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Capítulo 17. Onde mora o seu coração

Te encontrei quando a chuva caia

Naquela tarde tão fria de solidão.

Te encontrei quando palavras não mais existiam,

E o silêncio era a única resposta para minha desolação.

Te encontrei naquele breve espaço de tempo

Naquele tão doce e único momento

Em que te entreguei meu coração."

Rosana

GILBERT

Gilbert desceu do carro de aluguel que o trouxera de volta para casa e suspirou aliviado. Ficara longe por um mês, mas parecia que tinha sido uma eternidade desde a última vez que pusera os olhos em sua fazenda, e sentira muita falta daquelas terras tão íngremes, mas que traziam tantas lembranças de sua infância.

Quando partira em sua viagem pelo mundo pensara que seu destino estava em outro lugar e procurara desesperadamente por um lugar onde pudesse chamar de lar, mas descobrira que o único lugar no mundo onde estava o seu coração era em Avonlea. Ali era a terra natal de seus pais e onde ele aprendera os valores mais preciosos de sua vida. Ali ele cultivava os seus sonhos, seus objetivos para o futuro e onde sempre poderia voltar quando precisasse encontrar paz para seu espírito. Fora um erro achar que a sua felicidade estava em outro continente, Avonlea era seu lar e jamais a abandonaria novamente.

Olhou para os campos e percebeu que Sebastian tinha começado a cultivar milho. Podia ver que a plantação já começava a florescer e logo estaria pronta para a colheita, e o menino se sentia culpado por não ter estado ali para ajudar o amigo naquele trabalho árduo, mas ele precisara daquele tempo para que seu coração serenasse e ele conseguisse ver as coisas com a clareza necessária, mas agora que estava de volta iria compensar Sebastian por sua ausência.

Há um mês suas emoções estavam confusas e ele não conseguia raciocinar direito. Quando deixara a praia depois de seu encontro com Anne, ele se sentira arrasado. Tivera que deixar de lado seus sonhos de amor para entender que dali para frente Anne estava fora de sua vida, doía pensar nisso, mas estava decidido. Prometera que não desistiria dela, mas naquele dia percebera que era inútil insistir. Cansara-se das incoerências da menina, de sua indecisão e de sua falta de coragem para superar os obstáculos que ainda os separavam e se entregar àquele sentimento tão incrível que nascera entre eles.

Gilbert entendia que agora era hora de seguir em frente e se dedicar aos seus objetivos. Queria ser médico, e para isso tinha muito que estudar e deveria deixar de lado tudo o que se referisse ao coração. Seu breve interlúdio com Anne chegara ao fim e pertencia ao passado, recuperaria o ânimo e voltaria todos os seus esforços para os planos antigos de estudo e de vida.

O único problema é que sabia que precisava se afastar por um tempo de tudo que o lembrava de Anne, pois sabia que se ficasse por ali cairia na tentação de procurá-la e aquele tormento nunca terminaria. Mas para onde deveria ir? Onde seria longe o bastante para que seu coração não fosse seduzido pelo seu amor por ela?

Lembrou-se então do convite que Ruby fizera par que ele viajasse com ela e sua família para o Sul. Naquele momento a ideia lhe parecera absurda, mas agora era como se fosse o passaporte para sua liberdade.

Sem pensar muito correu para a casa da menina, torcendo para que não fosse muito tarde para aceitar o convite. Chegando lá, fora atendido pela mãe de Ruby que garantiu que o convite ainda estava de pé e que eles viajaram assim que o marido chegasse do trabalho às seis da tarde. Gilbert olhara para o relógio, e percebera que tinha exatamente duas horas para arrumar tudo. Foi para casa o mais rápido que pôde, pensando no que diria para Bash, como explicaria sua súbita necessidade de viajar sem deixar que o amigo ficasse decepcionado com ele.

Entrou em casa e encontrou Sebastian tomando café na cozinha enquanto descansava depois de mais um dia de trabalho nos campos da fazenda.

- Oi, Gilbert. Se divertiu na praia?- perguntou alegremente, assim que o viu o menino ali na cozinha.

- Não posso dizer que foi um dos meus melhores dias na praia, mas a água estava muito boa para um mergulho. - respondeu Gilbert deixando transparecer sua expressão desanimada.

- O que aconteceu?- quis saber Sebastian, não compreendendo por que Gilbert parecia tão triste.

- Eu encontrei a Anne na praia e a gente acabou brigando pela milésima vez. Então dei um basta da situação. Não aguento mais estas idas e vindas do nosso namoro, embora não possa dizer que chegamos a namorar de fato.

- Gilbert, isso é normal na sua idade. Casais brigam o tempo todo. Vocês são muito jovens para levar tão a sério este tipo de coisa.

- Não, Sebastian. Dessa vez foi diferente. Você sabe o quanto eu amo a Anne. Mesmo quando estávamos em altar mar e eu sempre negava esse fato, você era o primeiro a dizer que eu não queria ver o que era óbvio para todo mundo. Porém, eu não posso mais viver desse jeito, nunca sei como agir com ela ou o que dizer, acho que cheguei ao meu limite e não aguento mais essa situação.

- Mas você me disse que não ia desistir dela nunca.

Gilbert olhou para Sebastian de um jeito tão desolado que o amigo podia ver vestígios de lágrimas brilhando em seus olhos, embora o menino tentasse disfarçar a intensidade do seu sofrimento.

- Foi a Anne que desistiu da gente, Sebastian. Eu já me humilhei o bastante por esse amor, mas agora chega. Não quero mais fazer parte disso. - então se sentou à mesa com Sebastian e procurou as palavras certas para contar-lhe o que tinha decidido. - Sei que prometi te ajudar nessas férias aqui na fazenda, mas na atual circunstância, sinto que preciso me afastar daqui por um tempo, por isso aceitei viajar com a família da Ruby para o Sul.

- Quanto à fazenda, você não precisa se preocupar. Posso muito bem contratar alguns trabalhadores temporários para me ajudarem com a plantação. Mas você tem certeza de que é isso mesmo que quer?

- Tenho. - respondeu Gilbert.

- Então, vá com Deus meu amigo, só não se esqueça de voltar. – disse Sebastian brincando.

- Claro que não. Vou ficar longe só por um tempo. Obrigado por entender. Agora vou arrumar minha mala, vamos partir ainda hoje.

Enquanto subia para o quarto viu Mary e a cumprimentou com um beijo no rosto. A esposa de Sebastian entrou na cozinha e disse;

- Eu estou enganada ou ouvi Gilbert dizer que vai viajar? – quis saber Mary.

Sebastian assentiu com a cabeça e depois contou toda a história para a esposa.

- E você vai mesmo permitir que ele faça essa besteira?- perguntou Mary olhando indignada para o marido.

- Ele está precisando respirar outros ares, Mary.

- Mas ele tinha que escolher viajar justo com essa garota? Você viu a última vez em que ela esteve aqui? O jeito que ela olhava para Gilbert? Parecia que ia saltar em cima dele ali mesmo na sala.

- Não exagere mulher. - disse Bash rindo da cara séria de Mary.

- Não estou exagerando. Entenda uma coisa, Sebastian. Mulheres são sempre mulheres, não importa de que classe elas venham. Quando se trata de homens sempre agem do mesmo jeito, e o tipo daquela menina eu conheço muito bem, quando resolvem perseguir um rapaz só sossegam quando conseguem colocar um anel na mão esquerda.

- Ora, Mary. Ruby ainda é uma criança para pensar nisso. - replicou Sebastian um tanto aborrecido pela insistência da mulher naquele assunto.

- É assim que começa, principalmente quando envolve um rapaz de ouro como Gilbert.

- Mary, o Gilbert me disse que precisa se afastar de Avonlea por um tempo e não vejo nada errado nisso.

- Espero que ele saiba o que está fazendo. - disse Mary ainda não convencida de que o menino tinha tomado a decisão certa.

E deixou isso bem claro quando viu Gilbert descer as escadas com sua mala de viagem.

- Você sabe que não concordo com isso, não é, Gilbert?

- Mary, vou ficar fora só por uns dias.

- Tudo bem, Gilbert. Não quero me intrometer. Mas, ainda acho que seria melhor você ficar aqui junto com sua família.

- Obrigado pela preocupação. Volto logo. Prometo. - abraçou a jovem mulher de Sebastian e foi para a casa de Ruby.

A viagem fora boa, Gilbert tinha que admitir. A princípio temera que Ruby ficasse grudada nele noite e dia, mas Graças a Deus a presença da família dela inibira um pouco os avanços da menina.

E ele se divertira naqueles dias de férias. Conhecera alguns primos de Ruby que eram bastante animados e o carregaram para todos os lados. Ela tinha algumas primas também, e uma delas em especial era bem interessante.

Seu nome era Elisabeth e fora apresentado a ela em uma das reuniões de família que comparecera como convidado. Quando Gilbert entrara na sala de visitas, Elisabeth fora a primeira pessoa que notara. Tinha as feições delicadas, nariz arrebitado, corpo esbelto e embora não fosse muito alta, conseguia encher a sala com sua presença viva e altiva.

Passara os momentos seguintes observando cada movimento da menina, seu riso franco enchia o ar e ela ia de grupo em grupo conversando com cada pessoa, mostrando-se alegre e simpática. Quando chegou ao grupo onde Gilbert estava, alguém os apresentou e o menino viu um lampejo de interesse passar pelos olhos castanhos dela quando ouviu seu nome. Estendeu sua mão delicada e disse:

- Então, você é o famoso Gilbert Blythe?

- Famoso? – disse Gilbert pegando mão dela para cumprimentá-la e largando-a logo em seguida.

- É que tenho ouvido Ruby falar de você há anos, mas não é que ela tem razão? Você é mesmo muito atraente.

Gilbert sentiu seu rosto ficar ruborizado pelas palavras dela, pois não estava acostumado às garotas tão ousadas como Elisabeth.

- Obrigado. - disse simplesmente e ouviu-a rir como se ele tivesse dito a coisa mais engraçada do mundo.

- Não posso acreditar. Um garoto que ainda fica vermelho com um elogio. Que bonitinho! Você é mesmo alguém singular Sr. Blythe. - Gilbert não soube o que dizer, mas ela parecia interessada na conversa, por isso, continuou:

- Estou curiosa. Conte-me mais sobre você.

E assim ele passara algumas horas falando sobre si mesmo enquanto Elisabeth contara algumas coisas sobre ela própria também. Gilbert descobriu que a menina queria ser advogada para defender o direito das mulheres. "Uma feminista nata" pensara Gilbert, e quando a noite terminara percebeu que tinha se divertido muito.

Porém, havia algo em Elisabeth que o tinha intrigado desde o primeiro momento em que a vira, algo que não conseguia compreender. Então, a luz do entendimento atingiu seus pensamentos. A menina tinha cabelos castanhos avermelhados que lembravam os de Anne.

Então era por isso que ela tinha chamado a atenção dele, e se deu conta de que mesmo estando a milhares de distância, a imagem de Anne não o deixava em paz, e reconhecer isso deixava um gosto amargo em sua boca.

Nos dias que se passaram, Elisabeth e Gilbert se tornaram companheiros constantes. O menino percebeu que ela era muito inteligente e ambos tinham várias coisas em comum, só que não passava disso. A atração inicial que ele sentira por ela sumira por completo, assim que seu cérebro entendera que não era a Anne que estava ali, embora seu coração desejasse muito que fosse. Mas mesmo assim, quando Elisabeth o convidara para passearem junto em um fim de tarde, ele aceitara mais por diversão do que pelo interesse na garota.

Da parte da menina também não existia um sentimento mais profundo por Gilbert. Gostava da companhia dele, mas era só isso. O convidara para saírem juntos somente para amolar sua prima Ruby, pois sabia que a menina era apaixonada por Gilbert há anos. Quando Ruby soubera do encontro dos dois, ela quase chorou de raiva e veio correndo falar com Elisabeth.

- Como pode fazer comigo, Liz? Você sabe que amo Gilbert. Por que tinha que convidá-lo para sair com você?

- Não se preocupe prima. Só quero me divertir um pouquinho. Quando voltarem para Avonlea, ele é todinho seu. – deu uma piscadela para a menina, deixando Ruby amuada e choramingando em seu quarto.

Encontraram-se no coreto da igreja. Elisabeth estava muito elegante em um vestido laranja de verão, e parecia bastante animada com aquele encontro. Sentaram-se em um banco para conversar, e em um momento em que Gilbert estava distraído, ela lhe dera um beijo. Os lábios dela eram suaves, mas não despertaram nele nenhuma sensação. Nem de longe pareceu com os beijos trocados entre ele e Anne que sempre lhe causavam palpitações no coração. Entendeu que seu sentimento pela ruiva continuava intacto e que demoraria muito tempo para conseguir esquecê-la, se é que isso aconteceria um dia.

Separou-se de Elisabeth e disse;

- Desculpe-me. Você é uma garota muito atraente, mas acabo de sair de um relacionamento complicado e no momento não quero me envolver com ninguém. - a menina tocou no braço dele sorrindo:

- Não se preocupe Gilbert. Não feriu os meus sentimentos. Não sou o tipo de garota que se magoa facilmente. Mas, me diga como é essa garota?

Gilbert sorriu de leve e falou:

- Ela é incrível e inteligente. Tem olhos azuis que iluminam o mundo, é bem teimosa e tem cabelos ruivos, o que explica seu temperamento difícil.

- Você está mesmo apaixonado. Dá para perceber só na maneira como fala dela. Essa garota tem sorte. O dia que eu encontrar um cara que me ame assim nunca mais vou largá-lo.

- Não sei se ela pensa do mesmo jeito. Nós brigamos e me afastei dela para pensar melhor, mas acho que não tem volta. - Gilbert balançou a cabeça desolado.

- Aposto que tudo dará certo. Você só tem que encontrar uma maneira de trazê-la de volta para seus braços. - disse Elisabeth, tentando encorajá-lo.

- Não sei se isso é possível, mas obrigado pelas palavras de incentivo.

- Então, Gilbert. Já que nos entendemos, poderíamos tomar um sorvete para celebrarmos nossa recente amizade. - disse Elisabeth se colocando de pé.

- Claro. - concordou Gilbert, prontamente e seguiu-a até uma sorveteria próxima de onde estavam.

Assim, os últimos dias da viagem de Gilbert passaram voando. Ele e Elisabeth continuaram a sair juntos, algumas vezes eram acompanhados por Ruby que parecia estar em um estado de crescente mau humor pela atenção que Gilbert dava à sua prima.

Agora que estava de volta, sentia que foi bom ter viajado, Teria mais um a semana livre antes das aulas recomeçarem e pretendia cumprir a promessa que fizera a Bash. Trabalharia na fazenda e faria o máximo para tirar proveito daqueles últimos dias de descanso. Queria estar focado quando voltasse para a escola, preparando-se para a Faculdade dali a um ano. Ser médico era seu maior sonho e não deixaria que nada atrapalhasse seu objetivo.

Pegou a mala de viagem que colocara no chão e se dirigiu para a porta de entrada de sua casa, onde Mary e Sebastian o esperavam com um sorriso no rosto e comida quentinha na mesa.

ANNE

O sol já estava alto quando Anne saiu de casa com uma cesta de piquenique em uma das mãos, e na outra uma sombrinha pra protegê-la do sol impiedoso de verão. Ela, Diana e Cole iriam se encontrar na floresta para aproveitarem um dos últimos dias de férias, e cada um tinha combinado de levar guloseimas para lancharem durante o tempo em que ficassem juntos.

As aulas recomeçariam em poucos dias e Anne estava feliz por isso. Cansara-se de ficar em casa sem fazer nada de especial, embora tivesse ido à praia várias vezes com Diana, ajudara Jerry nas tarefas da fazenda, tomara sorvete com Cole e visitara tia Josephine, sentia-se entediada, quase ansiosa para que seus dias fossem preenchidos com tarefas escolares. Tentara recomeçar seu clube de leitura, mas Diana vivia entretida com seu namoro com Jerry, e Ruby estivera viajando todo aquele tempo, então desistira.

Fechou a cara ao lembrar-se da viagem de Ruby e sabia o que viria a seguir. Bloqueou o pensamento antes que a atingisse e estragasse o dia que prometia ser divertido. Não iria pensar em Gilbert e o que significava sua ausência. Fazia exatamente trinta dias que não o via, e contara cada um deles como se isso encurtasse o tempo e o fizesse regressar mais rápido.

Em muitas noites sozinha em seu quarto mantinha a janela aberta, fantasiando que Gilbert subiria por sua cerejeira e a encontraria sentada em sua velha cadeira de balanço esperando por ele. Sabia que estava sendo uma tola romântica. Gilbert estava mais longe dela do que estivera quando se metera em um navio cargueiro para viajar pelo mundo. Naquela época não existiam sentimentos entre eles, pelo menos não os tipos de sentimentos que enchiam o coração de Anne e transbordavam a cada minuto que se lembrava de tantos momentos que tiveram juntos, mas que agora eram só uma memória fugaz.

Parou um instante para enxugar o suor que começava a brotar em sua testa. A floresta não estava longe, mas o calor era insuportável. Usava roupas leves de verão e protegera sua cabeça com um chapéu de palha, além da sombrinha que tornara sua companheira constante. Nunca fora amante do verão, pois sua pele nunca se bronzeava e acabava ficando com um aspecto de camarão, por mais que evitasse o sol não tinha jeito, tinha sido condenada além de seu cabelo ruivo, a ter a uma cútis delicada demais Sorte que o lugar que escolheram para o piquenique tinha um riacho e muitas árvores em volta, portanto, estariam protegidos do ar abafado que circulava naquele momento.

Finalmente chegara ao lugar marcado, e Diana veio correndo em sua direção no momento em que a viu.

- Graças a Deus que você apareceu! Achei que tinha acontecido alguma coisa pelo tempo que você demorou pra chegar aqui. – Diana falava rápido parecendo muito agitada.

- Me desculpe pelo atraso, mas preferi vir por outro caminho onde havia mais árvores, assim consegui escapar do sol por algum tempo. Odeio esse calor todo, você sabe disso. - disse Anne, colocando a cesta de comida no chão e se abanando com vigor. Viu Cole acenando para ela e se aproximou dele sorrindo.

- Oi, Cole. Você parece ótimo assim como Diana. Como vocês conseguem sobreviver a todo esse verão inclemente?

- Não é tão ruim assim, Anne. Com o tempo você se acostuma.

- Acho difícil isso acontecer. Especialmente quando se é ruiva como eu. - se abaixou e molhou o rosto com um pouco de água do riacho.

- Parece que a ruiva continua reclamando de tudo. – Anne ouviu alguém dizer.

- Jerry! Que bom que conseguiu vir.

- Terminei minhas tarefas da fazenda mais cedo e o Matheus me liberou pelo resto do dia.

- Assim ele pode passar a tarde toda comigo. - disse Diana dando um beijo no namorado. - O que você trouxe para o lanche? Estou faminta.

- Diana, você vive faminta. - disse Jerry rindo da expressão falsamente indignada de Diana.

- Está dizendo que sou gorda?

- Claro que não. Continua linda como sempre, o que estou dizendo é que você tem um apetite saudável e eu adoro isso. - se beijaram novamente.

Enquanto Anne estendia a tolha do piquenique no chão e arrumava com capricho os alimentos e bebidas que cada um trouxera, observou a camaradagem entre Jerry e Diana, e invejou-os como nunca. Será que um dia ela e Gilbert foram assim? Duvidava muito.

Cole viu o olhar pensativo de Anne e perguntou:

- Qual é o problema Anne?

- Não é nada importante. - disse ela com apenas a sombra de um sorriso se desenhando em seus lábios.

- Não precisa disfarçar. Você sabe que te conheço bem, e você é sempre um livro aberto quando se trata de Gilbert Blythe.

- Cole, por favor. - Não queria discutir aquele assunto quando a partida de Gilbert ainda doía demais.

- Anne, dessa vez você não vai escapar de nossa conversa tão facilmente. – disse Cole, tirando os sapatos e colocando os pés dentro do riacho. Ao longe se podia ouvir o riso de Jerry e Diana que tinham se afastado um pouco para ficarem sozinhos. Anne imitou o gesto do amigo e disse:

- O que quer que eu diga? Que você estava certo todo o tempo? Que fui uma estúpida e por causa disso afastei Gilbert de mim? – sua voz continha todo sofrimento do mundo e Cole, com pena da amiga pegou-lhe a mão a fim de consolá-la.

- Ajudaria muito se você admitisse para si mesma que ama esse garoto e o fato dele ter viajado com uma de suas amigas a magoou demais.

Anne olhou para o Cole e sabia que ele tinha razão. Estava cansada de negar o óbvio.

- Cole, o que vou fazer? Nunca pensei que amaria tanto alguém assim, e só percebi o quanto ao ver Gilbert indo embora daquela praia. Agora é tarde demais para mim. - encostou a cabeça no ombro do amigo e ficou olhando para a água do riacho, sentindo-se infeliz.

- Por que não diz a ele o que sente, Anne. Vai se sentir muito melhor se o fizer.

- Não acho que o Gilbert vá se importar. Ele deixou bem claro que não quer mais saber de mim.

- Anne, duvido que ele tenha sido sincero. Ele gosta demais de você para isso. Vamos, tenha coragem e confesse a ele todo o seu amor. Tenho certeza de que vai dar tudo certo. Um sentimento assim não morre facilmente.

- E se mesmo assim ele não me quiser mais? – os olhos dela procuraram por uma resposta nos dele.

- Então, terá aqui um ombro amigo para chorar o quanto quiser. - respondeu Cole, sorrindo.

Anne o abraçou apertado. Sentia-se tão grata por tê-lo como amigo. Queria que ele não tivesse que voltar para Paris, pois lhe fazia muita falta a companhia e os conselhos dele. Porém, Cole tinha construído outra vida para si em outro país e parecia feliz com a escolha que fizera. Anne apenas achava que ele estava solitário demais. Falara com ela uma vez sobre Pierre, mas nunca mais mencionara nada a respeito do rapaz. Desejava muito que o amigo encontrasse sua alma gêmea e vivesse o amor da maneira como deveria ser vivido, pois ele merecia por ser aquela pessoa maravilhosa.

- Ei vocês dois! Que tal se jogássemos monopólio? Trouxe o jogo na minha mochila. - disse Diana.

- Que boa ideia, Diana. Acho esse jogo muito divertido.

- Mas antes quero mais uma fatia desse bolo de banana de Marília. É minha sobremesa favorita.

- Claro, Diana. Coma o quanto quiser. - disse Anne, rindo da cara de gula da amiga.

Passaram o resto da tarde jogando, rindo e se divertindo. Quando o sol começou a se pôr, recolheram suas coisas e voltaram para casa animados e felizes.

Anne chegou a Green Gables se sentindo em paz. Era sempre bom falar com Cole. Ele era a voz de sua consciência e sempre dizia em voz alta o que ela própria não conseguia falar. Havia em seu íntimo certa ansiedade pelo início das aulas, pois seria a primeira vez que encontraria Gilbert após o incidente da praia, e não sabia como reagiria ou se ele sequer falaria com ela. Deveria confessar-lhe seus sentimentos e correr o risco de ser rejeitada ou deveria guardar para si tudo o que sentia e preparar-se para seguir sua vida sem Gilbert?

Incapaz de encontrar respostas para suas dúvidas naquele momento, Anne empurrou seus temores para um canto de sua mente, onde sabia que teria que enfrentá-los mais tarde. Com os sapatos nas mãos, entrou na cozinha descalça e foi ajudar Marilla nos preparativo para o jantar.

ANNE E GILBERT

- Vamos Diana, ande mais depressa ou chegaremos atrasadas no primeiro dia da escola. - reclamou Anne enquanto Diana a seguia em passos lentos, bocejando e cheia de sono.

- Por que tanta pressa, Anne? Nunca vi alguém tão ansioso para chegar à escola depois de um mês de férias. Dá para caminhar mais devagar, por favor?-

- Se caminhar mais devagar só chegaremos para a aula daqui a três horas. Vamos, menina, chega de preguiça. Você tem que começar a ir dormir mais cedo e deixar o seu namoro com o Jerry para os fins de semana. - aconselhou Anne.

- Não seja estraga prazeres, Anne. Estou tão apaixonada. Acho que não consigo deixar de ver o Jerry um dia sequer. - Diana falava do namorado com os olhos brilhando, e Anne percebeu que seria inútil insistir no assunto. Apertou mais o passo, queria chegar à escola logo, se Diana quisesse que ficasse sonhando pelo caminho.

Anne passara os últimos dias de férias em companhia de Diana e Cole, mas agora com o início das aulas a vida seguia seu curso, e cada um deles deveria voltar à suas atividades normais diárias. As aulas de Cole também recomeçariam, por isso, o amigo se despedira dela no dia anterior, prometendo voltaria para o Natal. Anne o vira partir com lágrimas nos olhos, sabendo instintivamente que sentiria muito a falta dele.

Chegara à porta da escola faltando um minuto para a aula começar, correu pelo corredor que levava aos armários dos alunos, seguida por Diana que estava quase sem fôlego por tentar alcançá-la. Anne andava com tanta pressa que não prestava muito atenção para onde ia, e acabou dando um encontrão em Gilbert que vinha na direção contrária, fazendo com que seu material escolar voasse pelos ares.

- Maldição. – praguejou alto enquanto tentava organizar os livros e cadernos espalhados pelo chão.

- Deixe-me ajudá-la. - disse Gilbert educadamente.

- Obrigada. - disse Anne, assim que conseguiu reunir todas as suas coisas levantando-se.

- Por nada. - disse Gilbert, dando-lhe as costas e continuando seu caminho até a sala de aula.

Anne ficou triste pela frieza de Gilbert. Ele mal olhara pra ela, mas pelo menos não a ignorara completamente. Suspirando profundamente guardou seu material no armário enquanto Diana chegava ofegante, e vendo a cara tristonha da amiga perguntou:

- O que foi Anne?

- Está tudo bem. Vamos logo para a classe, pois a aula já deve estar começando.

Entraram na sala apressadamente e sentaram-se em seus costumeiros lugares. Anne viu Ruby sentada cabisbaixa e pensou que ela não parecia tão feliz quanto a ruivinha imaginara que ela estaria após ter passado um mês em companhia de Gilbert. Não perguntou nada para a menina, pois decidiu que não queria saber. Anne também notou que Josie Pye tinha mudado de lugar e já não se sentava ao lado de Ruby. Será que tinham brigado? Bom, seria uma benção não ter mais aquela garota perto dela durante as aulas, não sendo alvo de seu sarcasmo e ironia.

A Srta Stacy entrou cumprimentando a todos e fazendo muitas perguntas sobre as férias. Depois disse que teriam um currículo diferente naquele semestre que envolveria atividades diversas dentro e fora da escola. Para a primeira atividade, ela havia programado uma viagem até uma fazenda de ovelhas para o próximo fim de semana, e os alunos teriam que observar como a tosa daqueles animais era feita, como toda a lâ era processada, e depois deveriam em grupos de quatro alunos criar um projeto que visasse apresentar melhorias para o trabalho observado. Deveriam também escrever um relatório completo sobre toda a atividade.

Os alunos ficaram animados e passaram todo o horário do recreio falando sobre o passeio. Anne aproveitou para falar com Ruby, e saciar sua curiosidade sobre determinados assuntos.

- Oi, Ruby. Estou curiosa sobre uma coisa. Por que a Josie não está mais ocupando a carteira do seu lado? Vocês brigaram?

- Não. Você não está sabendo? Ela e o Billy Andrews estão namorando e ela decidiu que ficará sentada perto dele durante as aulas.

- Não acredito! – disse Diana.

- Dois explosivos juntos é dinamite na certa. - disse Anne inconformada.

- Espero que os dois não se matem até o fim das aulas. – disse Diana.

- Também espero. - disse Anne.- Mas me diga como foi suas férias? Você se divertiu?

- Quem dera. –suspirou Ruby.

- Mas você não gostou de passar todos aqueles dias com Gilbert?- perguntou Diana.

- Eu nem tive oportunidade. Ele e minha prima Elisabeth se deram tão bem que não se desgrudaram mais. Acho que o Gilbert ficou meio apaixonado por ela. Quanto a minha prima não tenho tanta certeza, pois ela não é do tipo que se apega fácil.

- E como é sua prima?- perguntou Diana, antes que Anne o fizesse.

- Bem, Elisabeth é linda, inteligente, e não tem um só garoto que não a conheça que não se apaixone por ela. É claro que eu não teria nenhuma chance com Gilbert tendo ela por perto.

Anne ouvia a tudo sem esboçar nenhuma reação, mas estava sofrendo, é claro. Imaginar Gilbert com outra garota a atormentava muito, ainda mais sendo uma sem rosto, pois Anne podia imaginá-la de todas as maneiras possíveis, o que não era uma competição justa para ela.

Gilbert observava Anne de longe sem que ela o percebesse. Mantinha-se longe dela como tinha prometido a si mesmo que o faria, mas não era fácil cumprir essa promessa. Sebastian lhe contara que Anne o procurara logo que ele viajara com a família de Ruby, por isso, sentira-se tentado a falar com a menina quando se esbarraram no corredor de entrada, mas se controlara a tempo, não cairia nas armadilhas de seu coração novamente.

Voltaram para a classe assim que o intervalo terminou e após mais três horas de estudo foram para casa, encerrando assim o primeiro dia de aula.

A semana passou depressa deixando todos ansiosos pela viagem programada pela Srta Stacy. No dia marcado, cada aluno trouxe uma mala com alguns pertences e uma cesta de comida para alimentá-los durante a viagem até a fazenda de ovelhas. Anne sentou-se ao lado de Diana no ônibus, Ruby foi acompanhada de Josie e Gilbert de Muddy. Levaram exatamente duas horas para chegarem ao seu destino, e foram recepcionados com uma mesa farta de petiscos e sucos naturais, Depois do lanche foram levados aos seus alojamentos, e em seguida se reuniram com a Srta Stacy na sala de visitantes e seguiram para a parte da fazenda onde as ovelhas eram tosquiadas. Fizeram várias perguntas aos trabalhadores que ali realizavam suas atividades, observando também o processamento da lâ. Passaram o dia todo naquela tarefa, e após o jantar todos estavam exaustos e ansiosos por uma boa noite de descanso.

No dia seguinte repetiram as mesmas atividades durante o período da manhã. Como era sábado, foram liberados após o almoço para se divertirem em qualquer coisa que lhes interessasse. As meninas optaram por conhecer um jardim onde uma profusão de flores de espécies diferentes eram cultivadas, e comercializadas ali enquanto os meninos preferiram fazer uma excursão a cavalo pelos milhares de acres da fazenda, aprendendo um pouco mais sobre as atividades desenvolvidas naquelas terras.

Enquanto as garotas voltavam do passeio animadas e comentando sobre a beleza das flores que viram, encontraram Muddy tomando um refresco no refeitório da fazenda. O menino parecia inquieto, quase nervoso, o que despertou a curiosidade de Diana.

- O que aconteceu Muddy? Você está com uma cara estranha. O passeio pela fazenda não te agradou?

- Agradou sim. Foi bem interessante, na verdade. Mas é que tivemos um problema enquanto visitávamos alguns lugares da fazenda.

- Um problema? Que tipo de problema? – perguntou Ruby.

- O cavalo em que Gilbert estava se assuntou com um esquilo Sivestre, e Gilbert foi atirado ao chão batendo a cabeça e...

Anne não esperou para ouvir o resto, saiu em disparada em direção ao alojamento dos meninos. O coração estava apertado de angústia, e durante todo o tempo em que tentava chegar o mais rápido possível ao quarto de Gilbert, imagens do menino gravemente ferido povoavam sua imaginação.

Entrou no quarto dele sem bater, a porta se abrindo com um estrondo. Estacou de repente quando viu Gilbert parado na sua frente, com uma camisa que acabara de tirar da gaveta do armário nas mãos. O peito dele nu exibia vários arranhões assim como seus braços, e a não ser por um grande curativo na testa, ele parecia bem. Mas mesmo assim, ela se aproximou dele, tinha que tocá-lo e se certificar de que nada mais grave tinha acontecido com ele.

Gilbert ficou paralisado pela aparição intempestiva de Anne. Não esperava que a menina surgisse assim sem avisar pegando-o de surpresa. Então, a viu chegar mais perto dele, sua voz um pouco tensa enquanto falava.

- Muddy me contou do acidente. Você está bem?

- Sim, foi só um susto. Por sorte a fazenda mantém um médico aqui em caso de acidentes. Assim, já fui examinado e medicado.

- Meu Deus! Quantos arranhões! Você poderia ter morrido. - Anne não conseguia tirar os olhos do peito de Gilbert. Estendeu a mão e tocou suavemente com os dedos cada machucado do menino. Gilbert retirou a mão de Anne de seu peito, tentando evitar o toque dela.

- Está tudo bem Anne. Não parecia de preocupar. - A ruivinha não parecia estar convencida, e por isso, continuou tocando os braços, o rosto e o peito de Gilbert, como se necessitasse daquele contato para ter certeza de que nada de ruim o tinha atingido.

O toque da mão de Anne em seu corpo estava deixando Gilbert inquieto, por isso, segurou o pulso dela antes que a menina continuasse desafiando o seu bom senso.

- Anne, já disse que estou bem. Quer parar de me tocar desse jeito.

- Desculpe, não sabia que estava te incomodando. – Anne baixou a mão constrangida.

- E não está. É que com você me tocando assim tudo no que consigo pensar é no quanto eu gostaria de te tocar do mesmo jeito.

Anne se sentiu corar até a raiz do cabelo. Normalmente ela não era tão ousada, ou melhor, ela nunca fora tão ousada. Não pensara no efeito que seu toque teria sobre Gilbert, porque em sua cabeça tinha sido um gesto inocente, sem qualquer intenção dúbia, mas tinha que admitir que tocá-lo também a afetava e a consciência do seu amor por ele a atingiu como um raio. Então, não podia mais guardar em seu íntimo o que sentia, era grande demais, precisava confessá-lo e sem pensar nas consequências ela disse:

- Gilbert, sei que não tenho mais nenhuma chance com você, e não me importa se você vai achar tarde demais para o que eu vou te dizer, pois vou falar assim mesmo. – ela fez uma pausa e depois continuou- Você é o garoto mais incrível que já conheci, o príncipe que qualquer garota deseja para a sua vida, e peço desculpas por não ter te dito isso antes, mas é que tive medo de não ser digna dos seus sentimentos por mim. Sou órfã, e isso nunca foi bem visto em Avonlea. Quando vim morar com Matheus e Marilla, as pessoas me evitavam como se eu tivesse uma doença contagiosa, e tive que passar por muita coisa até conseguir o pequeno espaço que hoje ocupo nessa sociedade preconceituosa. Então, te conheci e você virou meu mundo de ponta cabeça. Nunca fui tratada com tanta consideração e respeito por um garoto, exceto aquela vez em que você me chamou de cenoura, mas já te perdoei por isso. - ambos sorriram daquela lembrança e Gilbert sentiu os olhos azuis de Anne quentes sobre ele. Assim ela continuou:

- Em pouco tempo me apaixonei por você, isso me assustou tanto que quis fugir, pois achei que depois de um tempo você me veria como uma impostora que não deveria estar o seu lado. Você tinha razão em tudo que me disse na última vez que nos falamos na praia. Usei a Ruby como desculpa para te afastar de mim, mas o problema sempre foi eu e o meu medo de me entregar a esse amor tão incrível e inesperado, mas por causa da minha estupidez eu te perdi, e agora só posso lamentar o fato de que fui burra o bastante por permitir que o único garoto pelo qual me apaixonei fosse embora da minha vida para sempre. – pronto, tinha dito tudo o que estava preso em sua garganta. Porém, não esperava que Gilbert fizesse qualquer comentário sobre seu súbito desabafo. Embora desejasse ardentemente que ele o fizesse.

O coração de Gilbert dava pulos de alegria. As palavras de Anne soavam como música aos seus ouvidos. Estava perdido nesse encantamento quando a ouviu dizer:

- Bem, vou embora e deixá-lo descansar. – a ruivinha deu-lhe as costas e antes que ela saísse pela porta por onde entrara, ele disse:

- Anne Shirley Cuthbert. Onde pensa que vai? Acha que pode vir até aqui, despejar tudo isso em cima de mim, e depois ir embora sem olhar para trás? Quero que ouça muito bem o que vou dizer para que nunca duvide da verdade dessas palavras. Jamais deixei de sentir essa imensa paixão por você. Quando estava em alto mar ou mesmo quando viajei com Ruby não consegui te esquecer, por essa razão, vou te dizer a mesma coisa que te disse há um mês atrás. Não existe ninguém no mundo inteiro para mim que não seja você, e eu jamais poderia viver em um mundo onde você não existisse. - Gilbert fez uma pausa enquanto Anne se mantinha de costas para ele sem dizer nada. Quando ela se virou, ele viu que a menina estava chorando, quase soluçando, e com todos os seus sentimentos por Gilbert transbordando pelos seus olhos ela perguntou:

- O que disse?- tinha medo que seus ouvidos a tivessem enganado.

- Eu disse que sou seu se me quiser. - disse Gilbert sorrindo, admirando aqueles olhos azuis que pareciam ainda mais belos e cintilantes por causa das lágrimas.

Os lábios de Anne se abriram em um imenso sorriso, correu para Gilbert e se atirou nos braços dele. Sem pensar em mais nada que não fosse no garoto a sua frente, colou seus lábios no dele e se entregou àquele momento com toda a sua alma.

Gilbert sentiu a maciez daqueles lábios sob os seus e imediatamente sentiu sua pulsação se acelerar. Estava inebriado por aquela sensação poderosa que o fazia flutuar até as estrelas. Anne estava ali e era dele, quase não podia acreditar naquele presente súbito e inesperado. Como esperara por aquele momento! Não iria largá-la nunca mais. Ela era tudo que desejara e ainda mais. Tê-la ao seu lado era uma dádiva da qual nunca pensara ser merecedor, mas se sentia agradecido pela felicidade que agora tomava conta de seu coração.

Enquanto Gilbert sentia-se tomado pela paixão, emoções diversas agitavam o íntimo de Anne. Estava nos braços de Gilbert onde sempre pertencera e incrivelmente não sentia mais temor algum. Suas dúvidas se evaporaram feito fumaça, dando lugar a única certeza que poderia ter, queria Gilbert Blythe em sua vida e não só por um instante, mas para a vida inteira. Nunca pensara que amaria alguém naquela intensidade, era como se fossem apenas um, alma e coração unidos em um só sentimento.

Suas bocas se separaram relutantes, mas permaneceram abraçados por alguns instantes, como se o mundo todo se resumisse naquele sonho de puro amor. Olharam-se hipnotizados pelo sentimento que ambos compartilhavam. Com a voz emocionada Anne disse:

- Você pode me perdoar por ter demorado tanto por me dar conta do que sentia por você de verdade?

- Tudo bem. Valeu a pena a espera. - disse Gilbert acariciando o rosto dela. Anne se aconchegou mais ao menino, enlaçando-o pelo pescoço e encostando seu rosto no peito dele, ouvindo-lhe as batidas do seu coração Em seguida se lembrou do acidente de Gilbert e o quanto ele deveria estar exausto, por isso, saiu do círculo dos braços dele dizendo:

- Acho melhor eu voltar para o meu quarto, pois você precisa descansar.

- Por favor, fique. - disse Gilbert levantando-lhe o queixo com o polegar.

- Gilbert, você sabe que nós meninas não podemos ficar no alojamento dos meninos. Agora que vi que você está bem, devo voltar para o meu quarto.

- Agora que mencionou isso, estou sentindo uma dor terrível no meu braço, vou precisar de uma enfermeira para cuidar de mim. - disse o menino, fingindo estar sofrendo muito.

- Pode parar de tentar me enganar, Sr. Blythe. - disse Anne em tom de brincadeira.

- Por favor, Anne. Fique. Quero apenas conversar com você, olhar a lua, podemos fazer aquele jogo de soletrar, prometo que deixo você ganhar. - Gilbert deu uma risadinha ao ver a cara de indignação de Anne.

- Quando foi que você teve que me deixar ganhar alguma coisa?

- Por favor, Anne. Fique, por mim.

- Bem, você disse que vamos olhar a lua e conversar. Só isso?

- Por quê? Você tem algo melhor em mente? Estou aberto a sugestões. - o olhar de Gilbert era de pura malicia e Anne balançou a cabeça:

- Não banque o engraçadinho comigo, Gilbert Blythe. Você tem que me prometer que vai se comportar. - Anne fingia estar sendo severa.

- Claro. - Gilbert ficou sério, mas ria por dentro.

- Será que estou vendo dedos cruzados atrás de suas costas? – disse Anne, quase rindo da cara de culpado que ele fez.

- Está bem, vou me comportar.

- Muito bem. Vou ter que avisar Diana. Não quero que ela fique preocupada comigo, achando que desapareci de repente.

- Tudo bem, vou esperar por você.

Assim Anne deixou Gilbert sozinho por um momento e correu até o quarto que ocupava com Diana, percebendo que já tinha escurecido. Quando a amiga a viu, suspirou aliviada dizendo:

- Graças a Deus, você apareceu. Estava quase enviando uma tropa de busca a sua procura.

- Desculpe Diana. Não quis deixá-la preocupada. Vim só te avisar que vou ficar com o Gilbert mais um pouco. Ele está precisando de mim.

- Como é? Quer dizer que estava com o Gilbert todo esse tempo?- ao ver Anne acenar afirmativamente, Diana deu um sorriso largo.

- Está me dizendo que finalmente se entenderam?

- Estamos conversando sobre isso. - disse Anne acanhada.

- Estou tão feliz por você. Já estava cansada de te ver sofrer calada. Depois você me conta os detalhes. Vá ser feliz. – disse a amiga.

Anne se despediu com um rápido aceno e depois voltou para o lado de Gilbert. Ficaram conversando por um bom tempo, às vezes se beijavam, e outras só ficavam de mãos dadas em silêncio. Em alguns momentos, Anne percebeu que Gilbert fazia uma careta que parecia ser de dor. Então perguntou:

- Gilbert, você está sentindo alguma coisa?

- Só um pouco de rigidez no ombro que me causa certo desconforto.

- É melhor tomar um analgésico e se deitar. – Ela foi até a mesinha de cabeceira dele, pegou um comprimido receitado pelo médico e um copo de água e deu para Gilbert. Levou-o para a cama, o fez deitar-se e deu-lhe um beijo na testa dizendo.

- Volto amanhã cedo para ver como está.

- Não, por favor, passe a noite aqui. Não quero ficar sozinho. - Gilbert implorava com o olhar pela presença dela.

- Mas, Muddy pode voltar a qualquer momento. O que vou dizer a ele?

- O Muddy não vai voltar hoje. Ele me disse que ia jogar xadrez com os meninos no outro quarto e passaria a noite todo com eles.

- Nesse caso eu fico então. Mas, antes preciso de um banho. Onde fica o banheiro mais próximo?

- Naquela porta perto da cama do Muddy. – disse Gilbert apontando para a direção que descrevera. - Se quiser tem roupões limpos no armário.

- Obrigada.

Anne tomou uma ducha quente e vestiu um dos roupões que Gilbert oferecera. Voltou para o quarto e viu que Gilbert estava acordado.

- Era para você já estar dormindo. - repreendeu –o.

- Não consigo dormir quando sei que você está tão perto de mim. - os olhos dele a acariciavam, fazendo com que pequenos arrepios atingissem a pele da sua nuca.

- Quer que eu apague a luz?

- Quero que se deite aqui comigo- Anne engoliu em seco ao ouvi-lo falar aquilo e respondeu:

- Gilbert, não acho que seja uma boa ideia.

- Eu te prometi que ia me comportar, não prometi?- aqueles olhos sempre conseguiam convencê-la de qualquer coisa.

- Está bem.

Gilbert se afastou um pouco dando espaço a ela para que se deitasse com ele. Ficaram de frente um para o outro, o olhar perdido um no outro, e mil pensamentos tomando forma em suas mentes. Anne afastou uma mecha de cabelo que caía na testa de Gilbert, e ele fitou a boca dela que estava tão próxima e convidativa. Anne instintivamente mordeu o lábio inferior, um hábito que tinha quando ficava tensa ou nervosa, e aquele gesto não passou despercebido a Gilbert. Era inocente e ao mesmo tempo provocante, fazendo-o desejar beijá-la desesperadamente, mas prometera se comportar, então não podia faltar com sua palavra naquele momento.

- Gilbert, no que está pensando?- Anne perguntara de repente.

- No quanto eu gosto de olhar para você.

- Assim você me deixa encabulada.

- Anne, você é maravilhosa. Sabe disso não é?

- Me acho tão comum.

- Não existe nada de comum em você, Anne. Como pode dizer isso? Nunca se olha no espelho?

- Você sabe o que penso a meu respeito. Beleza parece não combinar com as ruivas.

- Eu te acho linda, e você deveria pensar assim também. - ele não conseguia acreditar que ela não enxergasse o quanto era encantadora, e como o deixava louco só de olhá-lo do jeito que o olhava naquele momento.

Foi a vez de Gilbert perguntar:

- No que está pensando, Anne?

- Quando é que vai me beijar.

- Achei que nunca fosse me pedir. E trocaram um beijo longo, molhado e cheio de sentimentos. O sono foi chegando devagar e adormeceram enroscados um no outro. De madrugada, Anne despertou, e achou melhor voltar para seu alojamento, antes que alguém a pegasse no quarto dos meninos. Tomou todo o cuidado para não acordar Gilbert, trocou o roupão por seu vestido, e saiu do quarto sem fazer barulho. Seu estomago roncou faminto, e ela se lembrou que não comera nada no jantar do dia anterior, pois ela e Gilbert ficaram tão entretidos um com o outro que esqueceram da comida completamente.

O café da manhã só seria servido daí algumas horas, e para que pudesse enganar a fome Anne entrou na cozinha da fazenda e pegou uma maçã da fruteira. Em seguida foi para o seu quarto silenciosamente, dormindo até o amanhecer do dia. Após o café, todos pegaram suas coisas para voltarem para casa, e Anne foi bombardeada por Diana com milhares de perguntas sobre o dia anterior com Gilbert. A menina pediu paciência para a amiga, e disse que contaria tudo depois quando estivessem sozinhas.

Quando estavam indo para o ônibus, Anne sentiu alguém pegar em sua mão e surpresa viu que era Gilbert. Todos os olhares curiosos da escola estavam sobre os dois, inclusive o de Ruby e Josie Pye que largara um minuto de seu namorado Billy para concentrar toda sua atenção em Anne e Gilbert.

Anne sabia que Ruby estava furiosa com ela, pois percebera sua expressão de raiva quando a menina passara por ela e Gilbert. Teria que conversar com ela mais tarde e tentar fazê-la entender a situação, mas no momento só queria curtir a recém felicidade descoberta que a deixava em êxtase

A chegada em Avonlea foi calma e rápida. Os pais dos alunos esperavam por eles quando desceram do ônibus para levá-las para casa. Quem aguardava Anne na porta da escola era Matheus, e ele também esperava por Diana. Tinha combinado com a mãe da menina que a levaria para casa junto com Anne.

A ruivinha se despediu de Gilbert rapidamente com um beijo no rosto e foi para casa com Matheus e Diana. Após um longo relatório sobre tudo que tinham visto e feito na fazenda para Marilla, Anne subiu as escadas para tomar banho e depois desceu para o jantar. Em seguida, ajudou Marilla com a louça e foi para o seu quarto.

Quase deu um grito de susto ao ver Gilbert sentado em sua cadeira de balanço.

- Que está fazendo aqui à uma hora dessas, Gilbert? Você deveria estar descansando. Não está totalmente recuperado do seu acidente.

- Eu queria só dar mais uma olhada em você para conseguir suportar a noite de solidão que terei pela frente, até o amanhã chegar e eu poder te ver novamente.

- Gilbert, acabamos de nos separar. - disse Anne, abraçando-o.

- Para mim já faz uma eternidade desde última vez em que estivemos juntos. - disse Gilbert abraçando Anne pela cintura.

- Muito bem. Já me viu e me abraçou, agora é melhor ir para casa descansar. Estou preocupada com você.

- Só falta uma coisa.

- O que?-

- Isso. - disse Gilbert beijando-a.

Anne prendeu a respiração. Beijar Gilbert era a coisa mais incrível do mundo, e por isso, quase protestou quando ele interrompeu o beijo, pois para Anne tinha sido breve demais.

- Boa noite, Anne. Nos vemos amanhã.

- Boa noite, Gilbert.

Assim que o menino partiu, Anne se preparou para ir para cama, sentindo-se perdidamente apaixonada por aquele garoto que havia roubado seu coração completamente. Deitou a cabeça no travesseiro e em cinco minutos estava dormindo como um anjo.

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