Capítulo Dezessete
Victor Decker:
Devo dizer que a comida no País das Maravilhas era algo verdadeiramente fantástico, derretendo em minha boca assim que dei a primeira mordida. A decoração da sala era tão selvagem quanto seu habitante. Não havia janelas nem espelhos, mas uma luz suave e âmbar caía do gigantesco candelabro de cristal que dominava o teto arredondado. As paredes estavam cobertas de veludo dourado e roxo, entremeado com ramos de hera, conchas do mar e penas de pavão.
Uma série de prateleiras de cristal adornava a parede à esquerda. Metade delas continha chapéus de todos os tipos e tamanhos, decorados com mariposas mortas, enquanto a outra metade guardava o que pareciam, à primeira vista, casinhas de boneca feitas de vidro transparente. No entanto, logo percebi que eram terrários.
Dentro dos terrários, mariposas voavam de um lado para o outro, aninhando-se em folhas e galhos. Teias espessas revestiam os painéis de vidro em alguns pontos, lembrando as teias do meu pesadelo de Alice. Eram casulos, lagartas se transformando em mariposas.
— Por que Puck não consegue se transformar neste lugar? — Perguntei enquanto Morfeu colocava uma bandeja na mesa.
— Tomem chá. É uma bebida maravilhosa que acalma o estômago e clareia a mente. — Ele disse enquanto ajeitava a bandeja em uma mesa de vidro. Serviu o chá em uma xícara, e ondas fumegantes preencheram a sala, espalhando notas de mel e frutas cítricas pelo ambiente. — A Rainha Vermelha lançou uma magia sobre o País das Maravilhas. Aqueles que vêm de fora se tornam completamente impotentes aqui. Não me perguntem como ela conseguiu fazer isso, pois essa é uma resposta que eu mesmo não tenho. Isso tem sido assim por muitos anos, e muitos habitantes de Nevernever se perderam ao encontrar a entrada para este mundo, apenas para morrer rapidamente por não conhecerem sua fauna e flora.
— Derrotar a Rainha Vermelha nos permitirá desfazer esse encantamento. — Puck falou, e apertei sua mão, querendo transmitir força e mostrar que estava ao seu lado. Imaginava que ele pudesse estar se sentindo inútil.
Bebi o chá, sentindo o líquido quente e doce acalmar minha garganta. Passei um dedo na mesa sob o pires enquanto refletia sobre nossos próximos passos. Puck pegou um sanduíche e começou a comer, e eu o observei cautelosamente enquanto fazia o mesmo.
— Pepino. — Disse ele com uma mordida na boca.
— Eu sempre achei que sanduíche de pepino combinasse perfeitamente com chá, não é mesmo? — Morfeu comentou. — Vejo que estava com fome, meu amigo. — Ele olhou para mim com um sorriso travesso e notei que havia comido quase todos os sanduíches. — Não se preocupem, direi às fadas para prepararem mais.
— Quando entraremos em ação? — Puck perguntou, ansioso.
— Assim que meus espiões trouxerem resultados. — Morfeu respondeu. — Estamos atrás do cetro, lembra-se? Precisamos agir com sabedoria. Presumo que você conheça essa palavra?
— O que está sugerindo, demônio? — Puck perguntou, com desconfiança.
— Deixe minha gente procurar pelo País das Maravilhas. Conheço um espírito que é simplesmente incrível em encontrar coisas que não querem ser encontradas. Chamei-o hoje. Tenho todos os meus lacaios vasculhando o lugar, mantendo a cabeça baixa e as orelhas no chão. Eles trarão algo eventualmente.
— Eventualmente? — Olhei para Morfeu com preocupação. — O que devemos fazer até lá?
Morfeu sorriu e soprou uma nuvem de fumaça que se transformou em um coelho.
— Sugiro que fiquem confortáveis ou até mesmo treinem ainda mais seus poderes. — Morfeu falou com um tom enigmático.
*****************************
Dediquei meu tempo a treinar com Puck, tentando dominar melhor meus poderes, embora ele próprio enfrentasse dificuldades com os seus. Estávamos repletos de energia, da mesma forma que eu estivera na Corte Winter e agora, na mansão de Morfeu. Nós aguardávamos ansiosos por notícias sobre o cetro desaparecido, que seriam trazidas por completos estranhos. A situação era ainda mais angustiante devido à falta de distrações na mansão de Morfeu e à ausência de janelas para ver o mundo exterior. Além disso, como a maioria dos faeries, o lugar quase não possuía tecnologia, já que eles a desprezavam. Então, enquanto descansava, eu me limitava a enviar mensagens para Caroline, para saber como estava a parte dela na missão.
Puck estava sentado ao meu lado em um sofá, com uma expressão sombria. Em um momento de leveza, tirei uma foto dele.
— Ei, o que você planeja fazer quando tudo isso terminar? — Perguntou, olhando fixamente na minha direção. — Afinal, você estará finalmente livre do Nevernever e terá salvado o reino mortal.
— Voltar para minha família, para minha vida antiga — respondi, escolhendo a resposta que parecia mais apropriada. — Acredito que já fiquei longe demais, e terei muitas explicações a dar quando voltar. Imagino que, quando retornar, a magia terá alterado as memórias deles sobre o que aconteceu comigo.
Puck ficou em silêncio, e nossas conversas subsequentes mudaram de assunto várias vezes. Continuamos vagando pela mansão de Morfeu, ocasionalmente ouvindo discussões entre fadas ou vendo Puck sendo provocado quando estava distraído, embora raramente revidasse de forma mais cruel do que elas mereciam. Os poucos outros servos feéricos que vi simplesmente evitavam minha presença, nervosos, e insistiam que eu não deveria ser incomodado, seguindo as ordens de Morfeu.
Eu me sentia como um rato preso em um labirinto bizarro. Minha constante ansiedade pelo que estava por vir estava me deixando louco, assim como a coleção de objetos peculiares na mansão. Aparentemente, eu não era o único que estava ficando perturbado.
— Não aguento mais ficar aqui — Puck exclamou enquanto percorria a biblioteca, uma sala com carpete vermelho, uma lareira de pedra e estantes que se estendiam até o teto. Havia uma coleção impressionante de romances e revistas de moda, o que me manteve ocupado durante as longas horas de espera. — Onde está a aventura das Maravilhas?
Naquele dia, eu estava debruçado sobre o sofá, lendo alguns livros de fantasia, mas estava ficando difícil me concentrar com um Puck inquieto e impaciente na mesma sala. Ele sempre parecia desaparecer, provavelmente causando problemas com as fadas ou se metendo em confusão de alguma forma. Além disso, ele estava se tornando mais reservado desde nossa última conversa.
— Victor — ele disse, contornando o sofá para se ajoelhar diante de mim. — Precisamos agir logo! O cetro está ficando cada vez mais distante enquanto ficamos aqui de braços cruzados. Como podemos confiar em Morfeu? Você viu como ele reagiu quando mencionei seus avós.
— Shh! Puck, fique quieto! — Eu sibilei, e ele imediatamente silenciou. Estalei os dedos, fazendo um escudo de magia surgir ao nosso redor, impedindo que qualquer um nos ouvisse. — Você não pode dizer essas coisas em voz alta. Ele poderia nos ouvir, ou seus espiões poderiam nos denunciar. Tenho certeza de que estão nos observando a cada movimento. — Olhei rapidamente ao redor da biblioteca, mas não consegui detectar nada. No entanto, sentia olhos nos espreitando, escondidos nas rachaduras e nas sombras. — Ele já é ríspido com você e parece querer se livrar de você a todo momento. Não lhe dê mais razões para isso. Lembre-se de que ainda está sem seus poderes, só pode lutar com sua adaga.
— Eu sei disso, Victor. — Puck balançou a cabeça. — Mas não suporto mais essa espera. Eu deveria estar protegendo você, mas me sinto inútil aqui.
— Eu entendo como se sente — eu disse a ele, colocando minha mão em seu braço. — Também quero sair daqui, mas precisamos ter paciência. A paciência é uma virtude.
— Uma virtude que não possuo. — Puck murmurou, e eu ri.
— Apenas espere — eu disse. — Como parece que vamos ficar aqui por um tempo, como você planeja conseguir uma nova adaga?
— Tenho meus contatos. Preciso de uma arma para lutar — Puck respondeu, piscando um olho. — Não posso depender apenas de meus artifícios e minha sagacidade.
— Onde você estava quando me viu sendo levado para o Reino de Ferro? — Perguntei, embora a lembrança me trouxesse tristeza. Puck concordou com a cabeça quando olhou para mim.
— Eu precisava entender o que estava acontecendo em meu coração e até onde iria para ficar ao seu lado — Puck disse e apertou minha mão. — Victor, eu te amo com todo o meu coração.
Suspirei aliviado com suas palavras, sentindo uma alegria profunda em meu coração. Mesmo que tivéssemos que esperar pelos espiões de Morfeu, estava feliz por estar com ele naquele momento. Era o começo de uma nova fase de nossa jornada, repleta de incertezas, mas pelo menos estávamos juntos.
_________________________________
Gostaram?
Até a próxima 😘
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro