Capítulo 77- Uma luz na escuridão.
Olá, queridos leitores.Estou postando mais um capítulo porque senti vontade de escrevê-lo hoje,, e confesso que ficou um pouco pesado, mas não menos emociante, pelo menos para mim. Todas as palavras escritas aqui foram baseadas em verdades que vivenciei, por isso, nada foi escrito aleatoriamente, ou inventado, apenas usei minha imaginação para colocar cada sentimento de acordo com os de Gilbert e Anne. Posso dizer que sou uma conhecedora de causa, pois minha irmã passou por uma perda de bebê como a Anne, então, pude ver de perto o que a dor e o sofrimento fizeram com ela. Eu sei que muitas de vocês que leem a minha história são muito jovens, e talvez compreender a carga emocional desse capítulo assim como de todos os outros não seja tão fácil, mas, espero que possam enxergar além de cada linha que escrevo. Nada que Anne e Gilbert sentem é banal. São levados pelas emoções de tudo o que viveram até aqui e o que faz parte da história de cada um. Eu sei que muitas vezes sou questionada por colocar em alguns capítulos o ciúme que um tem um pelo outro, e suas brigas serem sempre por falta de confiança, principalmente no que diz respeito a Anne. Mas, quem pensa assim, está enganado, pois realmente não entendeu que o ciúme de Anne é por baixa estima. por não acreditar que sendo ela órfã, e nem ter conhecido sua família, não é digna de ser amada por um rapaz que até outro dia era objeto de desejo de muitas garotas de Avonlea., e mesmo depois de Gilbert ter dito tantas vezes que a ama e provado com ações essa verdade, Anne ainda não consegue se enxergar da maneira como ele a vê. Ela sempre se esbarra em seus pensamentos depreciativos de si mesma, menosprezando sua inteligência e sua capacidade de fazer as pessoas amá-la por si mesma. Por isso, essa não é somente uma história de amor, mas também de vida, de superação, de luta, assim como é a vida de todos nós. Nunca quis escrever uma história fantasiosa, e sim uma que levasse às pessoas a questionarem seus valores e até mesmo seus traumas, e começarem a enxergá-los por outra perspectiva. Espero que realmente essa história esteja tocando seus corações como a série sempre nos toca com as situações tão reais que nos apresenta. Muito obrigada pela atenção, e espero que me mandem seu comentários para eu saber o que realmente acharam desse capítulo tão verdadeiro e cheio de emoções humanas. Desculpem-me por qualquer erro ortográfico. Beijos.
GILBERT
Não, ela não podia estar falando sério. Ele ouvira errado, só podia ser. Gilbert olhava para Anne, enquanto esses pensamentos cruzavam sua mente, e ao mesmo tempo em que ele tentava ler no rosto dela até onde ia a verdade daquilo que ela acabara de lhe dizer. Então, ele percebeu que ela esperava cheia de expectativas pela resposta dele, e Gilbert continuou calado sem saber ao certo quais palavras usar, pois temia magoá-la, ou pior traumatizá-la ainda mais.
- Ouviu o que eu disse? - Anne perguntou, e o sorriso que antes estava lá ao fazer aquela declaração bombástica tinha desaparecido, dando lugar a uma incerteza que deixou Gilbert agoniado, ele então respondeu:
- Ouvi sim.
- É não vai dizer nada? - ela parecia decepcionada e aquilo doeu em Gilbert por que detestava quando não correspondia a imagem que Anne tinha dele, mas naquele caso específico, não podia apoiá-la naquela ideia tão sem propósito.
- Anne, não acho que seja o momento para você pense em um filho.
- Por que não? Achei que era o que você queria também. – O rosto dela murchou ante a ideia de que Gilbert não concordava com ela.
- Eu quero, mas não agora. Eu acho que temos tempo para isso. – Os olhos azuis cheios de dor de Anne deixaram o coração de Gilbert pesaroso, mas estava agindo assim para protege-la, e mesmo odiando vê-la olhar para ele como se não o reconhecesse, ele iria se manter firme naquela posição.
- Por que não, Gilbert, o que mudou? Por que não quer mais ter um filho comigo? - Gilbert a abraçou, beijando-a repetidas vezes no rosto
- Nada mudou, Anne. Apenas acho que você tem coisas mais urgentes para pensar. Está desejando trabalhar fora, fazer faculdade, está participando de um clube de leitura. Onde um filho vai se encaixar nisso tudo, agora? - Os olhos dela marejaram, e Gilbert se sentiu como um destruidor de sonhos, mas, queria que ela pensasse com coerência e não se deixasse levar pela emoção. Além do mais, ele sabia onde tudo aquilo a levaria, e não suportaria vê-la no fundo do poço de novo. Ela acabara de se recuperar, e Gilbert conhecia bem a fragilidade dela. Anne não estava preparada para a pressão da espera todos os meses sem que tivesse o resultado que esperava. Ela estava se esquecendo de sua dificuldade para engravidar, e ela não suportaria a decepção e a ansiedade que tudo aquilo causaria à ela.
- Você não quer um filho nosso. – Ela disse chorosa, se afastando de Gilbert como se o toque dele naquele momento a incomodasse.
- Amor, quero apenas que pense um pouco mais. São coisas demais ao mesmo tempo.
- Eu sei que consigo. Eu dou conta. - ela insistiu.
- Você sabe que é impossível para qualquer ser humano coordenar tantas coisas assim.
- Você não confia em mim? Não acha que posso conciliar tudo? Eu sou ótima em organização. – Anne disse com os olhos brilhantes, e Gilbert percebeu que ela não queria ouvi-lo, e ele estava relutante em trazer aquele assunto à tona. Era doloroso demais tanto para ele quanto para ela, e por isso, ele tentou amenizar a mágoa dela dizendo.
- Anne, por que não falamos sobre isso amanhã? Está tarde e ambos estamos cansados. Vamos voltar para cama e depois conversamos sobre isso.
- Você está fugindo do assunto. – Ela disse com a voz magoada
- Eu não estou fugindo do assunto. Eu só acho que esse é um assunto sério demais para falarmos no meio da madrugada. - para seu alívio ela pareceu concordar, e permitiu que Gilbert a conduzisse até a cama, mas ao se deitar, não deixou que ele abraçasse, e Gilbert soube que arrumara mais um problema como o qual lidar. Ele ficou um bom tempo acordado, incapaz de dormi, apenas pensando sobre aquela vontade súbita de sua noiva de ter um filho.
Ele adoraria ter um filho com ela. Vinha sonhando com aquilo desde que começaram a namorar, mas não nas atuais circunstâncias. Era arriscado demais, e não deixaria que Anne se colocasse em uma posição que lhe trouxesse sofrimentos futuros, por mais que sua vontade de ser mãe fosse maior que qualquer outra coisa naquele momento.
No entanto, sua mente brincava com ele naquele instante fazendo Gilbert imaginar como seria ser pai de um bebê de Anne. Ela ficaria mais linda ainda grávida, disso ele tinha certeza. Podia facilmente imaginá-la sentada em uma cadeira de balanço, com suas mãos na barriga e falando calmante com o bebê em seu ventre enquanto descrevia o cenário ao seu redor com sua voz musicalmente modulada. A imaginação dele foi ainda mais longe, e a viu com um bebê nos braços, uma pequena miniatura dela mesma de cabelos ruivos e olhos azuis como o céu em um fim de tarde.
Gilbert balançou a cabeça, afastando as imagens de sua mente que o emocionavam mais do que deveriam. Ele passou as mãos pela própria face, e ficou surpreso por estarem molhadas. Eram sonhos lindos tantas vezes cultivados em um passado longínquo de seu coração. A vida tomara um outro rumo, e era no presente que devia focar sua mente, por mais difícil que a realidade se mostrasse à ele.
Ele se virou e olhou para Anne que estava completamente adormecida, e se perguntou o que se passava dentro da cabeça daquela corajosa e tão linda mulher que era sua noiva? Quais traumas despertaram nela seu instinto materno, e o que a fazia querer abraçar o mundo de uma só vez quando ainda mal conseguia equilibrar sua vida? O que ela quer ia provar e para quem? Por que ela não podia viver uma coisa de cada vez? Ela não estava no melhor momento para pensar em filhos. Seu controle emocional era bem precário para isso agora, e Gilbert não ia arriscar sua saúde mental por algo que podia ser discutido no futuro. Ela precisa de ajuda e logo, antes que as frustrações que ela carregava durante todo aquele tempo a fizessem afundar em um oceano tão escuro que Gilbert não conseguiria mais resgatá-la.
Um frio passou pela espinha de Gilbert ao pensar que podia perder Anne para si própria. Ele queria que ela fosse feliz, ele precisava que ela fosse feliz. Gilbert nunca se perdoaria se sua missão ao trazer Anne para Nova Iorque fracassasse.
Gilbert continuou olhando-a enquanto ela dormia pacificamente, seus olhos acariciando-a apaixonados por aquela beleza sem igual, tão delicada como uma flor do campo e tão profunda quanto as águas do Atlântico Ele poderia olhar assim para ela a noite inteira, e ainda encontraria coisas novas para admirar, e mesmo as sardas lhe pareciam tão únicas, porque faziam parte de Anne como se fossem uma marca especial de sua personalidade inigualável.
Ele chegou mais perto e colocou seu braço no ombro dela. Anne abriu os olhos e piscou várias vezes por causa de suas pálpebras pesadas de sono. Depois, manteve os olhos bem abertos fixando-os no rosto de Gilbert. O rapaz se aproximou mais, e beijou-lhe a testa. Anne não disse nada, e Gilbert temeu que ela rejeitasse sua aproximação, ao invés disso, ela encostou seu corpo no dele, colocando seu braço ao redor da cintura de Gilbert, e adormeceram assim como se consolassem mutuamente.
A manhã seguinte chegou cheia de expectativas, mas também pesada de responsabilidades e decisões a tomar. Gilbert se levantou sabendo que aquele dia não seria fácil, e que mesmo que suas intenções fossem as melhores possíveis, Anne não encararia as coisas dessa maneira.
Além de orgulhosa, sua ruivinha era teimosa e tendia a se rebelar quando desafiada. Ele se lembrava bem dessa característica dela nas competições de soletrar, e como ela se tornava obstinada quando queria demais alguma coisa, principalmente se estivesse competindo pelo primeiro lugar, mas aquilo não era um jogo, e não haveria prêmios de consolo ao perdedor, aquilo era a vida que estavam lutando para manter, não havia lados para escolher, e caminhos que levassem a um desfecho fácil, e nenhuma certeza de que o que estavam fazendo era o certo, eles podiam apenas contar que estavam dando o seu melhor e torcer para que os resultados que surgissem de suas atitudes fossem os melhores para ambos.
Como fazia todas as manhãs, Gilbert preparou o café naquele sábado, e o levou na cama para Anne. Queria fazer um pouco de companhia para ela antes de sair para o trabalho, pois ele não tinha aulas na faculdade, mas o laboratório continuava com suas funções no período da manhã, por isso, ele podia acordar um pouco mais tarde e descansar um pouco mais, porém, naquele dia específico ele acabou se levantando no mesmo horário que acordava todos os dias, pois estava ansioso sobre a conversa que teria com Anne adiada na noite anterior.
Ele foi até o quarto com a bandeja em mãos, contendo tudo o que ela amava comer, pensando em fazer-lhe uma surpresa, mas, ela já estava bem acordada e tinha o olhar perdido no teto, parecendo estar seriamente comprometida com seus próprios pensamentos.
- Bom dia, meu amor. Espero que goste do café da manhã que lhe preparei. - Gilbert disse fingindo animação, mas no fundo seu estômago se contraia de nervoso ao ver Anne tão calada. E se ela estivesse em meio de uma crise por culpa sua? Mas, então, para seu alívio, Anne olhou para ele e sorriu.
Não era um daqueles sorrisos dela iluminados que faria até o sol se encantar, mas ainda assim, era um sorriso que o faria se apaixonar por ela outra vez, por que era verdadeiro, sincero e porque vinha da mulher que ele amava demais.
- Estamos comemorando algo especial? - ela perguntou se sentando na cama e olhando com curiosidade para a bandeja que Gilbert trazia nas mãos.
- Não, por que? – Gilbert se sentou de frente para ela na cama com a bandeja entre eles.
- Porque você só prepara brownies de chocolate para o café quando tem algo importante a me dizer. - Anne disse olhando-o por cima do doce que já estava saboreando naquele momento.
- De fato temos que conversar. Mas, não foi por isso que fiz os brownies
- Não? Então, por que foi? Quer me subornar por algum motivo? Vamos logo, Blythe. Me diga exatamente o que deseja? - ela estava de bom humor, e Gilbert não sabia se ficava feliz ou preocupado. Anne ultimamente pulava de um estado de humor para outro, e como estudante de medicina ele sabia o que aquilo significava, e do ponto de vista clínico, aquele quadro não lhe parecia muito bom.
- Eu poderia sugerir milhares de coisas para essa sua pergunta, mas não quero ser acusado de atentado ao pudor logo pela manhã. - Anne riu de sua resposta, e continuou a saborear a guloseima que Gilbert preparara como se fosse seu único interesse no momento.
Gilbert clareou a garganta, e pensou que precisava tocar no assunto delicado sobre o bebê, mas não estava encontrando uma maneira de abordá-lo com jeito, por isso resolveu ir direto ao ponto e acabar com aquilo de vez
- Anne sobre o assunto de ontem. - ele viu o sorriso dela morrer, e ela olhou para as próprias mãos ficando tensa, mas Gilbert decidiu continuar mesmo assim.- Eu sei que isso é muito importante para você, mas...
- Não se preocupe, Gilbert. Eu entendi seu ponto de vista. Você não quer ter um filho agora e isso é tudo. – A voz dela não parecia magoada, mas ainda assim pareceu a Gilbert que ela estava querendo esconder dele como se sentia de verdade.
- Anne, eu não disse que não quero um filho. - ele tentou explicar, mas ela rebateu de maneira firme
- Mas, também não disse que quer um. -
- Anne, amor, eu só quis dizer que...- ela de novo o interrompeu não deixando que ele concluísse o que queria dizer.
- Querido, eu sei. Fique tranquilo. Você tem razão, eu sou jovem, você também. Temos nossas carreiras para construir, podemos pensar em filhos mais tarde. - Anne disse aquilo sorrindo para ele e de um jeito tão calmo que fez Gilbert dizer a si mesmo que algo não estava certo ali.
- Está falando sério, Anne? - ele ainda perguntou, não acreditando que ela tivesse aceitado tudo o que ele dissera na noite anterior sem usar nenhum argumento para tentar convencê-lo do contrário
- Estou. Agora porque não para de preocupar com isso, e aproveite o café da manhã comigo? Nós quase nunca comemos juntos. - Gilbert ainda achava que precisavam falar mais sobre o assunto, mas Anne parecia não estar inclinada a discuti-lo, por isso, ele resolveu curtir aquele momento de calma e paz que estavam partilhando aquela manhã.
Mas, seu instinto médico lhe dizia que Anne estava escondendo seus sentimentos por trás daquele seu ar despreocupado e calmo, e que bem lá no fundo havia um furacão se formando, e Gilbert pressentia que estava a ponto de explodir. Eles voltariam naquele assunto quando tivessem uma oportunidade, pois ele entendia por experiência e por conhecê-la bem que, quando Anne evitava falar sobre um assunto era quando eles realmente deviam falar sobre ele.
Eles terminaram o café, e Gilbert se vestiu para o trabalho, e quando estava a ponto de sair, Anne veio até a porta e disse:
- Ia sair sem me beijar, Dr. Blythe? - ela o abraçou pelo pescoço, e uniu os lábios de ambos em um beijo incrivelmente sedutor. Gilbert colocou sua maleta no chão para abraça-la melhor, enquanto Anne permita que os lábios dele tivesse acesso total à sua boca. Gilbert explorou cada canto dela, deslizando sua língua por toda a sua extensão, deixando que a paixão que começava a consumi-lo contagiasse Anne também. O gemido rouco dela o fez voltar a realidade quando percebeu onde estavam. Qualquer um podia vê-los assim entregues a aquele momento de insensatez deliciosa. Por sorte ainda era bem cedo, e nenhum morador do andar onde viviam parecia estar desperto. Gilbert se afastou de Anne com relutância e disse baixinho:
- Como eu gostaria de não ter que ir para o trabalho hoje.
- Então, por que não fica? - ela disse ainda agarrada a ele, acariciando as costas dele por cima da camisa ousadamente.
- Não me tente. Eu preciso mesmo ir para o trabalho. - Gilbert respondeu com os lábios tocando os dela suavemente.
- Tem certeza que não quer ficar? - as mãos dela estavam no botão da camisa dele, e os lábios deslizavam pela lateral do rosto de Gilbert fazendo-o respirar cada vez mais rápido. Então, ele a afastou suavemente e respondeu ainda ofegante:
- Eu preciso mesmo ir, amor. Prometo que teremos uma noite incrível juntos. - Anne sorriu-lhe, e disse com a voz cheia de intenções que Gilbert entendeu muito bem quais eram:
- Eu vou cobrar essa promessa, com certeza.
Gilbert deu lhe um último beijo, e foi para o trabalho com a cabeça cheia de pensamentos perturbadores sobre Anne, e desejando que as horas não o castigassem demais e ele pudesse voltar logo para casa e para ela.
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ANNE
Assim que Gilbert saiu, Anne se sentou no sofá da sala, e respirou fundo, afastando os cabelos do rosto, e pensou na conversa que tivera com Gilbert na noite anterior. Ela não sabia bem porque mencionara a ele sua vontade de engravidar, mas, pensara tanto na carta de Diana, que sentira uma vontade imensa de ter a mesma alegria que a amiga.
Que dom sublime era aquele de poder gerar uma vida, e saber que por nove meses carregaria uma prova viva de amor a quem alimentaria e protegeria de qualquer mal. Qualquer mulher deveria se sentir abençoada por trazer ao mundo um anjo de Deus, que tornaria cada dia de sua vida tão valioso e tão pleno.
Qualquer mulher nascia com esse direito, menos ela. Qualquer mulher crescia sabendo dessa dádiva que lhe era dada ao nascer, menos ela. A Anne lhe parecia que viera ao mundo com um estigma, e que essa má sorte a acompanhara desde então. Ela nunca realmente tinha pensado em ter um filho até que começar a namorar Gilbert, e sua cabeça de enchera de sonhos.
A primeira vez que tivera certeza disso fora quando vira seu noivo com Shirley nos braços, e aquele olhar estampado em seu rosto que lhe mostrara o quanto Gilbert amava crianças, e ela prometeu a si mesma que lhe daria um filho tão logo se casassem, porque queria que aquele brilho incrível que vira nos olhos de Gilbert durasse para sempre. Anne queria fazê-lo feliz, e sentir orgulho de si mesma por poder realizar um dos sonhos do homem que amava.
E esse filho viera, sem que ela planejasse ou esperasse, e justamente por que ignorara a existência dele por sua própria inexperiência e juventude evidente, o destino o tirara dela como se zombasse de sua fragilidade como mulher. Fazendo-a se lembrar das palavras cruéis de uma das donas da casa onde vivera quando criança, que garotas ruivas como ela, órfãs e sem fortunas nasceram apenas para servir, e que a vida nada de bom lhe reservaria a não ser uma existência cheia de misérias e infortúnios
Mas, Gilbert a fizera acreditar que era possível para ela viver a felicidade dourada de seus sonhos, e que a encontrariam juntos em alguma parte de estrada que percorreriam juntos. Ele lhe dera tanto que ela pensara poder fazer o mesmo por ele, mas estava enganada. Ela não ficara magoada com a recusa dele ao lhe pedir para terem um filho, mas ficara triste pela dificuldade dele em entender porque ela queria tanto um bebê.
Marilla sempre lhe dissera que os homens sentiam e pensavam diferente de uma mulher, e um filho não tinha o mesmo significado para ambos. As perspectivas em relação a eles também eram distintas. Enquanto o homem era racional, a mulher era totalmente emocional, mas Anne pensara que Gilbert fugia à regra, pois ela conhecia o lado sensível de eu noivo que se assemelhava tanto ao dela, mas, na noite anterior ela descobrira que ele não era tanto a exceção que pensara que ele fosse.
Não achava que por essa razão, Gilbert fosse insensível ao seu sofrimento, muito pelo contrário. Ele lhe provara muitas vezes que sempre estaria com ela, e que ela nunca mais estaria sozinha ou desamparada, mas as necessidades de ambos eram diferentes naquele momento, e um filho estava fora de questão pelo menos para ele. Por isso, naquela manhã, quando Gilbert tocara no assunto ela dissera que estava tudo bem. Não queria vê-lo preocupado, atormentado, e querer fazer as coisas somente para agradá-la. Ela o amava demais para permitir que ele deixasse de viver os próprios sonhos para realizar os dela. Gilbert merecia ter todas as glórias do mundo e alcançar todos os degraus do sucesso que seu talento e dedicação permitissem. Anne somente esperava estar à altura de ser a esposa que ele precisava, pois por mais que ele falasse coisas maravilhosas a seu respeito, e do quanto a amava e admirava ela sempre acabava pensando que ele merecia mais.
Anne começou a se sentir sufocada dentro de casa com tantos pensamentos, atropelando-a ao mesmo tempo, se levantou do sofá e pensou que um pouco de ar puro pudesse lhe devolver a serenidade que lhe faltava naquele momento. Então, ela se vestiu com roupas confortáveis e quentes, e saiu para caminhar em uma manhã de sábado onde o sol preguiçoso ainda não dera as caras.
Assim, a paisagem do lado de fora era um tanto cinzenta devido a nevasca que caíra de madrugada, mas nem por isso deixava de ser encantadora. Havia várias pessoas caminhando pela Quinta Avenida como Anne naquele instante, e seus cachecóis e gorros coloridos davam um ar pitoresco em meio ao branco da neve que cobria as árvores, e os jardins totalmente desprovidos de flores devido ao início do inverno que se iniciara a poucos dias.
Anne caminhou por alguns minutos, sem realmente prestar atenção aonde estava indo, mas, quando se deu conta estava de volta à pracinha onde no outro dia todas as suas lembranças cuidadosamente enterradas vieram à tona.
Como viera caminhando até ali, ela não saberia dizer. Talvez tivesse sido seu instinto ou subconsciente que quisera confrontá-la novamente com seus fantasmas que não lhe dariam paz até que fossem totalmente exorcizados. Sentindo-se só ela se sentou em um dos bancos da praça, onde aquela manhã estava quase deserta, apenas algumas crianças que pareciam imperativas demais para ficarem dentro de cada se aventuravam por ali, e construíam um boneco de neve sob o olhar atento de suas mães.
Anne olhou para as três mulheres que conversavam animadamente a alguns metros dela, e de repente se viu invejando-as por estarem em uma manhã de sábado em companhia de seus pequenos, como Anne um dia sonhara em fazer. Tantas vezes ela se imaginara caminhando de mãos dadas com Gilbert assim, à frente deles um casal de crianças, seus filhos, enchendo o ar de seus risos e brincadeiras infantis.
Ela abraçou a si mesma, como se assim pudesse se proteger dos próprios pensamentos. Ela pensara que em Nova Iorque aquele sentimento não seria mais tão dolorido, porém, se enganara, doía igual à meses atrás, e estava de novo sentido as feridas sangrarem em seu coração. A carta de Diana fizera a dor renascer, mesmo não sendo intencionalmente, servira como gatilho para que Anne descobrisse que não estava livre de seus demônios íntimos, e nunca estaria até que tivesse um bebê nos braços.
Era isso que Gilbert não entendia, e Anne não o culpava por não saber, que nada do que fizesse arrancaria aquele dor de dentro dela. O trabalho novo era uma camuflagem para impedi-la de pensar demais, o clube de leitura era apenas uma distração de seus momentos ociosos, onde podia misturar sua paixão pela literatura com sua habilidade de escrita, e assim por meio de palavras enfeitadas, ela conseguia colocar no papel as verdades de seu coração. E a faculdade tinha sempre sido um sonho, bem antes de ela ir para Green Gables, quando ainda nem imaginava que um dia pisaria dentro de uma instituição de curso superior, e faria parte de seu grupo estudantil, e que conseguira alcançar por meio de muito esforço.
Gilbert dissera que era impossível para ela abraçar o mundo daquela maneira, e ele realmente ficaria espantado se soubesse que ela não queria nada daquilo. Com exceção da faculdade, que era a única coisa que a mantinha focada, o resto deixava de ter importância toda vez que ela entrava dentro do apartamento e fechava a porta.
Era muito fácil fingir interesse em coisas que não significavam nada, quando se tinha em mente não decepcionar a pessoa que mais se amava, e a última coisa que queria na vida era deixar Gilbert decepcionado. Ela prometera que tentaria recomeçar, e fazia isso toda a as manhãs, quando o se levantava e pensava como atravessaria mais um dia vazio em seu coração. Anne se tornara perita em representar um papel de felicidade que exibia apenas para as pessoas do lado de fora, exceto os momentos maravilhosos que tinha com Gilbert, esses ela nunca tivera que fingir. Estar com ele era o único momento de seu dia que podia sentir um pouco de felicidade verdadeira. Era por ele que não desistira meses atrás, era por ele que viera para Nova Iorque, e era por ele que não sucumbira as loucuras de sua mente.
Mas, ainda assim, por mais que ele lhe desse um amor tão perfeito, jamais conseguiria afastar de dentro dela a sensação de ser apenas metade de uma mulher, tendo metade de uma vida enquanto a outra parte não valia mais nada.
Anne continuou a observar as crianças e seu boneco de neve, e sem perceber começou a chorar. Aquelas eram lágrimas que estavam guardadas a tempos e as quais prometera não mais derramar. Mas, durante aquela semana fora desafiada tantas vezes a encarar seu passado, que por mais que fosse forte era de se esperar que seu colapso chegaria, somente desejava que Cole ou Diana estivessem ali para que segurassem firme em sua mão e a ajudassem a passar por mais aquele instante de escuridão.
Não podia correr para Gilbert agora, por mais confortável que o ombro dele fosse para derramar suas lágrimas. Não queria que ele a visse assim, pois ele ia achar que a culpa era dele e se realmente havia alguém a ser responsabilizado naquele história, certamente não seria ele.
- Moça, por que está chorando? - Anne olhou para frente e deu de cara com um par de olhinhos verdes que não paravam de encará-la. Ela tentou sorrir por entre as lágrimas e disse:
- Não é nada, meu anjinho. São coisas de adulto que você não entenderia.
- Quer um pirulito? Minha mãe sempre me dá um quando eu choro por algum motivo. Ela disse que servem para adoçar a vida. – Anne sorriu diante daquela criança tão pura, que via a vida por lentes coloridas, e se lembrou com tristeza que um dia também fora assim.
- Não, meu amor, não creio que um pirulito vá curar o meu mal.
- Que tal sorvete ou algodão doce? Não consigo imaginar nada melhor para me curar quando estou doente. - o menininho insistiu.
- Não estou doente, só um pouco triste. - Anne tentou explicar.
- Então, acho que vou perguntar para minha mãe se ela tem um remédio para essa doença. Você não imagina quanta coisa ela guarda no armário do banheiro lá de casa.
- Não precisa, meu amor. Já estou me sentindo melhor. Somente esse sorriso já fez maravilhas pela minha tristeza. Agora preciso ir embora. Obrigada pela sua companhia tão incrível. – Anne disse se levantando do banco.
- Então, até logo. Quem sabe outro dia que não estiver triste, possa vir fazer bonecos de neve com a gente. - o menininho disse animado.
- Será um prazer. – Anne disse passando as mãos pelo rosto, e secando as últimas lágrimas que ainda molhavam seu rosto
O menininho se afastou um pouco e de repente como se lembrasse de algo ele perguntou:
- Moça, você não me disse seu nome.
- É Anne.
- Me chamo Roney.
- Muito prazer Roney, - Anne disse acenando para ele.
- Eu também gostei de te conhecer Anne. - depois ele se virou, continuou seu caminho e se juntou novamente as crianças e seu boneco de neve.
Anne voltou para o apartamento ainda se sentindo triste, mas como sabia que logo Gilbert voltaria para casa, ela tratou de ir para o banheiro e lavar o rosto. Tinha exatamente duas horas para melhorar sua aparência antes que ele cruzasse a soleira da porta.
Ela lavou o rosto com água fria, enxugou-o com uma toalha, depois encarou o espelho que fora seu inimigo em outro tempos. Quando era criança e na adolescência, ela odiava ver seu reflexo nele, pois se enxergava exatamente como as pessoas diziam que ela era, a órfã feia, magrela e miserável, e naquele momento não podia dizer que o reflexo que via a agradava de algum mane ira. Ali estava a imagem de uma mulher que por mais roupas bonitas que usasse, ou mudasse o penteado do cabelo, o que enxergava era feio, escuro e cruel. Anne fechou o punho com força, e sem pensar bateu com ele na base do espelho, como se assim pudesse apagar o reflexo odioso que via de si mesma, mas calculou errado a força, e só quando sentiu seu pulso doer é que percebeu que tinha se cortado, vendo o sangue pingando na pia de mármore branco.
ANNE e GILBERT
O trabalho de Gilbert terminou uma hora mais cedo do que esperava, e então ele trancou tudo e foi embora. No caminho, enquanto cruzava a rua após o semáforo ter dado permissão aos pedestres para que atravessassem, ele ouviu uma voz conhecida no instante em que pisou na calçada.
- Gilbert. - ele escutou Dora gritar seu nome e se virou. A amiga parecia ter estado caminhando, pois vestia roupas de ginástica e tênis de corrida.
- Oi, Dora. Espero que tenha se divertido na noite de ontem. Não te vi mais depois da nossa dança.
- Eu me diverti sim. Fui embora bem tarde em companhia de alguns amigos. Mas, não posso dizer o mesmo de você, meu amigo. Por acaso vi você e Anne, e vocês não me pareceram muito amistosos um com o outro- Gilbert suspirou antes de responder:
- Esse é o menor dos meus problemas agora.
- Por que? - Dora perguntou interessada.
- Não quero te amolar com meus problemas em pleno sábado. Você merece um descanso.
- Que isso, Gilbert. Somos amigos, e aproveite que não cobro nenhum dos meus conselhos que dou aos meus amigos- Dora disse rindo.
- Nesse caso, acho que estou mesmo precisando conversar.
Assim, eles se sentaram em uma lanchonete, pediram um suco e começaram a conversar.
- O que foi dessa vez meu amigo. Você parece angustiado com alguma coisa. - Dora disse observando a expressão de Gilbert
- É a Anne, Dora. Acho que tem realmente algo errado com ela. - Gilbert disse cruzando as mãos em cima da mesa.
- Por que diz isso, Gilbert?
- Ela está agindo de maneira estranha, e está me deixando cada vez mais preocupado. A dois dias ela me disse que queria trabalhar fora, porque está cansada de ficar em casa, e quer se sentir útil. – Gilbert fez uma pausa para tomar um gole de seu suco de laranja.
- E isso não é bom? Parece que ela está reagindo ao quadro depressivo que me descreveu outro dia. - Dora disse apoiando seu queixo nas mãos.
- Seria se ela já não estivesse participando de um clube de leitura, estudando para a Faculdade, e resolvesse que quer ter um filho. – Dora o olhou espantada e perguntou:
- Tudo ao mesmo tempo?
- Isso mesmo. O que isso lhe parece? - Gilbert questionou interessado na opinião dela:
- Com exceção do filho, uma fuga dos seus reais sentimentos. Talvez ela pense que assim conseguirá sufocar seu sofrimento, encontrando dessa forma um jeito de seguir em frente. Muitas pessoas fazem isso, Gilbert. Se sobrecarregam de atividades para não pensar na dor.
- Isso tudo está me deixando maluco. Ontem à noite ela me disse que quer ter um filho. - ele disse olhando para o seu copo de suco sem realmente ver o que estava ali.
- E o que você respondeu?
- Eu disse apenas que não é o momento. Que ela deve pensar em outras prioridades, que somos jovens e que podemos pensar sobre isso mais tarde.
- E o que ela respondeu? - Dora perguntou, brincando com o canudo plástico que tinha nas mãos.
- Ficou chateada, me acusou de não querer ter um filho com ela, e foi para a cama magoada da comigo.
- E o que disse à ela foi o real motivo de sua recusa?
- Não. Você sabe qual ê o real motivo. Ela não está preparada, Dora Ela não vai saber lidar com a ansiedade e sua dificuldade em gerar um filho. Você já imaginou o pesadelo que tudo isso vai ser para ela? Eu não suportaria vê-la ficar arrasada todos os meses quando suas esperanças se frustrassem. Ela precisa tratar do seu emocional primeiro, se fortalecer por dentro, e só aí poderá realmente lidar com seus outros sentimentos.
- Gilbert, você está certo quando diz que Anne precisa aprender a lidar com seus conflitos, e a culpa de ter perdido o bebê mas, você também precisa aprender a lidar com a culpa de não ter estado lá para ajudá-la quando isso aconteceu. - Gilbert baixou a cabeça reconhecendo a verdade naquelas palavras. - Por isso, quer protege-la tanto, e sabe que não poderá fazer isso sempre. – Dora concluiu.
- Você não entende, Dora. Eu vivo em um medo constante do que Anne possa fazer em um momento em que eu não estiver por perto. - Gilbert confessou com os olhos atormentados.
- Você acha que ela pode se machucar? - Dora perguntou colocando em palavras o que Gilbert escondia em seus pensamentos.
- Quem pode saber? Ela passou por tanta coisa e suportou tudo sozinha. Quem poderia culpa-la por isso.
- Eu não acredito que Anne seria capaz de atentar contra a própria vida. Ela ê mais forte que isso. - Dora disse racionalizando tudo o que Gilbert lhe contara.
- Eu quero acreditar que sim. Mas, ela tem comportamentos que não entendo, e isso me assusta. Ontem, ela foi dormir magoada comigo. Então, hoje me preparei para conversar com ela sobre o bebê, e ela nem me deixou tocar no assunto, dizendo que me entendia e que eu estava certo sobre tudo, e por fim, antes de eu ir para o trabalho ela se tornou amorosa demais. Eu juro que se não a conhecesse, diria que ela é bipolar, mas sei que o caso não é esse. O que você acha?
- É um comportamento tipicamente comum de alguém que sofreu um trauma, e está tentando sobreviver às suas tragédia. Talvez essa seja a maneira que ela encontrou de ter uma vida normal com você. Cada um lida com suas dores como pode, Blythe.
- Eu sei, Dora. Mas, eu queria poder fazer mais por ela do que fiz até aqui. Eu a trouxe para Nova Iorque porque a queria comigo, e porque eu tinha medo do que poderia acontecer se eu estivesse longe. A melhor amiga dela acabou de se casar. O outro melhor amigo vive em Paris. Quem cuidaria dela se ela tivesse uma de suas crises? - Gilbert disse passando as mãos pelos cabelos. Dora sentiu pena do amigo que parecia excessivamente perturbado.
- Gilbert, foi uma ótima ideia trazê-la para cá. Um novo recomeço é provavelmente o que vocês precisam, mas você tem que entender que não pode proteger Anne de tudo. Ela precisa passar por esse período de luto, para que volte a ser a garota que um dia foi. Eu concordo com você. Ela não está pronta para ser mãe. Seria um processo exaustivo demais para uma alma quebrada com o a dela. Leva -se um certo tempo para superar, mas ela tem o que mais precisa que é você. O seu amor por ela pode ajudá-la a sair desse quadro preocupante, mas, não a sufoque Gilbert, e não a torne dependente demais de você. Ela precisa de apoio e de espaço também - Dora o aconselhou.
Eu sei que está certa. Vou pensar no que me disse. Obrigado por tudo, Dora. - Gilbert respondeu tentando sorrir.
- Você sabe que pode contar comigo. Eu sei o quanto tudo isso tem sido difícil para você.
- Não mais do que para Anne. Isso eu posso te garantir. Eu só quero que ela seja feliz. -
- É ela vai ser, Gilbert. Dê-lhe tempo. - Dora disse jogando seus longos cabelos loiros para trás, e olhando-o com seus olhos castanhos inteligentes.
- Sim. Vou ver se consigo convencê-la a ir à uma consulta com seu tio. Talvez Isso possa ajudá-la a acelerar seu processo de cura. - Gilbert comentou parecendo mais animado-
- Faça isso. Ajuda profissional é sempre a melhor coisa nesses casos.
- Bem, preciso ir. – Gilbert disse se se levantando, e de repente seu rosto se contraiu ao lembrar-se de algo. – Nossa, só agora me ocorreu que não avisei a Anne que ia me atrasar. Preciso passar no Campus para falar com o Professor Smith sobre nossa nova pesquisa.
- Se quiser posso avisá-la. Estou indo para o meu dormitório, e seu apartamento fica no meu caminho. - Dora se ofereceu.
- Vou aceitar sim. Mais uma vez obrigado, Dora. Por me ouvir e aconselhar.
- Sempre as ordens. Dr. Blythe. - Gilbert se despediu com um sorriso e foi em direção à Faculdade, enquanto Dora fazia o caminho oposto.
Em pouco tempo, Dora estava na porta do apartamento de Anne e Gilbert, e assim que bateu, a ruivinha abriu a porta e Dora disse:
- Ei. Anne, o Gilbert...- ela parou de falar no momento em que viu Anne apertando uma toalha ensanguentada em volta de seu pulso direito. - Meu, Deus! Querida, você precisa de um médico! - ela disse nervosa enquanto Anne tentava explicar o que acontecera-:
- Eu me machuquei e....
- Claro, claro. Venha, vou te levar para um hospital. – Dora disse tentando manter Anne calma, pois a ruivinha tremia. - Ela precisava mandar alguém avisar Gilbert. Ele precisava saber o que acontecera, e Dora começou a se arrepender por não ter acreditado quando Gilbert lhe falara do medo que ele tinha de Anne machucar a si mesma, e ela o realmente o fizera.
Chegaram à rua, e Dora chamou um táxi dando o endereço do hospital mais próximo. Ele olhou para Anne que parecia muito pálida e calada, ainda apertando a toalha ao redor do pulso. Dora abraçou a menina pelos ombros e disse:
- Vai ficar tudo bem, querida. Estou aqui com você é vamos cuidar disso.
O táxi estacionou na porta do hospital, e elas desceram. Logo, Dora conduziu Anne até a recepção e contou a atendente o que estava acontecendo, e enfermeiros apareceram levando Anne para a enfermaria.
Dora ficou esperando na recepção. Desejando que Anne ficasse vem e pensando em como avisaria Gilbert que sua noiva estava ali.
- Ei, Dora. - ela se virou e aliviada assim que viu Jonas.
- Graças a Deus, está aqui.
- Sentiu tanta falta de mim assim? - Jonas disse zombando de Dora. Ele trabalhava no hospital nas horas vagas por conta do plano de estágio.
- Não seja tolo. - Dora disse nervosa com a situação de Anne, e vendo que Jonas estava a ponto de sair- Poderia me fazer um favor?
- Claro? O que quiser, princesa. - Dora ignorou a parte melosa do apelido e disse:
- Você poderia vir até a Faculdade e avisar Gilbert que eu estou no hospital com a noiva dele?
- Claro, mas o que aconteceu?
- Ela se machucou e eu a ajudei. Pode fazer esse favor por mim? Ele foi falar com o Sr. Smith sobre um trabalho de pesquisa, e acredito que ainda esteja lá. – Dora disse sem entrar em detalhes. Quanto menos pessoas soubessem do que acontecera seria melhor.
- Claro. Irei imediatamente. - Jonas disse dando meia volta e saindo do hospital.
Dora se sentou no sofá da sala de espera e ficou aguardando notícias. Após vinte minutos, Gilbert entrou no hospital e parecia terrivelmente nervoso:
- Como ela está, Dora? - ele perguntou assim que viu a amiga.
- Ainda não sei. Não me disseram nada. Mas, ela já está sendo atendida.
- O que aconteceu? - Gilbert insistiu em saber. Dora já esperava por esta pergunta, e decidiu que deveria ser sincera.
- Eu acho que ela tentou cortar os pulsos. - Gilbert empalideceu terrivelmente se sentando no sofá, e olhando para Dora com os olhos desesperados.
- Eu sabia que deveria tê-la deixado sozinha. Eu devia saber. - Gilbert colocou a cabeça entre as mãos, e Dora colocou a mão em seu ombro dizendo:-
- Não foi sua culpa. Eu já te disse que não pode controlar tudo. Anne não é mais criança e toma suas próprias decisões.
- Não, ela está em Nova Iorque sob a minha responsabilidade. Eu devia ter tomado conta dela melhor. - Gilbert continuou s dizer desesperado.
- Gilbert, você...Dora Ia dizer que tudo ficaria bem, Mas, o médico apareceu, e Gilbert se levantou ansioso por notícias.
- Vocês são parentes de Anne Cuthbert?
- Eu sou o noivo dela. - Gilbert respondeu com a voz tremendo.
- Felizmente, está tudo bem. O corte foi superficial, mas como atingiu uma área de vasos sanguíneos bastante irrigada, acabou por gerar um sangramento grande. Parece que ela se cortou com um espelho, pois encontramos um pequeno fragmento do objeto em sua pele.
- Ela vai ficar bem? - Gilbert perguntou ainda parecendo muito nervoso.
- Claro. Em poucos dias poderá tirar os pontos e o curativo. Vou liberá-la para que possa leva-la para casa. - o médico disse.
Cinco minutos depois Anne apareceu e aa ver Gilbert, ela sorriu com carinho:
- Desculpe -me amor por tê-lo preocupado tanto. Não esperava encontrá-lo aqui. - Gilbert olhou o pulso dela enfaixado, seus olhos se estreitaram e ele se aproximou beijando-a na testa e perguntou:
- Como se sente? -
- Estou bem, não foi nada sério-, não se preocupe. O olhar de Gilbert endureceu e ele parecia zangado, e Anne se perguntou por quê.
- Venha, vou te levar para casa. - ele disse com a voz tão fria que fez Anne estremecer, mas ela não disse nada, atribuindo aquele fato à preocupação dele.
Eles saíram para fora do hospital, seguidos por Dora. Chamaram um táxi e foram para casa. Despediram-se de Dora assim que ela desceu em frente ao seu dormitório
- Obrigado por ter ajudado, Anne. Depois conversamos melhor sobre isso. - Gilbert disse em voz baixa.
- Tudo bem. - Dora respondeu.
- Eu também queria agradecer por ter me ajudado. Eu realmente estava assustada. Nunca tinham machucado assim antes. - Dora e Gilbert trocaram um olhar significativo e a moça respondeu;
- Por nada querida. Foi um prazer.
Assim, eles continuaram o caminho até em casa com Anne estranhando o comportamento de Gilbert que não lhe dirigia a palavra. Entraram em casa, Gilbert foi até o banheiro, e viu a pia ensanguentada e os cacos do espelho espalhados pelo chão
- Espere aqui na sala, enquanto recolho os cacos do espelho que estão no chão. - Ele disse para Anne assim que voltou para a sala, vendo-a parada sem saber o que fazer.
- Não quer ajuda? - ela perguntou ansiosa para quebrar o silêncio que já a estava incomodando.
Não. – Ele respondeu com a voz seca deixando-a magoada.
Por que ele a estava tratando daquela forma? Será que a estava culpando por ter quebrado o espelho do banheiro e se machucado? Era um acidente doméstico comum que poderia acontecer com qual quer um. Não acreditava que Gilbert estava zangado por causa daquilo.
Ele voltou momentos depois sem olhar para ela e dizendo:
- Acho melhor trocar essas roupas e tomar um banho. Vou para a cozinha te preparar algo para comer. Pelo que pude perceber, você não comeu nada até agora.
- Está bem. – Ela concordou sentindo a garganta se apertar. Gilbert nunca a tratara com tanta frieza, e ela nem sabia o que tinha feito para deixá-lo assim.
Anne entrou no banheiro e percebeu que estava todo limpo. Ela se despiu com cuidado e tomou um banho quente, tentando evitar que o curativo que tinha no pulso se molhasse. Em seguida, ela desligou o chuveiro, se enxugou e se vestiu indo direto para a cozinha, disposta a descobrir porque Gilbert estava bravo com ela daquele jeito.
Ele estava de costas e ela não conseguia ver seu rosto, por isso, tocou-o de leve no ombro sentindo-o ficar tenso ao seu toque e disse:
- Gilbert, eu sinto muito, e....para sua consternação ela ouviu-o soluçar, e ficou ainda mais surpresa, quando ele virou para ela e Anne viu que ele tinha o rosto molhado de lágrimas. Então, Gilbert falou entre soluços não conseguindo mais controlar a angústia de seu coração:
- Como pode fazer isso, Anne? Não pensou nem um pouco em mim? Eu sei que tem sido difícil, mas não podia confiar em mim para contar o quanto estava insuportável para você viver dessa maneira? - Anne ouviu atônita as palavras de Gilbert sem saber realmente o que ele queria dizer com aquilo.
- O que está dizendo?
- Como pôde se machucar dessa jeito? Será que não pensou por um minuto como eu me sentiria se perdesse você? Deus! Eu sequer conseguiria continuar minha vida se você não estivesse mais nela. - Anne arregalou os olhos ao ouvir o que ele dizia. Gilbert estava pensando que se cortara de propósito? Ou pior que tentara se matar? Não podia deixa-lo acreditar naquilo. Ela nunca atentaria contra a própria vida, por mais que sua dor fosse insuportável. Isso ia contra todas as suas crenças. Por isso, ela o abraçou pelo pescoço e disse;
- Não, amor. Eu não fiz isso. Acredita em mim. – ele parecia não ouvi-la, a cabeça continuava baixa, e as lágrimas rolavam livres sem que Gilbert se importasse. Ele se sentou à mesa, e fez Anne se sentar em seu colo dizendo com os o rosto nos cabelos dela:
- Eu não posso viver sem você. Prometa-me, Anne, que nunca mais vai pensar em fazer algo assim. Prometa-me que o que for que estiver machucando você vai me dizer e resolvermos isso juntos. - Anne queria que ele entendesse que estava errado. Que ela não fizera nada daquilo, mas, compreendeu que Gilbert não ia ouvi-la naquele momento em que suas emoções estavam à flor da pele, ela apenas assentiu e disse:
- Eu prometo. - Então ela levou as mãos ao rosto de Gilbert enxugando-lhe as lágrimas uma a uma com seus dedos, como seu noivo tantas vezes já fizera com ela, enquanto ele se manteve de olhos fechados como se estivesse saboreando cada segundo daquela carícia suave. Em seguida, ela o beijou tentando levar um pouco de calor aqueles lábios que pareciam tão frios perdidos em seu desespero.
Sem pensar, Gilbert correspondeu ao beijo, sua necessidade por ela se triplicado pelo medo que tivera de perdê-la. Anne acariciou os cabelos dele enquanto dava passagem para a língua de Gilbert que parecia querer saboreá-la inteira. O beijo era urgente, as sensações também, e em pouco tempo Anne sentiu seu corpo inteiro pegando fogo. Ela descolou os lábios dos dele por um segundo, apenas para sussurrar bem próxima os lábios dele:
- Faça amor comigo. – Gilbert queria negar. Não achava que era o momento certo depois do que ela passar a naquela tarde, mas o medo, o desejo e a paixão se misturaram dentro dele como águas caudalosas de um rio, e ele estava a ponto de transbordar por aquela mulher que era a única razão de sua vida.
Ele a levou para o quarto, beijando-a com desespero, como se quisesse se certificar de que ela estava mesmo ali e que ele não estava sonhando. Em segundos estavam nus e se tocavam como se aquele fogo entre eles não pudesse ser saciado com apenas um momento de amor. Anne correu suas mãos e lábios pelo corpo de Gilbert, ouvindo-o maravilhada gemer seu nome em uma canção sensual de desejo e volúpia. Eles trocaram de posição, e ele disse com os olhos tão escuros que Anne sentiu que se afogaria dentro deles:
- Faz ideia de como me deixa louco? Não consigo sequer pensar direito quando você está assim em meus braços. - ela estendeu a mão, tocou no rosto dele e respondeu:
- Então, não pense. Apenas me ame agora e sempre. Sou toda sua, Gilbert Blythe.
Assim, Gilbert se perdeu naquele momento glorioso, onde sua alma se juntou a de Anne, e ele mergulhou no corpo feminino como se bebesse da fonte da vida mais deliciosa do mundo. Seu corpo agia por ele, e Gilbert apenas seguiu os seus instintos deixando que sua paixão por ela explodisse sem controle. Anne lhe dava tudo de si, mas ele queria mais, ele precisava de mais. A ideia de perde-la o deixara faminto por cada toque e cada beijo, e ele queria amá-la até que não existisse mais dor ou sofrimento, até que Anne compreendesse que a vida dele somente valeria a pena se ela sempre estivesse ali em seus braços. O ato de amor mais uma vez aconteceu, e como náufragos que se salvam no último instante eles nadaram por cada onda de desejo que os atingiu. O prazer nunca fora tão grandioso e tão intenso como naquele momento em que ambos celebravam a vida e o amor que partilhavam juntos.
Anne abriu os olhos para encarar o homem que lhe dera tudo aquilo e disse:
- Eu te amo. Nunca duvide do quanto me faz feliz e do quanto a vida a seu lado é preciosa para mim. - Gilbert acariciou o pulso machucado dela com carinho e respondeu.
- Eu te amo mais do que qualquer coisa que tenha significado para mim, e até mais que a medicina, E prometo que vou passar a vida toda te provando que não existe nada nesse mundo mais importante para mim do que nós dois. Você é a minha vida,Anne. - ela sorriu emocionada e o beijou sentindo pela primeira vez naquele dia, o brilho do amor de Gilbert irradiar dentro dela levando embora toda a sua tristeza.
E como prometera, ele a fez compreender pela noite inteira, o quanto a vida valia a pena porque se amavam daquela maneira. Juntos eram fortes, e juntos seriam sempre a luz um do outro na escuridão.
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