Capítulo 25.
Jake não respondeu de imediato à minha pergunta. Seus olhos subiram lentamente até minha testa, e seu sorriso casual ganhou um toque de provocação.
— O que aconteceu com a sua cara? — Ele perguntou, inclinando a cabeça como se analisasse o ferimento com interesse genuíno. Mas o tom era levemente debochado, como se estivesse se divertindo com o meu estado.
Eu senti o sangue subir ao rosto, mas antes que pudesse responder, ouvi o som de cadeiras arrastando dentro do apartamento. Niki, Sunghoon e Heeseung estavam se levantando para ver quem era.
Jake ergueu uma sobrancelha e deu um pequeno passo à frente, encostando-se na parede com uma expressão relaxada.
— Deixa eu adivinhar, Jay. Você andou invadindo outras casas por aí? — Ele disse com um sorriso torto, seu tom carregado de sarcasmo.
Me forcei a manter a calma. Cruzei os braços e estreitei os olhos para ele.
— O que você quer, Jake? — Perguntei, ignorando completamente sua provocação.
Jake inclinou-se para frente, como se fosse me contar um segredo, mas sua voz estava alta o suficiente para que todos ouvissem.
— Estou procurando o Jungwon. Ele está aqui?
Minhas sobrancelhas se ergueram automaticamente. Por que ele estava procurando Jungwon? Ele não havia voltado pra casa? Antes que eu pudesse processar ou responder, ouvi o som da porta do apartamento atrás de mim se abrindo mais.
Sunghoon apareceu ao meu lado, me encarando brevemente antes de fixar seus olhos em Jake. E, como se fosse algo ensaiado, ele sorriu de um jeito que só Sunghoon conseguia — confiante, quase desafiador.
— Oh, Jake! — Sunghoon disse, sua voz surpresa e carregada de charme. — Você acredita em amor à primeira vista ou vai passar por aqui novamente?
Jake ergueu uma sobrancelha, claramente surpreso pela ousadia. Um sorriso enorme e cheio de diversão apareceu em seu rosto. Não me recordava de se alguma vez tinha visto ele lançar um sorriso sincero, que não seja carregado de sarcasmo.
— Parece que alguém aqui tá tentando competir pelo meu tempo. — Jake respondeu, com um tom divertido, olhando diretamente para Sunghoon.
Antes que o clima pudesse escalar para algo ainda mais estranho — ou, quem sabe, engraçado —, Heeseung apareceu ao atrás de Sunghoon. Ele cruzou os braços e encarou Jake com uma expressão séria.
— O que você está fazendo aqui? — Ele perguntou, sua voz firme e sem qualquer traço de brincadeira.
O sorriso de Jake diminuiu ligeiramente, e ele ergueu as mãos como se estivesse se rendendo.
— Relaxa, Heeseung. Só quero saber se o Jungwon está por aqui. Não estou aqui pra causar problemas...
O tom casual de Jake não diminuiu a tensão no ar. Niki, que estava mais atrás, apareceu ao lado de Heeseung, lançando um olhar desconfiado para Jake.
Heeseung passou por mim sem hesitar, seu rosto carregando uma seriedade incomum. Ele parou à minha frente, colocando-se entre mim e Jake, bloqueando a saída. O olhar que ele lançou para Jake era firme, quase afiado, como se estivesse tentando cortar qualquer tentativa de desvio ou sarcasmo antes mesmo que Jake pudesse abrir a boca.
— Por que você está procurando o Jungwon aqui? — Heeseung perguntou, sua voz baixa, mas carregada de irritação.
Jake inclinou a cabeça, um sorriso preguiçoso dançando em seus lábios enquanto ele cruzava os braços, claramente se divertindo com o clima pesado.
— Calma, Heeseung. Não estou aqui para arrumar briga. Só que Jungwon não voltou pra casa depois da escola, e achei que talvez estivesse por aqui. — Jake deu de ombros, como se fosse a coisa mais natural do mundo.
Heeseung apertou os lábios, seu olhar não se suavizou nem um pouco. Ele inclinou-se ligeiramente para frente, sua postura agora imponente.
— E por que você acha que ele estaria aqui? Logo aqui, Jake? — Heeseung rebateu, sem esconder sua irritação.
Jake riu baixinho, um som que parecia mais uma provocação do que uma tentativa de desarmar a tensão. Ele deu um passo para frente, encurtando a distância entre eles, e inclinou ligeiramente a cabeça, o sorriso ainda presente, mas agora com algo mais suave.
— Mesmo irritado, você ainda continua lindo, Lee. — A voz de Jake estava carregada de nostalgia, mas seu tom era direto, sem o tom brincalhão que costumava usar.
O impacto foi imediato. Heeseung piscou, seu rosto congelando por um breve momento. Foi rápido, quase imperceptível, mas estava lá — um leve vacilar em sua expressão que nenhum de nós esperava.
Eu ouvi Niki ao meu lado inspirar de forma audível, e quando virei a cabeça, vi que ele estava olhando para Sunghoon, que por sua vez estava me encarando. Não precisávamos dizer nada; todos nós tínhamos visto. Heeseung tinha hesitado.
Mas, tão rápido quanto a tensão surgiu, Heeseung se recompôs, seu rosto voltando à neutralidade habitual.
— Não estou para brincadeiras, Jake. — A voz de Heeseung era fria agora, um contraste com a confiança calorosa de Jake.
Jake percebeu a mudança. Seu sorriso desapareceu lentamente, substituído por sua expressão séria. Era como se ele tivesse tirado uma máscara e, de repente, aquele sarcasmo habitual desaparecera completamente.
Ele olhou para mim diretamente desta vez, seus olhos escuros perfurando os meus com uma intensidade desconfortável.
— Ontem à noite, Jungwon chegou em casa tarde. Ele disse que estava com você. — A frase saiu com uma frieza tão cortante que me senti incapaz de responder por um segundo.
Meu coração deu um salto, e eu sabia que todos estavam esperando minha reação.
Heeseung virou a cabeça para mim, mas sua expressão era impossível de ler. Não havia raiva, surpresa ou qualquer outra emoção que eu pudesse identificar. Era como se ele estivesse esperando algo, qualquer coisa que eu pudesse dizer para esclarecer a situação.
— O quê? — Foi tudo o que consegui murmurar, minha mente tentando desesperadamente buscar uma mentira.
Jake continuou, sem dar muita atenção ao meu choque.
— Quando ele não voltou pra casa hoje, imaginei que vocês estivessem juntos novamente. Mas agora... — Ele pausou, seu olhar se estreitando levemente. — É estranho o fato de ele não atender minhas ligações.
O peso do que Jake havia dito caiu sobre todos nós. Eu tinha mentido e dito que estava sozinho para eles na noite passada.
Heeseung estreitou os olhos para mim, ainda esperando alguma resposta. Sunghoon cruzou os braços, inclinando a cabeça ligeiramente como se estivesse tentando juntar as peças do quebra-cabeça. E Niki parecia inquieto, seu olhar indo de Jake para Heeseung e depois para mim.
Eu estava completamente perdido, sentindo os olhares deles queimando em mim. Não sabia o que dizer, então fiz o que me parecia mais seguro naquele momento: improvisei.
— Eu encontrei ele por acaso... no parque. — Minha voz soou hesitante, mas continuei, tentando soar mais convincente. — A gente não se falou muito. Foi rápido.
Jake soltou uma gargalhada, do tipo que faz a espinha arrepiar. Não era de diversão, mas algo entre deboche e triunfo. Meu estômago afundou na mesma hora, porque foi nesse instante que eu percebi: ele sabia.
Jungwon havia contado para ele.
Jake sabia do beijo.
Ele passou a língua pelos lábios, ainda sorrindo, e repetiu minhas palavras, carregando cada sílaba de ironia:
— Claro, Jay. Por acaso.
Niki, ao meu lado, fez uma careta tão exagerada que parecia saída de um desenho animado. Foi impossível não notar que ele estava segurando uma risada. Sunghoon, por outro lado, apenas me observava, curioso, como se estivesse esperando pelo próximo capítulo de uma novela particularmente boa.
Eu engoli em seco, tentando me recompor.
— Sim, por acaso. — Respondi, cruzando os braços para esconder o desconforto.
— Por acaso... — Jake repetiu novamente, agora quase murmurando para si mesmo, como se saboreasse o drama.
Decidi mudar o foco, desesperado para tirar a atenção de mim.
— Eu estava indo comprar um presente para o Heeseung, mas... Jungwon apareceu no meu caminho.
No segundo em que terminei de falar, algo mudou na expressão de Jake. Foi tão rápido que eu quase achei que estava imaginando. Mas quando olhei para Heeseung, ele também parecia ter notado.
— Um presente? — Jake perguntou, sua voz um pouco mais baixa agora, mas ainda carregada de sarcasmo. — Que fofo da sua parte. Espero que tenha sido algo bom.
Jake se virou repentinamente, sem qualquer aviso, dando as costas para todos nós. Fiquei estático, ainda tentando processar tudo o que havia acontecido até ali, mas a voz dele me arrancou de meus pensamentos.
— Qual era o lugar mesmo? — Ele perguntou, ainda de costas, com um tom calmo, mas carregado de algo que parecia... afiado. Ele sabia exatamente como deixar as coisas desconfortáveis.
— Forest Park — respondi hesitante, sentindo meus próprios nervos me traírem ao deixar a resposta escapar tão rápido.
Jake ficou parado por um breve instante, como se estivesse saboreando a resposta. Ele assentiu levemente, ainda de costas, e antes que eu pudesse imaginar qual seria sua próxima provocação, ele disse:
— Entendi. Talvez ele tenha ido até lá na esperança de se explicar pra você.
Foi como se meu coração parasse por um segundo e, em seguida, disparasse com tanta força que achei que todos ali poderiam ouvir. O som dos passos apressados de Jake ecoou pelo corredor enquanto ele se afastava, mas, na minha mente, tudo estava em câmera lenta. Aquelas palavras ficaram ressoando em minha cabeça.
Se explicar para mim?
O silêncio que ficou após a saída de Jake foi quase insuportável. Eu estava estático, incapaz de reagir, enquanto minha mente era tomada por lembranças do momento no parque. O beijo. O jeito como Jungwon me olhou. Aquele olho vermelho e hipnotizante que parecia querer me dizer algo, mas, ao mesmo tempo, me deixava desconfiado.
Será que ele realmente queria... falar comigo? Explicar o que aconteceu?
Minha cabeça parecia um campo de batalha entre a dúvida e a confusão. Por um lado, não conseguia esquecer o jeito que ele hesitou antes de se afastar, como se estivesse lutando contra algo dentro de si. Por outro lado, o medo de descobrir o que ele estava escondendo me paralisava.
E, então, veio aquele sentimento estranho e inesperado, como se algo pesado e quente tivesse se instalado em meu peito. Era uma mistura de ansiedade e arrependimento, mas havia algo mais, algo que eu não queria admitir. Era como se uma parte de mim quisesse correr até aquele parque e descobrir se ele realmente estava lá, esperando por mim.
Mas por quê? Por que eu sentia essa necessidade de entender? Por que me importava tanto?
Antes que eu pudesse afundar mais em meus próprios pensamentos, senti uma mão firme pousar em meu ombro. Era Heeseung. Seu rosto não demonstrava nenhuma emoção específica, mas havia algo em seus olhos que parecia mais suave, quase como se ele estivesse tentando me confortar sem dizer uma palavra.
— Vamos entrar, Jay, — ele disse, sua voz baixa e calma, mas com uma firmeza que deixava claro que não era uma sugestão.
Eu não tinha energia para resistir. Minhas pernas se moveram quase automaticamente, seguindo Heeseung de volta para dentro do apartamento. O silêncio entre nós parecia dizer mais do que qualquer conversa. Quando entramos, vi Niki e Sunghoon me lançarem olhares curiosos, mas ninguém disse nada.
Heeseung me guiou até o sofá e sentou-se ao meu lado, permanecendo quieto.
Por que Jake havia falado aquilo? Por que Jungwon teria algo para me explicar? E, acima de tudo, por que eu estava sentindo esse estranho calor no peito, uma mistura de expectativa e medo que eu simplesmente não conseguia ignorar?
O silêncio pairava no ar. Niki, que estava sentado no canto do sofá, foi o primeiro a quebrar o silêncio.
— Acho que estou processando tudo isso ainda... — Ele murmurou, mexendo distraidamente na barra da camiseta. Sua expressão parecia perdida, mas também carregava um toque de ironia.
Eu quase agradeci por ele ter falado primeiro, tirando a pressão que estava toda em cima de mim. Sunghoon riu baixo, balançando a cabeça, e apoiou os cotovelos nos joelhos, inclinando-se para frente.
— Você não é o único, Niki. — Ele disse, seus olhos brilhando com um tipo de diversão que me incomodava. — Acho que a gente devia fazer uma sessão de perguntas. Sabe, pra esclarecer algumas coisas...
Eu imediatamente olhei para ele de canto, assim como Heeseung, que parecia tão irritado quanto eu. Sunghoon deu de ombros, um sorriso provocador curvando seus lábios.
— O quê? Só estou dizendo que seria interessante. — Ele continuou, erguendo as mãos como se estivesse se defendendo. — Mas tudo bem. Melhor não agora.
Eu suspirei, esfregando o rosto com as mãos. O cansaço emocional estava começando a me dominar, e eu nem sabia por onde começar a organizar meus pensamentos. Foi quando ouvi duas batidas na porta.
Meus ombros ficaram tensos automaticamente, e minha ansiedade disparou. Olhei para os outros, tentando ler suas reações. Heeseung apenas franziu as sobrancelhas, mas Niki e Sunghoon trocaram um olhar antes de se levantarem apressados.
— Eu abro! — Sunghoon anunciou, já caminhando rapidamente até a porta, com Niki logo atrás dele.
Eu me virei parcialmente para acompanhar a cena. Quando eles abriram a porta, Sunoo estava parado ali com um sorriso enorme no rosto e algo nas mãos. Ele parecia completamente alheio a clima que ainda pairava no apartamento.
— O que aconteceu aqui? — Ele perguntou, sua voz animada, enquanto seus olhos varriam o ambiente, pousando brevemente em mim.
Antes que eu ou qualquer outra pessoa pudesse responder, Heeseung se adiantou, cruzando os braços e balançando a cabeça.
— Nada. — Ele disse de forma firme e cortante, encerrando qualquer possibilidade de Sunoo insistir no assunto.
Sunoo apenas deu de ombros, como se não se importasse realmente. Ele entrou no apartamento com a mesma energia de sempre e se jogou no sofá como se fosse dono do lugar. Em seguida, ergueu o que tinha nas mãos, balançando com entusiasmo.
— Olhem o que eu consegui! Ingressos para o cinema! — Ele anunciou, como se fosse a notícia mais incrível do mundo.
Sunghoon e Niki trocaram olhares e, em segundos, pareciam ter esquecido tudo o que tinha acabado de acontecer. Os dois correram para perto de Sunoo, examinando os ingressos com expressões animadas.
— Qual filme? — Sunghoon perguntou, parecendo genuinamente empolgado.
— Não importa! — Niki respondeu, pegando um dos ingressos e segurando-o como se fosse um troféu. — Cinema no final de semana já é o suficiente pra mim, sendo de graça fica melhor ainda.
Sunoo riu, claramente satisfeito com a reação deles. Enquanto isso, eu estava sentado no mesmo lugar, observando a cena com um misto de alívio e exaustão. A leveza de Sunoo parecia ter dissipado, ainda que temporariamente, a tensão que havia dominado o apartamento.
Enquanto os outros conversavam animadamente sobre o cinema, Heeseung se aproximou e tocou meu ombro. Eu olhei para ele, e ele apenas balançou a cabeça, indicando que deveríamos conversar mais tarde. Assenti, tentando afastar a inquietação, pelo menos por enquanto.
Sunghoon, que ainda segurava um dos ingressos do cinema, virou-se para Sunoo com uma expressão mais séria, como se algo lhe passasse pela cabeça. Ele cruzou os braços, inclinando levemente a cabeça para o lado.
— Ei, Sunoo... você falou com o Jungwon depois da escola? — Ele perguntou, o tom casual, mas havia um leve interesse em sua voz.
Sunoo arqueou as sobrancelhas, um pouco surpreso pela pergunta repentina. Ele balançou a cabeça e deu de ombros.
— Não, por quê? — Ele respondeu, genuinamente confuso. — Jungwon não anda usando o celular tanto assim ultimamente. É quase impossível falar com ele.
Ao ouvir isso, Niki, que estava sentado, soltou um suspiro dramático e deixou o corpo cair para trás, apoiando-se nos cotovelos. Ele olhou para o teto antes de murmurar:
— É por isso que o Jake parecia perturbado...
Sunoo imediatamente franziu o cenho, girando o corpo para encarar Niki. Ele inclinou a cabeça ligeiramente, tentando processar o que aquilo significava.
— Espera... o que você quer dizer com isso? — Ele perguntou, sua voz cheia de curiosidade e um toque de preocupação.
Antes que Niki pudesse responder, Sunghoon, ainda com os braços cruzados, tomou a iniciativa. Ele ergueu as sobrancelhas, olhando diretamente para Sunoo.
— Jake estava aqui há poucos minutos. Ele apareceu na porta procurando pelo Jungwon. — Sunghoon disse de forma direta, como se estivesse entregando uma informação importante.
Sunoo piscou rapidamente, parecendo visivelmente incomodado. Ele trocou um olhar breve com Heeseung, que permanecia em silêncio e observava tudo de forma cautelosa. Em seguida, os olhos de Sunoo se moveram para mim.
— Ainda bem que eu não estava aqui. — Sunoo finalmente disse, sua voz soando mais baixa do que o normal. — Da última vez que encontrei o Jake, ele parecia... assustador. Agora entendi porque vocês estão assim.
Heeseung limpou a garganta, cortando o silêncio desconfortável que havia se instalado depois do comentário de Sunoo. Ele se virou para o próprio sofá, como se estivesse ponderando algo importante, e então olhou para Sunoo com a expressão mais neutra que conseguiu.
— Sua mãe está lá na recepção? — Ele perguntou, a voz calma, mas carregada de intenção. Era o jeito dele de mudar de assunto sem parecer tão óbvio.
Sunoo, ainda segurando os ingressos do cinema, assentiu enquanto os colocava cuidadosamente sobre a mesa de centro.
— Está sim. Ela chegou cedo hoje. — Ele respondeu, casual, mas ainda com a curiosidade evidente sobre o rumo da conversa.
Heeseung acenou com a cabeça, se levantando em um movimento fluido. Ele alisou a camiseta, como se quisesse organizar até mesmo os próprios gestos, e então anunciou, com aquele tom sério e eficiente que era tão característico dele:
— Vou descer pra pagar a mensalidade do apartamento. Depois disso, acho que vou ao mercado. Estamos sem algumas coisas na cozinha.
Sunghoon e Niki, que pareciam ter perdido parte do interesse na conversa, apenas murmuraram algo em concordância, enquanto Sunoo voltou a se sentar, agora mexendo no celular. Heeseung pegou suas chaves que estavam sobre a bancada, e seu olhar pousou brevemente em mim antes de sair, como se quisesse confirmar que tudo estava sob controle. Eu sabia que não estava, mas não comentei.
Assim que a porta se fechou atrás dele, Niki, que estava espalhado no sofá, olhou para mim com uma expressão de falsa inocência.
— E quem vai lavar as louças? — Ele perguntou, o tom exageradamente casual, como se fosse um problema para qualquer um, menos dele.
Rolei os olhos, já antecipando o que viria em seguida.
— É o seu turno, Niki. — Respondi sem hesitar, me levantando antes que ele pudesse pensar em protestar. — Boa sorte com isso.
Niki abriu a boca, claramente pronto para reclamar, mas eu já estava me movendo em direção à porta, aproveitando a deixa para escapar antes que ele tentasse me envolver em algum argumento furado. Fechei a porta atrás de mim e soltei um suspiro enquanto olhava para o corredor.
Segui para as escadas, senti meu coração acelerar a cada passo apressado que dava. Não queria encontrar Heeseung no meio do caminho; Não era como se eu soubesse exatamente o que estava fazendo, mas algo dentro de mim insistia que eu precisava ir até a ponte no Forest Park.
As palavras de Jake ainda martelavam na minha cabeça, e a ideia de que Jungwon poderia estar lá esperando por mim, me deixava inquieto. Talvez Jake estivesse mentindo, talvez estivesse apenas tentando me manipular e eu caí em seu papo como um completo idiota.
Ao sair do prédio, avistei um táxi na esquina. Levantei a mão automaticamente, e o carro parou em poucos segundos. Entrei no banco de trás, tentando parecer calmo, mas meu nervosismo era evidente até para o motorista.
— Forest Park, por favor. — Pedi, minha voz saindo mais baixa do que eu esperava.
O trajeto parecia mais longo do que deveria ser, ou talvez fosse minha ansiedade que fazia cada minuto parecer uma eternidade. Olhei pela janela, tentando distrair meus pensamentos, mas tudo o que eu conseguia imaginar era Jungwon, parado na ponte, com aquele olhar que parecia sempre ver através de mim. Eu não sabia o que diria se o encontrasse ali. Parte de mim queria gritar, exigir respostas, mas a outra parte... queria apenas ouvir sua voz, talvez entender o que estava acontecendo de verdade com ele.
Quando o táxi finalmente parou na entrada do parque, paguei o motorista rapidamente e desci, puxando o capuz da minha jaqueta para cima. O ar estava gelado, e o céu estava nublado, mas a ponte não era difícil de encontrar.
Mantive distância, me escondendo entre as árvores que cercavam a área. A visão da ponte à frente me trouxe uma onda de emoções confusas.
Meu coração quase saiu pela boca quando vi uma figura na ponte. Parei no mesmo instante, escondido entre as árvores, enquanto minha mente acelerava. Por um breve momento, achei que fosse Jungwon. Mas então, ao me forçar a olhar mais de perto, notei que era uma garota. Os cabelos ruivos dela reluziam suavemente sob a luz opaca do céu nublado. Ela estava encostada na madeira de apoio, os olhos voltados para o horizonte.
Eu suspirei, me apoiando contra uma árvore. Não era ele. Claro que não era.
Fiquei ali parado, observando de longe, enquanto a garota mexia no celular, parecendo alheia a tudo ao redor. Alguns minutos se passaram, mas cada segundo parecia se arrastar. Ela guardou o telefone no bolso e, sem pressa, começou a se afastar da ponte. Eu esperei até que sua silhueta desaparecesse completamente entre as árvores antes de finalmente me mover.
Caminhei até a ponte, os passos cautelosos, mas o peso do desapontamento caía sobre mim como uma pedra. Era como se algo dentro de mim já soubesse que não o encontraria ali, mas ainda assim, a confirmação era amarga. Me apoiei na madeira gasta da ponte, olhando para o rio abaixo como fizeram no dia anterior e nas outras vezes em que vim até aqui. A água estava calma, refletindo o céu cinzento.
Respirei fundo, o ar frio preenchendo meus pulmões e me forçando a manter a compostura. O que eu esperava encontrar, afinal? Uma explicação? Um rosto familiar que pudesse dissipar as dúvidas na minha cabeça? Tudo parecia tolo agora, uma ideia que só fazia sentido na minha mente confusa.
Meus olhos vagaram, acompanhando o movimento suave da água, mas algo chamou minha atenção na madeira à minha frente. Havia um arranhão, ou melhor, uma mensagem, gravada na superfície envelhecida da ponte. Abaixei-me, passando os dedos sobre as palavras minúsculas entalhadas, como se tocá-las pudesse me ajudar a entender.
"Às vezes, a escuridão nos envolve antes que possamos entender o que ela realmente é. Não sei quanto tempo vou poder ficar na sua luz."
Minha respiração falhou por um momento. A caligrafia parecia irregular, como se tivesse sido feita às pressas com algo afiado, mas a mensagem... Era como se cada palavra fosse um peso sobre meu peito.
Era dele. Eu tinha certeza.
Ontem não lembro de ter visto essa frase quando estive aqui.
Fiquei ali, encarando as palavras como se elas pudessem me oferecer algo mais, uma resposta para o que estava acontecendo. Ele sabia que eu viria? Ou isso era apenas uma coincidência cruel? Minha mente girava em círculos enquanto minha mão permanecia pousada sobre as letras entalhadas.
Eu não consegui dormir direito naquela noite. As palavras que encontrei na ponte continuavam se repetindo na minha cabeça, como um eco distante que não me deixava em paz. Cada vez que fechava os olhos, o peso delas ficava mais pesado.
Mas a verdade é que só uma coisa fazia sentido: Jungwon estava tentando me dizer algo, e eu não conseguia ignorar isso. Mesmo depois do medo que senti naquela noite, ainda havia algo mais forte. A vontade de entender.
Levantei mais cedo do que de costume. O quarto ainda estava escuro, mas minha mente já estava funcionando a mil. Sunghoon, como sempre, estava espalhado na outra cama, roncando baixo. Olhei para ele por um instante e senti uma pontada de inveja. Como ele conseguia dormir tão tranquilo? Eu, por outro lado, parecia preso num labirinto mental do qual não conseguia sair.
Peguei meu notebook e me sentei na beira da cama, hesitando antes de abrir a tela. Minhas mãos estavam suadas, mas eu as ignorei, abrindo o navegador. O que eu estava procurando, exatamente? Respostas? Algum tipo de explicação que fosse mais fácil de aceitar?
Digitei: "Olhos normais mudando de cor".
O primeiro resultado foi uma propaganda de lentes de contato. Ótimo, realmente útil. Continuei rolando, mas nada parecia relevante. Estava prestes a desistir quando um link no fim da página chamou minha atenção: "Histórias de olhos que revelam o sobrenatural."
Cliquei, e o site que abriu parecia algo saído de um filme de terror barato. O fundo era preto, com letras vermelhas piscando, e gifs horríveis de olhos assustadores. Suspirei, mas continuei lendo. A maior parte parecia fantasia barata, pessoas falando de vampiros, demônios e sei lá mais o quê. Mas uma postagem específica me fez parar.
"Olhos vermelhos aparecem quando alguém perde o controle. Se você viu isso e ainda está vivo, não é sorte. É um aviso."
As palavras fizeram meu peito apertar. A imagem de Jungwon na ponte voltou com força total. Aquele olhar... não era humano. Não podia ser. Mas ele não me machucou. Ele foi embora, sumiu antes que eu pudesse fazer qualquer coisa. Por quê?
Rolei a página, lendo mais depoimentos. Uma frase apareceu no final, como se tivesse sido escrita para mim:
"Se você está procurando por respostas, procure onde o silêncio fala mais alto. Lugares onde a emoção é forte, mas as palavras não têm espaço."
Fiquei encarando isso por longos segundos, até que minha mão se moveu automaticamente até o celular. Abri a galeria e, lá estava, a foto da frase gravada na ponte. Era impossível não fazer a conexão. A ponte... poderia ser o lugar de silêncio.
Porém, antes de eu completar qualquer raciocínio. Um travesseiro atingiu minha cara com força suficiente para jogar minha cabeça para trás, e o impacto direto com a cabeceira da cama arrancou um som seco do quarto e uma careta de dor de mim.
Por um momento, tudo o que fiz foi ficar ali parado, tentando entender o que diabos tinha acabado de acontecer. Quando finalmente abri os olhos, a visão que me recebeu foi Sunghoon. Ele estava de pé ao lado da cama, segurando a barriga enquanto gargalhava de uma maneira que eu tinha certeza de que ia acordar Niki e Heeseung.
— Você tá maluco?! — gritei, a mão indo direto para minha testa, que agora latejava por causa do ferimento ainda recente.
Mas ele não respondeu. Não conseguia. Ele já estava no chão, literalmente rolando de tanto rir. As lágrimas escorriam pelo rosto dele, e, se não fosse pela dor que pulsava no meu crânio, talvez eu achasse aquilo engraçado.
— Sunghoon, sério! Que diabos foi isso?! — insisti, ainda segurando minha testa enquanto o encarava, incrédulo.
Ele finalmente conseguiu recuperar um pouco de ar, embora ainda estivesse rindo tanto que a voz saía falhada:
— Cara... A sua cara! — Ele apontou para mim, e isso só fez ele rir ainda mais, o que era ainda mais irritante. — Foi a melhor coisa que já vi!
— A minha cara?! — Minha voz saiu suave, enquanto eu me levantava da cama. — Tá, mas você pode ver se não abriu o corte novamente? É que tá doendo.
Sunghoon congelou no meio de mais uma risada, e foi como se alguém tivesse desligado um interruptor. Ele piscou algumas vezes, claramente se lembrando que eu realmente estava machucado. Sua expressão mudou para algo que beirava o pânico, e ele se levantou do chão tão rápido que quase tropeçou.
— Merda, Jay! — Ele veio na minha direção, a risada completamente esquecida. — Deixa eu ver isso!
Antes que eu pudesse protestar, ele já estava puxando minha mão para longe da testa, examinando o corte com uma concentração tão exagerada que quase me fez rir. Era cômico o jeito que ele estava sério de repente, como se tivesse cometido um crime imperdoável.
— Tá doendo muito? Não tá sangrando. Cara, eu fui um idiota, desculpa! — Ele parecia genuinamente preocupado, e isso só tornou tudo ainda mais engraçado.
Eu não consegui evitar. Comecei a rir. Não da situação em si, mas da cara dele, da mudança brusca de atitude. Ele parou de falar na hora, me olhando como se eu tivesse perdido o juízo.
— Por que você tá rindo? — perguntou, confuso, mas com uma ponta de irritação surgindo na voz.
— Você! — respondi, tentando recuperar o fôlego. — Primeiro me acerta com um travesseiro como se estivesse me matando, depois age como se fosse um médico de emergência!
— Tá falando sério? — Ele cruzou os braços, me olhando com uma expressão que dizia claramente que ele estava ofendido. — Eu tô aqui, me desculpando, me preocupando, e você tá rindo da minha cara?
— É que você tá hilário, Sunghoon. — Eu tentei segurar o riso, mas só consegui piorar. — Mas sério, eu tô bem, tá? Relaxa.
Ele bufou, claramente não satisfeito, e virou as costas.
— Nada vai estragar o meu dia, nem você, Jay. — Ele começou a sair do quarto, jogando as palavras por cima do ombro. — Porque hoje tem cinema depois da escola, e eu não vou deixar sua testa cortada estragar isso.
Eu ri de novo, balançando a cabeça enquanto ele desaparecia pelo corredor. Sunghoon podia ser um pé no saco às vezes, mas era difícil não gostar dele.
Minha mão voltou para minha testa enquanto eu olhava de relance para o notebook ainda aberto. A leveza que Sunghoon trouxe foi boa, mas minha mente ainda estava presa na mensagem da ponte, como eu iria achar as respostas, se aparentemente Jungwon estava sendo transferido da escola?
. . .
Oiê! Lembrando que o próximo capítulo é bem longo, tá? Por favor, não esqueçam de votar e comentar o que estão achando.
☄️🩷
|Obs: O Wattpad não está notificando sobre a atualização dos capítulos, peço que fiquem atentos.
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