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Capítulo 8

Logo depois que Lana acordou, fomos para a pousada de táxi. Dona Mariana resolveu ajudá-la e gentilmente, cedeu um quarto para que ficasse até que pudesse voltar a trabalhar. Lana agradeceu a gentileza, prometendo que lhe pagaria todo o favor que estava lhe fazendo. Dona Mariana, por sua vez, disse-lhe que recusaria qualquer forma de pagamento. Ela recusou-se a ir ao médico e depois de insistir muito, atendemos o seu pedido. Dona Mariana e Alice me ajudaram a cuidar dos seus ferimentos e prometeram certificar-se de que ela iria descansar.

No dia seguinte fui para a faculdade e por sorte, não havia perdido nada de muito importante. Ao contrário da última aula, esta foi um tanto interessante. Começamos a estudar Português para Licenciaturas, uma disciplina básica, mas muito importante para aperfeiçoar a escrita. Sentia-me melhor agora que Lana estava perto de mim, segura. Já conseguia pensar melhor durantes as aulas. Durante a semana aprendemos a fazer resumos, resenhas, referências bibliográficas entre outras coisas que ainda iríamos estudar. Eu diria que de certa forma, até que estava gostando daquele curso.

***

Ao final da semana, no sábado, fui falar com Lana disposto a saber tudo o que aconteceu, também com a intenção de convencê-la de uma vez por todas a prestar depoimento contra Richard. Adiei essa conversa a semana inteira, não posso mais esperar.

— Oi Rick, pode entrar — diz gentilmente, assim que me viu ao abrir a porta.

— Vejo que está melhor — digo, com sutileza — fico feliz.

— Sim, obrigada. — Sorriu — Veio até aqui por algum motivo importante?

— Digamos que sim. Posso entrar?

— Claro — disse, então apontou para um pequeno sofá que havia no quarto, convidando-me para sentar. — Então, que motivo te trouxe aqui?

— Eu não quero ser desagradável Lana, eu sei o quanto é difícil falar do que aconteceu. Mas bem, você sabe que precisa, não é?

Nesse momento, vi seu rosto que antes demonstrava certa calma, mudar completamente.

— Ricardo eu...

– A interrompi — Você precisa prestar depoimento contra aquele homem. Só assim ele poderá ser preso.

— Mas eu não quero ir, por favor, eu não quero mais vê-lo. Não quero mais pensar em nada que tenha relação ao que aconteceu — disse convicta, seu tom de voz demonstrava a angústia que era falar naquele assunto.

— Entendo que não queira mais vê-lo, mas é necessário que você vá até a delegacia, por favor... você não precisa ter medo.

— Prometo pensar, mas não te garanto nada. Por favor, entenda.

Assenti, fazendo com que ficasse mais calma.

— Só me responde uma coisa...

Ela me olhou com receio, como se já soubesse o que poderia perguntar.

— Aquela não foi a primeira vez que ele te agrediu, não é?

Ela permaneceu calada, uma expressão de angústia presente no olhar.

— Por favor Lana, eu preciso que me conte.

— Me deixa sozinha. Eu não quero falar sobre isso.

— Apenas me responde, eu não vou te julgar — insisti.

— Tudo bem. Se é o que quer saber, não. Não é a primeira vez — respondeu, receosa.

Ao ouvir aquela confirmação, passei a ter ainda mais raiva e vergonha do homem que meu pai se tornou.

— Por que me escondeu isso? — perguntei incrédulo.

— Você tem a sua vida, Rick... Eu não quero ser um fardo para você, sei que não tem culpa de meu casamento com seu pai ter dado errado.

— Você não é um fardo para mim, é a minha única família. Aquele homem não é meu pai, ele é um canalha, Lana. Nunca mereceu uma mulher como você.

— Não quero atrapalhar a sua vida — continuou, com lágrimas que ameaçavam cair de seus olhos — Mas não sei como seguir, não sei o que fazer e... — começou a chorar repentinamente. — Tenho vergonha de mim mesma por tudo isso... Desculpe-me.

Abracei-a de imediato, acariciando levemente seus cabelos.

— Lembro-me de quanto estava ao meu lado quando era criança — comecei a dizer — de como era boa e cuidava tão bem de mim. Você não atrapalha a minha vida, você é parte dela — digo e ela forma um leve sorriso em seus lábios.

Ela tem o sorriso mais verdadeiro que eu já vi. Aquele sorriso que nos toca profundamente e que parece sorrir com a alma. E como é bom ver aquele sorriso, como me sinto bem estando ali, ao seu lado.

— Qualquer pessoa faria o mesmo por um garotinho tão adorável como você era — disse, limpando suas lágrimas com as mãos. — Não me agradeça mais por isso.

— Qualquer pessoa não, só você para me aguentar. — ela riu, discordando — Você é uma pessoa muito especial.

— Mesmo não sendo verdade — riu, arrancando-me um sorriso repentino — Obrigada Ricardo. — Então, abraçou-me mais uma vez.

Nesse mesmo instante, Alice entrou pela porta inesperadamente e só percebi sua presença quando observei que ela nos fitava, estranhamente.

— Desculpe por interromper a conversa de vocês, eu só vim perguntar se a Lana precisava de alguma coisa — falou, depois de alguns segundos que pareceram uma eternidade.

— Tudo bem Alice, a porta estava aberta. Muito obrigada por se preocupar — respondeu Lana, gentil.

— Então eu já vou indo. Se precisar de alguma coisa, é só ligar —  disse, então saiu pela porta rapidamente.

Lana disse que precisava ficar sozinha, então eu saí em seguida. Já que não tinha trabalho no sábado, passei o dia escrevendo poesias, o que mais gosto de fazer nos tempos livres. E naquela tarde, por alguma razão, a imaginação fluiu sem esforços.

***


O Sol já havia desaparecido, dando lugar a lua cheia daquela noite, que junto as estrelas, tornavam o céu ainda mais bonito. Da janela do meu quarto, senti o agradável vento gélido da noite, o qual inundava todo o ambiente. Observando aquele cenário exuberante no céu, continuava a escrever uma poesia, aproveitando a inspiração exorbitante que me causou aquela vista.

Logo em seguida, Alice me ligou dizendo que precisava falar comigo urgentemente e que a encontrasse em uma praça perto de casa. Não estava nem um pouco afim de sair e interromper o meu momento criativo, mas como ela disse que era algo importante, eu fui.

— Achei que não viria mais! — disse Alice, assim que me viu. Ela estava estranhamente arrumada e bonita aquela noite.

— Digamos que estava meio sem vontade de sair de casa — respondi.

Ela riu.

— Quase sempre, né?

— É que estava no meu auto momento de inspiração e você me atrapalhou, dona Alice — digo — Mas então, o que você quer falar comigo?

— Preciso te perguntar uma coisa. Mas primeiro senta aqui.

Sentei ao seu lado em um dos bancos da praça, sem entender o motivo repentino de Alice ter me chamado até ali.

— Rick, eu não quero ser intrometida ou algo do tipo,  nós somos amigos, contamos tudo um para o outro e eu preciso te fazer uma pergunta — iniciou — Já venho percebido isso a algum tempo, só quero que me confirme.

Seu jeito alegre e espontâneo de sempre, deu lugar a uma feição séria e um tanto esquisita.

— Que pergunta?

— O que sente pela Lana? — questionou-me diretamente, sem rodeios.

Paralisei no mesmo instante. Não sabia como responder aquela pergunta, ou talvez, escondesse a resposta de mim mesmo. Ponderei um pouco para responder, tentando buscar as palavras mais apropriadas, — as quais não encontrei.

— Não estou entendendo aonde quer chegar — digo, passando as mãos uma na outra, demonstrando sem querer meu nervosismo.

— Eu só quero que diga o que sente por ela de verdade, simples.

Não consegui dizer nada, assumir um sentimento pela Lana era algo estranho para mim. Algo que escondia de todos e até de mim mesmo, mas que no fundo, sei que existe. Entretanto, o que mais me intriga é o porquê da pergunta tão repentina de Alice.

—  Não entendo... Por que a pergunta?

Ela olhou para mim, séria, baixou os olhos e suspirou profundamente.

— Eu preciso te falar uma coisa... — iniciou — Algo que tenho guardado aqui há muito tempo — disse, pegando minha mão e posicionando-a em seu coração, aproximando-se discretamente.

Olhei em seus olhos e tive suspeitas do que ela estava prestes a confessar, desejei profundamente que desistisse.

— Eu te amo Ricardo — começou a dizer, os olhos marejados — Sempre te amei. Mas sabe, me conformava com sua companhia, na esperança de que me notasse algum dia. E é por isso que te perguntei isso, porque tenho medo de perder você.

Eu não sabia como reagir. Permaneci calado por alguns instantes, sem saber o que poderia fazer ou dizer.

— Alice, eu...

— Shhh… — Ela indagou, tocando meus lábios com seu anelar, impedindo-me de responder qualquer coisa.

Então, olhando em meus olhos com extrema ternura, Alice aproximou-se ainda mais de mim e quando menos esperava, nossos lábios se encontraram.

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