Capítulo • 37
Abro a porta com extrema delicadeza, sem fazer qualquer barulho. O quarto está iluminado apenas com a luz da lua que ultrapassa as cortinas azul-claro. No momento que meus olhos se acostumam com a breve escuridão, sinto como se houvesse voltado no tempo.
As paredes pintadas de cinza estão repletas de recortes de jornais sobre resgates do Corpo de Bombeiros de Washington e alguns pôsteres de personagens da Marvel. Todavia, desde pequeno, sabia a profissão da qual queria seguir, isso apenas me motivou a ler tudo relacionado a bombeiros enquanto crescia. Cada documentário, entrevistas e reportagens de resgates na televisão aumentava minha vontade de tornar-me um excelente bombeiro.
Em um dos cantos do quarto possui uma estante com livros da época em que estava no colegial e do curso de capacitação do Corpo de Bombeiros, onde estão perfeitamente arrumados. Isso tem dedo da senhora McDemott, penso com um sorriso nos lábios. Por mais que, aos olhos da sociedade, somos considerados "ricos", não precisamos de um empregado para fazer tudo por nós. Minha mãe confessou uma vez que, nos nossos quartos, apenas ela entra para fazer a limpeza. Esse é um hábito que se enraizou dentro dela com os passar dos anos.
Meus olhos recaem na cama de casal, na qual o meu bem mais precioso está dormindo, aquela que possui meu coração. Sua respiração ritmada e expressão suave indica que seu sono está tranquilo. Ando até ela com passos calculados, como se estivesse hipnotizado. Sento na cama, e minha mão vai de encontro ao seu rosto, acariciando sua pele tão suave e delicada quanto a dona.
Curvo o corpo até minha boca estar perto do seu ouvido, e sussurro as palavras que estarão para sempre gravadas no meu coração, como houvessem sido tatuadas.
— Eu te amo tanto, princesa. Você e a Hope são tudo para mim, e por vocês sou capaz de ir até o inferno se isso significar que estarão sempre seguras. — Beijo sua bochecha. Deito-me ao seu lado e a abraço antes de continuar: — Meus braços sempre estarão a sua disposição para serem seu porto seguro. Se um dia o mundo estiver se ruindo, saiba que estarei aqui para sustentá-lo junto com você. Sempre juntos, assim será nosso relacionamento. Nunca na frente ou atrás do outro, mas sim caminhando juntos de mãos dadas.
— Sempre juntos — ela murmura, sonolenta. Ergo o tronco e sou atingido por suas íris que refletem todos os seus sentimentos. — Eu te amo, Dominic McDemott.
Leva minha mão de encontro a sua boca e deposita um breve beijo, antes colocá-la de novamente sobre sua barriga.
— Então você estava acordada o tempo todo, senhorita Bennett? — Apoio o queixo em seu ombro.
— Não tenho culpa se você fala alto — rebate, divertida.
— Que calúnia!
Sorrio, contudo esse sorriso se desvanece rapidamente ao lembrar de todo o inferno que estamos passando.
Respiro profundamente, frustrado.
— Como está seu irmão?
— Péssimo. Ele contou o verdadeiro motivo de toda essa situação. — Fecho os olhos, as suas palavras permanecem vagando entre meus pensamentos. — Me sinto tão frustrado, nunca imaginei que Diogo iria se colocar numa situação dessa.
— Quer conversar?
Ao virar-se, ficamos frente a frente, com apenas sua barriga — lar da nossa princesinha por enquanto — nos separando.
— Não sei se deveria falar... — hesito. — Tenho medo que afaste-se de mim.
E se ela achar que somos perigosos demais?
— Jamais. Não vai se livrar de mim tão facilmente, Dominic Lewis McDemott. Você é meu.
Arqueia sua sobrancelha perfeita.
Porra, essa mulher!
— Que mulher possessiva. — Mordo o lábio, isso provoca um belo rubor nas suas bochechas. — Igualmente, princesa. — Beijo seus lábios, rapidamente.
— Não mude de assunto, sinto que você precisa desabafar.
— Tem razão — confesso.
Respiro fundo antes de iniciar o relato, a cada palavra observo suas reações atentamente em busca de medo ou rejeição por Diogo estar envolvido com a máfia. Entretanto, quando não encontro nenhuma dessas reações sinto meu coração se acalmar, e assim consigo finalizar toda a história.
— Meu Deus.
Apenas essas palavras escapam dos seus lábios rosados. Consigo ver através dos seus olhos que busca algo a mais para falar, contudo suas palavras sumiram. Compreendo perfeitamente, me senti assim no momento que meu irmão contou tudo.
— Sim, meu Deus. Fiquei igualmente chocado ao escutar pela primeira vez. Mas o que realmente me deixou abalado foram as palavras do meu pai. Ele repreendeu Diogo por ter escondido isso da família, e eu também estou fazendo isso, princesa. — Encosto minha testa na sua, nossos lábios à poucos centímetros. — Só que eu não posso revelar algo que não pertence apenas a mim, teria que dizer sobre você e não quero te deixar desconfortável.
— Quando isso tudo acabar, quero conversar com a sua família. Falar sobre mim — diz tão baixo, que se não estivesse perto seria impossível de escutar. — Eles precisam saber.
— Princesa...
— Esse era o meu medo antes de conhecê-los. Medo que eles achassem que eu era uma golpista por estar grávida e talvez te enganando dizendo que o filho era seu...
— Ela é minha. — Quase rosno ao interrompê-la. — Hope é minha filha, ninguém irá ousar dizer o contrário. Ela é uma McDemott.
Angel não diz nada, apenas afunda o rosto no meu pescoço, e sinto suas lágrimas. Penteio seus cabelos com meus dedos, tentando acalmá-la.
— Hope Bennett McDemott. Assim que ela será conhecida, e sentirá orgulho desses sobrenomes.
Beijo o topo da sua cabeça e a abraço o quanto é permitido. Nesse momento permito-me esquecer um pouco desse inferno que recaiu sobre nós.
Estou com a minha família nos braços. Farei de tudo para ser o melhor homem para Angel, aquele que sempre irá amá-la e tratá-la como uma princesa.
E, principalmente, farei de tudo para ser um bom pai para Hope, quero ser o seu herói, aquele para quem ela irá correr quando o mundo parecer grande demais. Alguém que sempre poderá contar, seja nos momentos ruins ou bons.
Estou na metade das escadas quando ouço o barulho de algo se espatifar; parece ser vidro. O grito repleto de dor e angústia ecoa a seguir.
— Desgraçado! Eu vou te achar, Enrico Bertolini. Vai pagar por ter pego a minha mulher!
Merda.
Corro em direção ao quarto do meu irmão. Ao adentrar o cômodo, fico sem reação ao encontrar o grande Diogo McDemott ajoelhado no chão, chorando. Porra!. Sinto meus próprios olhos arderem ante o princípio de lágrimas. No momento que grita mais uma vez, reajo e caio de joelhos ao seu lado, abraço o corpo trêmulo.
— Calma, irmão — murmuro, seu corpo treme ainda mais diante da força de seu choro.
— E-eu quero-o a minha m-mulher — choraminga, parecendo um menino perdido.
— Vamos achá-la — afirmo, sério. — Vem, levanta. — O ajudo a se levantar, e o faço encontrar meus olhos. Seus olhos avermelhados, rosto marcado pelas lágrimas e a sua camisa salpicada de sangue deixam-me sem reação por um segundo. — Você vai entrar naquele banheiro e limpar todo esse sangue. Depois vai descer para ver seus filhos um pouco. Eric ligou, daqui a pouco irá chegar trazendo notícias.
Ele não diz uma palavra sequer, apenas caminha até o banheiro, seus ombros curvados como se um enorme peso houvesse sido colocado sobre eles. Passo as mãos pelos cabelos e observo a parede manchada com o líquido que havia na garrafa que se encontra quebrada do chão.
Ouço o barulho do chuveiro, e resolvo deixá-lo ter esse tempo. Saio do quarto e encontro meu pai e Jonathan sentados no sofá, quando chego nos últimos degraus da escada.
— Como ele está?
— Devastado, pai. Simplesmente não parece o Diogo.
— Eu deveria ter cuidado melhor de vocês — profere, frustrado. — Máfia. Seu irmão trabalha para a maldita máfia. Se eu soubesse...
— Não tinha como saber — rebate Jonathan. — Mas deveríamos ter prestado mais atenção quando Diogo terminou a universidade. Estava mais frio que o habitual, com o passar dos anos isso se tornou algo normal para nós.
— Seu irmão vai ser morto se pensar em largar a máfia. Não sei como os alemães lidam com a lealdade, mas se Diogo fizer qualquer coisa que infrinja a lei deles, morre. Não apenas ele, mas toda a família, porra!
— Essa merda é tão seria assim? Eu achando que os malditos terroristas eram os piores — diz Jonathan.
— Ambos são, Jonathan. Só que a máfia acaba sendo o pior.
— Quando tudo isso acabar preciso conversar com vocês. — Engulo em seco, parece que tem algo obstruindo minha garganta. Todavia, as palavras conseguiram escapar.
O peso da culpa.
A culpa nua e crua, por estar escondendo o inferno que venho passando em pensar nas mulheres da minha vida em risco.
Eles merecem saber. Nós McDemott's sempre resolvemos tudo em família, somos o sinônimo da lealdade e respeito.
A porta se abre e minha mãe adentra a casa com meus sobrinhos. O órgão em meu peito se aperta dolorosamente. Diogo terá que contar para eles o que está acontecendo, podem ser crianças, todavia são inteligentes o bastante para saber que algo não está certo.
— Titio Dom! — grita Sofia, e corre na minha direção.
— Oi, linda. — Curvo e a pego no colo. — Como você está?
— Estou triste, tio — murmura contra meu ombro. — Papai, não está bem e estou com saudade da mamãe.
— Calma, minha pequena. — Afago sua cabeça.
Ouço o som de passos descendo os degraus, um breve silêncio preenche a sala antes de Nicolas e Rebecca gritarem pai e correrem na sua direção.
— Pai — diz Sofia, baixinho.
A desço e logo ela corre na direção de Diogo, que está ajoelhado abraçando os filhos. Minha mãe para ao meu lado, abraço seu corpo trêmulo e beijo sua têmpora.
— Quando vamos ter paz? — sussurra. — Minha nora está nas mãos de monstros, grávida ainda por cima!
— Diogo não vai parar até achá-la.
— Seu irmão é um mafioso. — Suspira longamente.
— Tecnicamente ele é apenas o advogado.
— Foda-se, trabalha para máfia de qualquer jeito.
— Fique calma, mãe. — Beijo o topo da sua cabeça e me afasto. — Angel?
— Quando saí estava comendo um pouco. Não pode passar o dia sem comer.
— Está certa. — No momento que saí de casa ela havia adormecido mais uma vez depois da nossa conversa. — Vou ficar mais um pouco com o Diogo e depois a levarei para casa.
Passo a mão pelos cabelos, sinto-me devastado, sem rumo. Me afasto e caminho rumo a janela, pego o celular. Ligo para a única pessoa que me mantêm no controle.
— Amor.
Meus olhos se fecham e encosto a cabeça no vidro, essa voz doce sempre será a razão da minha calma. A parte obscura parece adormecer no momento que a escuto.
Isso é algo que nós McDemott's temos em comum. Amamos intensamente, protegemos intensamente e quando algo ameaça nossa família, a escuridão recobre nossos sentidos.
— Como vocês estão?
— Estamos bem e você, amor?
Sua voz condena sua preocupação.
— No limite. Não aguento mais ver ele sofrendo.
— Oh, tente se acalmar.
— Não consigo. — Expiro o ar com força, frustrado. — Fico me colocando no lugar dele. Se fosse...
Não consigo continuar a linha de raciocínio.
— Estamos seguras, Dom.
— Enquanto aqueles malditos não forem presos... Não irei sentir paz. — Rosno.
— Eles não podem se esconder para sempre. — Suspira e ouço o barulho de talher de encontro ao prato. — Queria colocar as mãos naquela vadia. — Meus lábios se curvam, pela sua pausa deve estar sentindo vergonha. — Desculpa, mas queria estragar aquele rosto falso dela.
— Uau! Minha princesa tem garras, como uma gatinha. Adorei esse seu lado — sussurro.
— Dominic!
Tenho a certeza que um rubor extremamente tentador está colorindo suas bochechas.
— Sou inocente, praticamente um anjo.
— Lúcifer, no caso — ela resmunga.
— Pode estar certa. — Sorrio. — Tem uma escuridão presente dentro de mim e você é a única que tem controle sobre ela. Cuide bem de mim.
— Sempre.
— Dominic, estamos indo — avisa minha mãe.
Giro nos calcanhares e a encontro poucos de mim, seu rosto está marcado por lágrimas. Ando até ela e a abraço.
— Eu te amo — sussurro. — A senhora é forte.
— Eu te amo, filho. — Beija minha bochecha.
Ela se afasta com meus sobrinhos, cravo os olhos no Diogo. Porra, ele tenta sorrir para os filhos, contudo o conheço, está destruído por dentro.
— Princesa? — Coloco o celular de volta na orelha.
— Como está seu irmão agora?
— Destruído. Minha mãe acabou de sair com as crianças.
Percebo Diogo seguir em direção a sala de segurança, meu pai e Jonathan se sentam no sofá, conversando baixo.
— Vocês são fortes, algo que observei em cada encontro familiar.
— Está comendo certinho? — Resolvo mudar o assunto.
— Estou tentando... Toda essa situação me deixou enjoada.
— Daqui a pouco te levarei para casa.
— Não vou sair do seu lado.
Ouço passos pesados, me viro a tempo de ver Diogo passar as mãos pelo cabelo com raiva.
— Amor, preciso desligar. Tente descansar mais um pouco após comer, logo estarei com vocês. Amo vocês.
— Também te amamos.
Encerro a chamada com algo aquecendo meu peito após ouvi-la dizer que me ama. Todavia, ele se esfria no momento que cravo os olhos em Diogo.
— Diogo? — chama nosso pai, e se levanta do sofá.
— Conversei rapidamente com Aylena e Aleksey. — Inspira e solta o ar com força, tentando domar a raiva aparente em suas íris. — Foram atingidos com dardos tranquilizantes. Quando você me disse que estavam desacordados e amarrados, imaginei que houvesse ocorrido uma luta. Eles viram quem os atingiu antes de apagarem por completo. Foi um segurança do Stephen. — Uma risada amarga escapa por seus lábios. — Não sei como ainda me surpreendo com a merda que está acontecendo ao meu redor. — Pressiona a ponte do nariz, como se buscasse a calma.
— Então Stephen mandou traidores? — Arqueio a sobrancelha, isso tudo é muito estranho.
— Não. — Crava seus olhos no chão. — Sua mulher foi quase morta por Paola Bertolini, irmã do desgraçado que levou minha mulher.
— Que irmãos mais psicopatas, não é mesmo? — aponto ironicamente.
— Isso ainda é um elogio.
— Filho, que inferno você se meteu e nos colocou no meio. Não irei dizer que estou com raiva de você — diz nosso pai, e Diogo o observa em silêncio, vergonha nublando seu olhar. — Estou magoado. Por quase dez anos escondeu esse segredo. Era apenas a merda de um jovem quando entrou nessa maldita máfia, mas seu erro foi esconder de nós. Sempre deixei claro: aconteceu alguma coisa? abra a merda da boca e conte para a família. Somos a porra de uma família! — Se exalta, sinto como se houvesse levado um soco. — Nunca escondam nada. Isso não dá certo, uma hora eu ou a mãe de vocês iremos descobrir. Quantas vezes tenho que repetir a mesma frase que nos define? Somos McDemott's, juntos resolveremos e ultrapassaremos qualquer inferno. Lealdade e respeito define a nossa família, e é assim que seremos definidos até o fim.
O silêncio preenche a sala, e não consigo encarar meu pai. A intensidade das suas palavras enraizaram na minha mente, aumentando a culpa.
— Cheguei na hora errada?
Uma voz gélida reverbera pelo cômodo.
— Eric — cumprimenta Diogo. — Espero que tenha boas notícias. Vamos para o escritório.
Caminhamos em silêncio, as palavras proferidas minutos atrás ainda estão martelando na minha cabeça. Pressiono os olhos sentindo uma dor de cabeça se aproximando. Diogo segue até sua mesa e apoia as mãos nela. Fecho a porta atrás de mim e encosto nela.
O detetive permanece em silêncio, e isso não é um bom sinal. Essa minha suposição é confirmada quando ele revela que não encontrou nada relacionado ao nome que Diogo conseguiu arrancar daquele maldito com a tortura. Nem ao menos me surpreendi no momento que meu pai revelou que ele seguiu com a tortura, antes que eu o encontrasse daquela forma no quarto.
Se fosse eu no seu lugar, também não hesitaria em fazer o possível e o impossível para achar minha mulher.
— Repete mais uma vez. Acho que ouvi errado. — Diogo quase rosna.
— Todos os dados ligados àquele nome foram apagados. Não tem nada, Diogo.
Meu irmão pega o abajur e o joga de encontro a parede. Cerra as mãos em punho e seu rosto se torna vermelho devido a raiva.
— Liga para ele — ordena Eric.
Ele? Não é possível que ele está pensando nisso.
— Ligar para quem? — questiona nosso pai pela primeira vez desde que entramos no escritório.
— Stephen — responde, sombrio. — Ele irá me ajudar a achar minha mulher.
Porra!
Ps: Essa é última parte detalhada desse assunto sobre o sequestro. Como ele está detalhado no livro do Diogo, não há necessidade de repetir a mesma coisa em visões diferentes, ficaria cansativa a leitura.
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