Capítulo Catorze
Victor Decker:
Puck retornou ao meu lado, e eu apontei para a porta atrás de mim que já havia se fechado.
— Sinto que não poderemos voltar pelo caminho que viemos — falei, enquanto uma das flores assentia lentamente.
— Não podem sair por onde entraram — a primeira flor murmurou, olhando para seu próprio corpo queimado com expressão de pavor. — A toca do coelho só possui abertura para o nosso reino. Os portais que se abrem para o seu são guardados nos castelos bem distantes daqui e são controlados pela nobreza, dentro do coração pulsante do País das Maravilhas — explicou outra flor, gesticulando com o braço. — É lá que fica a única saída. Você não acha que já teríamos saído se houvesse como fugir da toca?
Enquanto eu processava essa informação, minha mente se voltou para toda a mobília enfiada nas paredes do túnel com hera. Elas estavam tentando construir um caminho para acessar meu mundo?
— Então a toca pode levar para qualquer lugar do mundo humano, mas alguns conseguiram passar facilmente — Puck disse, virando-se para mim. — Por que a rainha precisa ficar com o cetro?
— O País das Maravilhas está em guerra, as Cortes Brancas e Vermelhas lutam diariamente pelo poder — uma rosa murmurou, tremendo ao se aproximar de mim. — Tudo aqui é um caos absoluto, uma verdadeira loucura.
— Estou começando a gostar desse lugar — Puck disse com um sorriso irônico. Então, ela soltou uma risada, mas eu rapidamente a lembrei da urgência da situação. Abri minha mochila, peguei um pedaço de bolo e dei a ela.
Em questão de segundos, crescemos drasticamente, ficando muito mais altos do que as flores. Com cuidado, Puck varreu o jardim com um de seus sapatos gigantes, fazendo as flores gritarem e se agruparem em um buquê de pétalas trêmulas.
Depois de chutar o balde de pulgões, Puck rugiu para as flores e elas enraizaram-se novamente na terra, recriando o jardim que nos cercava. Continuamos nossa jornada com um único passo, deixando as flores para trás.
— Sorte delas por não terem sido esmagadas pelo meu pé. — Puck comentou e, de repente, ouvi um barulho vindo de dentro da mochila. Abri-a e notei que o celular que Caroline me deu estava funcionando.
— Aqui me lembra o Reino de Meghan, segundo o que ela e Ash conseguiram fazer. Eles trouxeram a internet do mundo humano para o Reino de Ferro. — Puck mencionou Meghan, fazendo meu coração apertar de ciúmes.
— O que foi essa expressão? — Puck perguntou, confusa, mas eu a ignorei.
Peguei o celular e vi várias mensagens de Caroline, mas uma delas chamou minha atenção.
— Para provar que sou um aliado, coloquei um pouco da magia das Maravilhas neste aparelho para que você possa se comunicar com seus amigos — Puck leu por cima do meu ombro. — Quem é esse "M"?
— Um possível aliado deste lugar — respondi e mandei uma mensagem para Caroline, pedindo-lhe que investigasse quem havia criado o Cetro para recuperar a jóia, enquanto Puck e eu continuávamos nossa busca pela parte perdida.
— Então, para onde vamos agora? — Puck perguntou.
— Sempre em frente, mas fique atenta ao que está acima de nós — pedi a ela, e Puck assentiu.
— Com todo prazer — ela respondeu, tentando se transformar. No entanto, nada aconteceu por minutos. Ela olhou para mim, desesperada. — Não estou conseguindo me transformar!
Concentrei-me em sua aura e notei uma camada vermelha sangue sobre sua magia, impedindo-a de se transformar.
— Algo está bloqueando sua habilidade de transformação e ainda está sobre sua magia — expliquei, e ela tentou algumas ações, sem sucesso. Puck pegou algumas de suas bolotas dos bolsos e as jogou no chão, mas nada aconteceu.
— E agora, para onde vamos? — ela perguntou, visivelmente desanimada.
Em vez de oferecer palavras de conforto, peguei sua mão e me concentrei em nossa localização. Era hora de descobrir o próximo passo em nosso misterioso caminho pelo País das Maravilhas.
****************
A costa se estendia até onde minha vista alcançava, um deserto infinito de fuligem tremeluzente. Era algo completamente diferente do que eu esperava encontrar no coração do País das Maravilhas, se é que era realmente isso que este lugar era. Não havia fauna nem flora à vista, exceto por uma solitária árvore, mais alta e mais larga do que uma sequoia, a alguns metros de nós. A magia emanava dela, como um ímã que me atraía para mais perto.
A casca da árvore estava coberta por uma película negra de joias, desde o tronco nodoso até os ramos que se estendiam a dezenas de metros no ar. Sob a luz do sol, parecia um milhão de diamantes brancos cintilando. Nas pontas de cada galho, rubis líquidos brotavam e gotejavam no chão, como se a árvore estivesse sangrando pedras preciosas, assim como os elfos fazem quando sua pele é perfurada, contrastando com o solo de areias negras.
Subi na árvore, cuidadosamente navegando pelos rubis no chão. Uma pulsante marca na base do tronco latejava por trás da casca de diamantes, como um coração mágico prestes a ser revelado. Cada batida se manifestava em linhas vermelhas que formavam um desenho intrigante, uma mistura de um coração e um diamante, passei as pontas do dedo chamando um pouco de magia enquanto Puck me segurava firmemente enquanto eu colocava meu pé sobre o símbolo.
Um estalo de eletricidade estática percorreu meu corpo até a árvore e vi que meu calcanhar começou a brilhar fortemente bem onde tinha minha marca de nascença, e então um som retumbante quebrou o silêncio. Puck me puxou para trás rapidamente quando o tronco se abriu, e a casca brilhante se enrolou como um pergaminho, revelando uma passagem. Um brilho suave e avermelhado vibrava do interior.
— Como você sabia o que fazer? — Puck perguntou, me entregando o sapato.
— Foi um pressentimento. — Respondi, entrando na passagem.
— E essa marca de nascença brilhante... — ele começou a dizer.
— Sempre tive. É um traço de família da minha avó. — Expliquei tirando o sapato e mostrando a marca que tinha mudado e se tornou visível me fazendo lembrar da marca pulsante. — Meus irmãos não têm essa marca, e meu avô costumava dizer que herdei muitas coisas dela.
— Você chegou a conhecê-la? — Puck indagou.
— Não, ela morreu quando minha mãe era criança, em um aci... — Parei abruptamente, confuso, tentando recuperar uma lembrança fragmentada. Meu avô uma vez mencionou que minha avó havia morrido devido a uma conspiração de pessoas cruéis.
Senti-me tonto por um momento, e Puck me amparou. Continuamos descendo por uma escadaria sinuosa, cujos degraus produziam um som abafado sob nossos pés. Eram ossos, entrelaçados e amarrados com algum tipo de cordão dourado cintilante, formando a escada. Muitos dos ossos apresentavam deformidades de tamanho ou forma, enquanto outros pareciam pertencer a criaturas humanoides.
Saltamos do último degrau e nos esgueiramos por uma cortina de trepadeiras. Em vez de nos depararmos com um subterrâneo sombrio, nos deparamos com uma vasta floresta fechada, serpenteando através de vegetação alta e fluorescente até chegarmos a uma clareira de musgo verde-limão, líquen amarelo vivo e cogumelos reluzentes. Um círculo de árvores se fechava acima de nós, com os galhos esticados e entrelaçados formando um domo, e lascas do céu roxo surgiam aqui e ali, projetando sombras peculiares.
— Como você sabe para onde devemos ir? — Puck perguntou.
— Não sei... mas você não sente isso? — perguntei, e ele sacudiu a cabeça negativamente.
Avançamos para o centro da clareira, onde um cogumelo gigante, listrado de ultravioleta, aguardava envolto em uma nuvem perfumada. Uma sensação inconfundível de reconhecimento se apossou de mim. Estávamos diante do covil da Lagarta, o sábio guardião do País das Maravilhas.
Observamos enquanto algumas fadas surgiam e se posicionavam nas paredes da clareira, formando um círculo ao redor do cogumelo. A nuvem de fumaça começou a se dissipar, revelando um narguilé e um rapaz com asas negras e cabelos azul luminescente, descansando no topo do cogumelo com tranquilidade.
Ele inalou a fumaça da mangueira e soltou plumas no ar, algumas assumindo a forma de pássaros, outras de flores. Uma das figuras vaporosas se separou e se transformou em um rosto de criança, que reconheci como o meu próprio rosto quando tinha cinco anos.
— É bom vê-lo novamente — disse o rapaz. — Aquele que nasce de dois mundos.
Puck me puxou para trás dele, enquanto algo brilhava em minha mente.
— O que você quer dizer com "nascido de dois mundos"? — perguntei.
— Você já sabe muito bem o que quero dizer. Seu avô era um mortal abençoado pela magia, com a capacidade de entrar nos sonhos, um presente da primeira rainha das Maravilhas como símbolo de amizade. — o rapaz explicou. — E sua avó era uma feérica que veio do País das Maravilhas.
Embora eu já soubesse que era um mestiço, a confirmação de que herdei tanto o dom do meu avô quanto a origem da minha avó do País das Maravilhas trouxe um sentimento de alívio inexplicável ao meu peito. Era como se eu finalmente entendesse parte da minha própria identidade, mesmo que essa revelação trouxesse mais perguntas do que respostas. Este era apenas o começo de uma jornada que me levaria mais fundo nos mistérios do País das Maravilhas, e eu estava mais do que disposto a enfrentar cada desafio que o destino tinha reservado para mim.
Até a próxima 😘
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