e tentam recrutá-los, mas ninguém sabe ao certo como encontrá-los.
- E você já conheceu algum Guerreiro Darätzsalah, Eres?
- Não, mas qualquer homem que já esteve em um campo de batalha, já ouviu estórias sobre eles. –ele endireita a coluna e me encara. –Dizem que eles se mantêm incógnitos e podem até mesmo estar entre nós sem sabermos.
- Você está insinuando que eu...
- Com suas habilidades de luta, faria todo o sentido se não fosse por um detalhe. –diz intrigado.
- Qual?
- Se há algo que todos têm certeza sobre os Guerreiros Darätzsalah, é que só existem guerreiros homens entre eles.
- Quê? –pergunto fazendo uma careta. –Eles têm que nascer de algum lugar e certamente esse lugar se trata de uma mulher. E para existirem clãs espalhados pelo mundo, eles devem ter filhos e com certeza devem nascer meninas também.
- Obviamente que sim. –responde ele parecendo se divertir com a minha indignação. – Mas dizem que somente os meninos são treinados para se tornarem guerreiros.
- E pareço ser alguém que segue as convenções? –ergo minhas sobrancelhas para enfatizar.
- O fato de você conseguir ler algo que provavelmente só eles sabem ler, definitivamente quer dizer alguma coisa.
Sinto uma alegria crescer em meu peito e sorrio abertamente. É a pista mais concreta de quem eu realmente sou que tenho. E quase tudo se encaixa. Minha pericia com o arco e a flecha, com as cimitarras e tenho certeza que sou capaz de manejar qualquer outra arma com destreza também. Minhas habilidades de luta, o sentimento que tive durante a emboscada, como se meu corpo sentisse falta daquele fervor de uma batalha. E o grandalhão líder dos mascarados sem dúvidas era fisicamente mais forte que eu. Mas ainda assim, não tive muitas dificuldades em vencê-lo. E há também o fato de eu conseguir ler a inscrição na rocha...
- Também já ouvi estórias sobre os Guerreiros Darätzsalah. –diz Gonn, um sujeito magricelo de cabelos ralos, mas extremamente habilidoso com seu bastão de aço. – E realmente todas elas relatam apenas guerreiros homens.
- Mas como é possível que nenhum dos eruditos foi capaz de reconhecer a inscrição na rocha como sendo algo na língua desses guerreiros? –Vanshey diz com expressão intrigada.
- Nunca soube de relatos que eles deixassem inscrições por aí. –Eres simplesmente dá de ombros. – E se a senhorita Aédris não tivesse traduzido e citado o nome deles, eu nunca teria associado também.
- Já cansei de especulações! –digo ficando de pé tão repentinamente que Tov sacode a cabeça irritado. – Sua vez de falar, Rius!
- Eu não...
- Duvido muito que sua promessa tenha sido não falar sobre os Guerreiros Darätzsalah. –ela também fica de pé e nos encaramos sem piscar por longos segundos.
Por fim Rius desvia o olhar e depois de respirar fundo, diz:
- Está bem. –começa resoluta. – Você é uma guerreira Darätzsalah, satisfeita?
- Então há mesmo mulheres entre os Darätzsalah? – Jilliabi, um rapaz geralmente muito quieto e com quem eu só troquei poucas palavras até agora, fala pela primeira vez na conversa.
- É claro que sim. –retruca Rius com impaciência. – Como a própria Aédris disse, nascem meninas também.
- Sei que tem mais, Rius. –meu tom deixa claro que não vou aceitar que ela continue me enrolando. – Continue.
Ela joga os braços para cima.
- Por todas as luas! –sua irritação é visível. – Tinha me esquecido o quanto você é autoritária quando quer!
Agora sou eu que me irrito.
- Não estou mandando! Estou lhe pedindo como amiga! –minha voz se eleva e muito. – Ou você não é tão minha amiga quanto pensei que fosse?
Ira se inflama em seus olhos.
- Como se atreve a dizer isso? Quando dedico a minha vida a lhe proteger! –ela grita.
- Me proteger do quê? –pergunto também gritando.
Sua expressão se suaviza e ela volta a se sentar na grama evitando me olhar nos olhos.
Ao nosso redor, ninguém ousa emitir nenhum som. Os outros guerreiros voltam a se aproximar para escutar a discussão. Vejo que até mesmo Entur saiu da tenda de Lorde Kadrahan e veio ver o que está acontecendo.
- Realmente, mulheres não são criadas e muito menos são treinadas para se tornarem guerreiras Darätzsalah. –continua Rius enquanto olha para todos os lados, menos para mim. – Mas seu pai era Faraahtz, o líder de todos os Darätzsalah e segundo você me contou, um dia ele apareceu com uma recém-nascida nos braços e disse que a criaria para ser uma guerreira e sua sucessora. –um sorriso brota de seus lábios. – Como ninguém nunca foi capaz de derrotá-lo, simplesmente tiveram que acatar suas ordens.
Ajoelho-me diante dela.
- Era? Ele...
- Ele faleceu logo depois... –Rius se interrompe engolindo em seco. – Quando você estava pronta para assumir o lugar dele.
- Como ele morreu?
- Ele estava doente há muito tempo e simplesmente sucumbiu a doença quando viu que você seria capaz de liderar os Darätzsalah. –antecipando a minha pergunta, ela completa. – Membros de outros clãs podem desafiar o sucessor pela liderança, mas você provou ter herdado a força de seu pai e venceu todos os que ousaram tentar roubar o lugar que era seu por direito.
Isso explica muitas coisas, mas não tudo.
- E quanto a minha mãe?
- Seu pai nunca lhe contou nada sobre ela.
- Ela muito provavelmente era uma bruxa. –Entur se intromete constatando o óbvio.
- É o mais provável, de fato, mas nunca tivemos certeza. –ela responde enquanto cruza os braços diante de si. – Os dons... Os dons peculiares de Aédris só começaram a surgir quando ela deixou de ser criança.
- Quando nos conhecemos, Rius? –pergunto.
Ela sorri abertamente e finalmente volta a me olhar nos olhos.
- Quando éramos muito pequenas, criancinhas mesmo. –seu olhar agora está perdido nas lembranças. – Um dia você encontrou na floresta uma criatura pequena e ferida. Eu ainda não sabia me controlar, por isso o que você encontrou era algo feio e disforme. Mesmo assim não teve medo e cuidou de mim. –tristeza passa em seu semblante, mas no segundo seguinte é substituída por ternura. – Eu já tinha sido muito maltratada pelas pessoas e você foi a primeira a realmente se importar comigo. Nunca mais te larguei depois disso.
- Queria poder me lembrar disso. –lamento. – Assim como queria me lembrar do meu pai e de todo o resto.
- O seu pai era um homem bom e também foi como um pai para mim. –ela segura minhas mãos nas suas. – Isso é tudo o que precisa saber.
Discordo, mas no momento basta. Minha cabeça começou a doer com tanta informação e o meu esforço inútil de tentar lembrar de tudo que me foi dito.
De repente o rosto de Rius a minha frente fica fora de foco e o mundo ao meu redor começa a escurecer. Pelo menos já estou ajoelhada no chão. Esse é meu último pensamento antes de perder os sentidos.
Desperto muitas horas mais tarde e além da escuridão da floresta, o ronco do meu estômago diz que não perdi apenas o almoço, mas o jantar também. Olho ao redor e vejo que estou em minha barraca e Rius está dormindo serenamente ao meu lado. Ainda bem que minha barraca não é muito pequena e tem espaço suficiente para duas pessoas.
Com cuidado para não acordá-la, saio engatinhando e do lado de fora encontro Dras dormindo com a cabeça apoiada nas costas de Tov que também dorme.
Fico de pé e alongo os meus membros doloridos de tanto dormir. A fogueira já está apagada e vejo pontos de luz espalhados à distância. Com certeza são os sentinelas e suas lamparinas.
- Está se sentindo melhor?
Não fico surpresa ao me virar e deparar com Vanshey zelando por mim como sempre. Se ao menos eu pudesse mandar em meu coração...
- Sim, acho que só apaguei principalmente porque dormi apenas umas duas horas na noite passada. –ele segura uma lamparina em uma das mãos e na outra... – Isso aí é comida? –pergunto apontando para o embrulho.
- Claro, guardei para você! –ele me presenteia com um sorriso afetuoso e ao mesmo tempo preocupado. – Imaginei que estaria com muita fome quando acordasse.
- Estou faminta! –respondo.
Sentamos-nos perto da fogueira apagada e ele tira do embrulho tudo que guardou para mim. Peixe e coelho assados, pão de sadewa, creme de priss, um cantil de suco de amora e outro de água.
Começo a devorar tudo sem me fazer de rogada.
- Então você é uma lendária guerreira Darätzsalah... Como está se sentindo a respeito disso?
- Não sei. –falo com a boca cheia. – Não consigo pensar quando estou com fome.
Ele solta uma gargalhada alta, antes de dizer:
- Bom saber, isso me dá ideias...
Faço a minha melhor cara de ameaça antes de dizer:
- Tem certeza que quer ter ideias idiotas agora que sabe que fui criada para ser uma guerreira letal?
- Você não me machucaria. –diz com convicção.
Arqueio minhas sobrancelhas e inclino a cabeça sugestivamente já que ainda estou com a boca cheia.
- É mesmo. Você já me deu muitos socos e quase quebrou o meu nariz uma vez. –ele esfrega a face direita como se estivesse lembrando a dor novamente. – Mas isso foi antes. Agora pelo menos amigos nós somos, não?
- Sim. –termino de engolir meu último pedaço do coelho. – Somos amigos com certeza.
Pego o pão, mas paro a meio caminho da minha boca e volto o meu olhar na direção da tenda de Lorde Kadrahan.
- Vá vê-lo. É o que você quer, não é? –desde quando minhas emoções se tornaram tão transparente para Vanshey? – Entur foi dormir na barraca dele e se ele saiu de perto do General, é porque ele deve estar melhor.
- Obrigada, Vanshey. Por tudo.
- Sempre estarei ao seu lado quando precisar, mesmo que apenas como um amigo. –chego a abrir a boca para falar, mas ele continua. –Ainda não quero sua resposta.
- Vanshey...
- Não desisti de você. – Ele me dá um sorriso travesso enquanto se levanta. – Preciso apenas aperfeiçoar melhor as minhas ideias antes de pensar se devo ou não desistir.
- A sua lamparina... –é tudo que consigo dizer.
- Pode ficar. Já estou morrendo de sono. –diz já de costas para mim enquanto caminha para sua barraca. – Boa noite, Aédris.
Pego o que restou da comida, na verdade apenas o pão e a água e então me levanto.
É apenas uma visita médica, tento me convencer enquanto caminho até a tenda de Lorde Kadrahan.
Uma vez lá dentro, ainda de pé, aproximo a lamparina dele. Ele está exatamente como eu o deixei, na mesma posição e sem camisa, apenas usando a calça preta. Custava muito Entur tê-lo deixado vestido de forma mais decente? Agora que não está mais cheio de cortes, é muito mais fácil admirar o tórax musculoso.
Suspiro e tento incorporar uma curandeira indiferente e responsável. Ajoelho-me e coloco a lamparina e a comida a uma distância segura. Em seguida olho para ele. Seus olhos estão fechados e suor escorre de todo o seu rosto. Coloco a mão em sua testa. A febre voltou e está suando frio. Não preciso me preocupar. Não preciso me preocupar. Não preciso me preocupar. Repito diversas vezes em pensamento. Rius garantiu que ele ficará bem. Febre já era esperada. Até mesmo delírio ainda pode acontecer. Pego um pano e umedeço na bacia que Entur deixou por perto. Seco o suor e volto a molhar o pano. Repito o processo algumas vezes, mas chego a conclusão que não há mais nada que eu possa fazer e devolvo o pano ao lugar que estava.
Antes que eu me sinta tentada a ficar ali a noite inteira admirando ele, decido voltar para a minha barraca e é quando o ouço murmurar:
- Myris... Myris...
Não consigo evitar franzir o cenho ao ouvi-lo chamar por ela.
- Myris... Não... Não...
Ele está delirando e é por ela que ele chama para acalmar seus pesadelos.
Estou prestes a me levantar, quando ele abre os olhos. Seus olhos sem foco giram para todos os lados, como se procurasse por algo, ou melhor, por alguém. Então seu olhar se fixa no meu, mas tenho a certeza que não é a mim que ele vê, quando diz:
- Meu amor, você está aqui! –antes que eu consiga reagir, sua mão direita segura o meu punho e me puxa para si. – Ao menos em meus sonhos posso tê-la novamente em meus braços. –e com a mão esquerda ele segura o meu pescoço e me puxa de encontro aos seus lábios.
E como tenho sangue nas veias, eu correspondo ao beijo. É um beijo quente, literalmente, já que ele está febril, mas carregado de paixão. Como se ele há muito tempo estivesse faminto e ansiando por saciar a sua fome. O beijo vai se tornando mais lento, carinhoso e cheio de amor. Ele me aperta cada vez mais em seus braços, como se tivesse medo de me perder. Então me lembro. Não é a mim que ele acha que está beijando. É ela que ele não quer perder. Myris, sua princesa, sua noiva...
Como também tenho amor próprio, me livro de seus braços. Ele murmura mais alguma coisa ininteligível e depois simplesmente tomba a cabeça para o outro lado. Sua respiração acelerada ao poucos volta ao normal e sei que agora que acha que sonhou com sua princesa, ele terá um sono tranquilo.
Já a minha respiração acelerada e meu coração disparado não voltarão ao normal tão cedo. Levo os dedos aos meus lábios. Que espécie de mulher eu sou? Aproveitando-me de alguém doente delirando de febre. Tenho que sair daqui antes que eu faça alguma outra besteira. Saio praticamente correndo da tenda.
Como estou sem um pingo de sono, pego novas roupas para tomar banho no pequeno lago represado que Rius encontrou antes. Acordo Tov e ele vêm comigo de vigia. Dras e Rius continuam dormindo.
Tov escolhe uma das rochas mais alta e senta-se nela. Tenho certeza que seus ouvidos apurados e visão aguçada irão me alertar de qualquer intruso.
Tiro minhas roupas e entro no lago. A água está gelada, muito gelada, mas é melhor assim. Dessa vez lavo os meus cabelos e tiro todo o remédio que deixou parte dele melecado.
Quero refletir sobre as recentes descobertas do meu passado, sobre ser uma guerreira Darätzsalah e tudo mais que isso implica, mas simplesmente não consigo. Meus pensamentos involuntariamente voltam para onde não devem.
Termino meu banho e decido fazer algo de útil, já que refletir não está me levando a lugar algum. Procuro um dos sentinelas e passo a noite vigiando o perímetro de nosso acampamento com Tov ao meu lado.
Como obviamente gosto de me torturar, tão logo os primeiros raios de sol passam pelas copas das árvores, vou até a tenda de Lorde Kadrahan. Apenas para checar se a febre passou. Apenas isso.
Para a minha surpresa, o encontro já de pé vestindo uma camisa preta.
- Obrigado. Sei que isso foi obra sua. –ele diz apontando para o próprio peito enquanto fecha os últimos botões.
- Só retribuí o favor. – digo mordendo o lábio inferior enquanto abaixo a minha cabeça e desvio o meu olhar. – Você já salvou a minha vida duas vezes. Agora te devo apenas uma.
- O que você fez agora?
- Por que acha que fiz alguma coisa? –pergunto na defensiva.
- Porque você sempre faz essa cara quando aprontou algo e se sente culpada. –ele balança a cabeça e suspira alto. – E como você raramente se sente culpada das coisas que apronta, tenho até medo de saber o que foi dessa vez.
Epa! Será que ele se lembra do beijo? Ele não estaria me perguntando se aprontei algo se lembrasse, certo?
- Filho, graças a todas as divindades você já está de pé! Sente-se melhor? –Entur entra na tenda me poupando de responder.
- Estou melhor sim e já disse para não me chamar assim. –seu tom é seco.
Entur não está na minha lista de pessoas preferidas, mas precisava falar dessa maneira com o homem que o considera como filho? Que estava apenas preocupado com ele?
- Peço desculpas, general. Não voltará a acontecer.
- Há quanto tempo estamos aqui?
- Duas noites e um dia.
- Acorde a todos. Diga para comerem algo e comecem a levantar acampamento. Devemos partir o quanto antes.
Vejo que a comida que deixei para ele ainda está intocada.
- Você precisa comer mais do que qualquer um. Vou pedir para alguém lhe trazer mais alguma coisa. –digo antes de sair.
Pouco tempo depois já estamos todos prontos para partir. Todos estão muito felizes por verem seu general completamente recuperado. No momento ele está em reunião com Eres, Entur e mais alguns outros soldados. A essas alturas ele já deve saber sobre minha identidade recém-descoberta e sobre a verdadeira natureza de Rius. Daria tudo para saber qual foi a reação dele diante das novidades.
Falando em Rius, não a vi ainda essa manhã. Ela já não estava quando fui a barraca procurá-la.
- Você conseguiu dormir um pouco ou passou a noite inteira em claro? –Vanshey pergunta ao se aproximar.
- Não dormi nada. Aproveitei e fiz patrulha com os sentinelas.
- Logo vai acabar cansada.
- Tudo bem, acho que fui treinada para passar alguns dias sem dormir e...
Dras se aproxima com Rius em sua forma de cavalo.
- Mestra Rius já está pronta. –Rius relincha e ele começa a traduzir. – Mestra Rius dizer para não esquecer vestidos.
- Rius, agora que sei quem é você, eu não posso... –ela relincha irritada.
- Mestra Rius dizer para não ter frescura. Que Mestra nunca se importou antes.
- Rius, eu posso ir com Vanshey e você como bem entender. –agora sim o relincho dela está realmente irritado.
- Hum... Mestra Rius... Hum... Mestra Rius dizer que... Mestra Rius realmente não importar, Mestra!
Sorrio, pois sei que Dras não traduziu as ameaças que Rius provavelmente falou. Bem, vou ter que me acostumar com isso, afinal ir com Vanshey não era mesmo uma opção. Disse isso apenas para provocá-la. Coloco a sela nela, a mochila e as duas trouxas. Minhas cimitarras estão nas bainhas e o arco e a aljava de flechas nas minhas costas.
Então voltamos a nossa corrida desenfreada e para a minha total alegria, antes do primeiro sol se pôr, chegamos a uma cidade. Uma cidade de verdade e com pessoas de verdade dessa vez. Nada de ilusões. Eu acho.
A cidade não parece ser tão próspera quanto Barian, mas já gosto mais dela. Há árvores e canteiros de flores nas calçadas. A cidade basicamente se constitui de construções de dois ou três andares. Há muitas tavernas e lojas de comércio. Imagino que as moradias devem ficar nos arredores da cidade. As pessoas andam com pressa pelas ruas do que deve ser o centro comercial e o transito de carruagens chega a ser caótico. Aqui com certeza é rota de muitos viajantes, pois ninguém parece estranhar a nossa tropa.
Como novamente precisamos repor nossos suprimentos, nos espalhamos pelas hospedarias da cidade. Lorde Kadrahan, Eres, Entur, Oris, Fins, Vanshey, eu e mais alguns outros ficamos na que parece ser a maior e mais confortável. Tão logo tiro a sela de Rius, ela desaparece.
Subimos para o segundo andar, onde ficam os quartos que passaremos a noite.
- Se precisar de alguma coisa, estou no quarto ao lado com Fins. –diz Vanshey com um sorriso prestativo nos lábios.
- Tranque a porta, pois acho que Rius não verá Fins como um empecilho para te atacar. –o provoco em meio a uma gargalhada. Ele fica corado, mas realmente parece considerar o perigo.
Entro no quarto que escolhi. Ele é grande, possui duas camas, uma mesinha com um vaso de margaridas no centro, duas cadeiras e dois baús em um dos cantos. O chão é de madeira escura e as paredes são pintadas em um tom de azul bem claro. Há uma janela a minha direita sem cortinas e do lado oposto uma porta onde deve ser o banheiro.
Largo as minhas coisas no chão e corro até lá. Há uma pia, um vaso sanitário, uma banheira e tubulação. Amo a modernidade. Será que há uma caldeira para levar água quente pelos encanamentos? Pela primeira vez sinto falta do meu quarto do Centro de Aprendizagem, onde tudo é tão moderno e até com certo luxo. Tenho que admitir que Lorde Kadrahan foi generoso ao pagar por um lugar com tanto conforto. Ouço um barulho e vejo Tov entrar pela janela com Dras em suas costas. Logo em seguida uma bela águia também entra pela janela.. Rius. Acho que devo avisar a Vanshey para trancar a janela também.
Ela se transforma em garota e corre para o banheiro.
- Uma banheira! –exclama ela lá de dentro. – Sabe há quanto tempo não sei o que é tomar banho na água quente de uma banheira? –ouço o barulho de água correndo. – Não pretendo sair daqui por pelo menos uma hora.
O meu próprio banho terá que ficar para depois. Me jogo na cama mais próxima e adormeço instantaneamente.
Acordo com Rius sacudindo meu braço.
- Acorda dorminhoca. Já lhe deixei dormir por duas horas!
- Não foi o suficiente. –viro para o outro lado.
- Vamos sair! Procurar uma festa para nos divertirmos! –coloco o travesseiro em cima da cabeça. – A festa no Ducado de Vanshey estava maravilhosa! Talvez encontremos algo parecido por aqui.
- Você foi a festa lá? –tiro o travesseiro da cara. – Foi por isso que sumiu!
- É claro que fui. Ao contrário de você, sei aproveitar os bons momentos da vida. –ela puxa o meu braço até me fazer sentar. – Vamos, te dou quinze minutos para tomar banho.
- Não quero ir a lugar nenhum. Estou cansada e com sono!
Rius agora está usando um belíssimo vestido lilás com um corpete em um tom de roxo. Duas tranças finas enfeitam a lateral de seu rosto enquanto a maior parte de seus cabelos está solto.
- Está bem. –ela se levanta e caminha em direção a porta do quarto. – Venha Dras, vamos colocar fogo nessa cidade! –olho feio para ela. – Não literalmente, é claro.
- Dras, adorar festas! Dras gostar muito, Mestra Rius. –e os dois simplesmente saem porta a fora.
Tov faz menção de segui-los, mas para com a pata ainda no ar. Olha para a porta e depois para mim e acaba decidindo ficar.
Não acredito que Rius realmente saiu e me deixou sozinha. Ao menos Tov sabe o significado de ser um guardião.
Decido tomar um banho e devo ter adormecido pelo menos uma hora dentro da banheira. Finalmente saio do banheiro, coloco uma calça de couro marrom e uma blusa branca de mangas curtas. Ia voltar a dormir, quando ouço alguém bater a porta.
- Aédris, sou eu, Larcan.
- Já vou! –adeus cama.
- Rius não está? –é a primeira coisa que ele pergunta quando abro a porta.
- Foi festejar por aí.
- Com quem?
Cruzo os braços e sorrio divertida para ele.
- Hum, Lorde Kadrahan mandou te chamar. Teremos uma reunião.
- Só vou calçar as minhas botas. Um minuto.
Chamo Tov que está deitado na cama de Rius, mas ele olha para Vanshey e volta a dormir. Deve julgar que se estou com os outros guerreiros, estou segura e não preciso dele. Seu sono é mais importante.
Logo que estou calçada, sigo Vanshey pelo corredor.
Agora que sabe que sou uma Darätzsalah, Lorde Kadrahan deve considerar a minha opinião a respeito de estratégias mais relevante.
O quarto dele fica no andar acima e é bem maior que o meu. Eres, Entur, Oris, Fins, Gonn e Jilliabi já estão presentes. Estão todos de pé inclinados sobre uma enorme mesa de madeira.
- Estamos decidindo qual é a melhor rota a tomar a partir de agora, senhorita Aédris. –diz Eres assim que me vê abrindo espaço entre ele e Lorde Kadrahan. –Devemos levar sua opinião em consideração, já que uma guerreira Darätzsalah deve entender mais de estratégias de guerra do que a maioria de nós. –seu sorriso é sincero e vejo que ele me tem em mais alta estima.
Entretanto o olhar frio que recebo de Lorde Kadrahan me diz que não foi ideia dele que eu participasse dessa reunião. Agora sim farei questão de opinar em tudo e me fazer ser ouvida.
Olho para mesa e vejo que há um enorme mapa sobre ela. Vanshey que se posicionou entre Eres e Fins, começa a apontar os lugares e dizer os nomes. Será que algum dia aprenderei essas letras?
- Estamos aqui, na cidade de Zaria. Daqui cinco dias de viagem alcançaremos o Deserto de Ossos, aqui. –seu dedo vai seguindo o mapa. – Depois passaremos pela cidade de Talaski e...
- Que lugar é esse? Por que não cortamos caminho por aqui? –pergunto apontando para uma área pequena no mapa. – Chegaremos ao Deserto de Ossos em menos de dois dias se seguirmos por aqui.
- É o Reino de Ismirsha. –Eres responde. – Não seria uma boa ideia chegarmos com uma tropa de cem homens em um reino pequeno como o deles. Eles atirariam primeiro e perguntariam depois.
- Ismirsha... –algo me soa familiar.
- Ismirsha está fora de cogitação. –declara Lorde Kadrahan e tenho a impressão de ouvir certo rancor em sua voz.
- Acho que seríamos bem recebidos em Ismirsha. –digo sem saber ao certo porque disse isso. –Tenho a sensação que já estive nesse reino antes.
Lorde Kadrahan que até então olhava fixamente para o mapa, quase quebra o pescoço com a rapidez que se vira para mim. Há ira crescente em seu rosto.
- Você já esteve em Ismirsha? –seu tom é acusatório e cheio de raiva. – Quando?
- Aédris está certa. –é a voz de Rius que adentra o quarto com Tov e Dras ao seu lado. –Já estivemos em Ismirsha e tenho certeza que seremos muito bem recebidos. Aédris e o Príncipe Niklaus são ótimos... Amigos.
Rius ostenta um sorriso travesso no belo rosto.
- Soube que Ismirsha possui um armamento muito moderno. –diz Entur. – Se a senhorita Aédris e o príncipe são amigos, talvez ele nos ceda algumas.
- Ahhh, tenho certeza que o príncipe ficará muito feliz em rever a Aédris. Ele dará qualquer coisa que ela pedir. Qualquer coisa mesmo.
- Já disse que Ismirsha está fora de cogitação.
- Por que, Lorde? Algum motivo lógico para não irmos? –o sorriso de Rius está cada vez mais amplo. – Posso ir na frente e alertar o príncipe para que não sejamos atacados quando chegarmos, se é isso que lhe preocupa. Ele me conhece, sabe quem e o que sou.
- Estaremos poupando três dias e chegaremos mais rápido a sua princesa, Lorde Kadrahan. –digo com certa amargura.
Esse argumento encerra a questão e fica decidido que partiremos para Ismirsha assim que amanhecer.
Depois da reunião, os homens decidem beber um pouco em uma taverna e Rius me convence a ir com a promessa que me contará o quão amiga eu sou do tal príncipe.
A taverna é um gigantesco salão. Tenho certeza que todos os homens de nossa tropa estão aqui e muitos moradores da cidade também. No ar há um cheiro muito forte. Uma mistura de tabaco, suor e álcool. Há também o tagarelar de várias conversas e músicos tocam instrumentos desafinados em um dos cantos da taverna. Alguns casais dançam alegremente e alguns grupos jogam cartas e jogos de dados nas mesas. E é claro, todos bebem muito.
Rius milagrosamente consegue achar uma mesa vazia para nós.
- Me esperem aqui. Vou arrumar bebida para nós.
Logo a perco de vista no meio de tanta gente e Vanshey foi procurar um banheiro.
A algumas mesas de distância, vejo Lorde Kadrahan com Eres, Entur e Oris. Vejo que é o único que não está bebendo.
- Posso lhe pagar uma dose de Hyon? –pergunta um loiro de cabelos espetados que se senta a minha mesa sem ser convidado.
- Não, obrigada. –digo ao mesmo tempo em que o avalio. Até que ele é bonitinho com seus olhos verdes e sorriso de covinhas.
- A bela dama que fica mais linda ainda de calças, não bebe álcool? Posso lhe oferecer um suco de nascan então. -suco de nascan é uma das bebidas mais caras nesses tipos de estabelecimento.
- Só se quiser me matar. –respondo gargalhando. Com tantos sabores de suco, ele tinha que me oferecer logo nascan? – Sou alérgica a nascan. O que quer dizer que sou muito perigosa e você deve se mandar.
- Por que ser alérgica a nascan a torna perigosa? –pergunta o desconhecido intrigado.
- Porque quer dizer que sou alérgica a nascan como todas as bruxas, o que me torna uma bruxa também. Então é melhor cair fora.
- Se quer se livrar de mim, bela dama, vai ter que inventar outra desculpa. –diz o sujeito que ainda não sei o nome. – Minha bisavó era uma bruxa e não havia nada que aquela velha gostasse mais do que fruta de nascan.
Agora ele tem a minha total atenção.
- Você tem certeza disso?
- É claro! Se apenas uma fruta fosse capaz de matar uma bruxa, já teríamos nos livrado delas há muito tempo.
O estranho tem razão. Ele continua falando, mas já não o ouço mais. Ódio começa a crescer dentro de mim em proporções imensuráveis.
Rius chega com as bebidas, mas derrubo os copos quando me levanto abruptamente.
- Meu vestido...
Vanshey aparece na minha frente e me olha preocupado.
- Você está bem?
- Sai do meu caminho. –o empurro para o lado.
Como fui idiota. Como não liguei os fatos antes? Me odeio por não ter percebido tudo antes. Como pude ser tão cega assim?
Sigo praticamente atropelando as pessoas no meu caminho. Alguns minutos antes ele tinha se levantado para ir a algum lugar e está de costas para mim quando chego até ele.
Os músicos escolheram exatamente esse momento para fazerem uma pausa.
- KADRAHAN! –grito.
Ele que já tinha dado um passo, congela no lugar. Lentamente ele se vira para mim.
- Todo esse tempo você tem mentido para mim! –grito cada vez mais alto. – Você já me conhecia!
Pela primeira vez vejo medo em seu olhar. Um medo real.
- Você recuperou a sua memória? –ele pergunta hesitante.
- Me responda! Você já me conhecia?
Ele pensa por um momento. Obviamente chegando a conclusão que se estou perguntando, é porque não me lembrei de nada. Vejo um certo alivio surgir em seu semblante.
- É claro que eu conhecia você. –ele diz pausadamente. –Todos na corte já tinham ouvido falar da garota no povoado que...
- Não se atreva a fingir de desentendido agora! –a fúria me domina.
As conversas cessaram e todos ao nosso redor nos olham com curiosidade.
- Aédris...
- Como pude ser tão cega? Você me conhece melhor do eu mesma me conheço. O significado das expressões que faço, o meu modo de agir. Consegue antecipar o que vou fazer antes que eu decida. Você me deu o arco e a flecha assim como as cimitarras porque sabia que eu seria capaz de usá-las perfeitamente. Não é qualquer um que consegue manejar cimitarras. Para uma "iniciante", você deveria ter me dado uma espada. E também... O pão com creme de priss você me deu em um gesto tão automático porque já sabia que era assim que gosto, mesmo que eu não soubesse. As inscrições na pedra, você já sabia que sou uma guerreira Darätzsalah. E não são as bruxas que são alérgicas a nascan, apenas eu sou e você sabia disso!
Sinto o mundo tremer ao meu redor, mas não me importo. A raiva me cega.
- Aédris, você precisa se acalmar! –ele diz se aproximando de mim com cautela.
- Não quero me acalmar! –berro enquanto algo desconhecido vibra dentro de mim. – Quero que você me diga a verdade! Toda a verdade! Você me conhece há muito tempo e com certeza foi por isso que foi tão contra que eu viesse nessa jornada! Tinha medo que eu me lembrasse de você!
- Se você não se acalmar, pode destruir esse lugar simplesmente com sua fúria. –ele está cada vez mais perto. – Quer mesmo ser a responsável pela morte de todas essas pessoas?
- Então comece a falar. –digo com a respiração acelerada. – Só assim você não será responsável pela morte dessas pessoas!
*****
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro