Capítulo 20- No calor dos seus braços.
ANNE
A época da colheita tinha recomeçado, e por esta razão, as aulas na escola tinham sido suspensas por alguns dias. Assim Anne teria mais tempo livre para se dedicar aos seus passatempos favoritos, como visitar Diana com mais frequência, por exemplo, pois Gilbert ajudaria Bash na fazenda e só poderiam se ver à noite. Andara negligenciando a amiga ultimamente, ela bem sabia disso, mas com a doença de Marilla e o namoro com Gilbert sua vida tinha ficado atarefada demais e tivera que abrir mão de algumas coisas.Por isso, esperava consertar essa sua pequena falta ainda naquela tarde.
Ela e Diana combinaram de ter seu café da tarde no clube de leitura, pois fazia uma década que nenhuma das duas aparecia por lá. Desta forma, parecera uma boa ideia passar algumas horas juntas naquele espaço em que ambas tinham construído a tanto tempo atrás.
Encontraram-se no caminho para a floresta e chegaram juntas ao velho clubinho. Quando abriram as cortinas que usavam como porta, Diana começou a tossir e disse;
- Meu Deus, Anne! Como esse lugar está empoeirado!
- Tem razão, Diana. Faz tempo que não venho aqui e o seu estado é lastimável. - olhou ao redor e viu que as chuvas da estação tinham feito certos estragos. Alguns de seus livros tinham embolorado por causa da umidade e havia muitas folhas secas cobrindo o chão. Ainda bem que Anne sempre guardava itens como vassoura e esfregões de limpeza por ali, assim puderam fazer uma faxina rápida e deixar tudo limpo e organizado.
Trouxeram chá gelado em uma garrafa térmica,assim como bolinhos de fubá, torradas e geleia. Anne serviu a bebida em xícaras de porcelana que pegara emprestadas de Marilla, pensando que dariam certo ar de requinte naquele ambiente tão simples.mas encantador.
- Então, me conte sobre seu namoro com Gilbert. Creio que estão se dando bem agora ou estou enganada? – Diana perguntou, enquanto mordia uma torrada com geleia.
- Estamos nos dando maravilhosamente bem. Gilbert é uma pessoa incrível. Quando eu o conheci pensei que ele fosse um tanto quanto arrogante, consciente demais de sua inteligência. Mas, hoje percebo o quanto estava enganada. Ele é gentil, engraçado e muito romântico. Cada dia que passa estou mais apaixonada por ele. - enquanto Anne falava Diana viu os olhos dela brilharem deixando-a ainda mais bonita,e sorriu satisfeita.
- Eu sempre te disse isso, mas você nunca acreditou. Gilbert é assim desde criança. Nunca foi de falar muito, principalmente com meninas, e quando tinha que conversar com alguma colega de classe ou conhecida se mostrava bastante tímido. Isso foi mudando ao longo dos anos conforme ele foi crescendo, tornando-se um menino muito bonito e cobiçado por todas as meninas. Mas ele nunca demonstrou muito interesse. Era sempre educado e formal, um perfeito cavalheiro, mas nunca o vi olhar duas vezes para uma garota a não ser para você. Acho que esse seu temperamento forte pegou-o de jeito. - disse Diana, dando um tapinha na mão de Anne.
- Acho que ele me pegou de jeito também. - Anne sorriu. – Nunca pensei que iria me apaixonar. Achava que ficaria uma solteirona como Marilla. Olha só o que o destino me preparou.
- Te deu um enorme presente, isso sim. Garotos como Gilbert não são fáceis de encontrar.
- E o Jerry?- Anne se serviu de mais um pouco de chá.
- Jerry é perfeito para mim. Me trata como uma verdadeira dama.Nunca discutimos por nada. Ele é muito romântico também. Quando estamos sozinhos, ele me fala frases tão lindas de amor em francês que me trazem lágrimas aos olhos.
- E a sua mãe?Aceitou o namoro de vocês?
- Depois que passou a conhecer o Jerry melhor, ela começou a mudar sua opinião sobre ele. Ah, esqueci-me de te contar uma novidade. Tia Josephine escreveu e disse que quando o Jerry tiver idade suficiente, ela vai pagar os estudos dele em Paris.Não é maravilhoso? Jerry vai realizar o sonho de ser advogado.
- Fico tão feliz por vocês, Diana!- Anne pegou as mãos da amiga nas suas. – Vocês dois merecem ser felizes.
_ Eu também poderei ir a Paris terminar meus estudos como minha mãe tanto deseja. Já imaginou Jerry e eu na cidade do amor? Não é perfeito?
- É claro que sim. Tudo acabará bem afinal.
- Meu pai já morre de amores pelo Jerry, pois o considera muito trabalhador e esforçado, além de bastante inteligente.
- Vocês têm planos para essas nossas pequenas férias?
- Vamos nos ver todos os dias, e talvez ir até a cidade para tomarmos sorvete ou irmos ao cinema. E você e Gilbert?
- Não fizemos planos. Gilbert vai trabalhar com Sebastian na fazenda e creio que estará exausto até a noite. Então, preferimos ficar juntos em casa mesmo. Talvez no fim de semana a gente vá até a praia, mas não combinamos fazer nada de muito especial.
- E Marilla? Como ela está?
- Ela está ótima. Já voltou a velha forma. Mas, o médico recomendou que ela use óculos para ajudar a amenizar as dores de cabeça.
- Que bom, Anne. Graças a Deus o problema não foi tão grave quanto vocês pensaram..- Diana colocou a xícara vazia de volta no pires, sentindo-se satisfeita .
- Sinto-me muito aliviada. Fiquei apavorada coma ideia de perdê-la. Felizmente Gilbert estava lá para me ajudar a suportar todas aquelas horas de tensão.- Anne suspirou com a lembrança daquele dia.Gilbert fora seu salvador,estava a ponto de entrar em desespero quando ele aparecera e fizera toda sua angústia desaparecer. Ela o amara mais ainda por isso.
- Nada como um pouco de amor para fazer com que tudo fique bem melhor na vida. Não concorda? – Diana puxou de leve as tranças da amiga, o que fez Anne rir alto.
- Diana,você e sua filosofia romântica.- Anne disse sorrindo.
- Você não me contou sobre a prima de Ruby que apareceu no aniversário de Gilbert. Como ela é?- perguntou Diana curiosa.
- Bem, a princípio quis esganá-la só de vê-la perto de Gilbert toda cheia de intimidades. Mas sabe que depois que ele nos apresentou ela se mostrou muito simpática? Disse-me até que estava torcendo por nós dois. Gostei dela, Elisabeth me pareceu uma garota muito sincera, e também disse que quer me conhecer melhor quando voltar a Avonlea, pois acredita que seremos grandes amigas.
- Devo sentir ciúme desta pretensa rival por sua amizade? – Diana perguntou com tanta sinceridade que fez Anne rir.
- Diana, você sabe que é minha melhor amiga, e ninguém nunca tomará seu lugar em meu coração. - Anne abraçou a menina com carinho.
- Que alívio. Por um segundo pensei que teria dividir você com essa garota.
- Não seja boba. Seremos amigas para sempre.
- E como a Ruby tem se comportado? Não a tenho visto muito ultimamente. E na escola ela quase não fala comigo. Parece que ficou ressentida por eu apoiar seu namoro com Gilbert.. – Diana descansou o queixo nas mãos enquanto esperava pela resposta de Anne.
- Ela ainda continua muito zangada, e não acho que me perdoará um dia. – uma sombra triste passou pelos olhos de Anne.
- Anne, esqueça a Ruby. Não é culpa sua se o Gilbert não se apaixonou por ela. Na verdade, ele nunca mostrou nenhum tipo de interesse. Não sei por que Ruby nunca desistiu dele. Eu no lugar dela já teria partido para outra a muito tempo.
- Bem, dizem que o primeiro amor a gente nunca esquece. - Anne usou um velho ditado que sempre ouvira na boca de muitas pessoas que conhecera.
- Só que esse amor Ruby vai ter que esquecer, pois ele já tem dona. - Diana disse exagerando em suas expressões faciais, o que fez Anne dar uma enorme gargalhada.
- Diana, Gilbert é meu namorado, não minha propriedade. Então, não posso ser dona dele. – Anne corrigiu a amiga docemente.
- Você me entendeu, Anne. Foi só um modo de dizer.
- Eu entendi, só estava brincando. -– disse Anne segurando o riso.
- Mudando de assunto. Você notou que a Josie Pye andou tristonha na escola esta semana?- perguntou Diana.
- Para falar a verdade não percebi não. Ela me irrita tanto que não faço questão nem de olhar para ela. – disse Anne.
- Parece que o Billy Andrews terminou o namoro com ela no dia do aniversário do Gilbert.
- Se desentenderam?- Anne se lembrou do banho de mar que dera nela naquele mesmo dia, e quase riu da cena que se formou em sua mente.
- Não. Muddy me contou que Billy ficou interessado na prima de Ruby, e por isso, não quis mais saber da Josie. Billy até pediu para Muddy apresentá-los.. - contou Diana.
- É mesmo?
- Sim, e pelo que entendi ele e Elisabeth se entenderam muito bem.
- Não pensei que Elisabeth se interessaria por alguém como o Billy. Ela parece ser uma menina tão inteligente enquanto Billy é aquele grosseirão de sempre. Ainda não esqueci o que ele tentou fazer comigo no clube de leitura. - Anne estremeceu ao lembrar-se daquele episódio que agora parecia estar anos luz dela.
- Talvez ela prefira os canalhas. Isso explicaria porque ela não se interessou tanto pelo Gilbert. - Diana comentou.
- Graças a Deus! Não aguento mais tanta concorrência pelo meu namorado. - disse Anne fingindo um ar afetado, e então, as duas riram divertidas.
- Anne, você já experimentou estes bolinhos de fubá? Estão divinos. - Diana fechou os olhos para saborear melhor os bolinhos.
- Devem estar mesmo, pois eu mesma os fiz.
- Tinha me esquecido do quanto você cozinha bem. Já pode casar. - Diana viu Anne corar e se divertiu com a cena.
- Deixa isso para lá, Diana. Ainda é muito cedo para falarmos em casamento. Quero estudar primeiro, me formar como professora, aí quem sabe posso pensar no assunto.
- Eu não. Eu casaria amanhã se o Jerry me pedisse. - Anne olhou para a amiga e viu que ela já estava imaginando a cerimônia de casamento, a festa, a lua de mel e tudo o mais.
- Você é mesmo uma romântica incorrigível. - Anne disse, balançando a cabeça.
- O que você fará se o Gilbert te pedir em casamento? – Diana olhou para a amiga curiosa.
- Diana, o Gilbert só tem 17 anos. Não acha que ele é muito jovem para querer se casar?
- Bem, meu pai diria que ele já é um homem e pronto para constituir família. – Diana respondeu.
- Gilbert tem muitos planos para o futuro. Ele quer ser médico, e não acho que ter uma esposa seja um deles por or. .- Anne passou as mãos pelos cabelos distraída.
- Mas você aceitaria se ele te pedisse?- insistiu Diana.
Anne sabia a resposta antes de dizê-la para Diana. É claro que aceitaria. iria com Gilbert aonde ele quisesse, faria o que ele quisesse sem sequer questionar nada. De repente, Anne percebeu o quanto estava envolvida em seu amor por Gilbert e isso a assustou. Sempre tivera um espírito livre, independente e nunca se apegara a ninguém, pois sabia o que isso significava e não queria sofrer com perdas ou despedidas. Mas Gilbert era outra história. Ele a fizera baixar a guarda e tomara conta de seu coração completamente, e ela não sabia o que faria se o perdesse.
- Não pensei nisso ainda. Como disse, acho muito cedo para me preocupar com esse tipo de coisa. - por fim respondeu um pouco incomodada por Diana ter abordado aquele assunto.
- Bem, então teremos que ver o eu acontece. - disse Diana, depois olhou para os bolinhos que restavam e perguntou com os olhos brilhando de gula. – Não vai mesmo comer esses bolinhos?
- Não, Diana. Fique a vontade e coma todos se quiser. – respondeu Anne, aliviada pela amiga ter mudado de assunto.
- Que tal me desafiar para uma partida de xadrez? Muddy me disse que Gilbert andou te ensinando a jogar. - perguntou Diana, assim que terminou de comer.
- É verdade. – disse Anne.
- Bem, então vou te dar uma surra neste jogo. Passei a vida toda jogando com meu pai e sei de todas as estratégias. – brincou Diana.
- É mesmo? Pois vou te mostrar que você não é páreo para mim. - disse Anne aceitando o desafio.
- Que vença a melhor. - respondeu Diana divertida.
Assim, passaram o resto da tarde se divertindo, curtindo a companhia uma da outra, sem se preocupar com o que o futuro reservava. Eram jovens e tinham todo o tempo do mundo.
GILBERT
Fazia um calor impiedoso e Gilbert tinha a sensação de que estava trabalhando sob uma temperatura de quarenta graus. Encontrou uma sombra convidativa embaixo de uma árvore frondosa, e decidiu fazer uma pausa do trabalho árduo da colheita que ele, Bash e alguns homens que contrataram para trabalhar na fazenda estavam envolvidos desde manhã.
Acomodou-se no chão, encostando suas costas no tronco da árvore, e abriu a garrafa térmica que trouxera consigo. Encheu um copo com o líquido que havia dentro dela, e se deliciou com uma saborosa limonada que Mary preparara antes que eles saíssem para o trabalho.
Bash fizera um excelente trabalho com a plantação de milho, Gilbert pensara. E por isso, teriam uma colheita farta, o que significava bons lucros para eles naquele ano. As coisas tinham melhorado consideravelmente desde que Bash viera morar com ele na fazenda, pois Gilbert nunca tivera muito jeito para plantar ou colher, mas Sebastian estava acostumado a esse tipo de trabalho desde criança, pois vivera em uma fazenda como aquela junto com seus pais. Por esta razão, não tivera nenhuma dificuldade em lidar com as terras de Gilbert, fazendo-as prosperar como nunca.
Gilbert pouco ajudara com o plantio, pois Sebastian não permitira. Queria que ele se dedicasse aos estudos, e o ajudasse somente quando estivesse livre das tarefas da escola, com o que Mary concordara plenamente. Então, naquela semana, como não teria aulas na escola, Gilbert se juntara a Bash na colheita, e até que estava se divertindo. Não era um trabalho fácil, mas Sebastian transformava qualquer atividade em algo bastante agradável.
A única coisa que o incomodava um pouco era que ficava longe de Anne. Embora se vissem à noite, ele sentia muito a falta dela. Acostumara-se a tê-la por perto durante boa parte do tempo, pois ficavam juntos na escola todos os dias, e muitas vezes estudavam na casa de Gilbert durante a tarde. Por isso, tinha que fazer um esforço enorme para não se distrair com seus pensamentos durante o trabalho que demandava muito de sua atenção.
Desde seu aniversário sentia-se diferente, mais apaixonado, se isso fosse possível, e completamente envolvido sentimentalmente. Sabia que Anne o afetava fisicamente e a atração por ela aumentara perigosamente., a um ponto em que atrapalhava sua concentração. Passava a maior parte do tempo pensando nos beijos dela, naquele corpo que se encaixava tão bem no seu, naqueles olhos que tocavam seu coração.
Ele a queria e a desejava de um jeito que não era nem um pouco prudente para nenhum dos dois, e ele sabia que Anne se sentia do mesmo jeito, pois a maneira como correspondia a cada beijo que trocavam lhe mostrava que a paixão que sentiam era mútua. Ele não conseguia resistir àquela sensualidade natural que vinha dela, estava enfeitiçado pela beleza dela, a maciez de sua pele e delicadeza de cada curva de seu corpo. Cada vez que a tocava era uma nova descoberta, e fazê-la vibrar em seus braços lhe causava uma sensação incrível.
Anne também o vinha surpreendendo com certas atitudes que Gilbert jamais pensara que seriam típicas dela. Quando o vira conversando com Elisabeth na praia, ela se aproximara deles e o abraçara mostrando certa possessividade em relação a ele que Anne nunca fizera antes. Fora como se a ruivinha quisesse mandar um recado para Elisabeth de não se aproximar demais, ou teria sérios problemas. Secretamente Gilbert adorara aquilo tudo, pois ver Anne defender o relacionamento deles contra influências externas o deixara exultante e feliz. Anne era surpreendente, ele não se cansava de dizer. Quando pensava que já conhecia todas as facetas dela, a garota surgia com outra ainda mais fascinante que era quase impossível não se deleitar com as diferentes personalidades que a tornavam inesquecível. Ele nunca mais seria o mesmo depois te tê-la conhecido, disso Gilbert tinha certeza.
- Aceita companhia, ou te atrapalho?- disse Sebastian com seu sorriso largo de sempre.
- Claro Bash. Você não atrapalha de jeito nenhum. Fique a vontade. Está um calor insuportável, não acha?- Gilbert passou a mão pela testa ensopada de suor.
- Bem, venho de um país onde é calor assim quase o tempo todo, então, essa temperatura elevada não é surpresa para mim. O que está tomando?- perguntou Sebastian, ao ver Gilbert com um copo na mão.
- Limonada. Mary a preparou hoje de manhã. Está uma delicia. Quer um pouco? – estendeu a garrafa térmica na direção do amigo.
- Nem precisa perguntar. Adoro as limonadas da minha esposa. – encheu um copo e tomou um grande gole da bebida gelada, deixando transparecer em seu rosto o prazer que sentia com o frescor que sentia. Depois olhou para o menino com curiosidade e disse:
- Você está com uma cara de bobo. Já sei, está sonhando com sua ruivinha. – O amigo brincava, Gilbert sabia, mas mentalmente saboreou aquelas palavras "sua ruivinha", e o significado delas deixou-o eufórico. Anne lhe pertencia, era assim que ele a via agora, mas não pensava naquelas palavras como se atestassem que ele era o dono da menina. Anne era dele em seu coração, e isso queria dizer que eram parte um do outro e jamais se separariam se dependesse dele.
- Não vou negar que estava pensando nela. Boa parte do tempo ela é a primeira coisa na qual penso quando acordo de manhã, e a última quando me deito na cama à noite. Nunca pensei que a paixão fosse dessa maneira arrebatadora e envolvente. Ela me enfeitiçou completamente. Como isso é possível? – Gilbert olhava para o horizonte como se falasse consigo mesmo.
- Bem, quando amamos é dessa forma que nos sentimos, arrebatados, como você mesmo disse poucos segundos atrás.
- Tudo é tão diferente com ela. Já me interessei por garotas antes, mas nunca pensei nelas duas vezes seguidas. Até pensei que fosse imune ao amor, e sempre fiz piadas com meus amigos sobre isso. Mas cá estou eu, completamente rendido e parecendo um idiota. - Gilbert riu de si mesmo.
- O poder do amor é maravilhoso, Gilbert. Pode curar muitas feridas, além de abrir nossos olhos para horizontes maiores que o nosso. – Gilbert balançava a cabeça concordando com o amigo.
- Tem razão, Sebastian. Nunca me senti tão vivo como quando estou com Anne. Ela transformou a minha vida, e hoje consigo ver outras cores além do cinza. Quero viver minha vida com ela, quero me casar, ter nossos filhos. Assim que me formar médico, vou fazê-la minha esposa. - o menino tinha os olhos sonhadores, como se pudesse enxergar o futuro ali naquele instante a sua frente.
- Já conversou com Anne sobre isso? – perguntou Sebastian.
- Não exatamente.
- Então, converse antes de fazer planos para não ter surpresas pelo caminho. Anne não me parece o tipo de garota que permite que tomem decisões por ela.
- Você está certo. Falarei com Anne sobre isso no devido tempo.
- Só não demore muito, pois ela pode ter seus próprios planos e seria muito bom verificar se encaixam com os seus.- aconselhou Sebastian.
- Farei isso sim, com certeza. Obrigado, Sebastian.
- Disponha meu amigo. Agora, acho melhor voltarmos para o trabalho Temos ainda muito milho para colher. - deu um tapinha no ombro do menino.
- Claro. Ao trabalho. - sorriu Gilbert.
Passaram as duas seguintes trabalhando vigorosamente, até que Sebastian disse:
- Creio que terminamos por hoje. Vá para casa, Gilbert. Eu vou acabar de arrumar tudo por aqui e então também irei descansar. Diga a Mary que me espere para o jantar.
- Está bem. Nos vemos mais tarde. – Gilbert se despediu e foi para casa ansioso pelo momento em que encontraria Anne. Já estava morrendo de saudades daquela ruivinha de personalidade marcante.
Em toda a sua pressa de chegar em casa não percebeu que alguém o observava estrategicamente escondido atrás do celeiro. Assim que o menino passou pelo jardim, um vulto o acompanhou até a varanda indo se esconder atrás de uma árvore no quintal e pensou; "Esperarei pelo momento certo, nem que eu tenha que ficar aqui a noite toda."
GILBERT E ANNE
Ao entrar rm casa, Gilbert acabou esbarrando em Mary que vinha da cozinha apressada.
- Nossa, Mary! Por que tanta pressa? – o menino percebeu que ela estava agitada.
- Que bom que você chegou, Gilbert! Aconteceu um imprevisto e vou ter que sair. - Mary disse toda afobada.
- Vai sair agora e sozinha? Mary, você acha que é prudente? Não tem se sentido muito bem nos últimos dias, e acho que você sair assim sem companhia é perigoso. Por que não espera o Sebastian? Ele não demora a chegar. – Gilbert disse preocupado.
- Não posso esperar por ele. Uma amiga minha me pediu para que eu a ajudasse com um bolo de aniversário para a sobrinha dela . O aniversário é amanhã e a confeiteira que ela contratou ficou doente, e ela está desesperada .- Mary explicou apressadamente.
- Mas Mary. Você vai ter que ficar de pé por algumas horas e não acho que isso seja uma boa ideia. Você precisa pensar no bebê.
- Gilbert, não se preocupe. Prometo que não vou me cansar. Posso muito bem cuidar do bolo sentada. Além do mais é um trabalho leve. - Mary tocou no braço do menino com carinho.
- Mas como você vai chegar até a casa dessa amiga? Não me diga vai andando?
- Claro que não. Ela vem me pegar de carro .- Mary acabou de falar e ouviram uma buzina insistente.- É ela. Preciso ir. O jantar está pronto. Vocês só terão que esquentá-lo. Deixei um assado no forno, e verdura e legumes cortados e lavados na geladeira para a salada. Se quiserem sobremesa tem sorvete no freezer. Agora tenho que ir. Diga a Sebastian que não vou demorar. - Beijou Gilbert no rosto e saiu pela porta rapidamente.
O menino só balançou a cabeça. Mary era tão teimosa quanto Anne. Quando metia uma coisa na cabeça ninguém a convencia do contrário. Parece que ele e Sebastian tinham uma queda por mulheres voluntariosas. Foi até a cozinha, abriu a geladeira e se serviu de um pouco de água gelada, depois subiu as escadas e foi em direção de seu quarto. Estava louco por um banho depois de trabalhar o dia todo embaixo daquele sol escaldante. Além disso, Anne logo chegaria e ele queria estar pronto quando ela aparecesse. Entrou no chuveiro assoviando, enquanto abria a torneira do chuveiro e deixava que a água fria refrescasse seu corpo suado do trabalho.
No andar de baixo a porta da frente havia sido deixada entreaberta. O vulto viu quando Mary entrara no carro e fora embora. Então, ele saiu de trás da árvore e entrara na casa. Olhou ao redor e viu que Gilbert não estava ali. Subiu as escadas sorrateiramente e procurou pelo quarto do menino. Avançou pelo corredor, viu uma porta entreaberta e resolveu arriscar. Ouviu a água do chuveiro correndo e percebeu que sua intuição estava certa. Aquele era mesmo o quarto de Gilbert.
Olhou ao redor e viu que tudo ali tinha a cara de seu dono. Era aconchegante, apesar de ser desprovido de coisas superficiais. As paredes eram pintadas de branco, e no canto do quarto havia uma estante cheia de livros com títulos variados. Havia também uma mesa de estudos onde vários cadernos de anotações, lápis, borracha e canetas estavam caprichosamente arrumados.
O vulto andou pelo quarto e chegou até a cama onde se sentou sem cerimônia. Pegou o travesseiro de Gilbert e o abraçou com força, sentindo o perfume almiscarado que ele usava. Levantou os olhos, e deu de cara com um retrato de Anne que cobria toda a parede. Seus olhos se estreitaram de ódio e seu coração se apertou dentro do peito. Tinha que admitir que Cole fizera um excelente trabalho, pois conseguira captar a alma da ruivinha naquele retrato, mas mesmo assim não podia deixar de pensar que era o seu retrato que deveria estar ali, e não daquela garota que aprendera a desprezar. Anne tinha destruído seu sonho e faria o mesmo com ela. Ficaria ali até Gilbert sair do chuveiro, pois sabia que longe dos olhares de todos teriam mais chances de se acertar. Olhou para o retrato novamente e sorriu maldosamente. Pagaria Anne com a mesma moeda, e a menina nunca mais trataria seus sentimentos com desprezo. Diante deste pensamento, encostou sua cabeça na cabeceira da cama e esperou pacientemente para falar com Gilbert. Não estava com pressa, tinha a tarde toda livre para conseguir o que queria.
Enquanto isso, Anne se preparava para encontrar Gilbert. Ela e Diana tinham passado uma ótima tarde juntas, e quando voltaram para casa sentiam que seus laços de amizade tinham se estreitados mais ainda. Eram como irmãs e não importava o quanto estivessem distantes fisicamente, em seu coração estariam sempre unidas..
Uma hora depois, a menina se despediu de Matthew e Marilla e se dirigiu para a casa de Gilbert. Caminhava bem rápido, pois queria encontrar logo com o namorado. Assim que pôs os pés na fazenda do menino, viu Sebastian saindo do celeiro e disse:
- Olá, Sebastian. Como está?
- Estou bem Anne. Veio encontrar com o Gilbert? – viu a menina assentir e continuou. - Ele foi para casa já faz um tempo. Creio eu deve estar ajudando Mary com o jantar.
- Irei até lá, então. Obrigada. - se despediu e marchou em direção à casa..
Viu que a porta estava aberta e entrou chamando por Mary e Gilbert, mas não os encontrou em lugar algum. por esta razão,imaginou que Gilbert deveria estar em seu quarto. Resolveu subir e avisá-lo que tinha chegado, e depois o esperaria na sala de jantar.
A porta do quarto de Gilbert estava apenas encostada, ela abriu-a, esperando encontrar Gilbert, mas ficou momentaneamente paralisada quando viu quem estava ali. Ela abriu a boca para dizer algo, mas neste momento Gilbert saiu do chuveiro, enxugando os cabelos em uma toalha vigorosamente, interrompendo o interrogatório que ela iria fazer a Ruby.
O menino pareceu surpreso ao ver as duas em seu quarto. .Seus olhos foram de Ruby para Anne, e depois se fixaram em Ruby. A menina parecia muito à vontade sentada em sua cama como se tudo ali lhe pertencesse. Como ela entrara? Como não percebera a presença dela na casa?
- O que faz aqui Ruby?
- Eu ia fazer a mesma pergunta- comentou Anne.
- Ora, Gilbert, não se lembra? Convidou-me outro dia na escola. - Ruby falou com uma voz afetada que irritou os ouvidos de Anne.
- Eu nunca falo com você na escola. Como poderia ter feito tal convite? – Gilbert perguntou indignado com a mentira da menina.
- Os homens têm a memória curta quando lhes convém, não concorda Anne? - A ruivinha não respondeu. Não conseguia acreditar que Ruby estava fazendo aquilo com ela.
- Não seja mentirosa, garota. Eu nunca te convidei para vir aqui. - Gilbert se mostrava cada vez mais irritado.
- Querido, você se esqueceu dos vários bilhetes que me enviou na sala de aula quando Anne não estava olhando? Agora quer se fazer de inocente na frente dela?- Ruby continuava com seu teatro e o menino teve vontade de sacudi-la até que falasse a verdade. Olhou para Anne, mas não conseguiu decifrar o que ela estava pensando. Em meio a sua raiva, ele falou:
- Cale a boca e saia daqui por vontade própria, ou vou ter o maior prazer em te pôr para fora.
- Tudo bem. Eu vou sair porque quero, e não porque você está mandando. Sei que está nervoso porque Anne nos pegou assim, mas acho que podemos resolver isso mais tarde. - enquanto descia as escadas Ruby sabia que tinha perdido qualquer chance que pudesse ter com Gilbert no futuro, mas esperava ter arranhado um pouco a confiança que Anne tinha nele.
Quando viu que Ruby saira pela porta, Anne sentou pesadamente na cama. Logo em seguida, ela observou o menino largar a toalha molhada que ainda tinha nas mãos em cima de uma cadeira, e se aproximar dela com um a expressão preocupada.
- Anne, tudo o que a Ruby disse não é verdade. Esqueça o que aconteceu poucos minutos atrás e se lembre apenas que te amo.
A menina não respondeu por alguns segundos. Continuou de cabeça baixa, sem olhar para Gilbert, e esse silêncio dela começou a deixá-lo nervoso. Não sabia o que ela estava pensando ou se acreditava nele, não era possível que em um único instante Ruby conseguira destruir o que ele demorara tanto para conquistar.
Finalmente Anne levantou o rosto, e o que Gilbert viu refletido no fundo daqueles olhos azuis era tanta mágoa que o menino sentiu um baque no coração. Ele não suportava vê-la tão triste, a dor de Anne era a dele também. Gilbert sentiu uma vontade enorme de apagar aquele sofrimento que ela claramente demonstrava, por isso, sentou-se ao lado dela na cama e começou a falar:
- Anne, eu sinto tanto. Por favor, acredite em mim, eu quero... – Anne pegou o rosto dele entre as mãos e o beijou sem esperar que ele terminasse o que estava dizendo. Quando abandonou os lábios dele, ela disse olhando dentro dos olhos de Gilbert.
- Gilbert, nada neste mundo vai mudar o que sinto por você. A única coisa que quero é que fiquemos juntos. – Gilbert a abraçou apertado e falou entre os cabelos dela.
- Por um momento você me deixou assustado. Pensei que tinha acreditado na história absurda de Ruby. – Anne se afastou um pouco para ficarem de frente um com o outro, segurou na mão de Gilbert e disse:
- Eu jamais pensei que Ruby usaria de um golpe tão baixo para tentar nos separar. Foi como se pela primeira vez eu pudesse enxergá-la de verdade. Acho que Cole tinha razão em tudo que disse sobre ela afinal. – tentou sorrir, mas tudo o que conseguiu foi o esboço de um sorriso.
- Anne, eu amo você. Acredita em mim, não é?
- Eu jamais duvidaria, pois eu também te amo, Gilbert. – seus olhares se encontraram, e suas bocas se procuraram ao mesmo tempo. Gilbert estreitou Anne em seus braços e a deitou delicadamente em sua cama, os cabelos da cor de chamas vivas espalhados pelo seu travesseiro.
Então, ele tocou com os lábios a curva suave do pescoço dela, sentindo a textura macia da pele de Anne. O perfume que ela usava embriagou seus sentidos e todo o corpo de Gilbert reagiu em resposta àquela sensação. Ansioso procurou os lábios da menina, e o que encontrou ali era mais doce do que mel puro.
Anne estava inebriada pela delicadeza de Gilbert, podia sentir os lábios dele deslizando pelo seu pescoço e deixando um rastro de fogo em sua pele. Precisava tocá-lo, por isso suas mãos acariciaram toda a extensão do peito nu de Gilbert, e depois descendo e subindo pelos braços musculosos dele, indo parar atrás da nuca masculina, trazendo a cabeça do garoto para mais perto de seus lábios. Como Gilbert era tão deliciosamente másculo! Quando ele a beijava com tanta intensidade, ela sentia como uma mariposa atraída pela luz. Quantos beijos tinham trocado ao longo de todo aquele tempo, e quantas vezes ela se entregara a todos eles? Ela e Gilbert se pertenciam, e essa verdade nenhum dos dois podia negar. Ela colou mais o corpo dela no de Gilbert, e então ouviu o menino murmurar seu nome baixinho. Abriu os olhos e sorriu com a visão daquele rosto lindo tão próximo ao seu. Logo vieram outros beijos, um mais profundo que o outro, até que Gilbert se separou dela, tentando se controlar a todo custo. Anne quase não podia respirar, seu coração batia descompassado, e ela só queria prender Gilbert em seus braços e nunca mais ter que se separar dele.
Mas Gilbert deixou o momento passar e perguntou:
- Está com fome?
- Faminta. – ela respondeu
- Então, vamos descer. Mary deixou o jantar pronto antes de sair, e só temos que aquecê-lo e preparar a salada. - estendeu a mão e ajudou Anne a se levantar. Ela ajeitou o melhor que pôde os seus cabelos e suas roupas, e seguiu Gilbert até a cozinha.
Quando Sebastian chegou, ele encontrou Gilbert e Anne conversando animadamente. O menino deu-lhe o recado de Mary e o amigo subiu para um banho. Meia hora depois se juntou a eles para o jantar, e passaram horas agradáveis juntos, saboreando o sorvete de creme com chantili que Mary deixara para sobremesa. Depois, Anne e Gilbert lavaram e guardaram a louça do jantar, enquanto Sebastian se sentava na varanda para esperar Mary.
Ela chegou no momento em que Gilbert estava levando Anne de volta a Green Gables. Acenaram para ela e se puseram a caminho da fazenda dos Cuthberts. Assim que chegaram na varanda da casa de Anne, se despediram com um beijo doce, prometendo se encontrarem no dia seguinte na casa de Gilbert novamente para estudarem matemática juntos..
Anne deu uma olhada em Marilla antes de ir para o seu próprio quarto, e como não tinha sono resolveu ler um livro para esperar o sono chegar. Depois de uma hora se divertindo com dragões, poções mágicas e reino encantado, a menina adormeceu, enquanto lá fora as estrelas brilhavam, prometendo uma noite cheia de sonhos, onde só se falava a voz do coração.
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