Capítulo 60- Remando contra a maré.
Olá, queridos leitores. Estou postando mais um capítulo de nossa saga Gilbert e Anne. O amor entre nossos protagonistas continua forte, mas Anne tem aprendido que o amor de Gilbert por ela sempre foi incondicional e que ela não o valorizara o suficiente. As emoções neste capítulo continuam em alta,por isso espero pelos comentários, e prometo que no final dessa tormenta pela qual Anne está passando haverá um lindo arco-iris a espera dela.
Beijos. Muito obrigada por tudo.
ANNE
- Você ficou maluca, Anne? Não acredito que vai mesmo fazer isso. - Anne ouviu Diana dizer indignada.
Estavam em Green Gables , no quarto da ruivinha, e enquanto a amiga falava com ela como se ela estivesse cometendo o pior pecado do mundo, Anne olhava as gotas de chuva baterem no vidro de sua janela , e escorrerem como lágrimas, as suas próprias lágrimas, que ela já não conseguia evitar sempre que pensava sobre os rumos que sua vida tinha tomado.
Como era possível que há quase dois meses atrás ela estivesse tão feliz vivendo um conto de fadas, e de repente tudo ruíra, transformando-se em um sonho ruim do qual não conseguia mais acordar? Ela se virou para Diana que esperava pela resposta dela, com as mãos na cintura e uma expressão grave no rosto, e disse com a voz cansada.
- Que escolha eu tenho? Gilbert quer ver Sabrina, e prometi que a levaria até ele.
- Anne, você tem noção do que está fazendo? Vai entregar Gilbert de bandeja para essa imoral? - Diana estava tão brava que sua voz tremia.
- Ele não se lembra de mim, Diana. O que quer que eu faça? – Anne perguntou com seus olhos cheios de angústia.
- Por que não diz logo que é a noiva dele? Por que fica se escondendo nesse papel de amiga que a está consumindo por dentro? - Diana se aproximou dela e colocou suas mãos no ombro de Anne.
- Eu não sei o que fazer, Diana. Estou tentando ser forte, mas está tão difícil. - uma lágrima escorreu pelo canto do olho de Anne e foi se alojar na curva do seu pescoço.
- Eu sei que não está fácil, mas não acho que trazer a Sabrina até aqui vá resolver alguma coisa. – Diana disse tentando dar seu apoio a Anne.
- E como você acha que estou me sentindo? Essa garota é tudo o que desprezo na vida, mas Gilbert se lembra mais dela, que destruiu nosso noivado, do que de mim a quem ele prometeu amar o resto da vida. Você sabe como estou me sentindo humilhada? - Anne baixou a cabeça e olhou para o chão desanimada.
Ela sabia que Diana estava certa. Era loucura trazer Sabrina para perto de Gilbert, mas ele lhe pedira aquele favor, como poderia negá-lo? Faria o que fosse possível para vê-lo feliz. Esse era seu objetivo de vida agora. Mesmo que seu coração fosse metralhado mil vezes pela dor, ela não conseguiria se afastar dele. Talvez isso fosse amar incondicionalmente, colocar a felicidade do outro acima da sua, mesmo que essa felicidade fosse a morte de suas próprias ilusões.
- Querida, eu não consigo imaginar tudo o que você está passando. – Diana disse- mas, eu estou aqui para te dar apoio. Somos como irmãs, Anne. A sua dor é a minha. - Anne olhou para Diana agradecida. O que seria dela sem sua amada amiga do seu lado?
- Obrigada, Diana. Tudo o que eu queria era que essa situação acabasse logo. Estou tão exausta. Mas, pelo que vejo, não conseguirei ter paz tão cedo. - Anne disse desconsolada.
Ela vinha visitando Gilbert todos os dias, pois não suportava imaginá-la longe dela e dentro daquele hospital. Eles conversavam, ela lia livros para ele, e depois Anne voltava para Green Gables com a sensação que deixara parte de seu coração para trás.
Gilbert continuava tratando- a como amiga, e isso lhe despedaçava a alma. Ela tentava fazer com que ele se lembrasse de algumas coisas através do olfato ou paladar, mas não tivera muito sucesso.
Anne até lhe preparara as rosquinhas que ele tanto amava em uma tentativa de que o sabor lhe despertasse lembranças antigas, mas além do fato de que ele adorara a textura macia e açucarada da guloseima, isso não o levara a se lembrar de nada em especial.
É claro que ela notará os olhares dele sobre ela, principalmente quando ele pensava que Anne estava alheia ao que estava ocorrendo ao seu redor. Gilbert parecia segui-la pelo quarto de Hospital, observando com atenção todos os movimentos dela, como se Anne fosse seu objeto de estudo mais interessante.
Às vezes seus olhares se encontravam e ela quase podia ver o antigo Gilbert naquele castanho dourado, mas depois, ele desviava o olhar fazendo -a ter consciência de tudo o que tinha perdido.
Ela sentia uma falta terrível de ouvi -lo dizer que a amava, de como ele gostava do seu cabelo e de como a achava linda. E isso não era por vaidade ou por que ela precisava de alguém para alimentar seu ego. A verdade era que Gilbert tinha um jeito de dizer essas coisas que fazia Anne acreditar que ela tinha realmente deixado sua casca de garota órfã para trás, e deixara vir a tona a Princesa Cordélia que vivia em algum lugar dentro dela. Gilbert a libertara de tantas amarras, e a ajudara a descobrir tantos pontos positivos em si mesma quando pensara que era apenas um peso no mundo sem significado para ninguém. Por essa razão, Anne nunca imaginara que chegaria o dia em que voltaria a se sentir assim
Sem Gilbert ela não conseguia seguir em frente. Estava estagnada no mesmo lugar desde o dia em que tudo acontecerá. Anne deixara a ideia de descobrir sobre as suas origens de lado, aquilo parecia tão sem sentido agora, e ela também não conseguia pensar na Faculdade. Ainda tinha um mês de férias antes das aulas começarem, mas, Anne sequer conseguia pensar em estudar.
Sua cabeça estava confusa, e seu espírito tão apagado, que não tinha vontade nenhuma de voltar aos livros ou as aulas de reforço de literatura que adorava. Tudo isso parecia fazer parte de um passado no qual era feliz, mas não soubera dar o devido valor.
Sua realidade era outra nesse momento, e enquanto Gilbert estivesse perdido nas brumas do esquecimento, ela não se sentia em condições de fazer mais nada.
Uma pontada em seu ventre a fez se lembrar do que mais queria esquecer. A perda de seu bebê ainda doía demais, e Anne não tinha certeza se um dia deixaria de sofrer por isso. Como ela gostaria de ter seu bebezinho crescendo em seu ventre, sendo a prova viva de seu amor por Gilbert e seria a força que lhe faltava agora. Anne nunca pensara em ser mãe cedo. Queria se formar, casar com Gilbert e depois pensar em filhos, mas, depois de toda a fatalidade que a atingira, Anne não conseguia deixar de pensar que teria amado ser mãe naquele momento, e por essa razão, o vazio que sentia dentro de si mesma era três vezes maior.
- Anne, está me ouvindo? - Diana perguntou ao notar que Anne parecia estar a milhares de quilômetros dali.
- Desculpe, Diana. Tenho coisas demais na minha cabeça. Não tive a intenção de ignorar você. – Ela disse com um sorriso triste.
- Tudo bem, minha amiga, eu compreendo, mas quero te dizer uma coisa é espero que não me leve a mal. – Anne balançou a cabeça concordando, e assim, a menina continuou. - Eu sei o quanto ama o Gilbert. Eu acompanhei de perto o desenvolvimento desse romance. Mas, você não acha que deveria se afastar um pouco dele?
- O que está dizendo, Diana? Que eu deveria abandonar Gilbert sozinho naquele leito de hospital? - Anne disse horrorizada com as palavras da amiga.
- Querida, você sabe muito bem que Gilbert não está sozinho naquele hospital. Mas, você está se acabando de tanto sofrimento. Teve uma perda terrível e se não bastasse, seu noivo não lembra de você. Acha que tudo isso vale a pena? Não seria melhor voltar a sua rotina e tentar levar uma vida mais ou menos normal?
- É que normal seria esse, Diana? Um normal sem Gilbert e todos os planos que fizemos juntos? Você acha mesmo que eu conseguiria? - Anne pare cia tão indignada pelo que a amiga dissera, que seu rosto ficara vermelho.
- Desculpe me, Anne. Não quis te ofender, e nem fazer pouco caso do seu amor. Eu só acho que se voltasse a fazer as coisas que ama, você mudaria aos poucos a maneira com a qual você tem se sentido.
- Diana, eu não posso. Não me peça uma coisa dessas, seria o mesmo que me pedir para deixar de respirar. - Anne respondeu, pensando que Diana não sabia que naquelas visitas diárias que fazia a Gilbert, Anne compreendera que precisa mais daquilo do que ele.
Vê-lo todos os dias a ajudava a dormir a noite, sabendo que no dia seguinte estaria com ele de novo. Anne sabia que se privasse de suas manhãs na companhia de Gilbert, estaria aumentando o buraco que tinha dentro de si exatamente no lugar onde ficava seu coração.
- Tudo bem, Anne foi apenas uma sugestão, não precisa ficar nervosa, mas, agora vamos voltar ao foco de nossa conversa aqui. Você vai continuar insistindo nessa loucura de levar a Sabrina para ver o Gilbert? - Anne balançou a cabeça afirmativamente e respondeu:
- É o que Gilbert deseja, Diana. Não posso negar isso para ele.
- Tudo bem. E você já sabe como conseguirá encontrar essa garota? - Diana perguntou colocando uma mecha do próprio cabelo atrás da orelha.
- Eu pedi para o Muddy me ajudar. Por sorte ele descobriu que os amigos de Gilbert ainda estão nas redondezas de Avonlea e ele ficou de procurá-la hoje.
- E como você está se sentindo com tudo isso? - Diana perguntou pegando a mão de Anne entre as suas.
- Péssima, mas, o que importa para mim é o bem-estar de Gilbert. Acho que posso aguentar essa situação toda, se eu souber que ele está bem. - Anne respondeu com o olhar fixo em algum lugar a sua frente.
- Por que parece que está se punido, Anne? Eu entendo que queira ver o Gilbert bem, mas seu tom de voz me indica outra coisa.
- E o que seria? - Anne perguntou tentando fugir do olhar de Diana.
- A perda do bebê não foi sua culpa, Anne. Pare de se machucar assim. Nada do que fizer vai mudar o que aconteceu. Você precisa se perdoar e seguir em frente. Diana disse acariciando os cabelos de Anne.
- Eu não sei se consigo. Mas, prometo que vou tentar- Anne disse com a voz tão triste que fez Diana abraçá-la.
- Que cena mais comovente. – as duas amigas se separaram e Anne lançou um olhar para a porta dando de cara com o pior dos seus pesadelos.
- Sabrina. - ela disse.
- Parece que nos encontramos de novo. - a garota olhava para Anne com desdém.
- O que ela está fazendo aqui? – Diana perguntou para Anne surpresa.
- Eu pedi para Muddy trazê -la até aqui. Pode nos dar licença, Diana? Preciso falar a sós com Sabrina.
- Tem certeza? – Diana perguntou preocupada.
- Sim, não se preocupe. - Anne disse sorrindo.
- Está bem, então. Volto amanhã para te ver. – Diana disse se despedindo de Anne com um beijo na bochecha da ruivinha. Em seguida, passou pela porta sem sequer olhar para a cara de Sabrina.
Esta por sua vez, não perdeu tempo. Olhou para Anne e disse com a sua odiosa arrogância.
- Bem, o que quer falar comigo?
- Eu quero te falar de Gilbert. O Muddy te contou toda a história? - Anne perguntou sentindo um bolo se formar no seu estômago lhe causando náuseas.
- Você se refere ao fato de que Gilbert finalmente admitiu que sou a mulher certa para ele? Sim, ele me contou. - Anne sentiu sua náusea aumentar. Como suportaria aquilo? Ela respirou fundo e respondeu.
- O Gilbert está com amnésia, Sabrina. E por alguma razão ele pensa que você é a noiva dele.
- Pelo menos ele mostrou que tem bom gosto. - Sabrina disse passando a mão pelos cabelos, e analisando Anne de cima a baixo.
- Sabrina, eu não tenho tempo a perder com suas ironias. O que quero saber é se posso contar com você para visitar Gilbert amanhã à tarde? – Anne disse com paciência.
- Claro. Acha que eu perderia a oportunidade de ver a sua cara quando Gilbert me chamar de amor? - Os olhos de Sabrina eram pura maldade, e Anne se sentiu congelar por dentro. Mas, mesmo assim encontrou forças para dizer:
- Muito bem. Estamos acertadas então. Vou te esperar no hospital amanhã à tarde
- Pode me esperar que estarei lá. E antes de ir embora quero te perguntar uma coisa. - Sabrina disse com um falso sorriso.
- E o que é? - Anne perguntou se sentindo doente.
- Quem está rindo por último agora? - Sabrina riu sarcasticamente, e saiu pela mesma porta que entrou sem se despedir.
Assim que ela foi embora, Anne sentiu seu estômago se revirar. Ela correu para o banheiro e vomitou.
GILBERT
Era mais uma manhã ensolarada, onde um céu azul e incrivelmente sem nuvens tornava aquele dia ainda mais bonito. Esse cenário inspirador Gilbert conseguia ver da janela do seu quarto de hospital. Na verdade, ele preferia estar lá fora sentindo o calor do sol sobre a sua pele, e respirar o ar fresco que a brisa parecia trazer constantemente, mas ele ainda não tinha autorização para sair do quarto.
Segundo o médicos, ele precisava de mais uma semana de repouso, antes de se aventurar a andar pelo quarto sem a ajuda de ninguém. Felizmente, sua recuperação vinha acontecendo como o previsto. A atadura da cabeça já havia sido retirada, e as dores fortes que sentia antes afortunadamente tinham passado, porém, seu peito, local onde levará o tiro, continuava enfaixado, mas ele acreditava que em poucos dias já poderia também retirar o enorme curativo que envolvia o lugar.
Mas, nada daquilo o incomodava tanto quanto sua perda de memória. Ele passava os momentos em que estava sozinho tentando se lembrar de alguma coisa, e de fato, alguns lampejos de recordações vinham à sua cabeça, mas era algo tão rápido que não lhe dava tempo para organizar os pensamentos e juntá-los em um acontecimento inteiro. Isso o deixava extremamente preocupado, embora os médicos dissessem que as lembranças voltariam com o tempo, e tudo o que ele podia fazer era ter paciência, Gilbert não conseguis deixar de pensar em sua memória perdida.
Ele olhou para o relógio que havia no quarto e percebeu que faltava bastante tempo para Anne chegar. Ela vinha visitá-lo todos os dias, e ele ficava ansioso esperando pela chegada dela.
Gilbert se ajeitou melhor nos travesseiros, e suspirou, enquanto seus pensamentos o levavam por um caminho perigoso, que ele sabia não ser o certo, mas não conseguia evitar.
Sempre que Anne estava ali, lendo para ele, Gilbert a observava sem conseguir tirar os olhos dela. Ela era tão linda, e tinha uma pele suave que lhe dava vontade de tocar. Aquela voz que chegava aos seus ouvidos como poesia, o deixava incapaz de resistir às sensações que lhe causava, e aquela boca sensual que ele vinha sonhando em beijar mandava mensagens ao seu corpo que eram difíceis de ignorar. Ainda bem que ela não podia ver o que havia debaixo das cobertas, ou Gilbert morreria de constrangimento. Ele tentava não desejá-la, mas seus sentidos o traiam e ele se pegava imaginando como seria tê-la ali deitada ao seu lado com os olhos azuis cor de safira brilhando somente para ele
Gilbert vinha tentando esconder seus sentimentos em relação a Anne, para que ela não percebesse e não se assustasse com a ousadia dele em querê-la quando ambos estavam comprometidos. Mas, havia certas situações que ele não conseguia evitar, e acabava deixando evidente o seu interesse por ela.
Outro dia, enquanto ajeitava o travesseiro dele, Anne escorregara e ao tentar se equilibrar ela acabou se apoiando de leve no ombro dele, o que fez com que seus rostos ficassem perigosamente próximos, os labios quase se tocando e os olhares perdidos em suas próprias emoções. Por um segundo, Gilbert percebeu algo nos olhos de Anne que o fez se perguntar se ela não desejava aquele beijo tanto quanto ele, mas logo ela se recuperou daquele momento íntimo entre ambos e se afastara dele, e quando isso acontecera, Gilbert se sentira triste, como se uma barreira estivesse entre os dois que o impedia de chegar até ela. E a coisa mais estranha era que ele sentia que se a tomasse nos braços, saberia por antecipação qual seria a sensação.
Gilbert lançou um olhar para o relógio e viu impaciente que faltavam duas horas para Anne chegar. O que faria até lá para distrair seus pensamentos?
De repente, a porta se abriu e ele olhou para porta esperando que fosse Anne, mas ficou desapontado ao ver que era Mary. Ele gostava muito da mulher de Sebastian, mas não era ela que ele queria ali naquele momento.
- Oi, Mary. – Ele disse sem animação.
- Oi, Gilbert. Você estava esperando outra pessoa? - Mary perguntou intrigada.
- Não, por que? - ele mentiu, não queria que ninguém percebesse o seu interesse em Anne.
- Você fez uma cara tão decepcionada quando me viu, que achei que tinha chegado em uma hora ruim. - ela respondeu, ainda tentando encontrar algum indício do que Gilbert estava pensando.
- Foi impressão sua – Ele respondeu mantendo seu rosto sério.
- Gilbert, será que não estava esperando que fosse Anne? - ela perguntou diretamente, pois ela era o tipo de mulher que detestava rodeios.
- O que a faz pensar isso?
- Eu não sou boba Gilbert, e já percebi a maneira como olha para Anne quando ela está aqui. - Mary torcia para que aquele interesse que Gilbert estava demonstrando por Anne significasse que ele estava se lembrando da noiva aos poucos.
- Está tão óbvio assim? - ele perguntou se sentindo repentinamente tímido por falar sobre aquele assunto.
- Querido, você está sentindo algo por ela? - Mary perguntou sorrindo
- Não sei, Mary. Toda vez que ela está aqui é como se fosse o único lugar onde ela deveria estar. Às vezes tenho a impressão que tudo a respeito dela é um mistério, mas ao mesmo tempo tão familiar. Parece que já senti aquele cheiro de rosas que ela tem, e que já vi aquele sorriso maravilhoso que ela lança para mim quando está feliz, ou quando digo algo engraçado. É como se já tivesse sonhado ou visto antes em algum lugar todas essas pequenas coisas que fazem parte dela. Não é estranho? - Gilbert perguntou olhando para Mary de maneira incerta como se ele próprio tentasse entender a confusão de seus sentimentos.
- Não acho. Você deveria tentar explorar mais o que sente por Anne, pois assim poderia descobrir quais são os seus reais sentimentos.
- Eu tenho medo, Mary. – Gilbert confessou.
- Medo do que? – Mary perguntou intrigada.
- De descobrir que o que sinto é bem mais que atração física.
- Ainda não entendi. - Mary disse tentando fazer Gilbert falar um pouco mais sobre o que o estava incomodando.
- Ela tem noivo e me disse que o ama, e eu também estou comprometido. Eu tenho medo que ela me rejeite, e também não quero magoar minha noiva.
- Gilbert, arriscar faz parte de um relacionamento. Você precisa descobrir o que sente verdadeiramente por Anne, caso contrário acabará preso a outra garota por medo e perderá a chance de viver um amor de verdade.
Gilbert assentiu concordando com Mary, e ainda ficou pensando nisso quando ela o deixou meia hora depois.
Ele precisava realmente compreender seus sentimentos, e por que ficar perto de Anne o fazia esquecer de tudo como se a única coisa que importasse era tê-la por perto.
Por outro lado, ele não podia esquecer que tinham compromissos com outras pessoas que não mereciam se magoar com o que inesperadamente estava acontecendo. Gilbert nem tinha certeza se Anne sentia o mesmo que ele, mas era algo que estava disposto a descobrir.
GILBERT E ANNE
Anne chegou ao hospital naquela tarde um pouco apreensiva em como seria o encontro de Gilbert e Sabrina. Algo lhe dizia que não seria nada fácil para ela vivenciar aquele momento, mas não conseguia ficar longe, era como se precisasse estar ali para proteger Gilbert das investidas daquela garota que parecia estar se divertindo com a situação de Anne.
No dia anterior, depois que Sabrina fora embora Anne chorara um rio de lágrimas novamente, parecia que havia dentro dela um oceano inteiro o qual ela não conseguia evitar que transbordasse cada vez que se sentia fragilizada, e naquele momento estava se sentindo tão fraca que achou que não suportaria mais aquela provação. Passara o resto do dia trancada em seu quarto, e quando Marilla voltara do passeio com Matthew a encontrou deitada na cama embaixo das cobertas, em um dia em que estava quente demais para isso.
- Anne, querida. Está se sentindo mal? - a boa mulher perguntou preocupada.
- Acho que estou gripada, Marilla. Não é nada demais. - Anne mentiu, estava se sentindo péssima, mas não era a enfermidade do corpo que a afligia e sim a de sua alma. Estava cansada, e se sentia sem forças para lutar contra os seus esqueletos do armário. A única coisa que queria era dormir o resto da vida.
- Vou verificar sua temperatura. - Marilla disse, pegando um termômetro e medindo a temperatura de Anne. Depois de alguns segundos, ela percebeu que Anne estava apenas febril, mas a palidez do rosto inspirava preocupação.
- Viu preparar uma sopa para você. Quase não tem se alimentado, deve ser por isso que está se sentindo mal assim.- Marilla saiu do quarto enquanto Matthew se sentava ao lado da cama de Anne e perguntava:
- Querida, o que está acontecendo? Você não me parece nada bem.
- Matthew, sinto tanto a falta de Gilbert. Queria que ele estivesse aqui comigo. - Anne disse com os olhos lacrimejantes.
- Anne, eu sei o quanto isso tem sido duro para você, e te admiro demais por ter conseguido se levantar todas as manhãs e levar sua vida da melhor maneira possível Outra pessoa em seu lugar já teria desistido. – Matthew disse com as mãos dela entre as suas.
- Acho que não consigo mais, Matthew. Minhas forças se acabaram.
- Você consegue, Anne, esqueceu que te conheço bem? Já te vi nas piores situações sempre lutando pelas coisas que acredita, e tenho certeza de que não vai recuar agora. Você precisa apenas de uma trégua, de um descanso, e deixar que outras pessoas cuidem de você para variar. - Ele acariciou os cabelos dela com carinho.
- Dói tanto, Matthew. Não consigo respirar. – Anne apontou para o próprio coração.
- Meu amor, você está magoada e ferida, é natural que se sinta assim, mas saiba que seu velho pai está aqui, se apoie em mim se precisar. Você não está sozinha, querida. - Anne deitou a cabeça no colo de Matthew e se deixou ficar assim, até que Marilla apareceu com a sopa e fez Anne comer cada colherada, ignorando as caretas que a menina fazia. Mais tarde, fez Anne se levantar e tomar um banho, e quando voltou para a cama, ela caiu em um sono profundo.
Ao amanhecer já estava melhor. Matthew tinha razão, ela era mais forte que pensava e tinha que continuar lutando por ela mesma e por Gilbert, mesmo que ele nunca mais se lembrasse dela, ela ficaria ao lado dele, pois não conseguia se ver em nenhum outro lugar.
A chuva do dia anterior tinha ido embora, e deixara no ar a sensação de frescor que fazia tudo o mais parecer leve e suave. Era um bom presságio acordar em uma manhã tão ensolarada como aquela, já bastava a escuridão dentro dela, não precisava de outro dia triste para deixá-la pior. Estava agradecida pelo sol matinal trazer um pouco de luz ao seu coração.
Anne tomou café com Matthew e Marilla, e depois realizou algumas atividades em Green Gables, mesmo Marilla lhe dizendo que deveria descansar. Estava ansiosa demais, e não suportaria esperar pelo momento de encontrar Gilbert e Sabrina sem ter o que fazer.
Assim, logo após o almoço em Green Gables, Anne começou a se arrumar. Ela vestiu um vestido azul de saia rodada e mangas curtas, e sapatilhas brancas. Os cabelos, ela preferiu deixá -los soltos, e como acessório ela usou um par de brincos de pérola, e a pulseira de gotas azuis que Gilbert lhe dera no seu aniversário de dezesseis anos.
Jerry passou para buscá-la e levá-la até o hospital a pedido de Diana. A amiga se oferecera para ir com ela, mas Anne recusara, pois precisava enfrentar aquilo sozinha.
- Você está bem? - Jerry perguntara assim que chegaram ao hospital.
- Sim, não se preocupe. – Anne disse com um sorriso triste.
- Anne, quero que saiba que não precisa ser forte o tempo todo. Você tem amigos que te amam e que te apoiam. Eu sei que não temos estado juntos como antigamente, mas continuo sendo seu amigo. Por isso se precisar de mim, estou aqui. - Anne olhou para ele com carinho, o abraçou e respondeu:
- Obrigada, meu amigo. Sei que posso contar com você tanto quanto você pode contar comigo. Sou lhe muito grata por isso. - ela deu-lhe beijo no rosto.
- Quer que eu entre com você? - Jerry perguntou assim que a viu sair do carro.
- Obrigada, mas não é necessário. Acho que consigo dar conta disso sozinha.
- Tudo bem, então. Eu venho mais tarde te buscar. - Jerry disse. Então, Anne se despediu com um aceno e entrou no hospital.
Quando chegou ao quarto de Gilbert, ele estava sozinho, o que tudo indicava que Sabrina ainda não tinha aparecido. De certa forma, Anne se sentiu aliviada, pois teria algum tempo sozinha com Gilbert.
Quando ele a viu entrar seus olhos se iluminaram de tal maneira que fez Anne corar. Ele estava tão lindo que fez o coração dela suspirar ao observar os cachos escuros caindo em sua testa, o rosto relaxado e aquele sorriso que tinha o poder de encantá-la com sua luz, fazendo-a se sentir única aos olhos dele.
- Você demorou a chegar. - Gilbert disse observando todos os detalhes de sua aparência, inclusive a pulseira que pareceu lhe lembrar algo, mas logo a sensação desapareceu.
- Eu tenho certeza de que não estou atrasada. - Anne disse consultando o relógio da parede.
- Eu sei que não está. É que eu estava ansioso pela sua chegada. - Anne ouviu as palavras de Gilbert e uma alegria inesperada tomara conta de seu coração. Então, Gilbert sentia sua falta? Era bom saber que o sentimento dele por ela ainda estava vivo de alguma forma.
- Bem, estou aqui. – Ela disse sorrindo. - Eu trouxe outro livro para lermos juntos.
- Será que você se importaria de apenas conversarmos? – Gilbert perguntou olhando-a intensamente.
- Claro. Sobre o que quer falar? - ela disse colocando o livro de lado.
- Primeiro quero que se sente mais perto de mim. - Gilbert disse apontando para a cadeira ao lado de sua cama. Anne fez o que ele tinha dito, e então perguntou:
- E então?
- Quero que me conte um pouco de você. Temos conversado de várias coisas, mas você nunca me fala muito sobre sua vida.
- Bem, como sabe sou órfã. – E assim Anne passou os próximos minutos contando detalhes sobre sua vida que Gilbert sabia, mas tinha esquecido.
E enquanto ela falava, Gilbert olhava para ela e pensava que nunca tinha visto uma garota tão linda como aquela. O rosto de traços delicados que lhe dava ar de anjo etéreo e perfeito, a cabeleira ruiva que lhe caia até a cintura como se fosse um manto de seda rubra, os olhos azuis que o fascinavam pelo seu brilho, e os lábios rosados que eram sua perdição. Como queria beijá-la! Daria tudo por um leve roçar daquela boca na sua.
Sem pensar ele levou as mãos ao rosto dela, fazendo Anne se calar no mesmo instante. Seus olhos se prenderam nos dela o que pareceu uma eternidade, e a maciez da pele dela em seus dedos fez Gilbert dizer
-Você é tão linda, que não consigo tirar os olhos de você. – Seus dedos traçaram cada linha do rosto dela, e Anne fechou os olhos deliciada. A quanto tempo Gilbert não a tocava assim? Era apenas uma simples carícia, mas que para ela significava o mundo inteiro.
Ela abriu os olhos e percebeu que ele estava tão perto que bastaria um movimento de cabeça para que seus lábios se perdessem nos dele. Mas, ela decidiu esperar que ele tomasse a iniciativa, pois não queria que ele percebesse o quão ansiosa estava pelo beijo dele.
- Não quero parecer desrespeitoso por sua condição de garota comprometida, e também não quero te dar a impressão de que estou me aproveitando da situação. Mas, você se ofenderia se eu te dissesse o quanto estou louco para beijá-la? - Anne quase perdeu o fôlego ao ouvir Gilbert dizer aquilo. Ela também queria muito que ele a beijasse, parecia que faziam anos que isso tinha acontecido pela última vez.
- Gilbert, eu...- mas foi interrompida por uma voz que disse estridente:
- Amor, que saudades! - Anne se virou a tempo de ver Sabrina se aproximar da cama com seu rebolado exagerado dos quadris.
Ela passou por Anne, sem sequer cumprimentá-la, indo direto para onde Gilbert estava. Sem que ele pudesse esboçar qualquer reação, ela o abraçou e capturou os labios dele em um beijo quase escandaloso.
Anne observou a cena por um segundo, chocada demais para tomar qualquer atitude. Ela sentiu a tão conhecida dor tomar conta de todo o seu ser enquanto pensava que Sabrina roubara o beijo que deveria ser dela. Então, ela decidiu ir embora, pois não suportaria ver o homem que amava nos braços daquela garota cínica e hipócrita nem mais um minuto.
Ela caminhou até a porta e saiu do quarto, sem olhar para trás. Mas, se tivesse olhado, ela teria visto Gilbert interromper o beijo e afastar Sabrina dele como se sentisse nojo pela garota, e ver Anne indo embora com pesar, pois tudo o que queria era que ela ficasse.
Ele olhou para a garota morena que lhe sorria maliciosamente, e não conseguia acreditar que ela fosse sua noiva. Sabrina era bonita, ele não podia negar, mas parecia uma beleza vazia se comparada a Anne.
Por que tinha pedido que ela viesse vê-lo, se não conseguia sequer suportar o olhar que ela lançava sobre ele? Gilbert apenas desejava que ela fosse embora, e que Anne voltasse com sua presença vibrante que lhe fazia tão bem.
Porém, naquele instante, Anne caminhava para fora do hospital com lágrimas descendo silenciosas pelo seu rosto. A tarde continuava linda, mas dentro dela o sol tinha se apagado e uma tormenta impiedosa e fria começara a cair dentro dela outra vez.
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