C A P Í T U L O 42
— Nós estamos literalmente na merda. — reclama Bonnie mais uma vez. Reviro os olhos novamente acelerando para longe do estacionamento do colégio. — Ninguém havia dito que o carro do Ian era um Audi A3, um carro caro! Se nós ousarmos acidentalmente arranhar esse veículo, apenas nossos rins serão capazes de arcar com as despesas.
Estávamos no caminho para a casa de Henry e Bonnie surtou assim que colocou os olhos no carro de Ian.
— Vocês me obrigaram a ir pedir. Queria que eu fizesse o que? Pedisse para ele ir em uma concessionária mais próxima para trocar o carro por um que não coloque a venda dos nossos rins no mercado negro? — balbuciono tentando manter meu foco na estrada, porém de olho no banco traseiro através do espelho. Bonnie cruza os braços bufando.
Respiro fundo mais uma vez tentando continuar calma enquanto Mia vasculha os pertences de Ian que estavam pelo carro.
— Olha, ele esqueceu o celular aqui. — abre o porta - luvas tirando um celular com capa protetora de cor azul. Aquele não era o celular de Ian, reconheci pela capa. O aparelho era de John Hernandez.
— Tecnicamente é o carro dele, então ele deixou aqui, não esqueceu. — questiona Bonnie. Pela primeira vez desde que entramos naquele carro precisei concordar com o ser humano no banco traseiro.
— Quem hoje em dia anda sem celular? — questiona Mia colocando o celular no seu devido lugar. Bonnie não a respondeu. Ignorei toda aquela conversa.
O GPS seguia um caminho desconhecido para mim, de segundo em segundo verificava se estávamos no caminho certo, mas aparentemente era o certo.
A rua mórbida e deserta seria um ótimo cenário de filme macabro, haviam abóboras com caras assustadoras ao lado de cada caixa de correio desgastada.
— Um cenário perfeito para o Halloween. — zomba Mia forçando um sorriso.
— Ou para assassinato de adolescentes. — dramatiza Bonnie. — Tem certeza que é aqui?
Você acaba de chegar ao seu destino!
Nem precisei responder, o gps fez isso por mim. Olho a casa em que fui indicada a parar e observo a cor clara desgastada, a pequena escada que dava acesso a porta não parecia tão segura e uma cadeira antiga de balanço dificultava um pouco mais meu lado medrosa.
Abro a porta do carro decidida a saber como Henry estava e o que havia acontecido.
Assim que piso meus pés no chão um frio percorre minha espinha.
Mia repete minha ação e Bonnie receosa faz o mesmo.
Engulo seco todo o medo preso em minha garganta começando a caminhar para a casa.
Aperto a campainha ouvindo o barulho alto de um som irritante. Desvio minha atenção diversas vezes da porta para o carro cinza de Ian estacionado.
— Você travou todas as portas? — pergunta Mia se agarrando ao braço de Bonnie.
— Sim. — respondo ouvindo passos ágeis por trás da porta antes dela ser aberta revelando Henry visivelmente assustado com nossa presença ali.
As roupas casuais o vestiam bem, mas não combinavam nada com sua expressão cansada e incrédula.
— O que fazem aqui? — pergunta ríspido. — Vocês são loucas de virem para cá? E de quem é esse carro?
— Nós ficamos preocupadas com você. — respondo a primeira pergunta e a que menos achei rude.
— Não somos loucas por queremos visitar um amigo. — foi a vez de Mia.
— E o carro é do Ian. — Bonnie acrescenta. Ele ainda nos olhava de uma maneira estranha, como se não nos quisesse ali. Percebendo isso, Mia toma a iniciativa e entra na casa mesmo sem ser convidada.
— Vocês tem que ir embora agora. — ordena nos expulsando.
Bonnie e eu entramos na casa observando um pouco da bagunça que estava, tudo fora do lugar, como se tivesse acontecido uma briga.
— Se você não está doente, por qual motivo não foi ao colégio? — insiste Mia cruzando os braços.
— Vocês tem que ir embora! Aqui é perigoso, ainda mais com um Audi estacionado aqui na frente. — questiona desesperado ou talvez preocupado com a nossa visita em sua casa.
— Não vamos sair daqui até nos contar. — decreto fazendo pose de durona.
— Meu pai não é um bom homem, não vou poder voltar ao colégio até sair da equipe de torcida. Ele disse que é coisa de gente escrota e acha que eu ganhei uma bolsa de estudos dançando. — desabafa com lágrimas nos olhos. — Mas não ganhei dançando, eu me esforcei para entrar em um colégio bom, coisa que ele não reconhece.
Sabíamos da história de Henry Manchester e saber de tudo que ele precisou enfrentar para ter um futuro melhor é ainda mais admirável.
—Você tem grandes chances de ganhar uma bolsa de estudos em qualquer lugar do país, só pelo amor que coloca no seus passos. Não pode desistir por seu pai diminuir o seu talento! — aconselho sentindo meus olhos inundados simplesmente por ver meu amigo mal.
— Vocês precisam ir embora. Meu pai não é bom. — suplica fechando os olhos com força. — Ele não pode ver nenhuma de vocês aqui. — olhei na direção das meninas com a intenção que elas também tivessem percebido que era a deixa para irmos embora. Mas antes que pudéssemos fazer isso, a porta é aberta por um homem com quase cinquenta anos e aparência cansada. Assim que ele nos ver dar um sorriso sem humor.
— De qual das patricinhas é o carrão estacionado na frente da minha casa? — pergunta rudemente nos avaliando.
— Pai, elas já estão de saída. — Henry ignora a pergunta indicando a porta para irmos.
—Que isso? Faço questão delas ficarem, meus amigos vão amar. — a porta foi empurrada de uma maneira bruta pelo pé do pai de Henry, seu olhar era fulminante.
— Esse bairro não é lugar de donas de Audis. — engulo seco.
— Sr. Manchester, nós ficamos preocupadas com o Henry, por isso viemos para saber como ele estava. Nos importamos com seu filho. — disse Bonnie posicionada ao meu lado. Percebi seu corpo tremer de puro medo.
— Que lindo discurso! Fiquei emocionado. Ah, espera! Eu não tenho um coração. — fez uma pausa drástica. — Eu quero as chaves do carro.
Fico totalmente paralisada com seu pedido, o carro tem gps, é moderno, ele queria as peças?
— Por quê? — me atrevo a pergunta.
— Porque ele é ótimo para desovar corpos de pessoas que sabem muito. — esclarece estendendo a mão. — As chaves.
—O carro não é nosso. — minha voz falha.
— Garota, acha mesmo que eu acredito? — questiona se aproximando. — Se você quiser sua pele e das suas amigas a salvo é melhor entregar a merda da chave! — grita nos deixando assustadas, Henry apenas abaixou a cabeça visivelmente sentindo o mesmo medo que nós do próprio pai, mas a grande diferença é que ele era filho do homem na nossa frente, conhecia o pai e talvez pudesse o impedir. — Digam que foi um assalto a mão armada em um bairro perigoso, onde as mocinhas vieram ingenuamente. Todos sempre acreditam nisso, o carro é blindado, então obviamente tem seguro.
— Eu não vou entregar a chave. — digo com uma falsa confiança. O homem se afasta respirando fundo.
— Anna, se não entregar nós vamos morrer. — sussurra Bonnie.
— Eu não vou entregar a chave. — repito respirando fundo.
— O Ian vai entender, mas ele não vai deixar vocês saírem ilesas. — diz Henry pela primeira vez desde a ameaça do pai.
— Eu entendo a Anna, não sabemos o valor sentimental que esse carro pode ter na vida do Ian. — sussurra Mia me encarando.
— O seguro cobre. — retruca Henry.
— É melhor você ficar calado como fez até agora, Henry. Nós só estamos aqui porque nos importamos com a sua vida. — ordena Mia frustrada. — Mas você parece não se importar se seu pai vai apontar uma arma nos ameaçando de morte.
— Eu disse para vocês irem embora!
— Eu quero a merda das chaves do carro ou coisas ruins vão acontecer. — a irritação do pai de Henry chegou em seus olhos gélidos e um nervosismo percorreu todo meu corpo.
Aquele homem aparentava ser tão nauseabundo, tipo o péssimo literalmente. Não se via bondade ou compaixão por qualquer outra pessoa. Se precisasse matar, ele matava. Mas tudo isso por um carro? Claro, é um carro caro, só que não faz sentido matar pessoas inocentes por isso.
O olhar assassino do pai de Henry recai sob nós novamente. Um sorriso divertido surge em seus lábios, porém seus passos em nossa direção são impedidos pelo barulho irritante da campainha. Foi como se nossa salvação soasse pelo gongo.
O velho caminha sorrateiro para atender a porta.
— Temos que matar ele. — murmura Mia nos deixando assustadas, se é que fosse possível. A encaro profundamente incrédula com sua fala, mas um perfume conhecido impede qualquer repreensão da minha parte.
Encaro o loiro parado na porta com as mãos no bolso, seu olhar estava sob mim.
— Ah, temos mais visitas! — o velho finge animação. Ian, Roberto, Bryan, Thales e John adentram a casa de uma forma lenta, como se quisessem que cada passo fosse gravado ou documentado. — De quem é o carrão ai da frente? — pergunta fechando o sorriso que persistia em seu rosto.
— É meu, o Audi ai da frente é meu. — Ian responde com os olhos em mim. Aquele olhar frio e decepcionante que parece mutilar uma alma. — Não queremos problemas, só viemos buscá-las.
— Não querem problema? Tem um carro aparentemente caro na frente da minha casa, ah não, agora são dois carros e três patricinhas na minha sala desafiando a minha autoridade porquê se importam com meu filho. Você me diz que não estão à procura de confusão. — o homem volta a sorrir. — Esse carro não deve valer nada para um cara como você, é só estalar os dedos para ganhar outro do seu papai.
Analiso as expressões do loiro e percebo sua respiração tranquila, como se esse cara não fosse intimidador.
— Até eu gostaria que as coisas fossem tão simples assim. Mas digamos que eu não fale com meu pai e sou grato por ter uma mãe que dar duro pelos filhos. Então é mais difícil de estalar os dedos. — sua fala teve um misto de rispidez. Eu sabia aquela história e diria que Ian tinha sim a facilidade de estalar os dedos e conseguir o que quisesse, mas ele valorizava o merecer, o se esforça para ter algo que queira, pois é a única forma de chegar a algum lugar.
— Como meu amigo disse, não queremos problemas Sr. Manchester. — foi a vez de Roberto.
— Tudo bem. Mas não se esqueçam que esse não é um bairro para vocês, principalmente para garotinhas sozinhas. — olhou em nossa direção e indicou a porta com as mãos.
Mia e Bernice dispararam em direção a saída como se precisassem de oxigênio.
— O senhor precisa dar uma chance ao talento do seu filho. Ele é um excelente dançarino. — digo olhando no fundo da alma daquele homem tão gélido.
— Vamos, Anna. — ouço a voz grave de Ian me chamar encaro mais uma vez o homem acabado pela idade e começo a caminhar sob o olhar do garoto com uma expressão indecifrável.
Assim que saio da casa observo o jipe renegade de Thales estacionado na frente do Audi.
— Aqui parece um bairro tranquilo. — diz John analisando o lugar.
— Aqui é sinistro, sabe quantos assassinatos já foram cometidos nesse bairro? — questiona Thales fitando John. — Muitos, alguns deles até sem nenhuma pista de suspeitos. Mas qual foi a merda que vieram fazer aqui?
— Só viemos saber como um amigo estava. — responde Mia cruzando os braços.
— Vocês já ouviram falar das funções mensagens e ligações? Pois me parece que não.
—Pega leve, Thales. — repreende Bryan.
— Vocês estavam tão preocupadas com o amigo e ele não me pareceu com o mesmo sentimento, pois se o pai pegasse uma arma e apontasse na cabeça de cada uma, aposto que mesmo assim ele não questionaria o pai. — retruca Thales com um olhar reprovador, como se a nossa preocupação fosse errada. Sei que a repreensão foi diretamente para mim, ele não engoliu meu "namoro" com o amigo, isso é bastante visível, sou apenas uma desleixada que está usando um cara popular. Mas sinceramente não me importo com o que Thales pensa sobre mim, isso não acrescenta em nada na minha vida.
— É melhor irmos embora. — disse Roberto abrindo a porta do Jipe.
Encaro Ian que não falou absolutamente nada desde que saimos da casa, encostado na lateral do Audi. Sua expressão era amena e parecia mais calma. Sigo em sua direção com os braços cruzados e uma respiração pesada.
— É pelo carro? — foi uma pergunta clara, queria saber se ele ter vindo para cá foi justamente pelo maldito carro. Seus olhos azuis seguiram até meu rosto analisando minhas expressões.
— É melhor irmos embora. — disse fugindo da minha pergunta. Entrego as chaves em suas mãos encarando o fundo de seus olhos.
Espero que Ian Lewis destrave o carro para me sentar no banco de trás, sendo acompanhada de Bonnie e Mia, John Toby vai na frente já sorrindo por ter encontrado seu celular no porta-luvas. Porém aquilo não me interessava, eu estava bufando de pura raiva, saber que Ian Martin Lewis Lawrence havia saído do colégio apenas por está preocupado com o maldito carro fez meu coração doer, só que sei fingir que algo não tenha me abalado, mesmo quando me abalou.
Bjs♥
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