Capítulo 102- Surpresas que a vida trás
Olá, queridos leitores. Mais um capítulo postado. Espero que gostem e comentem. Obrigada por tudo. Beijos.
ANNE
Era a última semana de aula, e Anne caminhava pelos corredores da faculdade pensando nos dias que se seguiriam. Deveria estar feliz, pois teriam três meses de férias e tanto ela quanto Gilbert poderiam aproveitar cada segundo da companhia um do outro, e fazer o que quisessem, exceto pelo fato de que talvez todos esses planos fossem arruinados por uma única coisa que martelava em sua cabeça a dias, e que por mais que se esforçasse não conseguia esquecer,
Várias vezes por dia, ela dizia a si mesma "não pense", mas, seu cérebro, cruel como era, não a deixava esquecer. A palavra cirurgia estava em sua cabeça e pintava um quadro tão terrível, que todos os seus medos e receios pioraram seus pesadelos. Ela sabia que não estava na mesma situação de antes, mas, ainda assim, a incoerência de seus pensamentos em alguns momentos a fazia se lembrar daqueles dias em que sua vida passara a ser vivida em função da recuperação de Gilbert, e isso talvez se repetisse nos próximos dias vindouros.
Ela e Gilbert não conversavam sobre isso, como se tivessem feito um acordo silencioso de que quando entrassem pela porta adentro do apartamento viveriam os melhores momentos de suas vidas, e que nada abalaria o amor que sentiam, porém, Anne conseguia sentir a apreensão nos gestos de Gilbert mesmo que ele lhe sorrisse todo o tempo, a beijasse mais vezes do que estava acostumado a fazer, falasse de tudo o que fariam naquelas férias animadamente, Anne sabia que a palavra "cirurgia", também estava na cabeça dele.
As dores de cabeça não cederam, apenas diminuíram de intensidade, isso por si só já assinava um diagnóstico que o médico de Gilbert nem teria que fazer. Ambos sabiam o que significava a incidência das dores, mas, queriam fingir que aquilo não abalava a fé cega que tinham de que tudo se resolveria da melhor forma possível, e assim a palavra "cirurgia" pairava sobre eles mesmo não sendo mencionada verbalmente,
Anne caminhou por mais alguns segundos, e chegou ao portão da faculdade. Ela não queria ir para casa ainda, pois precisava se armar de mais um pouco de coragem antes de colocar um sorriso no rosto e perguntar a Gilbert como havia sido o seu dia, o que ele gostaria para o jantar, se deitar na cama com ele e fingir dormir uma noite inteira quando passaria mais momentos olhando para o teto, e ouvindo o barulho que viria da rua.
Seus passos ecoaram pela calçada não tão movimentada naquele dia. A maioria dos alunos já tinha ido para casa, pois estavam realizando as últimas provas antes das férias, e assim o vai e vem de pessoas perto da faculdade era bem menor. Gilbert tinha ido a campo com seus amigos de sala para realizarem uma experiência em grupo e somente se veriam quando ele chegasse depois do trabalho no laboratório, assim, ela teria muito tempo para passar consigo mesma.
Anne chegou à esquina que a levaria em direção ao apartamento, mas, ela parou e acabou se decidindo a ir por outro caminho. Ela precisava de apoio, mas não do tipo que um amigo lhe daria. Ela precisava de um apoio que ninguém mais poderia lhe dar a não ser o lugar para onde estava indo.
A Catedral de São Patrício ficava no centro de Nova Iorque, mais especificamente na Quinta Avenida. Contrastando com a paisagem local repleta de lojas elegantes, seu estilo neo-gótico dava um charme adicional a comunidade local que vinha em busca de paz dentro de suas paredes brancas de mármore, e era justamente isso que Anne viera procurar ali.
Ao entrar dentro da igreja que mais parecia um castelo medieval, Anne sentia que estava em outro mundo. O silêncio que reinava ali lhe dava impressão de que o paraíso seria muito fácil de ser encontrado se pudesse esquecer o barulho dos carros que passavam pelas ruas perto da igreja, transformando o ambiente lá fora em uma cacofonia total. Mas, ali dentro, nada se ouvia a não ser um piano suave que tocava hinos gospels, e às vezes uma voz suave entoava cânticos cheios de amor e esperança.
Esperança essa que Anne desejava para si, porque depois de tantos terremotos em sua vida, acreditar que seria diferente dessa vez era quase como se procurasse uma agulha no palheiro.
Ela se sentou em um banco na parte de trás da igreja e elevou seus pensamentos em uma prece muda, ficando surpresa por ainda se lembrar da oração que Marilla tinha lhe ensinado assim que fora viver em Green Gables, e a qual nunca mais rezara desde que perdera seu bebê e Gilbert ficara em coma. Na verdade, essa era a primeira vez que entrava em uma igreja depois daquela época. Anne se afastara completamente daquele ambiente sagrado, e tivera suas razões que se contasse para Marilla ela lhe diria que ela estava totalmente errada.
Porém, só ela sabia como se sentira abandonada em suas orações, como se as palavras que dissesse naquela época soassem completamente vazias. Ela se revoltara contra Deus, e contra tudo o que lhe ensinaram, e passou a pensar que era bobagem tudo no que acreditara, porque a justiça pela qual ela esperara e a misericórdia pela qual clamara se perderam entre as paredes de seu quarto e ela nunca mais conseguira encontrá-las. Todos lhe disseram na época que o que lhe acontecera tinha um propósito, mas, ela nunca entendera qual era o motivo real para tudo aquilo. Ela abortara um filho sem sequer saber que ele existia em seu ventre, e vira o amor de sua vida correr o risco de morrer, e depois passara pela péssima experiência de ver Gilbert esquecer quem ela era, então, se todos aqueles infortúnios aconteceram para fazê-la aprender algo com eles, tudo o que lhe provocaram foi uma sensação de descrença e vazio.
No entanto, ali estava ela, em busca de algo maior do que palavras, então deveria ser verdade quando diziam que a procura por Deus sempre acontecia mais pela dor do que pelo amor. Ela não era hipócrita de dizer que não sentia mais raiva por suas dores do passado, como também não ia dizer que não sentia raiva agora pelo que Gilbert estava passando. Ele mais do que ninguém merecia uma vida boa, então, por que não existia um alivio ou uma solução rápida para o problema em sua cabeça sem ser aquela maldita cirurgia? Ela continuava com medo, e esse sentimento a paralisava por completo em suas ações no dia a dia, nos seus estudos e no seu relacionamento com Gilbert.
Anne fizera as provas dos últimos dias com facilidade mais pelos conhecimentos anteriores do que por conseguir estudar para elas. Ela mantinha os livros abertos em cima da mesa, porém, seus pensamentos vagavam para fora deles e se concentravam em Gilbert ao invés da matéria de literatura. As tarefas da casa eram realizadas automaticamente, e mesmo o jantar que preparava todas as noites com capricho não tinha gosto nenhum, porque seu apetite fora embora assim como sua calma e sua paz. Até os momentos com Gilbert tinham mudado, não em nível de paixão, pois essa continuava a mesma. Faziam amor com o mesmo fogo de antes, mas, todas vez que estavam deitados na cama descansando um nos braços do outro, ela se perguntava se não seria a última vez que ficariam assim. Ela vivia no automático, desejando que aquilo tudo passasse logo, e ela pudesse enfim respirar aliviada assim que Gilbert estivesse em casa com ela completamente recuperado. Mas, outros pensamentos sempre acompanhavam esse, e se acontecesse diferente do que desejava? O que faria e como lidaria com os dias difíceis sozinha em uma cidade grande? Ela tinha Cole, mas, o amigo também a vida dele para cuidar, não poderia estar ao lado dela todo o tempo, e recorrer aos seus amigos de Avonlea estava fora de cogitação, pois, todos estavam ocupados demais com seus próprios compromissos para se deslocarem para Nova Iorque naquele momento. Era óbvio que faria qualquer coisa por Gilbert, deixaria tudo de lado para se dedicar a ele, assim como fizera em Avonlea, mesmo que ele a tivesse feito prometer que ela não mudaria nada em sua rotina por ele.
Anne permaneceu de olhos fechados por muito tempo, e nem percebeu que chorava durante sua oração. Ela sentiu um toque em seu braço e quando abriu os olhos, uma senhora simpática estava sentada a seu lado e a olhava com simpatia.
- Desculpe-me por atrapalhar seu momento de oração, minha querida, mas, não pude deixar de notar sua tristeza, e fiquei imaginando o que poderia estar perturbando uma jovem tão linda.
Anne passou as mãos pelo rosto enxugando as lágrimas que continuavam a cair, e disse tentando sorrir:
- Acho que independente da idade, todos nós temos problemas com os quais lidar.
- Bem, se está procurando conforto espiritual veio ao lugar certo.- a simpática senhora disse.- Me chamo Nora.- ela estendeu a mão para Anne que a pegou com cuidado e a apertou dizendo:
- Me chamo Anne com e.
- Que nome lindo! Assim como a dona.- Nora disse mantendo a mão de Anne entre as suas, e Anne não se importou. Apesar daquela senhora ser alguém estranho, ela descobriu que um pouco de companhia a ajudava a se sentir melhor naquele instante.
- Obrigada. Eu realmente preciso de ajuda, mas, não sei se a encontrarei aqui.- ela disse, a voz saindo em um tom amargurado que impressionou Nora.
- É claro que sim, minha querida. Basta pedir com o coração sincero e Deus atenderá o desejo do seu coração.- Anne a olhou cética. Como queria acreditar que ali estava a resposta para o seu desespero.
- Eu não sei se consigo acreditar nisso.
- Diga-me, minha querida. Por que veio até aqui?- Nora fez a pergunta olhando-a profundamente.
- Porque eu não tinha mais nenhum lugar para ir.- Anne disse e estava sendo sincera, porque já tinha tentado de tudo para deixar seu coração em paz, e nada havia adiantado. Aquele fora o único recurso que lhe restara quando todos os outros haviam falhado.
- Não parou para pensar que talvez tenha sido condicionada a fazer isso?
- Como assim? – Anne perguntou olhando para a boa senhora confusa.
- Você pode pensar que veio até aqui levada por um sentimento de desespero e até de descrença, mas, o seu coração sabia que aqui era o lugar certo para você estar e que encontraria aqui o alimento para a sua fé.
- Faz muito tempo que não piso em uma igreja, e nem sei se Deus ainda ouve as minhas preces.- Anne disse sentindo sua garganta se apertar.
- É claro que Ele ouve. Deus não desampara ninguém. Você pode ter desistido de Deus, mas, Ele não desistiu de você.- Nora disse aquilo com tanta convicção que fez Anne fixar seus olhos nela admirada.
- A senhora realmente acredita nisso?
- Sim, como acredito que a felicidade nesse mundo é possível se acreditarmos que ela anda ao nosso lado sempre, e basta estender a mão para alcançá-la.- Anne ficou pensativa por um minuto e Nora lhe perguntou em seguida.- Não quer me dizer o que a aflige?- Anne ficou em dúvida por um instante se deveria dizer o que estava acontecendo com Gilbert, pois mal conhecia aquela senhora, porém, logo pensou que talvez fosse bom partilhar com um estranho o pesar de seu coração, pois estava exausta de fingir que se sentia bem com aquela situação para todo mundo que lhe perguntava. Limpando a garganta, ela disse:
- Meu noivo tem um coágulo no cérebro e precisa de uma cirurgia.- aquilo parecia mais real agora que dissera em voz alta e a fez estremecer de repente.
- É muito grave?- Nora perguntou interessada no relato de Anne.
- Sim, porque esse coágulo se desenvolveu por conta de uma lesão que ele sofreu no ano passado que o fez perder a memória por um tempo.- ela não queria se lembrar daquilo, porque cada vez que o fazia, parecia que revivia cada dia daquilo tudo em sua carne, e era mais uma forma de tortura para fazê-la sofrer.
- Sinto muito, Anne. Deve ter sido difícil. Você o ama muito?- Anne sorriu com a pergunta. Medir o tamanho do seu sentimento por Gilbert nunca fora fácil, e também explicar como se sentia em relação a ele sempre a colocava em uma situação difícil, porque não havia explicação para tal sentimento. Não foi uma coisa que aprendera no dia a dia, pois ela tinha certeza de que se sentia assim desde o primeiro minuto em que o vira. Fora amor à primeira vista, uma paixão insana que tentara negar, mas da qual não pudera escapar. Era um sentimento maior do que esperava que um dia fosse, e que duraria mais do que sua existência nessa terra.
- Eu o amo com todo o meu coração, e não consigo imaginar um futuro com outro homem que não seja ele.
- Então acredite que tanto sua fé quanto o seu amor podem salvá-lo. Milagres existem em todos os lugares, basta que tenha olhos para ver.- Nora disse. – Eu vou orar por ele em meu grupo de orações, e você verá que ficará tudo bem.- Nora soltou a sua mão, e Anne balançou a cabeça emocionada. Ela fechou os olhos por um instante. fazendo uma última oração antes de voltar para casa, e quando abriu os olhos e se virou para agradecer Nora, ela não estava mais lá.
Anne ficou sem saber o que pensar por um momento. Não era muito de acreditar em coisas paranormais, mas, naquele momento foi a única coisa que lhe ocorreu para aquela boa senhora ter sumido assim sem que conseguisse vê-la em parte alguma, contudo, logo balançou a cabeça e ponderou que estava pensando em absurdos.
Entretanto, quando saiu da igreja, curiosamente ela se sentia mais aliviada, e o peso que carregara até ali não estava mais dentro dela, e assim ela foi caminhando para casa deixando que seus olhos se enchessem com o colorido da estação que ela amava desde criança.
Assim que abriu a porta do apartamento, o olhar preocupado de Gilbert caiu sobre ela, ao mesmo tempo em que ele caminhou até onde estava e a abraçou com força, suspirando aliviado.
- Graças a Deus que chegou. Eu quase saiu para a rua novamente a sua procura. Por que demorou tanto para chegar em casa?
- Desculpe-me, amor. Eu não percebi que já era tão tarde. Sai da faculdade depois da aula de monitoria, e resolvi caminhar um pouco. Eu estava precisando de um pouco de ar puro.- ela respondeu se aconchegando mais naquele abraço que naqueles dias em que se sentia inquieta era a única coisa capaz de fazê-la relaxar.
- Por que? Aconteceu alguma coisa que te deixou chateada?- Gilbert perguntou afrouxando o abraço e encarando a expressão séria do rosto de Anne.
- Não é nada demais, Gilbert. Eu só precisava ficar sozinha, mas, agora estou bem.- ela disse tocando o rosto dele, e se odiando pela preocupação que marcava todas as linhas do rosto dele. Gilbert não podia se estressar, e ela estava dando a ele motivos de sobra para ficar tenso.
- Tem certeza de que não quer falar? Eu sei que posso te ajudar a se sentir melhor.
- Querido, não podemos apenas conversar sobre coisas menos sérias? Não quero que se preocupe à toa. Eu disse que estou bem e é verdade.- ela aproximou os lábios do dele, deu-lhe um selinho, e colocou sua bolsa sobre a mesa.
- Já começou a preparar o jantar?- Anne perguntou sentindo o cheiro de tempero que enchia o ar do apartamento agradavelmente.
- Está quase pronto na verdade. Só falta preparar a salada. – Gilbert disse seguindo-a até a cozinha. Anne levantou a tampa da panela e viu que ele tinha preparado seu prato favorito, bife à parmegiana.
- Que delícia. Vou me trocar e volto daqui a pouco para jantarmos juntos.
Então, ela foi até o quarto, tomou uma ducha rápida e voltou para junto de Gilbert que a esperava com a mesa toda posta. Eles se sentaram juntos na mesa, e enquanto se serviam da comida, eles conversaram sobre amenidades do dia. A refeição estava ótima, e Anne comia com prazer tudo o que Gilbert tinha cozinhado naquele dia, mas, quando colocou a segunda garfada do bife em sua boca, a bile pareceu encher seu paladar de fel, e ela saiu correndo em direção ao banheiro antes que vomitasse na mesa. Gilbert entrou no banheiro atrás dela, e segurou seu cabelo enquanto ela colocava tudo para fora do que acabava de comer. Quando terminou, ela lavou as mãos e o rosto, e olhou para Gilbert que a fitava com atenção, e um vinco na testa que mostrava bem o quanto aquilo tudo o estava afetando.
- Não me olhe desse jeito, Gilbert. Você sabe que fico assim toda vez que estou em um período tenso com as provas e tudo o mais.- ela não quis dizer que o tudo mais tinha a ver com a doença dele. Ele não precisava saber o quanto aquilo tudo estava mexendo com o seu emocional a ponto de fazê-la sentir náuseas em algumas refeições. Só não esperava que acontecesse aquilo bem na frente de Gilbert.
- A quanto tempo tem se sentido assim, Anne?
- Essa é a primeira vez que isso acontece, Gilbert. Eu passei muito tempo sem comer hoje.- ela explicou tentando fazê-lo desfazer aquela expressão apreensiva de seu rosto.
- Anne, eu já te disse para não ficar sem se alimentar. Isso só pode te fazer mal. Você sabe que seu estômago é sensível demais à suas mudanças emocionais.
- Eu sei. Vou fazer um chá para nós dois, está bem? – ela lhe deu um beijo no rosto e ia em direção à cozinha, quando Gilbert segurou em seu pulso e disse:
- Deixa que eu preparo. Me espere na sala que logo me junto a você. – Anne assentiu e se sentou no sofá de olhos fechados tentando relaxar o suficiente para fazer seu estômago voltar ao normal.
Gilbert voltou com o chá e algumas torradas que a fez consumir junto com o chá, pois não queria que ela ficasse de estômago vazio. Depois, ele se sentou no sofá, com a cabeça de Anne entre suas pernas e um livro de palavras cruzadas nas mãos. Anne estava tão cansada que acabou dormindo em pouco tempo, e com Milk pulando em seus calcanhares, Gilbert a levou no colo para a cama se deitando ao lado dela logo em seguida.
GILBERT
Gilbert suspirou aliviado ao terminar de responder a última questão da prova. Aquele exame tinha sido mais difícil que os anteriores, e exigira mais do seu raciocínio e bom senso para os problemas apresentados, mas, ele tinha conseguido terminá-lo no tempo exigido e acreditava que teria um bom resultado se não conseguisse a nota máxima. Assim, ele se levantou, entregou a prova e saiu da sala seguido por Jonas que o acompanhou até o refeitório.
Anne já estava lá esperando por ele sentada junto com Sharon que também esperava por Jonas, e ela acenou par ele assim que o viu. Eles caminharam em direção às duas garotas, e quando se aproximaram delas, Jonas se sentou ao lado de Sharon e Gilbert puxou Anne para seus braços, que o enlaçou pelo pescoço, e sorriu-lhe de um jeito tão doce, que ele quase a beijou ali mesmo, mas, se conteve porque o refeitório estava cheio de gente, e ele preferia esperar até que estivesse sozinho com ela.
- Como foi na prova? – ela perguntou acariciando os cachinhos dele.
- A prova não estava fácil, mas, creio que me sai bem.- ele respondeu colocando sua mão direita no ombro dela.
- Eu tenho certeza de que se saiu bem , meu amor.- Anne disse , beijando-o de leve no rosto.
- Vem comigo.- ele disse puxando-a para o lugar onde sempre ficavam juntos quando tinham a oportunidade, e sentando-se com ela embaixo de sua árvore favorita.
- Eu adoro ficar aqui com você, mas, por que estava com tanta pressa de vir para cá? Eu nem me despedi da Sharon.- Anne disse segurando na mão dele com carinho, passando o dedo indicador sobre sua linha da vida.
- Porque eu queria te beijar.- ele disse olhando para os lábios dela deixando claro suas intenções.
- E precisava me arrastar para cá para isso? Todo mundo sabe que somos um casal, e já estão acostumados com nossos beijos.
- Mas, não do jeito que quero te beijar agora.- ele a fez se sentar em seu colo, com uma perna em cada lado do seu corpo.- sua boca colidiu com a dela, com uma sede que surpreendeu a ambos, mas, ela não recuou e o seguiu naquele beijo, deixando que Gilbert explorasse cada parte de seus lábios sem pudor. Gilbert desceu as mãos até os quadris dela apertando-os contra os dele, fazendo Anne enrolar mais as pernas em sua cintura. Não havia mais ninguém ali a não ser o dois, por isso, Anne não se importou quando Gilbert colocou suas mãos embaixo da sua blusa, subindo-as por seu abdômen até alcançar o sutiã dela, que ele não tirou, mas, seus dedos se insinuaram por cima dele, fazendo Anne suspirar desejando que pudesse sentir o toque dele em seus seios nus. Ela colou os lábios no pescoço dele, e suas mãos acariciaram o peito dele sobre a camisa polo que ele usava naquele dia, e sorriu de olhos fechados ao ouvi-lo arfar. Gilbert tornou a beijá-la, e Anne sentiu a temperatura ficar cada vez mais quente, e quando sentiu os dedos de Gilbert no zíper de sua calça jeans, ela o empurrou, desgrudando seus lábios, deixando suas testas encostadas enquanto sua respiração ofegante era ouvida pelos dois.
- Era isso que quis dizer com me beijar?- Anne perguntou olhando-o nos olhos com seus rostos quase grudados.
- Desculpa, eu me deixei levar.- Gilbert disse sentindo seu coração descompassado. O que estava pensando quando a trouxera ali e a atacara daquele jeito? Nunca tinham feito isso antes em um lugar público, e ele estava envergonhado de si mesmo. Não queria fazer Anne passar por nenhum constrangimento se alguém os pegasse daquela maneira, porém, se ela não o tivesse parado ele sabia que perderia o controle totalmente.
Suas emoções andavam inconstantes naqueles dias, e pensar que no dia seguinte teria a resposta que vinha lhe angustiando nos últimos dias o deixava ainda pior, pois ele tinha quase certeza de qual seria a resposta, pois como estudante de medicina, ele sabia bem o que as dores que continuava sentindo significavam. Por isso, estar com Anne, beijá-la e tocá-la eram as únicas coisas que o impediam de pensar, pois quando se envolvia naquela onda quente de desejo por ela, nada mais passava por sua cabeça a não ser tê-la inteira para si.
- O que está se passando com você, Gilbert? Você nunca me beijou assim antes fora do nosso apartamento.- Anne perguntou com suavidade, e ele respondeu.
- Acho que estou ansioso por causa de amanhã, e queria distrair minha mente. Desculpa, amor, eu me excedi.- ele a abraçou e Anne respondeu com a cabeça em seu ombro.
- Eu entendo, mas, você podia ter conversado comigo e poderíamos juntos ter encontrado uma outra maneira de te distrair. Eu adoro ser tocada por você e te tocar, mas, aqui é um lugar totalmente inadequado para isso.
- Eu sei. Não vai mais acontecer, eu prometo.- Gilbert disse permitindo que Anne saísse do seu colo, e sentasse do seu lado.
- Quer falar sobre o que está te atormentando tanto? – Anne disse acariciando as costas dele para encorajá-lo a falar.
- Acho que nós dois sabemos, e não há nada para falar até que tenhamos uma resposta concreta do médico. - Gilbert disse apertando a mão dela contar sua palma.
- Não fica assim, amor. Eu vou estar lá com você.- Gilbert a olhou admirando lhe a beleza fresca e cada vez mais evidente. Ela desabrochava a cada manhã, e aquela força que ela lhe oferecia quando Gilbert sabia o quanto tudo aquilo também estava custando seu equilíbrio emocional lhe mostrava o quanto aquela garota era rara. Ele não a merecia, e no entanto, ali estava ela totalmente pronta a enfrentar o mundo com ele.
- Obrigado.- ele disse, beijando-lhe a mão, e depois perguntou:
- Como está se sentindo hoje?
- Estou ótima.- ela disse com um sorriso, mas, ele sabia que ela estava mentindo. Gilbert a vira se levantar discretamente da mesa naquela manhã, e ir par o banheiro onde ele a ouvira vomitar mais uma vez. Aquilo estava se tornando frequente naquela semana, e se não fosse pela improbabilidade de um pensamento que passara por sua cabeça, ele podia perfeitamente imaginar que era outra coisa. Contudo, apesar de tudo, ela continuava a mesma e nenhuma outra mudança no corpo dela ocorrera, então, pensar que o sonho mais incrível de ambos estava se concretizando era mesmo loucura. Anne andava tensa demais, e isso por si só era um fator que somatizado afetaria seu corpo físico.
- Você vai trabalhar na monitoria hoje?
- Sim, é o meu último dia, e então estou oficialmente de férias.
- Nós dois estamos, pena que ainda não podemos comemorar.- ele disse com tristeza.
- Não tem importância. Sua saúde vem em primeiro lugar.- Anne disse confortando-o.
- Eu prometo que vou te compensar depois.- Gilbert disse acariciando-lhe a nuca com carinho.
- Não precisa se preocupar com isso. Eu só quero que você fique bem.- Anne disse deitando sua cabeça no ombro dele, e ficaram em silêncio, cada um com seus pensamentos.
Gilbert fechou os olhos por um instante, sentindo a calma ao seu redor preenchê-lo. Era um daqueles momentos em que a vida fluía em seu próprio ritmo, e o mundo ao redor se tornava tão amplo que era quase impossível percebê-lo de uma só vez. Ele sentiu a mão de Anne na sua, e abriu os olhos para vê-la sorrir , apertando cada dedo da mão dele com força, como se quisesse que ele sentisse toda a energia dela naquele contato suave.
- Eu estou aqui, e sempre vou estar.- ela disse abraçando-o pela cintura.
- Eu nunca duvidei disso, Anne. O nosso amor é o maior apoio que tenho agora. Você é tudo para mim, e só queria que as coisas fossem diferentes, e você pudesse ser feliz a cada minuto do seu dia. Eu sei que te prometi que você somente teria motivos para sorrir desde que viemos para Nova Iorque, mas, falhei em minha promessa várias vezes, e espero apenas que um dia possa me perdoar por isso.
- Não há o que perdoar, Gilbert. A felicidade nesse mundo é muito relativa, e eu realmente sou feliz com você. As pedras vão sempre existir pelo caminho, e nunca pensei que viveríamos em um mar de rosas, mas, é isso que nos torna fortes, e somos muito mais juntos. Eu só quero estar com você a cada passo dessa nova batalha, e por favor, me deixe fazer parte dela, não tente me proteger demais.- Gilbert a envolveu em um abraço intenso. Seu amor para ela gritando dentro dele com toda a sua força. De tudo aquilo, a única coisa que o motivava a continuar era Anne, e não desistiria nunca somente por ela.
O tempo passou e eles tiveram que voltar para sala de aula, mas, Gilbert sentia que aqueles poucos momentos que ficaram juntos ali envolvidos em sua própria esfera foram importante para reforçar a sua fé em si mesmo, e na sua capacidade de resistir a qualquer revés da vida, desde que Anne lhe sorrisse como fazia naquele momento. Eles se despediram na porta da sala dela, e ao deixá-la, ele olhou várias para trás e a encontrou no mesmo lugar esperando que ele sumisse de vista para entrar na aula, e antes de virar no corredor para alcançar sala dele, ele acenou, e Anne lhe mandou um beijo pelo ar que Gilbert fingiu pegar com uma das mãos e colocou-a em cima de seu coração.
Gilbert realizou o restante das provas aquele dia sentindo-se mais confiante. Falar com Anne no intervalo tinha levantado o seu ânimo de tal modo que já se sentia capaz de enfrentar o diagnóstico do dia seguinte sem entrar em uma crise de ansiedade muito grave. Ao final da aula, ele pegou seu material, se despediu dos amigos, pois somente se veriam depois das férias e saiu andando pelo corredor em direção à sala de. monitoria. Queria dar uma última olhada em Anne, antes de ir para casa, pois não trabalharia no laboratório, e teria a tarde toda livre até que ela voltasse para casa.
Ele chegou na porta de vidro e apenas a observou de longe. Ela estava inclinada sobre um livro e explicava a matéria contida ali para uma aluna que parecia claramente interessada em suas explicações. Gilbert desejou que ela levantasse a cabeça e que olhasse para ele um segundo, porque aqueles olhos azuis tinham tanta pureza e sinceridade que provocavam dentro dele tantos sentimentos bons, além de dar-lhe a certeza de que por mais alto que fosse o muro que teria que ultrapassar, o que encontraria do outro lado fazia valer o esforço.
Porém, ela continuou entretida com sua aula, e não o viu parado ali todo bobo olhando para ela, assim, ele resolveu ir para casa e esperar por ela. No entanto, uma ideia se formou em sua mente e ele decidiu colocá-la em prática.
Deste modo, Gilbert caminhou por mais alguns minutos e chegou ao destino planejado. Ele subiu os degraus de mármore tão bem conhecidos por ele, e encarou a recepcionista que recebeu-o com um sorriso.
- Dr. Blythe. A quanto tempo.
- Olá, Amanda. O Dr. Spencer está ocupado?
- Não. Ele não tem nenhum paciente em sua agenda agora. Gostaria de falar com ele?
- Sim, se ele não se importar de eu não ter marcado hora.- Gilbert respondeu coçando a testa por um segundo.
- Creio que ele não se importará. Espere um minuto que vou falar com ele.- ela disse se levantando e caminhou até a porta do consultório do Dr. Spencer equilibrando em seu sapatos de salto alto pretos. Depois, de alguns segundos, ela retornou com o mesmo sorriso nos lábios com o qual o recebera e disse:
- Pode entrar. Ele o está esperando.
- Obrigado. - Gilbert disse com um sorriso.
Ao entrar na sala elegante do Dr. Spencer, o bom médico o olhou com uma expressão preocupada e disse:
- Olá, Gilbert Por favor, sente-se. - O rapaz obedeceu e o Dr. Spencer perguntou: - Algum problema com a Anne?
- Não no momento.- Gilbert respondeu um tanto hesitante.
- Então, o que o trás aqui?- O Dr. Spencer perguntou intrigado.
- Bem. O senhor deve saber sobre o meu problema atual.- Gilbert não se sentia confortável falando sobre aquilo, mas viera ali não por si mesmo, mas por Anne.
- Sim. Dora me contou. Sinto muito, meu rapaz.- o olhar de compaixão do médico fez Gilbert sentir um aperto dentro de si, e o rapaz fez um esforço imenso para não chorar, e com a voz baixa ele disse:
- Obrigado. Mas, eu vim aqui pedir que o senhor, por favor, cuide da Anne, porque eu sei que vamos passar por um período turbulento de novo, e eu não sei até que ponto ela vai conseguir suportar a pressão de toda a situação.- Gilbert parou de falar, porque o fôlego lhe faltou, tamanha ansiedade que o acometeu ao dizer tudo de uma vez. Ele baixou a cabeça e a tomou entre as mãos, tentando dessa forma respirar com mais calma.
- Tentando proteger a Anne de novo, Gilbert?- O Dr. Spencer disse com simpatia. Gilbert levantou a cabeça e respondeu:
- Dessa vez, ela precisa de proteção de verdade, Dr. Spencer. Eu não estou exagerando. Anne não tem ninguém nessa cidade a não ser a mim, e eu tenho medo do que pode acontecer se as coisas não saírem como esperamos. Ela é forte, eu sei disso, mas, até quando Anne conseguirá se manter firme, sem esmorecer? Por favor, somente me prometa que vai ajudá-la a passar por isso sem cair naquela depressão que a arrasta para um mundo onde ninguém consegue alcançá-la . Eu já a vi assim, e sei do que estou falando.
- Gilbert, eu entendo, e prometo que vou estar por perto se ela precisar de mim, mas, você também precisa se preocupar consigo mesmo. Como anda se sentindo?- Gilbert não viera ali para conversar sobre os seus sentimentos, mas, de repente, se sentiu tentado a falar, porque nas últimas horas tudo o que tinha feito era dizer a si mesmo que tudo ficaria bem, ainda assim, aquele aperto em seu coração não passava e quando pensava em Anne, aquela sensação só piorava.
- Estou tentando aguentar da melhor maneira possível. Às vezes, eu acho que tudo vai passar rápido, e que isso é apenas um sonho ruim do qual eu vou acordar logo, e outras vezes, parece que estou me afogando e não consigo chegar na superfície nunca.
- Você precisa ter fé, e acreditar no melhor sempre, é assim que batalhas difíceis são ganhas. E as dores de cabeça?
- Diminuíram, porém, não passaram, então, acho que nós dois sabemos o que isso significa. – Gilbert disse encarando o médico mais velho nos olhos.
- Sim, cirurgia, não é?- Gilbert balançou a cabeça desolado. Ele esperara tanto que aquele procedimento fosse evitado, mas, seu corpo não colaborara, e a medicação não tivera o efeito desejado.
- Vai dar tudo certo, Gilbert. Você é jovem, e na sua idade toda recuperação é mais rápida. Fique tranquilo, Gilbert, e se precisar conversar, eu estou aqui.
- Obrigado, Dr. Spencer. Eu preciso ir, pois, Anne logo estará em casa, e vai ficar nervosa se eu não estiver lá quando ela chegar.- Gilbert disse se levantando, sendo acompanhado pelo Dr. Spencer até a porta.
- Até logo, Dr. Spencer, e mais uma vez , obrigado por tudo.
- Por nada. Venha me visitar quando tudo isso passar.
- Vou tentar.- Gilbert disse com a voz triste, e assim deixou a clínica do Dr. Spencer e voltou para casa.
Anne não demorou a chegar, e deu a Gilbert um sorriso cansado assim que entrou em casa. Ela foi até Gilbert, apoiou suas mãos no peito dele e o beijou, depois, olhando-o nos olhos, ela perguntou:
- Como você está?
- Eu estou bem, Anne. Não se preocupe.- ele tocou o rosto dela com carinho, e Anne fechou os olhos deixando que ele percebesse toda a fragilidade dela naquele momento. Gilbert a observou melhor, e viu o rosto pálido dela, e aquele ar de quem precisava de uma boa refeição e horas extras de sono.
- Por que não se deita um pouco? Eu estava preparando o nosso jantar.
- Acho que vou aceitar a sugestão. Estou tão cansada, e o engraçado é que nem trabalhei tanto assim.- Anne disse se apoiando em Gilbert.
- Está se sentindo mal?- ele perguntou preocupado. Anne parecia quase sem forças.
- Não, é cansaço mesmo. A correria de todos esses dias acabou comigo.
- Vai descansar então. Quando o jantar estiver pronto, eu te chamo.- Gilbert disse acompanhando-a até o quarto, ajudando-a a se acomodar na cama.
- Obrigada, amor.- ela disse bocejando e se acomodando entre os lençóis.
Gilbert a beijou na testa, apagou a luz e saiu do quarto. Uma hora depois ele retornou para chamá-la para o jantar, mas, Anne estava mergulhada em um sono profundo, e Gilbert não teve coragem de acordá-la.
Ele voltou para a cozinha e acabou jantando sozinho, guardando a comida no forno para mantê-la aquecida caso Anne acordasse mais tarde e quisesse comer alguma coisa, mas, isso não aconteceu, e Gilbert não gostou da ideia de deixá-la dormir sem comer nada, por isso, ele foi até o quarto e chamou o nome dela baixinho, enquanto acariciava seus cabelos e beijava o seu rosto. Anne abriu os olhos sonolentos, e sorriu de leve ao vê-lo ali ao seu lado.
- Olá, dorminhoca. Já é tarde, não quer comer nada?- ele perguntou com o queixo apoiado no ombro dela.
- Não estou com fome.- ela respondeu se levantando e deitando a cabeça no peito de Gilbert, mostrando a ele o quanto ainda estava exausta.
- Você precisa comer alguma coisa. Que tal um copo de leite com rosquinhas? Eu posso trazer para você se quiser.
- Acho que quero tomar banho antes.- Anne respondeu, colocando os pés para fora da cama, e quando foi se levantar, ela pareceu ficar tonta, e Gilbert segurou-a pela cintura antes que fosse ao chão.
- Anne, o que foi amor? Está com tontura?
- Não sei. Acho que tem razão. Tenho mesmo que comer alguma coisa. Você me ajuda a chegar ao banheiro?- ela pediu parecendo tão frágil que fez Gilbert suspirar ainda mais preocupado.
- Claro. Apoie-se em mim.
Ele continuou segurando-a pela cintura e a levou para o chuveiro, onde ela se despiu e entrou em baixo na água morna. Anne começou a se ensaboar, e Gilbert percebeu que ela tremia, então, ele também se despiu, a abraçou colando seus corpos e ficaram assim enquanto a água caía sobre eles, sendo o único ruído que se ouvia naquele pequeno espaço onde ambos se mantinham presos um ao outro.
Gilbert desligou o chuveiro, ajudou Anne a se enxugar, a se vestir, e a fez se deitar na cama de novo. Em seguida, ele foi até a cozinha, preparou um copo grande de leite em uma bandeja junto com rosquinhas de leite, e voltou para o quarto onde Anne o esperava com a cabeça apoiada no travesseiro. No momento em que Gilbert entrou, ela se sentou novamente na cama , e deu-lhe um sorriso fraco.
- Obrigada.- ela disse assim que Gilbert colocou a bandeja em seu colo.
Gilbert observou-a comer sem dizer nada. De vez em quando seus olhos se encontravam, e eles se comunicavam dessa maneira, pois ambos sabiam por instinto o que cada um pensava naquele momento.
O dia seguinte pairava sobre eles como um divisor de águas, pois eles tinham consciência que só depois do diagnóstico final do médico era que poderiam decidir o que fazer com suas férias e suas vidas.
Anne terminou sua singela ceia noturna, e depois tanto ela quanto seu noivo escovaram os dentes e voltaram para a cama. Eles se deitaram lado a lado, de mãos dadas como faziam todas as noites, se perderam em pensamentos enquanto esperavam por um sono que não vinha. Depois de certo tempo, Gilbert ouviu Anne se remexer ao seu lado, colocar a mão esquerda no ombro dele e dizer:
- Gilbert, não consigo dormir, me abraça?- ele se virou no escuro em direção a ela, vendo apenas de relance os traços do rosto de Anne. Gilbert a puxou para seus braços, enquanto Anne se aconchegou a ele com seus rostos colados. O rapaz percebeu que ela chorava em silêncio, pois a umidade da sua pele era algo que ele não podia ignorar, mas, não a questionou sobre isso, ele apenas se limitou a acariciar seus cabelos, beijar-lhe os lábios com carinho, e deixá-la livre para desabafar sua angustia como quisesse. Depois de algum tempo, Anne pareceu adormecer, mas Gilbert continuou insone por mais algum tempo, sentindo-a suave em seus braços, aspirando o perfume de seus cabelos, ouvindo a respiração de Anne, e quando o sono chegou, Gilbert murmurou o nome dela antes de fechar os olhos e finalmente se afundou na paz de sua inconsciência.
ANNE E GILBERT
Despertar no dia seguinte não foi fácil para nenhum dos dois, pois precisaram de uma dose extra de coragem para colocarem os pés para fora da cama , fazerem sua higiene pessoal e tomar o café da manhã de maneira habitual.
Eles se sentaram a mesa, um de frente para o outro, porém, Anne não encarava Gilbert diretamente, por medo que ele pudesse perceber toda a sua apreensão. Dali a pouco, eles iriam até o hospital onde por fim saberiam os resultados dos últimos exames que Gilbert fizera, e ela finalmente arrancaria de dentro de si aquela sensação horrível de catástrofe eminente que estava minando toda a sua coragem, atacando seus nervos de maneira terrível.
Na noite anterior, ela chegara no seu limite, tanto que seu mal-estar fora causado por falta de alimentação e sono. Anne não estava mais controlando a tensão em seu corpo, por isso seu estado físico estava sofrendo.
Gilbert precisava dela, e por isso não podia se dar ao luxo de adoecer também. Ela tinha que se manter sobre os seus próprios pés, porque se entregar agora não faria bem a si mesma e nem a Gilbert. No entanto seu corpo resolvera falhar, deixando-a fraca, e naquela manhã, Anne não se sentia melhor do que no dia anterior , mas fingia que estava bem, pois se Gilbert soubesse do seu real estado, iria se encher de preocupação, e era a última coisa que precisavam naquele momento.
Ela sentiu a mão de Gilbert sobre a sua em cima da mesa, e seus olhos procuraram pelos dele que pareciam acariciá-la com seu jeito de olhá-la.
- Tudo bem?- ele perguntou um tanto hesitante. Anne parecia querer evitar de falar do compromisso que teriam naquela manhã, mas Gilbert sabia que a mente dela trabalhava fervorosamente.
- Sim, e você?- ela perguntou esperando pela resposta dele, pois não conseguia enxergar mais nada naquele rosto. bonito, além da aceitação calma do que estava por vir. Talvez ele estivesse disfarçando bem seus sentimentos, Anne não sabia dizer, mas, vê-lo sorrir no meio do caos fazia um bem enorme ao seu coração.
- Eu estou bem, Anne. Pare de se preocupar comigo dessa maneira.- ele disse acariciando seu queixo de leve.
- Você sabe que está pedindo o impossível. Como não vou me preocupar com você, se eu te amo?- ela disse aquilo em um tom calmo, no entanto apaixonado, que fez Gilbert responder:
- Eu também amo você, e quero que se lembre disso sempre.
- Eu sei. Somos parte um do outro, não é? - ela sorriu como confirmando o que ela própria dissera, e Gilbert entrelaçou sua mão direita na esquerda dela e respondeu:
- Sim. E é por isso que sempre sei o que está pensando ou sentindo. E sei que nesse momento está com medo do que vai ouvir do médico no hospital , e confesso que eu também. Eu Gostaria de poupar você disso, mas infelizmente, não existe nenhuma porta aberta por onde podemos fugir disso tudo.
- Eu não quero fugir, pois quero enfrentar o que quer que seja com você. E se você segurar em minha mão assim, sei que consigo matar mais esse dragão com você. - Gilbert sorriu pensando que não poderia esperar menos de Anne. Ela podia estar tremendo de medo por dentro, mas enfrentaria esse medo por ele, e Gilbert nunca se sentira tão grato por ser amado tão completamente dessa maneira.
- Obrigado Anne, por estar aqui. Você não sabe o que significa ter seu amor mesa momento.
- Você sabe que eu enfrentaria um oceano inteiro por você, não é
- Eu faria o mesmo por você.- Gilbert respondeu beijando as duas mãos dela sobre a mesa.
- Então, acho que está na hora de irmos até o hospital e sabermos o que o destino nos reservou dessa vez. Está pronto?
- Sim.- Gilbert disse sentindo-se mais animado com o olhar firme que Anne lhe lançou. Estavam juntos de novo em mais uma batalha, e isso era todo o suporte que ele precisava para continuar firme e inteiro.
Deste modo, foram até o hospital caminhando, e observando cada detalhe pelo caminho. De repente, todas as pequenas coisas pareciam importar para Gilbert na eminência do que estava para acontecer. As flores nunca lhe pareceram tão bonitas, e o céu nunca se mostrara tão azul como naquela manhã. Seu olfato estava mais apurado, e o odor adocicado da estação que vinha até ele pela brisa misturado a outros tão comuns no centro daquela grande cidade, lhe dava um senso de realidade de tudo o que ele estava vivendo com Anne a quase um ano, em um mundo totalmente diferente do que ambos estavam acostumados até então.
Dois filhos da terra que deixaram suas origens para se aventurarem juntos em uma cidade imensa onde todas as suas alegrias e tristezas eram partilhadas por seus corações, e ele podia dizer que encontraram bem mais do que estavam procurando, porque fora ali que seus sonhos amadureceram, e a realidade se tornara mais dura algumas vezes, fazendo com que Gilbert deixasse o menino ingênuo que fora de lado, para se tornar o homem que era agora com os olhos mais abertos e conscientes de que nem sempre o que se desejava era realmente o que realmente se precisava. E que a vida sempre tinha uma forma nada sutil de fazer as pessoas descerem de sua arrogância de acharem que já sabiam tudo, para lhes mostrar que sempre havia muito a se aprender, e que a sabedoria viria com o tempo, não tudo de uma vez, mas aos poucos conforme as experiências prepararia o caminho de cada um para que os frutos colhidos de cada nova empreitada fossem saboreados com consciência e maturidade.
Ele olhou para Anne que caminhava ao seu lado tão corajosamente, e a abraçou pela cintura, e no momento em que ela deixou que seus olhos pousaram sobre ele, Gilbert soube que ali estava sua vontade de continuar lutando, sua fé de que teriam um amanhã mais bonito e esperançoso. Gilbert queria viver para poder amar Anne um pouco mais, e dar a ela dias mais incríveis do que aquele que estavam vivendo. Ele queria viver para mostrar a ela que mesmo que ainda tivessem tantas pedras que dificultassem a caminhada de ambos, cada uma valia a pena, porque o amor absoluto que os esperava depois dos obstáculos que venceriam seria seu bônus final.
- Está com medo?- Anne perguntou ao vê-lo fitá-la intensamente.
- Não, enquanto eu estiver com você, não tenho medo de nada.- Gilbert respondeu apertando-a mais ainda contra ele. Anne levou a mão ao rosto dele, e tocou-lhe a face dizendo:
- Estou aqui, e sempre vou estar.- Gilbert assentiu e eles continuaram a caminhar até chegarem ao hospital.
Gilbert era o primeiro paciente do dia a ser consultado pelo Dr. Byron. Assim que chegaram, ele já estava esperando por eles em seu consultório, e pela sua expressão, Anne sabia que as notícias não eram boas. Ele tinha os exames de Gilbert na mão, e o examinava atentamente quando ambos entraram, e sem que ele lhes dissesse nada, Anne sentiu que o que mais temia realmente aconteceria, e não havia mais nada que pudesse fazer a não ser ter fé e rezar, ao mesmo tempo em que tentava abafar a onda de revolta que tomou conta dela, mesmo sem saber oficialmente os resultados dos exames, ela podia intuir em seu coração que não sairiam dali aliviados. Contudo, ela se manteve firme ao sentar-se ao lado de Gilbert, olhando atentamente para o médico que lhe sorria um tanto sem jeito, e segurando a mão de seu noivo tão forte como se daquele contato dependesse a vida dele.
- Bem, Gilbert, eu estava olhando os seus exames, e infelizmente as notícias que tenho nãos são as que você esperava.- Anne sentiu um bolo se formar em seu estômago, e ela engoliu em seco enquanto uma náusea subia até sua garganta ameaçando fazê-la botar para fora o pouco que havia comido aquela manhã, e um suor frio começou a brotar em sua testa evidenciando seu descontrole emocional interno.
- O senhor quer dizer que o coágulo continua no mesmo lugar, e a medicação não funcionou.- Gilbert disse com firmeza, e o médico o olhou com certa admiração.
- Eu não devia me espantar por você saber disso, afinal é estudante de medicina, mas, não achei que aceitaria isso com tanta calma. A maioria chega aqui tremendo nas bases antes mesmo que eu diga alguma coisa, e acabam surtando quando o diagnóstico se confirma, e no entanto, você parece já ter se preparado para as más notícias.
- Dr. Byron, eu já passei por muita coisa para saber que raiva e inconformismo não nos levam a nenhum lugar. Nós dois sabemos que nesse meu caso não existe outra opção a não ser a cirurgia. Então, acho melhor conversarmos sobre isso, e tudo o que tenho que fazer nos próximos dias.- Anne ouvia a conversa em silêncio, ela não se sentia capaz de falar ou emitir qualquer opinião, sua cabeça doía, o estômago rodava, e ela tentava a todo custo esconder seu mal-estar de Gilbert. De vez em quando, ela percebia seus olhares sobre ela, porém, Anne apenas fingia que prestava atenção no que o médico falava mas, se lhe perguntassem, a única palavra que se destacava em letras garrafais na sua cabeça era "cirurgia". Seu pesadelo era real, estava de novo no limbo de seus sentimentos tortuosos que a empurravam para o fundo da sua angústia.
- Quanto tempo dura a recuperação pós-cirurgia, Doutor?- Gilbert perguntou, pois precisava saber tudo o que envolvia o procedimento o qual sofreria nos próximos dias.
- Se a recuperação for rápida, no máximo em vinte dias você estará novinho em folha.- o médico disse em tom de brincadeira, porém, Anne não sorriu. Ela estava mais preocupada com sua necessidade de sair correndo dali e aliviar seu estômago que começava a torturá-la com o sabor amargo em sua boca.
- A cirurgia deve ser realizada daqui no máximo uma semana. Não podemos esperar mais.- o médico os alertou.
- Combinado, doutor. Vou apenas terminar de organizar algumas coisas, e na próxima sexta-feira estarei de volta.- ele se despediu do médico com um aperto firme de mão, e Anne fez o mesmo. Já no corredor, ele olhou para ela que se mantinha estranhamente calada e perguntou:
- Está tudo bem, Anne?
- Sim, será que pode me esperar por um instante?- ela disse, de repente parecendo muito pálida.
- Claro.- Gilbert respondeu vendo-a se dirigir ao banheiro feminino, sabendo exatamente o que estava acontecendo com ela. Aquela situação estava cobrando mais de Anne do que dele, e Gilbert não suportava vê-la assim.
Quando ela retornou, parecia um pouco melhor, pelo menos a palidez tinha diminuído um pouco. Gilbert se aproximou, pegou na mão dela e perguntou:
- Está melhor?
- Sim, obrigada.- ela respondeu agarrando a mão dele e não a largou mais.
A volta até o apartamento foi feita em silêncio. Gilbert tinha medo de falar e deixar Anne mais nervosa do que já estava, e a ruivinha evitava dizer qualquer palavra por pavor de desabar em lágrimas. Ela prometera a Gilbert que seria forte, e não podia voltar atrás.
Eles passaram o resto do dia evitando falar sobre a cirurgia de Gilbert marcada para o fim da próxima semana, porém, o rapaz sabia que era uma fuga inútil da realidade, pois teriam que falar sobre isso uma hora ou outra, e enquanto arrumava seus livros de medicina nas estantes do apartamento, ele observou Anne se mover pelo apartamento freneticamente, sem parar um minuto sequer. Cansado de vê-la correr de um lado para outro limpando cada canto da sala por minutos intermináveis, Gilbert terminou de organizar suas coisa, foi até Anne que estava ajoelhada esfregando uma mancha imaginária perto da janela, a fez se levantar e disse:
- Agora chega.
- Não, eu ainda não acabei de limpar a mancha toda.- Anne disse em protesto aquela interrupção.
- Não tem mais mancha nenhuma. Vá tomar banho e se trocar que vou te levar para jantar.
- Eu não quero sair de casa, e não estou com ânimo para me arrumar.- Anne disse desanimada.
- Pode vestir o que quiser. Não vamos muito longe. Você precisa sair daqui um pouco. Passou o dia todo me evitando, e nós dois sabemos por que.- ele disse sério, e Anne apenas assentiu se sentindo envergonhada por seu comportamento, e foi em direção ao banheiro onde tomou uma ducha rápida . Depois, ela caminhou até o quarto, escolheu uma calça jeans simples, uma blusa preta no estilo regata, sapatilhas baixas e prendeu seus longos cabelos em um rabo de cavalo. Quando saiu do quarto a procura de Gilbert, ela o viu esperando na sala por ela. Ele também havia tomado banho, seus cachinhos estavam úmidos, e ele vestia jeans, camiseta de algodão branca e tênis azul marinho. Quando a viu, Gilbert deu-lhe um sorriso tão calmo que nem parecia que dali a uma semana estaria arriscando sua vida de novo.
Ele a levou naquele restaurante italiano que ambos adoravam, onde eles passaram momentos agradáveis, mas, apesar do ambiente descontraído, Anne não conseguia relaxar. Ela mal tocou na sopa com ervas que Gilbert pediu para ambos, e comeu muto pouco do pudim de leite que o garçon serviu como sobremesa. A única coisa na qual conseguia pensar era que em uma semana sua vida iria mudar de novo, e não sabia se estava preparada para viver tudo aquilo novamente. No final da refeição, Gilbet a puxou pela mão, e enquanto um rapaz elegante tocava músicas italianas e românticas no piano, ele levou Anne até um salão que servia como pista de dança para os clientes, ele a tomou em seu braços e começou a dançar com ela.
Anne não se sentia no clima para aquilo, mas, estar abraçada a Gilbert naquele momento em que se sentia tão miserável era tão bom quanto irresistível, e assim, eles dançaram várias músicas juntos, até que Anne pediu para ir para casa, porque sentia que estavam apenas fingindo que tudo estava bem quando na verdade, Anne via seu mundo desabando ao redor dos dois sem que pudesse fazer nada.
De volta ao apartamento, Gilbert não deixou mais que ela se esquivasse dele, e no momento em que as luzes da sala se acenderam, ele a fez se sentar ao lado dele no sofá e perguntou:
- Vai me dizer qual é o problema?
- Nós dois sabemos qual é o problema, eu não preciso dizer nada.- ela disse quase zangada e Gilbert respirou fundo, tentando ter paciência com mais uma crise de Anne que estava a ponto de explodir.
- Eu pensei que estávamos juntos nessa.
- É claro que estamos juntos, Gilbert.- Anne disse surpresa pelo tom de voz dele.
- Não é o que parece. Você está agindo como se eu tivesse culpa pelo que está acontecendo.- ele disse aborrecido, e Anne arregalou os olhos ante aquelas palavras sem sentido.
- É claro que não, amor. Não seja bobo. Você é a última pessoa nessa situação toda que é culpado de alguma coisa. -ela disse tocando os cabelos dele.
- Então, por que mal me deixou te tocar hoje? Você ficou longe de mim o dia todo.- a voz dele se quebrou e foi só nesse momento que Anne percebeu o quanto ele estava tão magoado quanto carente. Ela se apressou em sentar no colo dele e abraçá-lo pelo pescoço enquanto dizia:
- Desculpe-me, Gilbert. Os meus pensamentos estão muito inconstantes hoje e eu não queria deixá-lo tenso ou preocupado. Não imaginei que esse meu estado de humor ia fazê-lo imaginar coisas contraditórias. – ela parou de falar e o beijou, tentando fazê-lo entender que a maneira como ela estava se sentindo não era culpa dele. Apesar de ainda estar chateado com o comportamento de Anne, Gilbert não conseguiu ficar indiferente a aquele beijo. Toda vez que aqueles lábios macios tocavam o seus, ele sabia que já estava perdido. Com um suspiro, ele entreabriu os lábios e saboreou os dela com paixão, fazendo a temperatura entre eles subir muito além do permitido. Eles se separaram por falta de ar, e ela disse no ouvido de Gilbert baixinho:
- Faz amor comigo. Eu preciso te sentir em mim mais uma vez.
Sem esperar mais, ele a levou no colo para o quarto, e quando a colocou na cama, Anne arrancou a camiseta dele, enquanto a blusa preta e o jeans que ela usava também eram tirados por Gilbert com uma pressa incrível. Nus, eles se deitaram na cama, e Gilbert deixou que Anne se deitasse por cima de seu corpo, beijando-a sem parar. Ela parecia tão excitante aquela noite, apesar de seu jeito um tanto quanto peculiar, pois cada toque dela em sua pele parecia mais faminto que o anterior, e sua excitação cresceu de um jeito que o fez gemer todas as vezes que seus corpos se roçavam, ou Anne deslizava as unhas dela por seu peito. A paixão queimava ambos como se estivessem em meio a lavas de um vulcão, e seus corpos necessitavam um do outro como se estivessem perdidos no deserto sedentos por mais carícias, por mais beijos, por mais sussurros e gemidos que escapavam pelos lábios de ambos que mal percebiam onde estavam. Os seios de Anne roçando o peito de Gilbert lhe davam mil e uma sensações diferentes, suas peles estavam tão grudadas como se fossem apenas uma, e o mundo girando ao redor deles era apenas mais um detalhe para tornara aquela noite de amor a mais intensa de todas. Talvez o medo do que teriam que enfrentar em pouco tempo fosse um dos principais ingredientes para todas as emoções desordenadas que estavam sentindo naquela noite, talvez a incerteza de não saber quando estariam assim novamente fizesse Anne se entregar ao seu homem por inteiro e sem reservas, ao mesmo tempo em que contagiava Gilbert com sua chama e sua paixão. Deste modo, eles se queimaram um no outro, e se descobriram um no outro também, e quando seus corpos se uniram, nada naquele instante poderia se comparar ao sentimento de êxtase que os tomou como dois bêbados se afogando no vício de se amarem sem barreiras, sem preconceitos, sem limites.
Quando Anne acordou no dia seguinte, o mundo parecia mais colorido e brilhante, e seu temor pelo que aconteceria dali a uma semana parecia ter desaparecido quase que totalmente. Ela se levantou sem acordar Gilbert, se vestiu e tomou café rapidamente, pois tinha combinado com Sharon de ajudá-la a comprar um presente para a mãe de Jonas que faria aniversário naquele fim de semana.
Antes de sair, ela deixou um bilhete para Gilbert dizendo onde tinha ido, pois se esquecera de falar com ele sobre isso no dia anterior por motivos óbvios. No instante em que pisou na rua, Sharon já a esperava sorrindo e a cumprimentou com um beijo no rosto.
- Bom dia, minha amiga. Como você está? Jonas me contou sobre a cirurgia de Gilbert. Ele estava trabalhando no estágio ontem no hospital e o Dr, Byron contou a ele.
- Estou bem, apesar de um pouco tensa com tudo isso.- Anne disse franzindo a testa. Não queria falar sobre aquilo logo nas primeiras horas da manhã. Ela estava se sentindo bem naquele dia, e não queria que a sensação horrível do dia anterior voltasse. Sharon percebeu sua pouca disposição para falar no assunto, e logo começou a tagarelar sobre as preferências de sua sogra de cor, perfume e flores.
A primeira parada de ambas foi uma floricultura, e enquanto Sharon procurava pelo arranjo perfeito, o olhar de Anne foi atraído por um vaso em estilo vitoriano. Encantada pela beleza dele, a ruivinha se abaixou para vê-lo melhor, e quando se levantou, ela sentiu tudo girar , sua vista ficou escura e não viu mais nada, desmaiando antes de chegar ao chão.
Quando abriu os olhos novamente, ela se viu deitada em uma cama macia, e se sentiu ansiosa ao identificar as paredes brancas do mesmo hospital em que estivera com Gilbert no dia anterior. Sharon estava sentada ao seu lado e chorava copiosamente, o que a fez se lembrar imediatamente de uma outra cena semelhante, mas era Mary quem estava no lugar de Sharon, e sua boa amiga lhe dera a pior notícia de sua vida. Nervosa com o comportamento de Sharon que não largava sua mão e continuava a chorar, ela perguntou:
- O que aconteceu Sharon? Por que está chorando?
- Anne... eu tenho uma coisa para te contar, mas, não sei como vai reagir.
- Conte-me logo, Sharon. Você está me deixando nervosa.- Anne disse apreensiva, e a amiga pegou suas duas mãos geladas entre as dela e disse:
- Você está grávida.- Anne não disse nada, apenas encarou a amiga com os olhos muito abertos enquanto uma única lágrima escorria pelo seu rosto.
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