12. Véspera (p.4)
Zac escancarou a porta de supetão, seu rosto transparecendo uma certa ansiedade.
— Eu tenho uma coisa para dizer! — falou ele. — Bernardo, Bárbara e Bianca são filhos de César Veter, líder dos anjos de ar, e Grian, a Rainha dos elfos.
Delwen, que assistia da cama, aplaudiu a performance.
— Foi ótimo! — disse. — Direto ao ponto.
— Dramático demais?
— Também. — Delwen deu de ombros. — Ainda assim, a informação principal foi passada.
Zac se encaminhou outra vez para o banheiro.
— Eu vou tentar mais uma vez — disse ele, fechando a porta, e a abrindo logo em seguida — César Veter tem filhos híbridos!
Delwen inclinou a cabeça pensativo.
— Sucinto... até demais, talvez. Vai parecer um maluco se chegar falando assim.
Zac maneou a cabeça negativamente e riu, indo se jogar na cama, ao lado de seu noivo.
— Essa coisa de ensaiar não vai dar certo. Não adianta, vai ser melhor improvisar. — ele entrelaçou seus dedos entre os de Delwen, a pele branca se destacando em contraste com a morena.
— Eu também não acho que isso está dando certo ou que vai ter qualquer serventia.
— Teoricamente — disse Zac —, serviria pra eu ficar menos nervoso.
— E você está menos nervoso?
— Não.
— Então não serve para nada, Isac.
Zac olhou-o de lado, enquanto as íris amarelas de Delwen fixavam-se no teto, circundadas por uma densa massa de cílios escuros.
— Obrigado, Delwen, meu amor. Incentivador como sempre.
— Não há de quê — ele respondeu, e sorriu. Decerto não entendera a ironia.
***
Marina observou pela janela quando um homem estranho desceu do carro e foi recebido na porta do Café com Tequila por Jack. Era muito alto, de ombros largos e pele clara. Seus cabelos e sua barba eram cor de cobre, em um tom de ruivo mais claro do que o de Marina, com um par de chifres negros e lustrosos brotando entre os fios. Ele tinha um sorriso torto no rosto ao falar com Jack, e deu-lhe algumas batidinhas no ombro esquerdo antes que ambos estrassem e fugissem do campo de visão da garota.
Ela se afastou da janela, andando de volta para a cama. Suas pálpebras pesavam e seu corpo estava esmorecido, como resultado de não conseguir dormir durante a noite. A ansiedade não deixava.
Enfiou-se outra vez debaixo das cobertas, torcendo para talvez conseguir pegar no sono, mas batidas na porta a obrigaram a erguer o corpo novamente.
— Pode entrar.
A maçaneta foi girada e a porta abriu com um rangido vindo de suas dobradiças. Arthur entrou por ela, e as olheiras debaixo dos olhos denunciavam que ele também não tivera uma boa noite.
— Bom dia — disse ele.
— Pra quem? — Marina perguntou, tentando arrumar o cabelo para parecer mais apresentável. — Eu não dormi.
Arthur riu e se sentou perto dela.
— Eu quase não dormi também. Preocupada com a reunião?
— Sim, como soube?
— Diana disse.
Ela assentiu e se encostou no braço dele. Arthur tinha cheiro dele, e, naquele momento, tinha cheiro da feiticeira também, impregnado em sua pele. Marina decidiu não comentar a respeito, mas sabia que os dois estavam juntos outra vez, ainda mais pela tranquilidade com a qual falou o nome dela.
Isso fez ela pensar em Miguel, e imaginar se eles também se resolveriam. Menos de um dia sem se falar e ela já estava sentindo falta.
— Não vai tomar café da manhã? — ele perguntou.
— Ainda não — disse ela. — Chloé saiu a pouco tempo e me chamou, mas eu não sou exatamente fã de chá, e tomar café perto dela é garantia de receber um milhão de reclamações pelo fato de que ela não gosta.
Arthur riu, sacudindo o ombro ligeiramente ao fazer isso.
— Isso é bem coisa dela.
Pensou por um minuto se deveria contar para Arthur que fora beijada por Miguel. O que ele diria a respeito? Era fato que os dois não se davam bem, mas talvez ele soubesse algo a respeito desse término mal contado da Chloé e do Miguel.
— Ela e Miguel terminaram, você sabia?
Ele girou a cabeça em sua direção, parecendo ligeiramente surpreso.
— Sério? Quando?
— Na outra casa — respondeu Marina, se afastando dele. — Pouquinho antes que a gente viesse pra cá.
Arthur encarou o chão com o cenho franzido, forçando a própria memória.
— Talvez ela tenha dito, eu não tenho certeza. Depois do que aconteceu com o feitiço, algumas coisas ficaram em branco na minha cabeça.
— Acha que eles teriam algum motivo pra isso? — especulou ela, torcendo pra que Arthur tivesse alguma coisa que pudesse ajudar.
Arthur apenas deu de ombros.
— Eles sempre foram um casal um pouco esquisito, mas se davam bem, até onde eu sei — ele balançou a cabeça negativamente. — Não sei dizer porque eles terminaram.
— Esquisitos como?
— Sei lá... — Arthur riu. — Eles nunca se comportavam muito como namorados, mas ela nunca pareceu infeliz em namorar com ele. Mas por que o interesse?
Marina balançou a cabeça negativamente. Agora assim estava com a pulga atrás da orelha.
— Por nada. Só curiosidade.
***
O plano de Zac era basicamente roubar comida da cozinha novamente. O que ele não esperava era encontrar Chloé e Bernardo lá, junto com Miguel, dificultando sua missão sorrateira.
O som alto do liquidificador não deixava ninguém conversar. Bernardo preparava o que parecia ser vitamina de banana, parado à beira da pia, descalço e usado um pijama com estampa de unicórnios. Os cabelos loiros erguiam-se em todas as direções, e as orelhas pontudas ficavam visíveis entre os fios.
— Você vai queimar o pão! — gritou Miguel sobre o barulho, e Bernardo desligou o liquidificador e correu para a sanduicheira, a tempo de salvar seu café da manhã.
Zac se sentou à mesa, junto de Chloé e Miguel, sem saber o que fazer. Estava torcendo para que eles não fossem demorar por ali.
— Não vai comer nada? — perguntou Bernardo, sentando ao seu lado e dando uma mordida em seu sanduíche.
Miguel olhou torto pra ele.
— Está tomando vitamina de banana com pão, queijo e presunto?
E Bernardo apenas deu de ombros.
— Eu tô com fome.
Zac sentiu Chloé chutar seu pé por debaixo da mesa.
— Tem chá no bule — disse ela. — E eu não vou te servir. Levante e pegue você.
Achando que seria melhor disfarçar para não levantar suspeitas, Zac foi ate o fogão e serviu para si mesmo o líquido em uma xícara. Provou a bebida ainda morna e reconheceu como sendo erva-doce.
Muito melhor do que café.
Ele caminhou de volta ate a mesa, pousando a xícara sobre ela. Notou que Miguel observava com atenção cada um de seus gestos, e olhou de volta de maneira interrogativa, no entanto, recebeu apenas um leve balançar de cabeça como resposta.
Bernardo, que tinha a boca cheia de sanduíche, fez com que o controle da TV flutuasse até sua mão, vindo do armário do outro lado da cozinha. Ele ligou o aparelho que ficava preso à parede. Uma mulher explicava um mapa com áreas sob influência de milícias no Rio de Janeiro. Bernardo não parou para assistir, e foi passando os canais até encontrar desenho animado.
Zac bebeu mais alguns goles do chá e se esticou para pegar biscoitos no pote de vidro sobre a mesa, enquanto assistia o Lula Molusco comemorar o fato de que o Bob Esponja estava indo morar com os pais.
— Seu irmão está melhor? — Bernardo perguntou a Chloé, logo após um gole de sua vitamina.
— Sim — ela esticou as mãos sobre a mesa, tamborilando os dedos sobre a superfície lisa do mármore. — Não tenho visto ele reclamar, e quando ele tá mal, nunca cala a boca.
— Já está até fazendo as piadas sem graça de sempre — adicionou Miguel. — Acho que não poderia estar melhor.
Zac revirou os olhos e tomou o restante de seu chá. Arthur podia ate tagarelar demais algumas vezes, entretanto, Miguel também não perdia uma oportunidade de zombar dele.
— Só não da pra negar que ele é lindo — destacou Bernardo, e suspirou de maneira cômica. — Deus me livre, mas quem me dera.
— Só não diz isso pra ele, por favor — pediu Chloé. — Arthur já tem um ego inflado o suficiente.
— Zac — disse Miguel, levantando-se e empurrando a cadeira para trás —, vem comigo, preciso te mostrar uma coisa.
Sem questionar, Zac levantou-se para segui-lo, roubando ao menos uma maçã da fruteira antes de sair. Não era o suficiente para Delwen, mas teria que esperar até que a cozinha estivesse mais vazia.
Miguel e ele já estavam subindo os últimos degraus da escada quando o garoto tirou uma sacola plástica de dentro de seu casaco de moletom cinza.
— Você não é nada bom em roubar comida — disse ele, entregando-lhe a sacola, que continha o suficiente pra que ele não se preocupasse novamente pelo menos até o jantar. — Anda, seu noivo deve estar com fome.
Eles estavam quase na metade do corredor quando Arthur e Marina saíram de dentro de um dos quartos, mas assim que ela avistou Miguel, deu meia volta e entrou novamente, batendo a porta com força, e deixando Arthur confuso.
— Leva pra ele, por favor — disse Zac, entregando a sacola a Miguel novamente. — Preciso falar com Arthur.
Miguel assentiu, e tomando o saco plástico em suas mãos, seguiu seu caminho ate o quarto.
— A gente pode conversar? — Zac perguntou a Arthur. — Em particular. Preciso te contar algo.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro