Capítulo • 41
Dor.
Algo que venho sentindo de modo constante e intenso nas últimas duas horas. Estou perdendo a noção de tempo e espaço, parece que estou aprisionada dentro de um mundo repleto de dor. Através da janela o dia está surgindo mais uma vez, algo que indica que o tempo se passou e nem ao menos reparei.
Um gemido doloroso escapa pelos meus lábios.
— Não vou aguentar.
— Calma, amor. Estou aqui, vamos passar por isso juntos.
Dominic inicia uma massagem utilizando seus polegares na minha lombar. O suor escorre pelas têmporas, sinto como se estivesse dentro de uma sauna. A camiseta foi substituída em poucas horas por um top, mas ainda permaneço com o short. No momento que a contração cessa, um imenso alívio recai sobre mim. Todavia, sei que não será por muito tempo.
Repouso a cabeça sobre meus braços que estão cruzados na lateral da cama e volto a refazer alguns movimentos emcima da bola. As palavras cujas quais a doutora disse sobre ser relaxante, realmente eram verídicas, no momento que iniciei os exercícios a dor aliviou um pouco.
— Quer água? — questiona Dominic, ainda agachado atrás de mim.
— Não quero vomitar de novo.
Ingeri água em alguns momentos apenas para arrepender-me logo em seguida quando fui parar no banheiro expulsando tudo para fora.
— Não pode ficar sem beber água. Se permanecer assim, teremos que ir para hospital e você será colocada no soro para se hidratar.
Suas mãos deslizam pelas minhas costas, o carinho e reverência em seus gestos ajudam a me acalmar.
— Prefiro o soro.
Sento quase ereta na bolsa e encosto o corpo contra ele, suas mãos repousam na minha barriga, abraçando-me com carinho.
— Amor, acho que podemos ir para o hospital — digo alguns minutos depois.
— Tem certeza?
Ele está ansioso, contudo, o medo surge em alguns momentos nas suas íris e ações desde que tudo se iniciou.
— Sim.
Tento sorrir, mas uma nova contração irrompe daquele mundo de dor para atormentar-me.
— Ainda estão irregulares — o ouço dizer com pesar.
— Não vou conseguir. — As lágrimas escorrem pelas minhas bochechas, a mandíbula tensiona devido a dor e força cuja qual estou travando os dentes.
— Você é forte. — Segura minha mão e a aperto junto com a dor. — Isso, aperte minha mão. Estou aqui, princesa.
Mais um gemido de dor escapa pelos meus lábios e continuo apertando sua mão em conjunto com a intensidade dolorosa. Sinto uma forte pressão, como se a Hope estivesse saindo, contudo tenho em mente que não é o momento correto. Quando a dor cessa, as lágrimas ainda escorrem, mas agora são de alívio.
— Me ajuda a tomar banho? — a pergunta escapa como um mero sussurro.
— Te ajudo no que precisar.
Beija minha têmpora após afastar alguns fios de cabelo do meu rosto. Ele me ajuda a levantar e com passos lentos andamos até o banheiro. Durante todas essas horas desde o início do trabalho de parto, estou com apenas seis centímetros de dilatação. A frustração tem sido uma companheira juntamente com o medo e a dor. Se passaram um pouco mais que vinte horas, todavia sinto como houvesse passado dias.
— Está demorando muito a dilatar.
— Laura disse que é normal. — Ele liga o chuveiro e coloca a mão embaixo do fluxo de água para testar a temperatura. — Vou pegar uma cadeira. — Encosta seus lábios na minha testa antes de sair do banheiro.
Esse homem é maravilhoso, em nenhum momento — além do exame de toque — saiu do meu lado. A roupa cai no chão, e ao entrar embaixo da água, a temperatura dela relaxa meus músculos cansados quase instantaneamente. É a primeira vez que estou tendo esse tipo de intimidade com o Dominic, e não sinto constrangimento ou algo do tipo, mesmo sabendo que a qualquer momento ele voltará com a cadeira.
— Seus pais e Laura estavam conversando quando passei por eles. — Ouço sua voz minutos depois, se aproxima e não encontro nada além de preocupação em suas íris, ele me ajuda a sentar na cadeira. — Laura perguntou se deseja ir para o hospital. Você completou vinte e quatro horas de trabalho de parto, seria melhor estar no hospital até chegar na dilatação total. Ela também irá colocá-la no soro para se hidratar.
— Não sendo aquele soro maldito — brinco.
— Esse eu não deixo chegar perto da minha mulher. — Os seus lábios estão curvados com um belo sorriso. — Se eu disser que mesmo nesse momento continua linda, você irá me bater? — Acaricia minha bochecha, suas íris transparecem todo seu amor.
— Sim, vou te bater. A última coisa que me sinto nesse momento é linda. Acho que a palavra correta seria destruída.
— Continuo a achando linda. — Beija meus lábios ternamente.
— Queria dormir — murmuro, a água ainda escorre pelas minhas costas. — Nossa filha quase não está se mexendo, às vezes sinto algo, mas não possui aquela força de antes.
— Pode se apoiar em mim para cochilar um pouco.
— Tenho a certeza que serão poucos minutos — digo amarga.
Encosto a cabeça no seu ombro, o cheiro desperta a sensação de lar. Seus dedos se enroscam no meu cabelo molhado e ele afaga delicadamente minha cabeça.
Consigo cochilar por alguns minutos antes de despertar ofegante diante da dor que parece martelar minha lombar sem qualquer piedade. Sinto que cheguei na fase ativa, até atingir a quantidade exata para Hope nascer, as contrações serão mais regulares e num curto espaço de tempo.
A contagem não funciona, e nem consigo chegar no dez antes de me perder. O ar não parece chegar suficientemente nos pulmões. Aquele sentimento de inutilidade surge, pois nem estou conseguindo controlar a minha respiração.
— Amor, calma. Você precisar controlar a sua respiração.
Sua voz parece tão distante, as lágrimas irrompem pelos meus olhos. Um soluço engasgado rasga minha garganta.
— A-apenas queria que e-essa dor fo-fosse embora e nossa fi-filha nascesse lo-logo — consigo falar em meio ao choro.
— Porra, eu não aguento vê-la assim. — Abraça meu corpo com mais força. — Nossa filha está muito perto de nascer. Logo estará nos nossos braços.
Aos poucos vou conseguindo controlar a respiração com a ajuda de suas palavras ternas sendo sussurradas no meu ouvido. No momento que a dor desaparece mais uma vez, ele me ergue da cadeira após desligar o chuveiro.
— Partiu hospital — tenta brincar e me senta na bancada. — Meus braços fortes estão servindo bastante. — Movimenta as sobrancelhas.
Apenas sorrio, e ele seca meu corpo com extrema reverência — principalmente a barriga — , sem qualquer teor sexual.
— Tinha que ser você para me fazer rir nesse momento.
— Sempre ao seu dispor, baby. — Coloca a toalha ao redor do meu corpo, preservando minha modéstia, esse gesto apenas me faz amá-lo ainda mais. — O que gostaria de vestir?
— Acho que aquele vestido de malha, que sempre usava em casa — consigo responder depois de pensar por alguns segundos. — Mas no hospital irei ficar de top e o penhoar de algodão que uso às vezes antes de dormir. Se não estou enganada o coloquei na mala.
— Vou conferir novamente. — Beija o topo da minha cabeça. — Não vai fugir, princesa — diz ao chegar perto da porta.
— Oh, como se eu fosse sair correndo — ironizo. — Olha, posso ir longe.
São esses momentos leves perto dele que não me deixam sucumbir totalmente a dor.
Expulsão. Uma das fases do trabalho de parto, e a que mais almejo.
A fase da dilatação parece não ter fim, quando penso que Laura após fazer o exame irá dizer: Angel, vamos para o centro cirúrgico, sua bebê vai nascer. No entanto, ela destrói as minhas esperanças ao revelar que dilatou mais um mísero centímetro, ou seja, a dor irá continuar por mais tempo.
Estou há trinta horas em trabalho de parto, e com exatamente sete centímetros de dilatação, de acordo com o último exame que Laura realizou a duas horas atrás. Tem mais ou menos seis horas que chegamos no hospital, e como ela havia dito ao Dominic, fui colocada na hidratação venosa assim que fui admitida na unidade. Algo positivo, pois sinto enjoo quando penso em comer ou beber água. Todavia, minha mãe insiste em tentar me fazer dar umas mordidas em uma bolacha de água e sal.
O desconforto na lombar está intenso, mesmo que eu não esteja em meio a uma contração. Realizo mais alguns movimentos na bola, um suspiro escapa pelos meus lábios. Estou tão cansada, o suor escorre pelas têmporas e costas, sinto vontade de voltar para debaixo do chuveiro, outro meio de escape.
— Amor — o chamo baixinho.
— Sim? — Ele se ajoelha do meu lado, estava sentado atrás de mim fazendo massagem nos meus ombros.
— Quero tomar outro banho.
Meus olhos se fecham no momento que entro embaixo do fluxo de água, tomando cuidado para não molhar o curativo do acesso venoso. Por alguns minutos me sinto em paz, contudo, uma nova contração resolve surgir inesperadamente. O corpo se curva, e Dominic entra embaixo do chuveiro para me apoiar. Aperto sua mão com força, enquanto ele sussurra palavras motivadoras no meu ouvido. Todavia, não consigo o ouvir com clareza, a dor parece não ter fim e a intensidade é maior que a anterior.
— Espaço de cinco minutos — diz quando a contração se desvanece.
— Estão mais perto — profiro ofegante.
Permaneço por mais alguns minutos embaixo dessa água morna que possui efeito como se fosse um bálsamo. Como se fosse uma rotina nossa, ele me seca novamente e me ajuda a colocar o penhoar. Ao voltarmos para o quarto, encontramos Laura.
— Como está, querida?
— Querendo que Hope nasça o mais rápido possível. — Suspiro, e Dominic me ajuda a sentar na cama. — Acho que vou levar essa bola para casa como um troféu, está me ajudando muito.
— Te dou ela de presente. — Seus lábios de curvam. — Agora, preciso ver como está essa mocinha e terei que fazer mais um toque.
Droga.
— Tudo bem. — Sem nem ao menos pedir, Dominic ajuda-me a deitar na cama. — Será um momento de tortura.
Como gostaria que minhas palavras houvessem sido apenas uma brincadeira. Dói muito no momento que Laura realiza o procedimento após nos aliviar dizendo que os batimentos da Hope estão dentro dos parâmetros normais. Quando ela brincou ao dizer que durante esse exame eu poderia ver até as estrelas, não era uma simples brincadera, era a verdade nua e crua. Minhas pernas se flexionam ao ser atingida inesperadamente por uma nova contração.
— Não aguento mais — repito essas três palavras como um mantra, infelizmente negativo.
Lágrimas grossas e feias escorrem pelas minhas bochechas. Dominic seca minha testa com a toalha, contudo o suor continua surgindo em meus poros sem nunca cessar por completo. Sinto-me presa em um novo universo paralelo onde a dor e o calor são minha fonte constante de tortura.
— Estou sentindo muita pressão — digo entre dentes. — Me diz que está perto! Sinto vontade de empurrar.
— Calma, estamos perto. Você está com oito centímetros de dilatação.
O que?!
— Oito? Apenas oito?!
— Sim, Angel.
— Não vou a-aguentar. — Soluço. — N-não sei se consigo-o.
— Princesa, olha pra mim. — Ele toca meu queixo instigando-me a seguir seu pedido. — Você consegue — declara sério.
Balanço a cabeça, tentando fielmente acreditar nas suas palavras. Fecho os olhos, cansada. Não consigo mais cochilar, acabei desistindo após ser acordada várias vezes depois que as contrações diminuíram o espaço de tempo para cinco minutos.
Dor;
Cansaço;
Frustração;
Enjoo;
Impotência;
Medo.
Parecem ser simples palavras, contudo, me envolveram como um casulo ao redor do meu corpo. Às vezes, minha mente prega peças e certos pensamentos negativos irrompem das profundezas. Um deles é a culpa ser minha por toda essa demora, mesmo que a doutora tenha dito várias vezes que para algumas mulheres o trabalho de parto do primeiro filho é mais longo.
Entretanto, minha mente cansada insiste em colocar-me como a culpada, isso pode explicar o choro e o sentimento de impotência.
As horas vão se passando, e o dia parece as acompanhar. Não consigo mais distinguir nada ao meu redor, estou presa dentro da bolha de dor e as minhas forças se tornam escassas a cada minuto.
No momento que Laura adentra o quarto duas horas após o último exame que indicou que chegamos aos nove centímetros de dilatação, olho para ela como se fosse alguma divindade e sinto vontade de cruzar os dedos, caso isso fosse possível.
— Dez centímetros — diz no momento que retira as luvas. — Vamos para o centro cirúrgico, sua bebê vai nascer.
— Oh, Deus. — Fungo. — Amor.
Aperto sua mão, encontro suas íris condenando seus sentimentos mais puros, dentre eles o alívio está mais aparente.
— Nossa filha vai nascer — sussurra, a voz rouca concretiza a emoção presente em suas íris.
Ele parecia sofrer junto comigo durante todas essas horas, e isso apenas concretizou aquele pensamento de que é um homem maravilhoso.
— Angel, preciso que faça força — instruiu, Laura.
— Não consigo. — Balanço a cabeça. — Estou tão cansada.
Simplesmente não sei quanto tempo se passou desde que fui trazida para o centro cirúrgico, parece uma eternidade e Hope ainda não nasceu. As forças estão ainda mais escassas, tenho medo de não conseguir trazer minha filha ao mundo.
— Ela está coroada, consigo ver sua cabeça — profere suavemente. — Hope apenas precisa da ajuda da mamãe para sair.
— Você consegue, princesa — Dominic diz, a voz abafada por causa da máscara. Todavia consigo ver seus belos olhos, parecem ainda mais avermelhados por causa das lágrimas. — Nossa filha está tão perto de nascer. Você é forte, uma princesa guerreira.
As forças parecem se renovarem mais uma vez com o propósito de trazer Hope ao mundo. Suas palavras ecoam na minha cabeça. Eu sou forte. Um grito surge arranhando a garganta e curvo o corpo.
— Isso, Angel — elogia Laura.
Mais um grito escapa pelos meus lábios, esse com mais intensidade e parece estar rasgando minha garganta. Deito na maca ofegante, estou tão cansada.
— Preciso que empurre mais uma vez, querida. Apenas mais uma vez. Você consegue, é uma guerreira.
Balanço a cabeça, e respiro fundo antes de fazer força mais uma vez. A mandíbula trava, e os dentes quase trincam devido a intensidade da força. No momento que ouço seu choro baixinho e delicado, deito-me na cama chorando, sem acreditar que consegui trazer minha filha ao mundo.
— Nasceu — sussurro.
— Nasceu, meu amor. — Dominic acaricia meu rosto e se aproxima para depositar um singelo beijo na minha testa. — Eu disse que conseguiria.
Uma enfermeira aparece com nossa filha enrolada numa toalha azul. No momento que a coloca sobre meu peito, fecho os olhos ao senti-la pela primeira vez. Toda dor que senti durante todas essas horas, não se compara a sensação de estar tendo o primeiro contato com ela.
— Ela é tão linda — declara, Dominic. — Parece um pequeno joelho, mas ainda é linda.
— Dominic — resmungo.
— É a realidade, princesa. Todos os bebês nascem assim, não é como se saíssem da barriga prontos para uma sessão de fotos.
Reviro os olhos, e volto a atenção para o pacote precioso em meus braços. Beijo a cabecinha ainda suja de sangue e a camada protetora que recobre seu corpo.
— Eu te amo, Hope. Minha esperança. Estávamos ansiosos para conhecê-la.
— Olá, princesa Hope. Aqui é o papai. — Toca sua mão com o indicador e ela o envolve com força. — Você me deu um susto, mocinha. Achei que iria esperar sua chegada emcima de uma maca.
— Sinto muito por atrapalhar, mas Hope precisa fazer os exames necessários. Logo se inicia a terceira fase do trabalho de parto: a dequitação, que é a saída da placenta — explica Laura.
— Tudo bem — concordo abatida, não queria me afastar da minha filha.
— Daqui a pouco vocês irão para o quarto e uma enfermeira vai ajudá-la com a primeira amamentação.
— Vou avisar a família. Tenho certeza que minha mãe está surtando e deixando os outros agitados.
— Oh, tenho a certeza — retorno a brincadeira.
No momento que ele se retira do centro cirúrgico, encontro Laura observando-me com orgulho aparente em suas íris.
— Parabéns, Angel.
— Foram longas horas. — Meus lábios se curvam em um sorriso cansado. — O corpo está dolorido e estou sentindo tanto frio.
— Sendo exata, o trabalho de parto durou trinta e quatro horas e quarenta e sete minutos. Depois que chegou aos dez centímetros, até Hope nascer se passou uma hora e quarenta e sete minutos. Quanto a dor e o frio, são sinais normal após tanto esforço.
— Obrigada — digo a enfermeira que começou a fazer uma massagem nas minhas pernas e alguns minutos depois nos meus braços.
Por alguns minutos tenho paz, contudo sou surpreendida por uma forte dor.
— Hora da placenta sair — informa, Laura.
— Achei que tinha me livrado dessas dores — resmungo.
Não consigo descrever a quantidade de tempo dedicada a esse processo. Todavia, quando a placenta é expulsa e a dor cessa, respiro aliviada.
— Sobre o banho — inicia Laura, e lhe dou minha total atenção. — Recomendo que espere de duas a três horas. Tem que estar acompanhada nesse momento, você pode ser surpreendida por uma tontura e sua pressão cair.
— Obrigada, Laura, por tudo. Desde o início quando entrei nesse hospital, você tem sido um anjo na minha vida.
— Não precisa agradecer. — Sorri. — Apenas cuide muito bem daquela mocinha.
— Irei cuidar com todo o meu amor.
Deus nos concedeu o dom de trazermos uma nova vida ao mundo. Me sinto imensamente triste quando crianças nascem num lar sem amor, passam fome e são submetidas a inimagináveis situações.
Hope não foi concebida de forma correta ou com o meu consentimento. Contudo, desde que escutei seu coração pela primeira vez soube que jamais poderia abandoná-la ou não lhe fornecer todo o meu amor de mãe.
Seu nome não foi escolhido em vão, e ela sempre será como uma chama de esperança na minha vida.
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