Capítulo 87- Arco-íris dos sonhos
Olá, queridos leitores. Estou postando mais um capítulo, e espero que me digam o que acharam dele. Acho que ficou bem romântico, mas, vou saber se ele realmente ficou bom depois que eu ler os comentário, portanto, estou ansiosa por eles. Desculpem-me pelos erros ortográficos, vou corrigindo aos poucos. Muito obrigada por todo o carinho que tenho recebido aqui, e por todos os favoritos. Vocês são realmente fantásticos por me darem a oportunidade de contar essa história que tenho escrito com meu coração. Beijos até o próximo capítulo, Rosana.
ANNE
A manhã de domingo provocou um sorriso involuntário em Anne ao sentir o calor do sol gostoso aquecê-la em mais um dia de inverno. Ela olhou para Gilbert ao seu lado, que dirigia o carro que tinham acabado de comprar no dia anterior e seu sorriso se tornou ainda maior. Ele tinha as duas mãos sobre o volante, tencionando-as quando fazia uma curva mais sinuosa, destacando os músculos do braço à mostra pela manga da camisa azul que ele dobrara até o cotovelo. Seu olhar viajou até os dedos longos agora relaxados sobre o volante, e um calor súbito a fez retirar o cachecol que estava enrolado em volta do seu pescoço enquanto imagens da noite anterior desfilavam em sua mente. Ela tentou disfarçar o leve rubor em sua face, que a lembrava que pensamentos assim em uma manhã de domingo considerado um dia sagrado eram no mínimo obscenos, porém, ela não conseguia bloqueá-los porque um certo universitário aspirante a cirurgião a provocava dia e noite, e não podia dizer que não gostava do jeito com que ele vinha se comportando com ela.
Desde sua última briga por causa de Dora, Gilbert mudara seu comportamento dentro de casa e também na faculdade. Anne notara que quando a garota estava por perto ele tinha o cuidado de manter certa distância, falando muito pouco com ela, a não ser quando era estritamente necessário, e isso não fora nenhum imposição de Anne. Ela tinha deixado bem claro que não queria que ele se afastasse de sua amiga. Apenas que impusesse certos limites, contudo, por iniciativa própria, Gilbert desenvolvera um novo relacionamento com Dora onde a intimidade de antes fora relegada a simples conversa sobre os trabalhos e projetos nos quais estavam envolvidos juntos. No fundo, Anne estava satisfeita, e não se sentia culpada como normalmente aconteceria no passado. Ele aprendera que até para a tolerância tinha limites, e Dora já tinha extrapolado demais a sua.
No dia seguinte, após a briga, ela e Gilbert chegaram à Faculdade e encontraram Dora rindo de orelha a orelha. O motivo, Anne podia muito bem adivinhar, e por pouco não arrancou sua expressão feliz com as próprias unhas, mas, ela se lembrou que seu espírito já não era tão selvagem, e anos vivendo em Avonlea a treinaram bem para aquele momento no qual tinha que se portar como uma mulher adulta e racional, mas, se Dora insistisse naquele seu senso irônico todo, Anne ainda daria a ela um gostinho de seu temperamento de ruiva não tão domesticado assim, porém, ela teve o prazer de acabar com o ar satisfeito de Dora quando Gilbert se despedira dela em frente de sua sala. Anne se agarrou a ele mais tempo do que seria prudente em público, e lhe deu um beijo tão intenso que várias cabeças se viraram para ver aquela demonstração de amor explicita. Assim, que se afastou, ela pôde observar duas coisas, o sorriso de Dora tinha sumido completamente, e seu noivo parecia supresso e um tanto desorientado pela ousadia da garota ruiva que nunca fizera isso em um local onde todos poderiam ver, e depois comentar.
- Anne, o que foi isso? - ele sussurrou com os olhos muito abertos.
- Um beijo. - Anne disse sorrindo do rosto espantado dele.
- Isso foi bem mais que um beijo. - ele comentou ainda sussurrando.
- O que foi, não gostou? - ela disse com uma sobrancelha levantada.
- O que você acha? - o rosto corado dele denunciava o que ele sentira com o beijo, apenas disfarçava para não dar na cara demais.
- Isso é para você se lembrar. - Ela disse com certa malícia.
- Me lembrar do que? - o rapaz perguntou confuso.
- Do nosso jogo de soletrar de ontem à noite. - Gilbert pareceu respirar mais rápido com as lembranças, e para deixá-lo um pouco mais perturbado, ela disse:
- Talvez a gente possa repetir nossa competição hoje à noite. Sabe como é, uma revanche, já que ninguém saiu ganhador dessa vez.
- Anne! - Gilbert disse, o nome dela soando rouco na voz dele. Ela apenas riu, sabendo que tinha conseguido o que queria, deu-lhe um beijo no rosto, dizendo antes de entrar na sala de vez:
- Até mais tarde querido.
Como de costume, ela se sentou ao lado de Sharon que a cumprimentou com um sorriso;
- Você parece que teve uma ótima noite de sono. - ela comentou examinando o rosto relaxado de Anne.
- Você não faz ideia. - Anne respondeu compartilhando consigo mesma o que exatamente suas palavras queriam dizer.
Assim, a aula começara e Anne se envolveu totalmente no mundo da Literatura que tanto amava.
O resto da semana fluiu levemente, e Anne se sentiu tão bem que quando o domingo chegara, ela se viu ansiosa pelo convite que Gilbert lhe fizera, ele apenas não dissera onde a levaria deixando-a curiosa por descobrir, sabendo anteriormente que deveria ser um lugar incrível conhecendo a capacidade que seu noivo tinha de surpreendê-la de maneira agradável sempre. Agora que estavam dentro do carro, rumo a sua pequena aventura, Anne se dava ao luxo de continuar olhando seu noivo que exibia sua beleza morena e sua habilidade em conduzir aquele veículo com tanta habilidade, assim como tudo o que fazia tão bem, inclusive bagunçar as emoções dela.
De repente, ele capturou seu olhar, e a olhou com seu sorriso matador que fazia Anne ter arrepios pelo corpo todo. O tempo podia passar, mas o poder que Gilbert tinha de capturar toda a sua atenção com aquele seu olhar insinuante parecia não diminuir nunca. Então, ele perguntou, sem desviar a atenção da estrada, e ao mesmo tempo, não permitindo que Anne escapasse de seu fascínio evidente.
- Posso saber, por que a Sra. Blythe me olha como se eu fosse sua sobremesa favorita?
- Talvez porque você realmente seja minha sobremesa favorita. - ela disse ousadamente, e o olhar de Gilbert se inflamou com sua resposta. Eles agora se provocavam assim, e Anne perdera a inibição inicial que a deixava vermelha feito um pimentão quando Gilbert lhe dizia palavras inapropriadas. Ela aprendeu rápido que na intimidade aquelas brincadeiras nada inocentes alimentavam o fogo entre eles, e ela também admitia que gostava imensamente desses momentos a dois.
- Você é minha sobremesa favorita também, principalmente quando está enfeitada com aquela sua lingerie rosa rendada. - Gilbert disse, seus olhos se demorando em seu rosto, estudando sua reação às palavras dele.
- Você sabe que rosa nunca foi minha cor favorita. Sempre pensei que a cor preta me favorecia mais. - Anne disse divertida, embora por dentro um certo calor começasse a incomodar de novo.
-Isso é por que você não se enxerga com os meus olhos, amor. Embora, devo confessar que qualquer cor que você use sobre essa pele perfeita me deixa louco do mesmo jeito. - Anne tentou respirar normalmente, mas, por Deus! Gilbert sabia ser mais provocador que ela. Era sério que estavam dentro de um carro em plena manhã de domingo, discutindo o tipo de lingerie que Gilbert gostava de ver Anne usando? Ela mudou de assunto instantaneamente, antes que aquilo tomasse um rumo que seria impossível ignorar.
-Não vai mesmo me dizer onde está me levando? - Gilbert sorriu com o canto do lábio, e respondeu.
- Estamos quase chegando. Você vai adorar.
Deste modo, viajaram por mais alguns minutos, e Anne aproveitou para curtir a beleza do dia. O céu estava claro e sem nuvens, e embora o ar continuasse frio, a temperatura naquele dia estava agradável, permitindo que atividades fora das casa e apartamentos pudessem ser realizadas, fato raro nos últimos meses em que a quantidade de neve era tanta, que apenas pensar em caminhar pelas calçadas da Quinta Avenida era correr o risco de sofrer uma hipotermia. Ela se sentia completamente leve, feliz e livre. Era maravilhoso aproveitar momentos assim ao lado de Gilbert, e isso a fazia pensar no quanto tinham amadurecido até ali. Seu relacionamento nada tinha de adolescente, tinham passado da fase de reconhecimento para descobertas mais maduras, e Anne se sentia cada vez mais mulher e dona de si. E ela adorava essa sua nova condição, assim como amava seu sexo feminino. Quantas vezes ouvira Marilla reclamar por ser mulher e se sentir limitada por isso, mas Anne descobria a cada dia que ser mulher era a coisa mais linda do mundo, e de forma alguma uma garota deveria pensar que não tinha a mesma capacidade de ser o que quisesse que um homem, pois usar saia não significava que tinha que se submeter a algum tipo de julgamento por sua conduta, ou se esconder atrás de um marido ou namorado dando a ele plenos poderes para decidir sobre sua vida. Ser mulher era mostrar a sua força, sua inteligência e sua habilidade em ser igual ou melhor que qualquer homem e em qualquer área, e ela nunca abriria mão do seu direito de evoluir e expressar sua opinião e pensamentos livremente. Por esta razão, ela podia dizer a plenos pulmões que ela amava ser mulher, se vestir como uma mulher, se olhar no espelho e descobrir todos os seus encantos mais sedutores, amar como uma mulher, ser amada como tal e descobrir nos olhos de seu parceiro a admiração que nascia a cada dia por ele respeitar seu espaço, sua individualidade e sua sexualidade.
Gilbert jamais ridicularizava seus sonhos, ele os enaltecia, ele a fazia enxergar de tudo o que era capaz de realizar mesmo quando ela achava que suas limitações não permitiriam. Ele dava asas à sua imaginação e voava com ela por tantos lugares que isso os colocava sempre na mesma sintonia, e objetivos de vida. Ele queria ser médico, ela professora, mas seus ideais como seres humanos eram tão semelhantes, que Anne nunca sabia quando o seus terminavam e os dele começavam. Era um privilégio enorme ser uma mulher no mundo do ambicioso Gilbert Blythe, o que a fazia adorar mais ainda ser a mulher que ele amava todas as noites.
- Amor, chegamos. - ele disse arrancando Anne de seus pensamentos profundos.
Ela olhou em volta e se encantou pelo lugar cuja beleza ela realçada pela paisagem verdejante existente por todos os lugares. Havia uma ponte suspensa e um lago incrível onde vários patinhos nadavam em bandos, tornando aquele lugar ainda mais encantador. Não havia muitos turistas por ali naquele momento, mas, os poucos que visitavam aquela paisagem inspiradora pareciam tão elevados pelo local quanto Anne.
- Gilbert, que lugar incrível! Como o descobriu? - Anne perguntou olhando para uma enorme placa que dizia "Sejam bem vindos ao Broklin Bridge Park."
- Eu vim aqui uma vez com a turma da Faculdade em uma excursão de pesquisa, e logo imaginei que você gostaria de conhecê-lo. Eu sei o quanto gosta de natureza, e Nova Iorque carece muito dela por ser uma cidade totalmente urbana. Achei que se sentiria tão em casa aqui como se sente em Green Gables. - Anne se aproximou dele, e o abraçou pela cintura dizendo:
- Você sempre me surpreende em tudo. - ela disse feliz, encaixando suas pernas no meio das de Gilbert, estreitando assim o abraço.
- É mesmo? E no que mais te surpreendo? - ele disse segurando o rosto dela entre as mãos.
- Principalmente quando me beija. – ela disse deixando que seu rosto ficasse bem próximo dele.
- Isso é porque eu adoro te beijar. - e ele não ficou somente nas palavras, porque logo prendeu os lábios dela entre os seus. Foi um beijo calmo e suave, e Anne se sentiu nas nuvens como sempre. Beijar Gilbert era sempre uma experiência que adorava, porque nunca sabia de que maneira aconteceria. Era o jeito dele lhe dizer de quantas formas diferentes a amava, e isso por si só era uma dádiva maravilhosa.
Eles se separaram depois de alguns segundos, e de braços dados, Gilbert a levou para fazer turismo pelo local. Havia tanta coisa para ver e explorar, que Anne se sentia como uma garotinha em um grande parque de diversões, depois do que pareceram horas caminhando sem parar, eles pararam em uma barriquinha de cachorro quentes e compararam suco de laranja, voltando para o carro a fim de se deliciarem com a comida e bebida. Assim que acabaram de comer, Gilbert perguntou:
- Quer dar mais uma volta por ai? Tenho certeza de que ainda há muita coisa para ser vista.
- Acho que prefiro ficar um pouco aqui se você não se importar.
- É claro que não. Você decide o que quer fazer. - ele sorriu e segurou na mão dela enquanto se olhavam feito dois namorados em seu primeiro encontro. Anne levou a mão ao rosto de Gilbert, e explorou com cuidado cada parte dele desde a testa larga, os pálpebras sobre os olhos castanhos adoráveis, as maçãs do rosto, o nariz perfeitamente esculpido, os lábios carnudos, e o queixo quadrado onde ela podia sentir a barba dele por fazer. Ela adorava sentir a aspereza em seus dedos, a suavidade da pele dele, e amava olhar para aquele rosto que sempre lhe tirava o fôlego.
- Amor. - ela sussurrou, e Gilbert olhou para ela surpreso e perguntou.
- O que é isso? Quer que eu soletre essa palavra agora? – ele disse brincando.
- Não. Eu apenas estava tentando imaginar o que essa palavra significa para você.
- Você quer que eu diga o que o amor significa para mim, mesmo eu demonstrando isso para você todos os dias? – ela assentiu, e ele pensou por um instante antes de responder.
- Bem, o amor para mim só tem um significado.
- E qual é? - ela perguntou curiosa.
- Você.
- Eu? - ela perguntou com a testa franzida.
- Sim, tudo o que o amor significa para mim está relacionado à você. No jeito em que nos abraçamos, nos beijamos, no seu sorriso para mim quando acorda, nesse momento, como você toca meu rosto, na maneira como confia em mim para me contar os seus pensamentos mais profundos, em tudo o que partilhamos juntos. É isso o que o amor significa para mim. - ele finalizou colocando uma mecha de cabelo de Anne atrás da orelha dela.
- Você não vai me perguntar o que o amor significa para mim? - a ruivinha perguntou curiosa.
- Eu não preciso, posso vê-lo em seus olhos. - e assim, seus lábios se encontraram mais uma vez naquele dia, só que agora mais exigentes e possessivos, porém se afastaram logo, pois sabiam muito bem como aquele calor todo poderia evoluir facilmente para uma fogueira, e aquele local não era de forma nenhuma o lugar mais apropriado para o que seus corpos ansiavam.
- Quer dar mais uma volta agora? - Gilbert perguntou sorrindo.
- Sim. - ela disse. E assim passaram o resto da manhã curtindo aquele lugar que conquistou o coração de Anne completamente, e por esta razão, ela o fez prometer que voltariam um outro dia e trariam Cole e Pierre junto com eles.
Quando voltaram para casa, já era quase fim de tarde, e depois de tomarem banho juntos, jantarem, eles resolveram ir para cama, pois o dia cheio de atividades os deixara exaustos, e logo que deitaram a cabeça no travesseiro eles adormeceram quase que instantaneamente.
A segunda-feira trouxe um pouco de preguiça a Anne que demorou a se levantar. Ela desejou que apenas naquele dia não tivessem que ir à faculdade, mas, como suas responsabilidades sempre vinham em primeiro lugar, logo ela estava pronta e saiu de casa em companhia de Gilbert, sentindo-se mais animada ao se lembrar que naquele dia começaria a trabalhar com a monitoria de Literatura, e estava ansiosa por aquele trabalho que além de lhe pagar um salário maior que o da livraria, lhe daria a oportunidade de ir para casa mais cedo, e ainda lhe permitiria fazer o que mais gostava. Por isso, assim que as aulas se enceraram. Anne reuniu suas coisas, e foi até a sala de Gilbert se despedir dele antes de seguir para a área de monitoria.
- Quer dizer que vou perder minha bela companhia para o almoço? - o rapaz disse sorrindo enquanto rodeava a cintura dela com as mãos.
- Ah, meu amor, Perdoe-me. Eu não queria que almoçasse sozinho, mas, terei que comer por aqui mesmo, pois a primeira aula começa daqui a trinta minutos.
- Que pena, vou sentir a sua falta. Almoçar sem você não é a mesma coisa. - Gilbert disse, beijando-a na ponta do nariz.
- Eu também vou sentir sua falta, mas, eu estou realmente empolgada com esse trabalho. Você sabe o quanto amo literatura. - Anne disse arrumando a gola da camisa de Gilbert.
- Eu sei, e estou muito orgulhoso da minha mulher. Eu tenho certeza que vai arrasar como sempre. - ele a beijou de leve nos lábios, e Anne sorriu ao dizer.
- Tomara que tenha razão. Nos vemos mais tarde?
- Claro, com certeza. - ele lhe deu um último beijo, e assim caminharam em direções opostas.
Anne fez um lanche rápido na cantina da Faculdade, e logo tomou seu lugar na sala de monitoria. Os alunos que passaram por ali eram extremamente agradáveis, e todos realmente prestavam bastante atenção na maneira como ela explicava cada ponto da matéria que para alguns deles era extremamente difícil, porém, Anne tinha uma didática incrível para tornar o que parecia um bicho de sete cabeças em algo realmente simples e interessante. Ela estava quase no fim de seu dia como monitora e teria apenas mais um aluno para atender, por isso, ela continuou sentada em sua cadeira e esperou. Em menos de um minuto o aluno entrou, e quando ela levantou o olhar seu coração pareceu falhar uma batida. Ela não podia acreditar que seu último aluno do dia seria Roy Gardner. Imediatamente, ela se levantou e começou a reunir suas coisas. De jeito nenhum seria monitora daquele imbecil, e falaria com seu professor no dia seguinte sobre isso.
- Onde pensa que vai ruivinha? - ele perguntou com a voz cheia de sarcasmo.
- Estou indo embora. - Anne respondeu seca, e ele apenas riu dizendo.
- Não pode ir ainda. Você tem que me dar aulas.
- Nem por todo o dinheiro do mundo eu seria sua monitora de Literatura. - Anne respondeu dando um passo para a saída, mas, parou quando Roy disse:
- Você vai ser minha monitora porque é obrigada a isso.
- Eu não sou obrigada a nada. - Anne respondeu sentindo o calafrio do seu estômago espalhar por toda sua espinha.
-Você é sim, sabe, por que? Meu pai é dono dessa instituição, e você fará o que eu quiser. - ele disse quase gargalhando.
- Então, posso ir até ele e dizer que não vou dar aula para o filho dele, porque ele me assedia. - Anne respondeu, tentando manter-se calma sobre o que Roy havia dito sobre seu pai.
- E acha que ele vai te ouvir? Eu sou filho único, Anne, e por isso, meu pai me ama incondicionalmente. Em quem você pensa que ele vai acreditar? Em mim ou em você? - Anne ponderou aquela pergunta por um instante, e realmente sabia qual era a resposta para aquela pergunta. Sendo Roy filho único, ele deveria ser adorado por toda família, e obviamente, os pais confiavam cegamente nele.
- Mesmo assim posso muito bem tentar fazê-lo me ouvir. - ela respondeu ríspida.
- Você pode tentar, mas, não vai conseguir. Sabe por que? Porque eu posso inventar qualquer história a seu respeito, e fazê-la engolir todo esses orgulho que carrega no peito, e te fazer perder a bolsa de estudos que tanto lutou para conseguir.
- Você não faria isso! - Anne disse chocada.
- Quer pagar para ver? - Anne sabia que o que ele dizia era verdade. Ela poderia perder a bolsa por denunciar o jovem rapaz por assédio, e não estava disposta a abrir mão da coisa mais importante de sua vida, depois de Gilbert e Milk. Por isso, ela engoliu a raiva que estava sentindo por Roy colocá-la naquela situação tão desagradável, e se sentou novamente para dar monitoria a Roy. Felizmente, ele não dissera nada mais desagradável e ela pode cumprir seu papel de monitora com eficiência. Quando terminaram, ele disse rindo daquele seu jeito detestável:
- Nos vemos na próxima semana, ruivinha. - ela o viu partir sentindo ganas de matá-lo com suas próprias mãos. Depois, ela tentou se acalmar respirando fundo e dizendo a si mesma que encontraria uma saída para aquele problema. Assim, ela foi para casa pensativa, mal notando as pessoas que passavam por ela na rua, pois seus pensamento estavam por demais perturbados. Ela chegou em casa, depois de ter pego Milk no apartamento de Cole, e se sentou no sofá desanimada tentando descobrir como foi que se metera naquela confusão.
GILBERT
Após se despedir de Anne na porta da faculdade, Gilbert seguiu para a biblioteca. Como não a teria como companhia para o almoço, ele não via sentido em ir para casa, preferindo comer algo por ali mesmo, e adiantar o trabalho de pesquisa para o próximo projeto no qual estava envolvido. Logo que entrou, a funcionária que trabalhava na recepção lhe sorriu, cumprimentando-o entusiasticamente, e o rapaz apenas retribuiu o cumprimento ignorando o jeito que ela olhava para ele, Gilbert a conhecia das outras vezes que estivera ali, e sempre a tratara bem, mas, a garota parecia fazer questão de deixar evidente seu interesse enquanto ele não tinha nenhum.
Como poderia? Tinha a mulher mais linda do mundo ao seu lado, o que tornava total perda de tempo quere chamar-lhe a atenção, porque seus olhos e seus pensamentos sempre procuravam por Anne, mesmo que ela estivesse em qualquer outro lugar que não fosse o seu campo de visão. Era óbvio que ele percebia os olhares, mas nunca lhe interessava prestar atenção uma segunda vez, a única coisa que tinha em mente era terminar a faculdade, casar-se com Anne e formar com ela a família que tinham planejado. O que Gilbert achava desagradável era que as garotas da Faculdade eram tão atiradas e insistentes, que mesmo quando ele deixava claro que era noivo, e não estava à procura de uma aventura por uma noite, elas não desistiam. Na verdade o interesse delas até parecia aumentar, pensando que ele apenas estava fazendo jogo duro e que cederia se elas continuassem com suas insinuações nem um pouco sutis. Por educação, ele nunca as tratava com menos respeito do que mereciam, mas ficava facilmente entediado com suas conversas vazias, pois depois de conviver todos os dias com uma garota que tinha o cérebro mais primoroso que já tinha conhecido, ficava muito difícil se contentar com excelência menor.
Seus amigos zombavam dele, não acreditando que Gilbert não se sentisse tentado a aceitar os convites que choviam em sua direção e sempre faziam comentários como:
- Não é possível, Blythe, que você tenha dispensado um mulherão daqueles.
- Está interessado? Corre atrás então. - Gilbert dizia sorrindo.
- Eu não acredito que você não tenha nenhuma curiosidade em saber como uma garota daquelas é na intimidade.
- Eu não preciso disso, eu já tenho minha garota,- ele respondia com os olhos grudados nos livros.
-Tão jovem e já desperdiçando a vida desse jeito.
- Você não falaria assim se conhecesse a garota dele.- Patrick vinha em seu socorro.
- Sim ela não é uma garota qualquer, ela é a garota. Entendeu? - Carlos ajudava Patrick na defesa de Gilbert, que sempre balançava a cabeça em agradecimento, sabendo que Anne tinha ganho um fã clube de peso entre seus amigos de medicina.
Gilbert foi até a prateleira onde havia os livros que precisava para a pesquisa, e depois se sentou de frente para a janela que dava para o pátio da faculdade que agora estava quase vazio, pois a maioria dos alunos já tinham ido para casa. A segunda-feira tinha amanhecido agradável, assim como tinha sido o domingo, e suspirando, Gilbert esqueceu momentaneamente os livros abertos sobre a mesa onde estava estudando, e deixou que seu pensamento o levasse de volta ao dia anterior quando ele e Anne tinham ido passar no Broklin Bridge Park.
Ele tinha escolhido aquele lugar para levá-la pois sabia da imensa conexão que Anne tinha com a natureza, e de todos os lugares de Nova Iorque que Gilbert havia visitado aquele era sem dúvida o que mais o lembrava Green Gables, No caminho até o parque, ele ficara observando-a disfarçadamente enquanto fingia prestar atenção na estrada, e percebeu o olhar dela sobre ele , o que o fez imaginar o que se passava na cabeça dela, porque às vezes ela parecia sorrir para si mesma sem deixar que seus olhos abandonassem o rosto dele. Caramba! Ela era linda! ele repetia isso todos os dias de manhã quando acordavam juntos, totalmente subjugado por aquela face rosada, boca vermelha e nariz arrebitado, e naquele instante, era parecia tão irresistível que ele quase parou o carro para olhá-la melhor. Então, a pergunta veio muito mais como uma brincadeira insinuante do que propriamente uma provocação:
-Posso saber, por que a Sra. Blythe me olha como se eu fosse sua sobremesa favorita? – a resposta veio mais surpreendente que a pergunta:
- Talvez porque você realmente seja minha sobremesa favorita. – ele ofegou sem querer ao ouvir as palavras dela, sentindo o coração se acelerar, que o fez dizer:
- Você é minha sobremesa favorita também, principalmente quando está enfeitada com aquela sua lingerie rosa rendada. – ele esperou pela resposta dela, porém, ela parou um instante como se procurasse o que dizer, e então ela respondeu:
- Você sabe que rosa nunca foi minha cor favorita. Sempre pensei que a cor preta me favorecia mais.
-Isso é por que você não se enxerga com os meus olhos, amor. Embora, devo confessar que qualquer cor que você use sobre essa pele perfeita me deixa louco do mesmo jeito. – ele dissera aquilo quase sem pensar, mas, percebeu imediatamente o efeito de suas palavras nela, pois o rosado do rosto se tornou mais intenso, e os olhos azuis ficaram maiores. Mas, logo, ela mudou de conversa, porque o clima dentro do carro já tinha mudado para algo mais.
Logo chegaram ao Broklin Bridge Park e Gilbert viu com prazer os olhos de Anne se arregalarem com a beleza do lugar que exploraram por muito tempo, se divertindo como nunca, pois fazia um bom tempo que não tinham momentos assim de puro lazer e relaxamento. Ele estava feliz, Anne estava feliz, e juntos estavam novamente em completa harmonia com seus corações e sentimentos. De repente, Anne sorriu e Gilbert se deu conta do quanto amava o sorriso dela, principalmente depois de meses sem ver aquela expressão genuína no rosto dela de pura alegria. Era algo tão lindo de se ver como se estrelas e sol se reunissem, e provocassem naquele rosto delicado um brilho incomum. Ela lhe lembrava a Anne do seu início de namoro que encarava cada nova experiência como uma grande aventura, e mergulhava de cabeça sem realmente preocupar até onde aquilo levaria. Como ele sentira falta dela! E somente agora compreendia que ela estivera todo o tempo lá, adormecida na alma dela, esperando apenas um incentivo para se revelar. E agora, como uma borboleta composta de muitas cores, ela voava pela luz de sua imaginação e ganhava cada vez mais sonhos pelos quais transitaria até atingir o ponto máximo de sua perfeita realização. E mais uma vez, Gilbert teve certeza de que não havia mulher como aquela em todo o mundo. Sua Anne era realmente extraordinária.
Horas depois dentro do carro, no qual decidiram descansar, ela lhe acariciara o rosto e dissera baixinho.
- Amor – Gilbert olhou para o rosto dela onde havia uma expressão difícil de decifrar e perguntara:
-O que é isso? Quer que eu soletre essa palavra agora?
- Não. Eu apenas estava tentando imaginar o que essa palavra significa para você. - ela dissera, e ele de novo perguntou:
- Você quer que eu diga o que o amor significa para mim, mesmo eu demonstrando isso para você todos os dias? – ela concordou com o que ele dissera, e ele pensou no que dizer já que as palavras tinha um peso enorme para Anne. Então a resposta viera em sua mente tão clara quanto um cristal:
- Bem, o amor para mim só tem um significado.
- E qual é? - ela quis saber.
- Você.
- Eu? - Anne parecia tentar encontrar uma ligação entre ela e a palavra amor, sem conseguir enxergar que aquilo era tão óbvio para qualquer um que observasse os dois.
- Sim, tudo o que o amor significa para mim está relacionado à você. No jeito em que nos abraçamos, nos beijamos, no seu sorriso para mim quando acorda, nesse momento, como você toca meu rosto, na maneira como confia em mim para me contar os seus pensamentos mais profundos, em tudo o que partilhamos juntos. É isso o que o amor* significa para mim. – ela ficou em silêncio pensando no que ele dissera, com seu olhos brilhando risonhos. Após esse momento, ela perguntou:
- Você não vai me perguntar o que o amor significa para mim? – e a resposta dele foi:
- Eu não preciso, posso vê-lo em seus olhos. – o beijo viera depois dessa declaração que fizeram os olhos azuis de Anne faiscarem de felicidade, fazendo Gilbert se sentir exultante por ser ele a provocar aquela emoção incrível nela.
Eles ainda se divertiram por muito tempo no Broklin Bridge, e quando finalmente foram para casa. Gilbert soube que ainda iria repetir muitos momentos como aquele junto a Anne.
Naquele instante, o olhar de Gilbert foi atraído pela figura de Dora caminhando no pátio, e seu estômago se contraiu de tensão, esperando que ela não o encontrasse ali na biblioteca. Eles ainda faziam parte do mesmo grupo de pesquisa, mas, Gilbert a vinha evitando nos últimos dias, depois da briga que ele tivera com Anne, e na maneira como ela jogara coisas na cara dele, mostrando o quanto estava magoada com as atitudes dele em relação à sua amiga. Ele não fizera aquilo por mal. Dora sempre estivera ao lado dele nos momentos em que ele se sentia tão perdido dentro do seu relacionamento com Anne, não sabendo como lidar com a situação que a afastava cada vez mais dele, amando-a cada vez mais em meio ao seu desespero, porém, não sabendo que direção tomar para trazê-la de volta para sua vida, e Dora lhe dera conselhos valiosos, segurara sua mão, não o deixara desistir. E em meio aquilo tudo, ele jamais notara qualquer interesse maior por parte dela do que aquela relação que tinham de amizade. Gilbert jamais nutrira nenhum outro tipo de sentimento por Dora. Sempre olhara para ela com olhos de amigo. Não que ele não a achasse atraente como mulher, e que fosse cego aos encantos dela. Dora era uma mulher interessante, bastante inteligente, culta, viajada, e eloquente. Ela também sabia ser divertida, além daquela seriedade toda que ela demonstrava na sala de aula da faculdade, assim como Gilbert, era bastante dedicada aos seus estudos, e com certeza teria um futuro brilhante. Mas, Gilbert não sentia a menor atração por ela e por qualquer outra mulher, pois seu coração já tinha sido conquistado a muito tempo, e se Dora desenvolvera qualquer sentimento romântico por ele como Anne veementemente afirmara, ela deveria procurar esquecê-lo, pois não havia nada ali para ela.
Embora, Anne dissera que não queria que ele se afastasse de Dora, Gilbert achara por bem fazê-lo, pensando na generosidade de Anne quanto a isso. Se fosse ele no lugar dela, com certeza não seria tão benevolente assim. Ele se conhecia bem, e sua possessividade em relação a ela podia estar controlada agora, mas, isso não queria dizer que não existia. Contudo, Gilbert não queria passar a ideia para Dora de que era mau agradecido e que não tinha consideração pela história de amizade que construíram, porém, ver Anne sofrendo por isso o destruíra por dentro, nunca mais queria vê-la chorando por algo que ele tinha feito. Ele a magoara sem intenção, e isso era pior do que quando se tinha consciência do que se estava fazendo. Anne não merecia aquilo, e Gilbert prometera que a protegeria de tudo, e que a faria feliz, que teriam uma vida diferente ali em Nova Iorque, e se para isso ele tivesse que fazer alguns sacrifícios ele os faria sem hesitar.
- Oi, Gilbert. - o sangue dele gelou ao ouvir a voz de Dora, e ele demorou um instante para se virar para ela, pois estava tentando encontra o que dizer, e quando o fez sua voz soou mais seca do que pretendia.
- Olá, Dora.
- Por que não me avisou que vinha para a biblioteca começar a pesquisa? - ela parecia chateada, e Gilbert sentiu uma pontada de remorso tocar seu coração.
- Eu decidi de última hora, e pensei que você já tinha ido para casa. - era uma desculpa ruim, mas teria que servir.
- Posso te fazer uma pergunta? - ela disse se sentando de frente para ele.
- Claro-. Gilbert respondeu, fingindo estar interessado em anotar algo do livro no qual estava pesquisando
- Por que tem me evitado? - Gilbert levantou o olhar para ela, e viu a expressão magoada no rosto dela ao lhe perguntar aquilo.
- Eu não tenho te evitado. - ele mentiu, mas, Dora não acreditou.
-É claro que está. Eu não sou idiota, Gilbert. Você quase não fala comigo, e agora, que Anne está estudando aqui, nos intervalos, você passa todo o tempo com ela e sequer troca meia dúzia de palavras comigo. O que foi que te fiz?
- Dora, você não fez nada de errado, mas, você tem que entender que sua relação com a Anne não é das melhores, e eu estou tentando evitar atritos entre você duas. - ele tentou explicar.
- E isso inclui me evitar? - ela disse com a voz irritada.
- Eu não quero que fique magoada comigo, mas, acho melhor ficarmos um pouco afastados um do outro. - ele disse com um suspiro.
- Foi a Anne que te pediu isso? Foi ela, não é? Anne não quer que você seja mais meu amigo.
- Não, pelo contrário. Fui eu mesmo que decidi isso. Anne não tem nada a ver com o que está acontecendo. - Gilbert sabia que a estava magoando, e se sentia péssimo por isso, porém, não havia outra maneira de fazê-la entender o quanto tudo aquilo era complicado para ele.
- Quer dizer que prefere acabar com nossa amizade a magoar sua querida Anne? - a maneira como Dora disse aquilo irritou Gilbert de um jeito que lhe deu uma resposta imediata, sem medir exatamente o que estava dizendo.
- Dora, Anne é minha mulher, e eu a amo, e se eu tiver que escolher entre qualquer coisa e ela, minha escolha sempre será ela. - Dora o olhou chocada, e por um segundo, Gilbert pensou que ela fosse chorar. Contudo, ela logo se dominou e disse com a voz abafada.
- Acho que estou sendo demais aqui, Desculpe-me por perturbá-lo, Vou deixar que termine sua pesquisa e quando tiver as informações que precisamos para o projeto, me diga, que escrevo os relatórios. - ela se levantou apressadamente, ajeitando seu casaco e segurando firmemente os livros que tinha na mão.
- Está bem. – Gilbert respondeu, vendo-a se despedir com um aceno de cabeça e marchar para a saída da biblioteca. O jovem estudante se sentiu triste, não queria que aquela situação tivesse chegado aquele ponto, porém, como dissera a Dora, Anne vinha em primeiro lugar sempre, Ele quase a perdera meses atrás quando ainda estava com amnésia, e ela decidira ir tentar a vida na França, e nunca mais deixaria que isso acontecesse. Anne era como um membro de seu corpo, e machucá-la era como se automutilasse, portanto, nada e ninguém era mais importante que sua relação com ela.
Suspirando, ele voltou a sua pesquisa, e uma hora depois foi para o laboratório. Teria uma tarde inteira de trabalho intenso, e agradecia por isso, pois dessa forma, evitaria de pensar o quanto aquela conversa com Dora o perturbara. Porém, ela se metera em um campo perigoso quando falara de Anne como se a menosprezasse, e Gilbert jamais deixaria alguém falar dessa maneira de sua noiva. Ele esperava que ela entendesse que tinha passado de todos os limites, e que ele não lhe pediria desculpas dessa vez.
ANNE E GILBERT
Anne olhava para a receita à sua frente com a testa franzida. Não era nada complicado, porém, era a primeira vez que fazia aquele tipo de comida sozinha e estava um tanto insegura, mas mesmo assim, ela resolvera tentar.
Cole tinha convidado a ela e Gilbert para jantarem com ele e Pierre aquela noite, e embora o amigo não tivesse lhe pedido que levasse qualquer coisa, ela resolvera dar sua contribuição, além do que dava-lhe algo mais que pensar do que aquela ameaça explícita na voz de Roy. Ainda não conseguia acreditar que estava nas mãos daquele cara repugnante. Ela tinha que achar uma saída, e logo, porque não era justo que perdesse sua bolsa por conta de um capricho daquele rapaz que resolver pegar no seu pé de maneira absurda. Ela pensara que ele a tinha esquecido, mas, pelo jeito ele estava apenas esperando o momento certo para abordá-la novamente. Ele era um cafajeste da pior espécie, e ela lamentava imensamente um dia tê-lo conhecido.
Anne passou a mão pela testa como se com esse gesto pudesse mudar o rumo de seus pensamentos. Estavam no começo da semana e ela já se sentia exausta por conta da tensão que passara aquele dia, ela olhou para a receita novamente e acrescentou os ingredientes que faltavam na panela que estava sobre o fogão, e concentrou toda a sua atenção na comida que preparava.
De repente, a porta se abriu, revelando um Gilbert todo sorridente, e Anne lhe sorriu de volta tentando esconder sua preocupação. Não queria que ele soubesse por enquanto o que estava acontecendo, por que se bem o conhecia ele iria tirar satisfações com o Roy, piorando a situação toda, por isso, Anne preferia evitar aquele confronto que somente lhe traria dores de cabeça
- Olá, quer ida. Que cheiro maravilhoso é esse? - ele disse se aproximando de Anne e admirando o aroma da comida que ela preparava.
- Fettuccine de frango e queijo. - Anne respondeu.
- É aquela receita da Marilla? - Gilbert perguntou apontando para a panela.
- Sim. Resolvi testar minhas habilidades na cozinha com esta receita. - ela disse mexendo com uma colher de pau o conteúdo da panela.
- E por que decidiu fazer essa comida maravilhosa especificamente hoje? - Gilbert perguntou-lhe sorrindo como se esperasse uma grande revelação.
- Bem, Cole nos convidou para jantamos na casa dele hoje, e pensei em levar esse fettuccine para comermos juntos. O que acha? - Anne perguntou com um olhar de dúvida, não sabendo se aquela tinha sido mesmo uma boa escolha.
- O que eu acho é que minha mulher é a melhor cozinheira do mundo. E qualquer coisa preparada por essas mãos de fada ficará maravilhosa. - ele disse beijando-a na testa.
- Espero que esteja certo. É a primeira vez que preparo essa receita sozinha. - Anne disse sentindo-se em dúvida quanto ao sucesso da receita.
- Diga-me uma coisa que você faz que não seja bem-feita ou que você não tenha facilidade para realiza-la? - Gilbert perguntou segurando o queixo dela.
- Geometria. Você lembra que sou péssima nisso? - Anne respondeu sem hesitar.
- Isso é apenas um detalhe, querida. Todo o resto você executa com perfeição. – Gilbert disse olhando-a de um jeito que fazia Anne acreditar que realmente era capaz de fazer qualquer coisa. A confiança que ele tinha nela a emocionava ao mesmo tempo em que batia o medo de falhar. Mas, dentro de seu coração ela sabia que Gilbert estaria sempre ao lado dela em todas as situações, assim como ela estaria por ele onde e quando ele precisasse. Ela se lembrou de Roy Gardner, e deu um suspiro profundo que chamou a atenção de Gilbert.
- O que foi, Anne? Parece preocupada. - ela pensou em disfarçar seu mal-estar com a lembrança daquele rapaz idiota, mas não enganaria Gilbert facilmente. Ele parecia ter um radar para detectar quando havia algum problema com ela, e realmente ela não queria ficar escondendo coisas dele demais.
- Não é nada muito importante. É apenas um rapaz que está me dando trabalho na monitoria. - ela respondeu amenizando a história toda. Não podia dizer que ele a assediara algumas vezes, e que agora estava forçando-a dar-lhe aulas extras, pois assim como ela poderia perder sua bolsa, Gilbert podia perder a dele também, e ela não se perdoaria se isso acontecesse. Gilbert ia ficar furioso e ia querer tirar satisfações, e sabe se lá o que poderia ocorrer. Não, era melhor ela mesma encontrar uma maneira de lidar com aquilo sem grandes estragos pelo caminho. Embora, não soubesse o que esperar de Roy Gardner.
- Ele está sendo inconveniente? - Gilbert perguntou sério.
- Mais ou menos. - Anne disse com cuidado.
- Quer que eu fale com ele? - Anne viu aquele brilho no olhar de Gilbert que indicava que a raiva começava a arder dentro dele, e ela se arrependeu de ter deixado parte de seu problema ser revelado.
- Não precisa amor. Eu acho que posso lidar com isso. – ela disse tentando encerrar o assunto.
- Você sabe que pode contar comigo para o que precisar, não é?
- Eu sei. - Anne disse olhando-o agradecida.
- Me avise se as coisas saírem de controle. - Gilbert disse beijando-a no rosto, e Anne assentiu.
- Deixe-me terminar de fazer essa receita ou não poderei garantir que o sabor será agradável. - Anne disse tocando o rosto de Gilbert com carinho.
- Quer ajuda para alguma coisa? - Gilbert disse prestativo.
- Não. Eu dou conta sozinha. – Anne respondeu sorrindo.
Assim, enquanto Anne terminava de preparar a comida que levariam para o apartamento de Cole, Gilbert aproveitou para revisar suas anotações da pesquisa, mas, nem por um momento ele deixou de observar Anne. Ela estava tensa, Gilbert podia sentir, e ele tinha certeza quase absoluta que tinha a ver com o rapaz que ela mencionara. O jovem estudante conhecia Anne tão bem que sabia quando ela não estava sendo sincera. E se ela estava agindo assim, era porque a situação era mais séria do que ela fizera parecer. Seu instinto protetor renasceu dentro dele como acontecia sempre que ele pressentia que havia alguma coisa que colocava Anne em risco. Ninguém precisava lhe dizer. Era algo que vinha de suas entranhas, tão natural como acontecera quando ele a salvara a primeira vez na floresta. E naquele exato momento, ele sentia aquela mesma sensação, e por isso, ele decidiu que ia descobrir por si mesmo quem era o cara que estava deixando sua mulher nervosa, e conversaria pessoalmente com essa pessoa. De jeito nenhum, Gilbert permitiria que Anne fosse magoada ou submetida a algum tipo de humilhação. Ela já tivera aquilo demais em sua vida, e Gilbert estava ali para garantir que aquilo nunca mais aconteceria.
O jantar fora combinado às oito da noite, por esta razão, Anne e Gilbert saíram de casa às sete e meia, pois a ruivinha insistira que eles fossem caminhando. A noite estava agradável, não havia nenhum sinal de nevasca, e era a primeira vez em semanas que havia uma lua e estrelas no céu e Anne estava encantada.
- Vamos, Gilbert. Olha que noite maravilhosa. - ela olhava para cima, seus olhos refletindo o mesmo brilho das estrelas.
- Tem certeza que quer mesmo ir a pé? Agora temos um carro, e não precisamos caminhar essa distância toda. - ele disse segurando o braço dela com delicadeza.
- Eu não perderia isso por nada. Você não acha essa lua gloriosa? - ela perguntou com seus olhos ainda perdidos na lua cheia que tomava conta do céu inteiro.
- O que eu acho é que existe algo ainda mais gloriosos essa noite. - Anne virou a cabeça para Gilbert a tempo de ver aquela luz que iluminava o castanho dos olhos dele, e por um momento ficou hipnotizada, sabendo exatamente que ele falava dela. Logo, ela desceu das nuvens para onde tinha sido transportada e disse:
- Acho melhor apressarmos o passo ou a comida vai esfriar. - Gilbert apenas riu, compreendendo imediatamente que ela tinha ficado encabulada com seu elogio.
Eles chegaram no apartamento de Cole em meio as risadas de Anne que não parava de gargalhar sobre as histórias que Gilbert estava contando sobre Carlos e Patrick. Aqueles amigos de Gilbert, mesmo sendo uns verdadeiros galinhas, eram muito queridos por Anne, Eles sempre a trataram com respeito e mostravam clareamento o afeto deles por ela e também a amizade que nutriam por Gilbert.
Cole os atendeu junto com Pierre que parecia cada vez mais à vontade com os amigos de seu companheiro, especialmente agora que seu inglês estava melhorando aos poucos.
- Boa noite, minha querida. - Cole disse, beijando-a no rosto.
- Boa noite, Cole. - Anne retribuiu-lhe o carinho, cumprimentando Pierre em seguida, assim como ele e Cole cumprimentaram Gilbert.
- Eu trouxe um prato para contribuir com nosso jantar. - Anne disse alegre, entregando o prato a Cole que quando viu o que Anne preparara, disse espantado.
-É o fettuccine da Marilla?
- Sim. Só não garanto que o sabor é o mesmo. - Anne o alertou.
- Não seja modesta, querida. Somente pelo cheiro, posso ver que ficou divino.
- Eu disse a ela, mas, Anne não acreditou. - Gilbert comentou, sorrindo somente para ela.
- Você não conta, amor. A comida pode ter ficado horrível, e você ainda vai dizer que ficou uma delícia. – Anne o repreendeu com carinho.
- Muito bem. Então, vamos experimentar essa delícia. - Cole disse sorridente.
Eles se sentaram à mesa e Cole além do fettuccine, serviu strogonoff de carne com creme de leite, batatas gratinadas e para beber vinho branco. Anne não estava acostumada a beber, por isso evitou o álcool o quanto pôde. Depois do jantar onde o prato que Anne trouxera fez o maior sucesso, Pierre desafiou Gilbert para uma partida de xadrez, enquanto Anne e Cole ficavam na sofá- conversando.
- E então, como está tudo entre vocês dois? - ele disse em voz baixa para que nem Gilbert ou Pierre escutassem o que estavam conversando.
- Estamos bem. Gilbert e eu conversamos sobre Dora, e ele compreendeu que o relacionamento de amizade entre os dois estava me incomodando. Eu deixei claro que não desconfio dele, mas, pedi que tomasse cuidado com Dora. Ele insiste que estou enganada a respeito dela, e que ela o vê apenas como amigo, Contudo, ele tem cumprido o que me prometeu e tem se mantido longe dela. - Anne explicou sem tirar os olhos do noivo que parecia estar apreciando jogar com Pierre que era igualmente habilidoso no xadrez.
- Gilbert sempre teve esse coração enorme. Ele sempre se mostrou disposto a ajudar todo mundo, e isso não mudou com a maturidade, e por isso, raposas como Dora conseguem facilmente se aproveitar dessa bondade dele em benefício próprio. - Cole disse se servindo de mais uma taça de vinho.
- Sim. Gilbert é uma pessoa incrível. Por um lado, eu tenho o maior orgulho dele de ter esse caráter íntegro e capaz de acreditar na bondade do ser humano, por outro, isso me preocupa, pois garotas como Dora podem usar de golpe baixo para convencê-lo a fazer algo que não queira. - Anne disse com seu rosto apreensivo.
- Gilbert não é um garotinho, Anne. Ela sabe bem distinguir o que é certo ou errado para si mesmo.
- Eu sei. Não estou dizendo que ele seja ingênuo. Apenas acredita demais nas pessoas erradas. - Anne disse suspirando.
- Você crê que Dora possa tentar fazer alguma coisa para estragar o seu relacionamento com o Gilbert?
- Quem pode saber? Uma mulher apaixonada é capaz de tudo para ter o homem que ama a seu lado. - Anne disse.
- Não acho que Gilbert te trocaria por qualquer outra garota. Ele realmente te ama, Anne.
- Eu sei. Não duvido disso. Apenas tenho medo que aconteça alguma coisa que nos separe. Eu não suportaria passar por todos o sofrimento de meses atrás'. - Anne disse, sentindo-se estremecer com as lembranças desagradáveis.
- Não acho que isso tenha alguma chance de isso acontecer. - o amigo disse inclinando seu corpo totalmente relaxado sobre o encosto do sofá.
- Espero que você esteja certo, Cole. Eu não posso perdê-lo. Gilbert é tudo o que dá sentido à minha vida. Sem ele, não sei se consigo continuar. - ela baixou a cabeça, pois estava ficando emotiva. Cole colocou sua mão sobre a dela para dar-lhe apoio enquanto dizia:
- Fique tranquila, meu amor. Esse rapaz te venera. Ele jamais te abandonaria por qualquer outra garota. - Anne apenas balançou a cabeça. Pensar que Gilbert poderia deixá-la por qualquer mal-entendido a deixava desesperada, e por mais que tivesse certeza do amor dele por ela, aquele pensamento nunca abandonava totalmente.
Notando a tristeza da amiga, Cole logo mudou a conversa para assuntos mais amenos, e logo Anne se viu rindo com a mesma leveza que vinha do amigo. Após duas partidas empatadas, Gilbert e Pierre encerram o jogo, assim, ele e Anne resolveram ir para casa, pois teriam que ir para a faculdade no dia seguinte, porém, eles combinaram com Cole e Pierre em repetirem o programa um outro dia.
Novamente, eles foram caminhando para casa enquanto conversavam sobre a noite agradável que tiveram. De repente, um trovão ao longe se fez ouvir, e Gilbert olhou para Anne dizendo;
- Não acredito que vai começar a chover. - no mesmo instante uma chuva fina começou a cair, e Gilbert puxou Anne para o abrigo embaixo do toldo de uma loja, e ficaram abraçados vendo a chuva aumentar cada vez mais. Depois de vinte minutos, sem qualquer sinal de que a chuva diminuiria, Anne puxou Gilbert pela mão e disse:
- Vamos, Gilbert. Não estamos tão longe de casa. - o rapaz olhou para ela espantado e respondeu:
- Você está dizendo que quer ir para casa no meio dessa chuva?
- Por que não? Você por acaso é feito de açúcar, Gilbert Blythe? Eu garanto que não vai derreter ao se molhar um pouquinho. - Anne disse para provocá-lo enquanto começava a caminhar em direção ao apartamento.
- Anne! - Gilbert gritou, mas logo percebeu que ela não lhe daria ouvidos, e irremediavelmente começou a segui-la como sempre tinha feito desde que a conheceu. Anne poderia ir aonde quisesse e Gilbert estaria lá logo atrás dela. Ele apressou o passo, e em segundos caminhavam lado a lado e ficavam ensopados igualmente. Gilbert se aproximou um pouco mais e segurou a mão dela, Anne o olhou de lado e eles sorriram um para o outro. Ela então, começou a gargalhar, sem um motivo aparente. Ela apenas se sentia leve e livre como nos primeiros tempos em Avonlea onde ela adorava caminhar na chuva daquela maneira sentindo-se uma garotinha feliz outra vez. Gilbert capturou aquele momento com seus olhos apaixonados, que olhavam par ela embebecidos com tanta beleza. Ela estava toda molhada, os cabelos bagunçados, gotas de chuva escorrendo por seu rosto, e ainda assim, ela estava mais linda do que nunca, tão fresca e tão irresistível que ele teve que puxá-la para um beijo, e no meio daquele temporal que caía sobre eles como uma cascata abençoada vindo dos céus, eles se abraçaram com tanta força que parecia que nada poderia separá-los nunca mais, e dessa maneira foram caminhando para casa, trocando beijos pelo caminho, enquanto subiam as escadas que levavam ao apartamento, e quando abriram a porta com Anne agarrada ao pescoço de Gilbert, ele a levou para o quarto, ajudando-a a tirar as roupas molhadas, e empurrando-a em direção ao banheiro enquanto dizia:
- Nós precisamos de um banho quente. - mas, Anne o interrompeu, puxando-o em direção a cama, ajudando-o despir as próprias roupas, e disse em um sussurrou no ouvido dele:
- Você me aquece muito mais que um banho quente. - e quando o corpo dele cobriu o dela, Gilbert soube exatamente o que ela queria dizer. A pele de Anne fervia contra a sua, e a friagem da chuva tinha ido embora no momento em que ambos colaram seus corpos. Em seguida, Anne deslizou suas mãos pelo corpo inteiro dele chegando a lugares que fez Gilbert arfar. Ele jogou a cabeça para trás, e ela mordiscou o pescoço masculino, fazendo o corpo dele entrar em um colapso trêmulo e e cheio de desejo.
- Quer que eu soletre alguma palavra agora? - Anne disse com um olhar cheio de fogo, seus belos olhos faiscando como dois sóis azuis.
- Duvido que você consiga soletrar a maneira como eu te quero. - ele disse ofegante.
- E como você me quer? - Anne perguntou, torturando-o com a ponta da língua.
- Será que ainda não percebeu? - Gilbert respondeu fechando os olhos novamente quando sentiu os lábios dela em seu abdômen indo em direção à sua intimidade.
- Desejo que me diga como me quer. - Anne disse provocante, sem parar um minuto de tocá-lo. Gilbert suspirou antes de responder, pois o jeito com que ela o estava tocando naquele momento o fazia suar frio. Com a voz ofegante, ele disse:
- Eu quero você inteira. Cada parte de seu corpo colado ao meu, o gosto da sua pele em meus lábios, o toque de suas mãos em mim, e seus olhos incríveis presos nos meus enquanto te faço minha. Eu quero fundir meu corpo no seu, e te mostrar o quanto senti-la entregue ao nosso momento de amor me deixa cada vez mais louco por você. – não houve mais oportunidades para palavras, pois seus suspiros e gemidos tornavam impossível dizer qualquer coisa. Tudo o que podiam fazer era sentir aquela urgência que tomava conta de ambos, aquela necessidade que tinham de sentir cada pedacinho de pele em seus dedos, a excitação crescendo em seu íntimo, levando-os a uma sensação crescente que ameaçava explodir a todo momento. Cada vez que Gilbert a tocava, Anne se sentia mais mulher, libertando suas vontades e desejos, sentindo-se tão quente como se o próprio sol a aquecesse a cem graus centígrados. E ela arrastou Gilbert com ela no passo a passo daquela dança de amor, suas bocas coladas como se saboreassem mutuamente, seus sentidos aguçados, seus movimentos sincronizados, e quando Anne o puxou em sua direção com as pernas em volta de sua cintura, Gilbert se sentiu quase explodindo na chama daquela mulher fenomenal, que estimulava sua loucura por ela a um ponto em que ele não conseguia mais raciocinar, e assim ele uniu seus corpos enquanto lá fora a o som da chuva que caía parecia um afrodisíaco a mais, embalando a ambos nos braços ardentes de um arrebatamento que ia além da necessidade física de se entregarem um ao outro. E quando o prazer veio, fazendo seu corpos tremerem juntos em um único segundo, Anne se agarrou mais a Gilbert, deixando que o corpo dele conduzisse o seu até o momento final no qual ela se derreteu cheia de amor por ele.
Alguns minutos se passaram até que se olharam novamente sem dizer uma palavra, pois seus olhos contavam tudo o que havia em seus corações. A história que relatavam, os poemas que declaravam, o sentimento único que os deixava rendidos um ao outro eram partilhados assim naquele momento em que Anne sentia Gilbert acariciar os seus cabelos, enquanto ela tocava o rosto do homem que lhe dera mais uma noite intensa como tantas outras que teriam dali para frente, e suspirou ao perceber o quanto suas almas se reconheciam, seus corpos se encaixavam e seus corações estavam conectados na mesma batida.
Desta forma, ela fechou os olhos e mergulhou em um sono tranquilo, levando-a a um mundo dos sonhos onde um príncipe encantado que tinha os olhos mais castanhos que ela já vira na vida lhe prometia além de todas as estrelas, um arco-íris repleto de amor e paixão por uma vida inteira e mais ainda além dela.
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