Formatura.

Parecia irreal a ideia de me formar no início do ensino médio, mas, contrariando todas as estatísticas, aqui estou eu.

Encaro todo o ambiente, decorado, com luzes e arranjos chiques. Todos os alunos de vestidos brilhantes e smokings elegantes.

Era outra realidade e eu assistia aquilo tudo com uma nostalgia tamanha. Eram muitas despedidas. Ciclos se fechando. E eu ficando emotivo.

Rafael estava do meu lado, lindo com um terno preto comum, com um detalhe que esquentou meu coração: uma gravata borboleta amarela, que combinava com o vestido também amarelo de sua mãe. Queria segurar sua mão, na frente de todo mundo, entrando nesse lugar mágico que seria nossa festa.

Para minha surpresa, ele a segura. E eu aperto. Tão feliz de poder mostrar o quanto eu o amo, para todo mundo.

Raquel e Thomas fecharam o pacote família da formatura juntos porque nossa família é minúscula. Cat e Lara vieram com nossos convites sobrando e Chul também. O convite de Lilian fora vendido para outra colega nossa.

Não que eu estivesse magoado. Eu sabia que ela estava realizando o sonho dela agora. E ela vinha falando comigo de vez em quando, mandando mensagens sobre coisas triviais, e mais recentemente para me parabenizar por ter colado grau.

Nem eu acreditei que consegui chegar até aqui sem um recuperação final. Os professores realmente são mais legais no último ano. Não aguentam mais encher nosso saco.

- Obrigado. –Sussurro no ouvido de Rafael, enquanto sua mãe e Tom iam procurar nossa mesa.

- Pelo o quê?

- Por segurar minha mão.

Rafael sorri, e antes que ele se incline para me dar um beijo, Anna Raylla vem até nós, deslumbrante, com um vestido longo verde água e tranças cor de rosa indo até a cintura.

- Anna Raylla, você é a mulher mais linda do mundo. –Digo a abraçando.

- Sério, você está uma deusa! –Rafael a abraça também.

- Ai, gente, nem acredito que estamos aqui! Não posso chorar, vai borrar a maquiagem que levei três horas para fazer. –Minha amiga diz abanando o rosto.

- Não precisa ficar assim com a minha partida, Annie Ray. –Rafa põe sua mão nos ombros dela, com falsa solidariedade e ela retribui com um tapa brincalhão.

- Idiota! Tudo está acabando! –Anna jogava as mãos para o alto, fazendo drama.

- Tranquilo porque odeio metade da escola, e a outra metade sou indiferente. –Comento sorrindo.

- Essa estatística só mudou porque saí do seu colégio, né? –Chul chega de surpresa, me agarrando por trás.

- Chul! Vai me sufocar!

- É para eu roubar esse seu terno azul maravilhoso.

Eu o abraço propriamente.

- Tudo pensado, cara.

- Você também está um gato, Chul. –Anna o abraça e logo em seguida, Rafael também. Chul estava com um terno comum, preto. Mesma escolha de Thomas. Porém sua camisa social era branca, diferente da do meu irmão, que também era preta.

- Cadê o Akin?

- Deve estar chegando. –Anna Raylla confere o celular. –É, isso aí. Família dele atrasou. Logo mais ele chega. Vamos para a fila de bebidas que está quilométrica.

- Não estão pedindo identidade ou pulseira? –Chul questiona.

- Cara, é nossa formatura. –Rafael diz. –Eu vou sair daqui louco, de um jeito ou de outro.

***

- Akin! –O meu grito e dos meus amigos é quase uníssono ao avistá-lo.

Na real, não tinha como não avistá-lo. Ele estava fantástico. Seu smoking branco reluzia de longe, e sua camisa por baixo era verde água, combinando com o vestido de Anna Raylla.

- O crédito é todo dela. –Ele chega já entrando na fila junto conosco, atraindo alguns olhares, e lasca um beijo em Anna. –Linda, linda, linda. QUE MULHER PERFEITA, JESUS!

Anna Raylla ri e meus Deus, eles dois são a coisa mais preciosa do mundo.

- Há quanto tempo estão nessa fila, hein? –Akin pergunta.

- Desde que mandei a mensagem, amor.

- Meu Deus, isso já tem quase meia-hora.

- 25 minutos para ser mais exato. –Chul pontua, atrás de mim.

- Pelo menos dá para pegar dois drinks por pessoa. –Rafael argumenta.

E assim que ele diz isso, o barman atende, e Rafael acaba pedindo dois mojitos.

Depois de 10 minutos, cada um de nós cinco tinha duas bebidas nas mãos.

- Eu queria propor um brinde... -Rafael começa.

- Ah, não. Lá vem. –Eu digo.

- Um brinde, a nós. Nossa amizade. Nosso baile. Nossa despedida.

- Não emociona, Rafael. –Anna diz.

- Tecnicamente, eu nem formei nesse escola... -Chul comenta.

- Não, ele está certo. –Akin interrompe. –É um final de um ciclo. É uma despedida.

- Tudo bem. Merece um brinde. –Chul concorda.

Eles dois me lançam um olhar de soslaio, e eu entendo. Todos sabem, exceto Rafa.

- Essa vai ser a melhor noite das nossas vidas! -Eu grito e levanto meus dois copos.

 Com 5 pares de mãos, 10 coquetéis alcoólicos, brindamos à nossa juventude.

***

Eu já estava para lá de felizinho.

Meu casaco tinha ficado na mesa junto com Raquel e eu dançava alguma música esquisita com Thomas, que também já estava meio alterado por ter tomado alguns copos de cerveja.

Havia tirado tantas fotos que talvez eu não estivesse bêbado de fato, e sim cego pelos flashes.

Catarina, Lara e Anna Raylla dançavam junto com a gente também, descalças, exaustas de usarem salto alto por horas.

Acho que tocava alguma música dos anos 80.

Os garotos estavam em um rodinha ali perto enquanto Chul virava uma garrafa de champanhe no gargalo.

- Esse é o melhor dia da minha vida! –Eu talvez já tivesse gritado isso mais do que uma vez naquela noite.

Porém os primeiros acordes de Love Me Again do John Newman começou a tocar e Rafael veio correndo me puxar, enquanto eu ouvia meu irmão gritar:

-Eu amo essa música!!!

Know I've done wrong,

I left your heart torn

Is that what devils do?

Took you so low,

Where only fools go

I shook the angel in you

O meu melhor amigo começou a dançar comigo. Nós dois trêbados e provavelmente muito desengonçados, mas eu me senti num filme, enquanto ele berrava a letra para mim.

I NEED TO KNOW NOW

KNOW NOW, CAN YOU LOVE ME AGAIN?

I NEED TO KNOW NOW

KNOW NOW, CAN YOU LOVE ME AGAIN?

Isso foi melhor do que qualquer pedido de desculpas. O garoto que eu amava, todo descabelado, suado e embriagado, cantando para mim, na frente da escola inteira.

E antes que a música pudesse terminar, em seu ápice, ele me puxou e me beijou. Na frente de todo mundo. Todo o colégio. Sem hesitar.

I told you once again

Do this again

Do this again oh lord

I told you once again

Do this again

Do this again oh lord

Tudo ocorria em câmera lenta para mim. 

Essa era a história de amor que eu merecia.

Entrelacei minhas mãos ao redor de sua nuca, e me agarrei nos seus cabelos. 

Aquela foi a primeira vez na noite que ele me beijou, disso eu tinha certeza. Mas não seria a última.

***

Estava tendo uma crise de riso, daquelas de doer a barriga.

Anna Raylla me mostrava o vídeo que ela gravara do meu irmão, cantando Love Me Again, e com suas co-dançarinas, Lara e Cat ao fundo fazendo passinhos de dança.

- Acha que devo enviar para a Lily?

- Por favor.

Nem cogitei que isso poderia vir a ser um problema. Eu estava entorpecido, na mesa do salão, comendo macarrão com uns três molhos diferentes.

Nem só de álcool vive o homem.

- Do que estão rindo?

Thomas chega de repente, e quase deixo o celular de Anna cair.

- Nada! –Respondo, sentando em cima do aparelho e recebendo um olhar enviesado da minha amiga.

- Tudo bem, então. –Tom relaxa, já descontraído pelo álcool e com seu casado dependurado em suas costas. –Estou vazando. Vou dormir no apartamento da Cat e da Lara. Raquel está indo com a gente também, vamos deixá-la em casa.

- Por que não vai para o apartamento?

Thomas dá um sorrisinho e joga as chaves para mim.

- Aproveita, irmãozinho.

E sai andando.

Fico de boca aberta, chocado pelo que acabou de acontecer.

- Alguém vai transar hoje. –Anna Raylla implica, dando leves soquinhos em mim.

- Cala a boca. –Digo sorrindo.

***

O último show da noite havia acabado, resultando num pico de energia com a música mais animada de todas e geral dançando em conjunto, abraçados.

Quando a canção acaba, as pessoas se dispersam, e já estou quase voltando para a minha mesa pensando em sentar um pouco, por exaustão e exagero no champanhe.

Porém No. 1 Party Anthem do Arctic Monkeys começa a tocar, e eu amava aquela música.

Ninguém ali parecia conhecê-la de fato, porém havia dezenas de casais coladinhos um no outro dançando a famosa música lenta, porque o brasileiro adora uma baladinha romântica no final das contas.

Permaneço ali, encarando as pessoas, melancólico. 

Até que alguém me cutuca.

- Rafa.

- Espero não estar atrasado, senhor, mas você seria meu par no baile está noite? –Ele finge fazer uma reverência exagerada e eu rio.

- Seria uma honra. –Seguro sua mão.

- Me concede essa dança, então? –Ele coloca sua outra mão nas minhas costas, me guiando até o meio da pista.

- Achei que nunca perguntaria. –Zombo, repetindo frases bregas ditas em algum filme piegas adolescente de baixa qualidade que eu amo.

Ficamos abraçados, indo de um lado para o outro, no centro do salão, dançando aquela melodia.

Enquanto Alex Turner canta "come on, come on, come on...", ele me beija. Garantindo uma cena para todos os espectadores. 

E no ápice da música ainda nos arriscamos tentando girar um ao outro, inventando passinhos, que acabam fracassando por estarmos tontos e sem preparo, mas que arrancam risadas sinceras.

- Não quero ir embora. –Ele cola sua testa na minha.

- Não precisamos ir. –Sinto nossas respirações sincronizados.

- Então seremos expulsos?

- Tirados a força, que seja.

Rafael sorri e me beija mais um vez, até que a música acaba.

E de fato fomos expulsos.

Nós cinco somos enxotados do salão com o restante dos formandos.

O dia está amanhecendo quando entramos no Uber e vamos para casa.

Durante o caminho todo estou esgotado, e cochilo com Rafael.

Porém quando chegamos, somos acesos.

Enquanto ele beija meu pescoço e me leva até a cama, me questiono se vamos fazer amor agora, porque sinto como se fosse a primeira vez que ele me toca. 

Com amor.

Então chego a conclusão que sempre me sentirei assim, porque tudo com ele é como se fosse a primeira vez.