Capítulo 7
Acordei no dia seguinte com um espirro. Como o esperado, a gripe me pegou.
Me levantei da cama e fui ao banheiro. Levei um susto quando me olhei no espelho.
Meus olhos estavam marejados e meu nariz vermelho. Eu sorri, imaginado se Diogo também estaria assim. Era óbvio que sim.
Na noite anterior, eu perdi a conta de quantas vezes nos beijamos na chuva. Depois de sair da praça, nós voltamos de mãos dadas até a escola, - brincando, rindo, e com algumas paradas irregulares para outro beijo. - então ele me deu uma carona para casa.
Nem é preciso dizer que ficamos mais de uma hora no carro, na frente da minha casa, até eu entrar antes que minha mãe chegasse.
Eu estava ciente que ela não chegaria antes das nove pois ela já havia me avisado antes de ir trabalhar, então eu tomei um banho e fui dormir ainda com o gosto de beijo de Diogo em minha boca.
Minha noite havia sido o que eu chamaria de perfeita, porém só agora eu havia percebido a merda que tinha feito.
Mesmo se Evellin não descobrisse, - não era possível ela descobrir, certo? - eu teria forças para me afastar de Diogo?
Se eu já não tinha forças antes, como eu teria agora?
Merda! O que eu fui fazer?!
Tomei um banho quente, me troquei e desci.
Encontrei minha mãe na cozinha, provavelmente preparando o café da manhã.
- Você não devia estar trabalhando hoje? - Perguntei com a voz rouca enquanto me sentava na mesa. Ela se virou para mim.
- Luna! Você está péssima! - Ela fez uma breve pausa - Ah... tomou banho na chuva ontem, certo? Como nos velhos tempos...
Eu tirei um palito de dente da caixinha que estava em cima da mesa e comecei a brincar com ele. Eu decididamente não falaria sobre isso com ela.
- Por que não foi trabalhar?
- Karen me deu uma folga. - Ela disse enquanto procurava algo no armário. - Disse que se precisasse de mim ela me ligaria. Aqui. - Ela me entregou uma cartela de comprimidos.
- Chegou que horas ontem?
- Quase dez. - Ela encheu um copo de água na torneira da pia e o colocou na minha frente. - Você já estava dormindo.
- Obrigada. - Eu disse enquanto tomava o remédio.
- Você se lembra que é hoje que iremos olhar o vestido com a Karen, não é?
- Droga! Eu tinha esquecido. Que horas?
- Três horas. Depois do almoço.
- Não posso ir nesse estado. Olhe para mim. Eu estou horrível.
Minha mãe riu.
- Sinto muito querida, mas o casamento é no próximo sábado. Não dá pra remarcar.
- Coloque outra dama no meu lugar.
- Não será possível. Ela não conhece mais ninguém. - Minha mãe tirou uma forma de pães recém-assados do forno.
- O que ela faria se não me conhecesse também?
- Não sei. Acontece que agora ela te conhece.
Eu cortei uma fatia do pão e deixei escapar um suspiro.
- Isso é lamentável.
O celular da minha mãe tocou em cima do balcão da cozinha e ela o pegou.
- Karen? - Ela disse quando atendeu. - Ah, sim... claro... tudo bem... Okay, eu estarei aí. - Ela desligou e me olhou. - O dever me chama. Nicolas vai passar aqui pra te buscar e nós nos encontraremos no centro. Esteja preparada.
Ela subiu para se arrumar enquanto meu coração afundava.
Nicolas...
Só agora me lembrei do que realmente deveria ter conversado com Diogo, mas acabei me esquecendo.
*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*
Eram 14:58 quando um carro buzinou na rua.
Eu estava na frente do espelho terminando de fechar meu tubinho de gloss, então o coloquei sobre minha mesinha de cabeceira e conferi minha imagem novamente.
Eu havia usado quase metade da minha base líquida para esconder as marcas do resfriado e passado duas camadas de rímel em cada olho. Poderia dizer que estava no mínimo apresentável. Se eu não espirrasse, ninguém poderia dizer que eu estava gripada.
Eu escolhi um vestido azul de frente única balonê acima dos joelhos e sapatilhas pretas estilo bailarina. Soltei meu cabelo.
- É isso aí, garota. - Eu disse para o meu reflexo. - Vamos lá. É só mais um dia.
Depois de espremer meus lábios mais uma vez eu saí do quarto.
Encontrei Nicolas na rua, com as mãos enfiadas nos bolsos da frente da calça, encostado no carro.
Sua camisa social estava com as mangas enroladas na altura dos cotovelos e a bainha escondida sob a calça. Ele era a imagem clara de uma garoto americano pronto para ir em uma festa com os amigos.
Seu cabelo molhado denunciava que havia sido lavado recentemente.
- Você está linda, meu anjo. - Ele disse enquanto abria a porta do carona pra eu entrar.
Eu revirei meus olhos. Não sabia se em 48 horas eu lhe dera intimidades suficientes para ele me chamar por apelidos carinhosos, mas resolvi não discutir sobre isso.
- Belo carro. - Eu disse enquanto andava em direção a ele, e era verdade.
O carro que me esperava era uma Ferrari vermelha brilhante tão limpa, que parecia ter acabado de sair da loja, o que era impossível já que eu o reconhecera como um dos três carros que estavam na garagem de Karen quinta-feira, quando eu e minha mãe fomos lá jantar.
Nicolas sorriu, mas seu sorriso não chegou aos olhos.
- Digamos que meu pai tinha um bom gosto. - Ele disse batendo a porta quando eu entrei, então deu a volta no carro.
- Ele te deu de presente? - Perguntei estudando o interior do carro quando Nicolas entrou.
- Sim. Não é sempre que a gente faz 18 anos, certo? - Ele disse enquanto colocava o cinto de segurança.
Eu segui seu exemplo e também coloquei o meu.
- Ele parecia ser um bom pai. - Murmurei.
- Ele era. - Nicolas rodou o volante, levando o carro para o tráfego movimentado de Colatina. - E seu pai, como ele era?
- Incrível. - Eu disse olhando pra ele. Ele sorriu. - Você sente falta dele?
O sorriso em seu rosto desapareceu e ele respirou fundo.
- O tempo inteiro. - Ele olhou pra mim por um instante e voltou o olhar pra frente. - Vamos falar sobre coisas boas. Você, por exemplo.
- Eu? - Minhas sobrancelhas subiram.
- Sim, você. - Ele disse sem me olhar. - Quinta-feira minha mãe mal deu espaço para nos apresentar. O tempo todo falando sobre casamento. Na boa, achei aquilo desnecessário.
- Bem, eu acho que é normal pra quem esteja prestes a se casar.
- Certamente é esse o problema. Ela está prestes a se casar.
Eu franzi minha testa.
- Você não aprova?
- Não. - Ele nem precisou pensar para responder. Isso me surpreendeu.
Okay. Agora ele tinha minha completa atenção.
- Por quê? - Perguntei me arrumando na poltrona para ficar de frente pra ele. Ele levou um momento pra responder.
- Acho melhor fazer uma lista. - Ele disse por fim.
- Então faça. - Pedi.
Ele me olhou por um momento e voltou a atenção pra rua.
- Começando pelo fato que ele tem idade suficiente para ser meu irmão.
- Hm... certo. Próximo item.
Ele sorriu enquanto parava no semáforo, então me olhou.
- Ele é o tipo de garanhão mulherengo que trairia minha mãe na primeira oportunidade que tivesse.
- Como você pode ter tanta certeza?
- Acredite, eu sei.
- Tudo bem. Então se ele tem idade para ser seu irmão, por que ele não fica com uma mulher mais nova?
Nicolas riu, como se a resposta para minha pergunta fosse óbvia demais.
- Porque minha mãe tem algo indispensável, que as vadias que ele pega não têm. - Ele puxou a marcha e deu partida no carro. - Dinheiro.
- Quer dizer que você acha que ele está com sua mãe interessado no dinheiro dela? - Perguntei.
- Não, eu tenho certeza.
- Talvez você não esteja agindo sobre a razão.
Ele me olhou sem entender.
- Bem, talvez a morte do seu pai tenha influenciado no seu ponto de vista, e você só não queira que outra pessoa assuma o lugar dele na casa.
Ele pensou por um segundo.
- Eu acho que não. Mas isso nos desviou do assunto principal. Eu realmente prefiro falar sobre você, Luna.
Respirei fundo enquanto olhava pela janela.
- Eu não. - Falei num sussurro.
- Por que? - Ele me olhou por um momento.
- Porque não há nada de interessante que eu possa te dizer sobre mim.
- Nem eu, mas mesmo assim sou eu quem estou falando até agora.
Eu sorri e estava prestes a dizer algo quando ele estacionou o carro do lado da calçada, desligando-o.
- Tudo bem. Vamos continuar essa conversa depois. Creio que tem gente nos esperando. - Ele saiu do carro e deu a volta para abrir a minha porta.
Cerca de três segundo depois, minha mãe e Karen se destacaram na multidão de pedestres vindo em nossa direção.
- Oh, aí estão vocês. - Karen segurou meu rosto entre as mãos e me deu um beijo na bochecha. - Chegaram bem na hora. Vamos logo, pois a qualquer momento podem me ligar do escritório me pedindo pra voltar.
*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*
Duas horas e três lojas depois, eu já havia experimentado onze vestidos e estava dentro do décimo segundo quando o celular de Karen tocou.
- Com licença, amores. Preciso atender. Ah, e se quiser minha opinião você está linda, como em todos os outros. - Ela sorriu pra mim e saiu da sala.
Olhei para o espelho novamente. Ela tinha razão, eu estava linda... mas ainda não conseguia me sentir totalmente bem dentro daquele vestido.
- O que você achou, mãe? - Perguntei sem desviar o olhar do meu reflexo.
- Hm... não que eu queira discordar da Karen, mas eu achei esse um pouco... demais pra você. - Ela disse atrás de mim.
Eu me virei surpresa para a olhar. Pela primeira vez ela disse algo válido. Algo que eu não esperava ouvir.
- Anh... Eu também. - Olhei para Nicolas. - E você, o que achou?
- Você está linda, como se fosse novidade. Mas se ainda não gostou, vá em frente e escolha outro.
Eu suspirei. Já estava tão cansada de trocar de vestido...
- Lu, temos que ir. - Karen disse entrando na sala novamente.
Um pequeno pavor surgiu dentro de mim. Eu ainda não havia encontrado o vestido certo!
- Nicolas, vamos ter que deixar Luna sobre seus cuidados. Se importa em usar seu cartão de crédito?
- Não, claro que não.
- Ótimo. - Ela se virou para mim. - Desculpa querida, mas estão precisando de nós no escritório. Você vai ficar bem?
- Vou. - Eu fiz que sim com a cabeça.
- Okay. Então sábado eu vejo o vestido que você escolher. - Ela beijou minha bochecha. - Divirtam-se.
Enquanto Karen caminhou na direção da porta, minha mãe me abraçou, me pegando completamente de surpresa.
- Tchau, minha linda. Eu vejo você mais tarde.
Eu estava chocada demais, mas consegui retribuir ao seu abraço.
- Ta. Tudo bem. Até mais.
Assim que elas saíram em me olhei no espelho pela milionésima vez, e foi então que eu o vi.
O vestido perfeito estava cobrindo um manequim do lado de Nicolas. Como eu não o vi antes?
Me virei e me aproximei dele para o olhar melhor.
Era branco e longo, atingindo o chão. Em seu interior, se tivesse cinco anáguas era pouco. Não tinha mangas. Era um lindo tomara que caia rendado na parte de cima e na barra da saia, com algumas missangas e pérolas brancas espalhadas por ele.
- Eu gostei desse. - Eu disse sem desviar meu olhar.
- Ah, eu sinto muito. - A vendedora disse se aproximando de mim. - Esse vestido não é para damas de honra. É para noivas.
- Se ela gostou desse, então por favor, tire-o do manequim pra ela experimentar. - Nicolas disse do meu outro lado.
- Não é tão fácil assim... - A vendedora rebateu constrangida. - Ele já está encomendado, e infelizmente é para o próximo sábado também.
Eu não pude esconder a decepção do meu olhar.
- Bem... - Nicolas retrucou. - Então estamos reencomendando. Diga à noiva que um imprevisto aconteceu, que o vestido rasgou, sei lá. Invente uma desculpa. Eu pago o dobro do preço.
Eu arregalei meus olhos enquanto olhava para ele, surpresa. Então olhei pra vendedora. Não pude deixar de notar o brilho em seus olhos.
- Hm... tudo bem. Eu vou ver o que posso fazer. Me dêem um minuto por favor. - Ela disse e saiu da sala.
Me virei para Nicolas.
- Por que você fez isso? Está louco? Faz ideia de qual é o preço de um vestido desses pra querer pagar o dobro?!
Ele riu e arrumou uma mercha do meu cabelo atrás da minha orelha.
- Dinheiro não é problema pra mim, Luna.
Eu me afastei do seu toque.
- Não é essa a questão. Eu só... não quero te explorar.
- Seria um prazer ser explorado por você. - Ele disse com um sorriso travesso e eu não pude deixar de notar a ambiguidade da frase.
Desviei o olhar sentindo meu rosto queimar e soube instantaneamente que estava corada.
- Pronto. - A vendedora disse voltando para a sala. - Está tudo certo. O vestido é seu.
Ela retirou o vestido do manequim sem dificuldades e me acompanhou até o quarto para me ajudar a trocá-lo.
*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*
Oito minutos depois eu saí da loja enquanto Nicolas acertava sua dívida na recepção. A tarde estava começando a virar noite e os primeiros postes de luz se acenderam.
Não levaríamos o vestido para casa naquele dia. Ele ainda precisava de alguns retoques para se ajustar bem em meu corpo, então quarta-feira eu voltaria para experimentá-lo novamente e talvez, eu pudesse o levar.
Pela primeira vez eu estava animada com tudo isso, e só de pensar em estar dentro daquele vestido na frente de outras pessoas me deu um frio na barriga.
Sorri sem querer e meu estômago roncou. Só então me lembrei que minha última refeição tinha sido o almoço a mais ou menos seis horas atrás. Depois disso eu não havia colocado mais nada na boca. Nem água.
- Está com fome? - Nicolas perguntou se aproximando de mim por trás, como se lesse meus pensamentos.
- Muita. - Respondi me virando.
- Que bom. Posso desfrutar da sua companhia por mais algum tempo. Vamos jantar em algum restaurante, depois eu te deixo em casa.
- Ah, não obrigada. Eu prefiro ir pra casa se você não se importa. Ainda preciso fazer a janta.
Ele levantou as sobrancelhas me questionando.
- Por que você faria janta pra você sozinha? Não precisa se dar esse trabalho. Considerando que sua mãe acabou de voltar para o escritório, eu duvido que ela chegue em casa antes das nove e meia.
Eu pensei por um momento. Ele tinha razão. Não era necessário eu fazer janta se estivesse sozinha. Era lógico que minha mãe comeria alguma coisa antes de voltar pra casa, e além do mais era só um convite... o que custava aceitar?
- Tudo bem. - Eu disse decidida. - Mas eu não quero jantar. Vamos comer um cachorro-quente, depois você me leva pra casa.
- Cachorro-quente? - Ele coçou o queixo examinando a opção.
- Sim. Um daqueles que vem com uma salsicha inteira, ovo de codorna e bastante mostarda. - Eu passei a língua pelo lábio superior para dar ênfase à minha exigência.
- Você tem ideia do quanto isso é prejudicial à saúde? - Nicolas me perguntou contraditório.
- E daí? É uma delícia. - Dei de ombros.
- Eu acho melhor comermos comida. Algo saudável.
Que merda! Por que todo mundo queria me dizer o que eu podia e não podia fazer?! Nem um cachorro-quente?! Dane-se.
- Quer saber? Tem razão. Eu vou jantar. Você pode me levar pra casa agora?
Ele arregalou os olhos surpreso com minha reação.
- Mas... - Ele começou a dizer, mas eu o interrompi.
- É isso, Nicolas. Se eu tiver que comer comida, então vou comer na minha casa.
Eu me virei e consegui dar dois passos antes de ele segurar meu braço, me fazendo parar.
- Espera. - Ele disse. Eu o olhei.
Então ele respirou fundo, como se tentasse manter sua raiva e frustração escondidas.
- Okay. Tudo bem. Vamos encontrar uma barraca de cachorro-quente.
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