Infância
╋ ARTHUR WEST ╋
Encarei Sam com uma irritação velada. Seu comportamento vitimista me dava nos nervos. Ele me observou por longos segundos pensando que eu não havia percebido. Podia jurar que estava me comparando com Theo. Revirei os olhos, irritado demais para conseguir fingir complacência e resolvi contar-lhe tudo sobre meu irmão. Sam merecia saber, visto que sua vida havia sido transformada radicalmente depois de conhecê-lo.
Havíamos tido uma infância conturbada. Nosso pai batia na nossa mãe quase todos os dias. Éramos tão pobres que não tínhamos dinheiro para o lanche na escola. Brincávamos apenas quando nosso pai não estava por perto, porque ele bebia e qualquer gesto era suficiente para irritá-lo, aquele desgraçado. Infelizmente dependíamos do salário dele que, somente após muitas brigas, era usado para comprar roupas e comidas. Foi assim durante anos.
Sofremos sem saber o que fazer, ouvindo nossa mãe gritar, ouvindo o barulho da mão pesada dele contra o corpo magro e frágil dela.
Nos escondíamos debaixo da cama.
Foi num desses momentos assustadores e tristes quando Theo me contou que, além de bater na nossa mãe, nosso pai também era um estuprador.
Não soube como reagir. Eu tinha 14 anos, ele 10. O que eu poderia fazer? Durante todos aqueles anos ele se esgueirava, bêbado, até a cama de Theo e fazia coisas nojentas e absurdas com ele.
Se dormíssemos num mesmo quarto, me perguntei durante muitos anos, será que tudo teria sido diferente? Eu conseguiria reagir, afastá-lo ou não faria nada e entraria em choque? Também poderia ter virado sua outra vítima.
Então, quando ele tinha 14 anos e eu 18, nosso pai morreu. Foi encontrado com uma garrafa de vodka quebrada em uma mão e cacos de vidro cravados na cabeça.
Nossa vida mudou a partir daquele momento. Como iríamos nos sustentar? Eu já tinha 18 anos, então precisei arranjar um jeito de pagar as contas e cuidar da minha família.
Passei anos trabalhando em uma empresa de vendas de produtos dermatológicos. Atendia clientes por telefone e ligava para oferecer os serviços. Minha mãe, depois da morte dele, ficou tão desestabilizada que nunca mais foi a mesma. Theo virou o filho querido dela, que a cuidava, abraçava e dizia que tudo ia ficar bem.
Ela entrou em uma depressão tão profunda que faleceu 1 ano após a morte de nosso pai.
Então um dia, quando entrei no quarto dele, o vi pegar um caco de vidro da gaveta. Era um estilhaço grande, manchado de vermelho. Theo segurou aquele fragmento com admiração, virou-o entre os dedos e, quando me viu parado na porta, olhando sem entender nada, apenas sorriu e o guardou.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro