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Capítulo 3

Na sala de espera do consultório da Dr. Lucia, naquela mesma tarde, Thomas tocava violão e cantarolava baixinho Eu Vou Morrer Sozinho, do cantor Jão. Algumas pessoas olhavam meio torto e outros sorriam parecendo gostar. Irmão músico e atarefado era isso. Ensaiava onde dava.

Quando chegou a minha vez, Thomas insistiu para entrar junto comigo, e eu deixei daquela vez.

- Precisamos trocar os remédios, está dando tremedeira nele.

- Você sabe que é um efeito colateral comum do remédio, não sabe, senhor Morais?

- Me chama de Thomas, por favor. Eu só tenho 22.

- Thomas, -Respondeu a minha psiquiatra, sempre simpática. –Podemos tentar algo novo mas sempre vai haver algum efeito colateral.

- Eu só quero que ele fique o mais norm...bem possível.

- Eu tô aqui, sabiam? –Respondi, meio alheio, meio raivoso.

- Desculpa, Ty.

- Minha opinião não conta nessa conversa?

- O que você quer, Tyler? –Perguntou Lucia, curiosa e sorridente.

- Quero parar de tomar os remédios. Eles me deixam estranho.

- Creio que isso não é possível no momento. –Ela respondeu com um pesar na voz que eu realmente senti.

- Então minha opinião não conta, né?

Ela suspirou.

- Você não tem percebido o quanto tem falado mais devagar?

Eu encolhi os ombros.

- Prática?

- Sua ansiedade melhorou, Tyler.

- Tenho minhas dúvidas quanto a isso.

- Por quê? –Ela se inclinou e fez aquela pose questionadora de psiquiatra.

Eu encarei Thomas e a Dr. Lucia também. Ele bufou e saiu porta a fora com o violão.

- Ainda não consigo dormir direito.

- Pesadelos?

Assenti.

- Com seu pai?

- Às vezes.

- E sua mãe?

- Às vezes também.

- O que você geralmente sonha?

- Você sabe, é diferente toda noite. Nem me lembro de vez em quando. Acordo assustado, com o coração disparado. Não durmo mais. –Repeti quase roboticamente, com a mesma escolha de palavras que eu digo em praticamente toda sessão.

- Com que frequência tem sonhado nos últimos tempos?

Penso por um tempo.

- Três vezes por semana? Acho que deve ser mais ou menos por ai. Tem semanas que mal tenho, e tem semanas que são o inferno.

- Ótimo. Está vendo? Você diminuiu de 5 dias na semana para 3. Está melhorando.

- Aham.

- O que sonhou noite passada? Quer falar sobre?

- Havia fogo, muito fogo e uma caveira que, sei lá, parecia minha mãe, e uma mão negra correndo atrás de nós, que seria meu pai. Thomas não estava. Acho que foi isso, basicamente. –Falei dando de ombros. Não foi dos piores.

- Você sabia que isso é um reflexo do que aconteceu...

- Ah não! Pode parar por ai com essa baboseira. Sempre o mesmo papo. Foi só um sonho. Assisti Viva: A vida é uma festa noite passada. Deve ser só por isso.

Dr. Lucia suspira e encosta a cabeça na mãos me olhando com intensidade.

- Talvez seja só por isso mesmo. –Ela se dá por derrotada pela primeira vez desde que a conheci e a encaro, estranhando. –Vou trocar seus remédios e tentar diminuir a frequência. Uma vez por dia, que tal?

- Ah. –Eu ainda estava surpreso, a encarando, estático. –Está ótimo. –Respondi já me levantando para ir embora.

- E Tyler, aquilo não foi um sonho.

- Não? –Perguntei confuso, já na porta.

- Foi um pesadelo, querido. Até mais.

Ela fecha a porta e me deixa confuso. Como sempre.

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