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PARTE III

Emilly despertou com a luz do sol entrando pelos vidros da janela do seu quarto.
Percebeu que acabou dormindo no chão gelado e o maldito espelho estava na palma da sua mão.

Ela jogou o espelho novamente contra parede, mas nenhum caco veio ao chão.
A moça se levantou lentamente. Estava completamente dolorida pela noite mal dormida no piso duro do seu quarto. Ela se dirigiu até a porta deixando o cômodo, o quanto mais longe daquele espelho, melhor.

Emilly não encontrou a sua amiga na sala e de acordo com o relógio da parede, era hora de das duas estarem saindo para seus respectivos empregos. Preocupada correu até o quarto de Olívia e a encontrou dormindo com os fones nos ouvidos e o volume no máximo. Não é a toa que não ouviu os seus gritos na madrugada.

Emily entrou no quarto indo na direção da amiga para desperta-la. Ao atravessar o cômodo ela passou pelo espelho do armário e através do seu reflexo viu a criatura que a aterrorizou ontem a noite. Uma sombra de olhos vermelhos a observando.

Aterrorizada ela recuou dando passos longos para trás, acabou esbarrando na escrivania de Olívia derrubando algumas canetas. Emilly olhou para trás assustada e encontrou um peso de papel, ela se virou para o espelho e a criatura ainda estava lá. Como se fosse seu reflexo.

— ME DEIXA EM PAZ! — Gritou Emilly arremessando o peso de papel e deixando o espelho em cacos.

Olívia pulou da cama assustada, olhou para a amiga que estava aparentemente aterrorizada. Emilly estava sentada no chão, encolhida se escorando no criado mudo com o rosto molhado olhando para os estilhaços do espelho do seu armário.
Olívia olhou para o armário sem o espelho e para seu peso de papel junto com os cacos no chão.

— Emy? — chamou Olívia preocupada. Ela se abaixou em frente a amiga. — O que houve?

Emily levantou a cabeça e Olívia pode ver com clareza o horror estampado na face da melhor amiga. Ela estava com olheiras e os olhos vermelhos.
Sua cabeça girou em direção do armário, onde o espelho estava e agora era apenas uma superfície lisa de madeira.

Emilly secou o rosto rapidamente e ficou de pé, Olívia a imitou ficando de pé e a encarou esperando resposta.

— Emilly?

— Tá tudo bem.

Olívia olhou para os cacos no chão junto com o peso de papel — Você destruiu o meu espelho com o peso de papel e depois ficou encolhida no canto chorando! Não tá tudo bem! O que houve?

— Eu vi uma coisa... — Emilly se interrompeu refletindo sobre contar a verdade para Olívia. Não queria ser taxada de louca e ela precisava de provas. — Acho que foi um bicho. Sabe que eu tenho fobia. — ela respirou fundo — Desculpa pelo espelho. Eu vou tomar banho. — ela saiu apresada querendo evitar mais perguntas.

Olívia observou amiga correr para o banheiro com a testa franzida. Sem entender o que estava acontecendo.
Ela respirou fundo também saindo do quarto para pegar uma vassoura e pá para catar os vidros e começar a preparar o café da manhã. Ia chegar arrasada ao trabalho pelo horário.

Após catar todos os cacos e jogar no lixo, Olívia estava preparando o café da manhã para ela e Emilly. Sanduíches de frango e suco de manga.
Faltava apenas bater o suco no liquidificador quando ela ouviu Emilly gritar.

— Sai! Vai embora!

O som do espelho sendo quebrado, um pouco abafado pelo chuveiro ligado. Olívia bateu na porta.

— Emilly? Emilly? Você se machucou?— chamou Olívia batendo na porta e recebendo apenas o som do chuveiro como resposta — Emilly, abre a porta.

Nada.

— Emy, você tá me assustando! — gritou Olívia — Não tem graça!

Sem resposta.
Olívia estava começando a se desesperar ao esmurrar a porta até suas mãos doerem.

— Emily! Pelo amor de Deus, me responde! — Olívia socou a porta — Emilly! Eu vou arrom... — Olívia se interrompeu ao sentir água escapar pela fresta da porta e junto com a água, sangue.

Seu coração disparou imediatamente e ela correu até a cozinha pegando facas com ponta. Olívia tirou parafuso por parafuso da fechadura até conseguir destravar a porta o que levou quase vinte minutos.
Ela encontrou Emilly nua sentada no chão do banheiro olhando para o pequeno espelho do armário da pia que agora estava no chão e entre cacos. O chuveiro estava ligado e a pia também, fazendo a água transbordar e inundar o cômodo inteiro até vazar.
Inicialmente Olívia ficou paralisada com a cena. Ver Emilly naquele estado a assustou muito, suas mãos estavam cobertas com sangue e cacos de vidros haviam entrado nas suas mãos fazendo cortes profundos, mas Emilly parecia não sentir dor.

— Meu Deus! — Olívia avançou puxando Emilly para fora do banheiro, ela a ajudou a amiga que ainda parecia alheia a tudo a se vestir e ir ao posto fazer alguns curativos.

Quando voltaram para casa era tarde, horário de almoço.
Olívia colocou Emilly no sofá.
Desde o acidente no banheiro que Emilly estava muda. Não a olhava no olho, apenas fitava o nada.

— O que houve, Emilly? — Perguntou Olívia segurando a mão da amiga — Fala comigo, por favor.

Com o silêncio como resposta, Olívia se levantou desistindo. Emilly ainda estava muito abalada por seja lá o que fosse.

— Eu vou limpar o banheiro. Não se preocupa. Só se recupera, tá? — disse respirando fundo, Emilly ainda fixava o nada com o olhar vazio, alheio. Como se estivesse em um tipo de transe — Quando estiver pronta para falar sobre o que está acontecendo, sabe onde me encontrar.

Olívia seguiu até o banheiro para limpar a bagunça de Emilly.
Quando a amiga atravessou a porta do banheiro Emilly deixou as lágrimas caírem.

— Eu não sei o que está acontecendo, Livi. — Sussurrou fechando os olhos com força — Eu não sei.

Emilly tinha recebido outra visita da entidade no banheiro. A coisa parecida mais irritada, exigindo que ela abrisse as portas ou caso contrário sofreria as consequências.

Ela deu uma pequena amostra do que iria acontecer a Emilly, caso não abrisse as portas.

Através do reflexo mostrou o rosto de Emilly se deteriorando. Derretendo como uma vela.
Desesperada ela passou a mão no rosto e sentiu a pele desmanchar em seus dedos. Mole e viscosa, em seguida seus cabelos começaram a cair, tufas por tufas. Sangue começou a escorrer do nariz derretido, rios de sangue cobrindo suas roupas e rosto.
O sangue começou a atrair moscas, uma a uma pousando no seu rosto até ela sufocar.

Emilly fechou os olhos finalizando as lembranças, Olívia havia chegado na hora certa e acabado com o pesadelo.
Emilly nem fazia ideia de como havia parado no chão do banheiro entre os cacos.

A noite caiu depressa, Olívia havia cuidado de avisar ao trabalho de Emilly que ela havia pegado uma virose.
Ela também a avisou que na manhã seguinte se as coisas não melhorassem ela iria leva-la ao hospital.

Para a sorte de Emilly as coisas melhoraram. Ela conseguiu ter uma boa noite de sono, sem pesadelos ou entidades a visitando.

No café da manhã ela tentava tranquilizar a melhor amiga.

— Foi apenas uma péssima noite de sono. Seguida de pesadelos. — disse Emilly olhando a amiga — Eu fiquei paranóica. Assustada. Desculpe te preocupar.

— Tem certeza que está bem para ir trabalhar?

— É claro. — Emilly sorriu — Relaxa.

Após o café da manhã, Olívia deixou Emilly no prédio onde de uma agência de marketing onde ela trabalhava e seguiu para o seu.

Emilly seguiu para o elevador, clicou no seu andar e parou ao lado de um senhor. Como de costume ela ajeitou o cabelo pelo reflexo do espelho jogando para o lado e passando os dedos entre os fios para ajeita-los. Seu coração disparou quando sentiu tufas saindo na sua mão através do reflexo. Emilly olhou para as próprias mãos para confirmar e viu seu cabelo entre os dedos.

— Meu cabelo! Meu cabelo! — disse desesperada.

O senhor ao seu lado a olhou sem entender — Está bonito moça. — disse antes de sair e a porta se fechar.

Emilly olhou novamente para suas mãos e não havia um fio sequer, nem mesmo no chão.

— Estão todos aí, por enquanto. — disse seu reflexo no espelho com os olhos vermelhos — Você sabe o que fazer Emy.

— O que? — perguntou Emilly encarando o seu reflexo ofegante.

— Mate.

— O que?

— É preciso uma oferenda para cada portal. E cada oferenda precisa ter tido uma passagem importante na sua vida, uma pessoa que você odeia, uma pessoa que te fez sofrer e uma pessoa que você ama. Você precisa matar e desenhar esse símbolo em qualquer superfície espelhada com o sangue da oferenda. — disse a entidade mostrando um sorriso muito parecido com o que Emilly dava quando estava satisfeita enquanto um símbolo estranho se desenhava sozinho no espelho na cor de vermelho sangue — Ah, os sentimentos precisam ser verdadeiros e intensos ou o portal não abre.

Emilly tirou a foto do círculo no espelho, tentando pegar o reflexo da entidade, mas tudo que saiu foi o reflexo dela mesma tirando a foto.

— E se eu não fizer?

— Vai perder tudo Emy. Primeiro tiro o seu bem mais precioso, a sua beleza.
Como lhe mostrei ontem, você vai ficar feia. E em seguida, vai ficar sozinha e eu vou te assombrar até que me ofereça a sua alma e no fim, eu te mato.

Emilly sentiu seus olhos ficarem úmidos.

— Você só tem mais três dias a partir de hoje. Cada dia é um portal, Emy. — a porta do elevador se abriu e a entediado abriu um sorriso maligno. — Sua primeira chance.

Emilly se virou para ver sobre o que a entidade se referia.
Era a sua concorrente com quem tinha uma rixa desde a faculdade.
Fabiana Morais.

A mulher sorriu ao ver Emilly chegar.

— Emilly, querida! O que foi? Até parece que viu uma assombração.

Emilly apenas forçou um sorriso descartando as maneiras de matar Fabiana no escritório.
Não era uma assassina.

— Deveria ter ficado mais alguns dias em casa, assim evitava o constrangimento de perder a promoção para mim. — disse Fabiana — Ninguém acreditou nessa histórinha de virose que a sua amiguinha inventou. — a mulher mostrou a foto de Emilly comprando biquíni na loja — Enquanto você se divertia na praia eu conseguia patrocinadores. Vamos ver quem o chefe vai escolher na semana que vem quando eu mostrar isso.

— Isso foi na minha folga!

— Pra mim foi ontem. E a vendedora vai confirmar tudinho. — Fabiana piscou e saiu rebolando até o banheiro.

Emilly respirou fundo, se sentindo perdida, frustada e com raiva. Raiva não ódio. Aquela vadia iria faze-la perder o emprego contando uma mentira.

Emilly olhou em volta, Ela viu uma gravata em cima da cadeira de algum funcionário, se aproximou lentamente olhando para os lados se certificando que ninguém a viu pegando e seguiu até o banheiro.

Ela entrou e trancou a porta encontrando Fabiana retocando a maquiagem. Se aproximou dela lentamente, e Fabiana sorriu a vendo se aproximar.

— O trabalho é uma guerra bonitinha. E na guerra vale tudo. — Fabiana a encarou através do espelho com um sorriso, mas seu sorriso se desmanchou ao ver a expressão de Emilly que de repente estava muito sombria.

Como que se pressentisse o perigo Fabiana se virou assustada para Emilly vendo que ela tinha algo nas mãos.

A luz do banheiro começou a falhar, o ambiente ficou gelado e Fabiana pôde juras ver os olhos de Emilly se tornarem vermelhos.

De repente Fabiana foi arremessada contra o espelho que alcançava o chão por uma Emilly incrivelmente forte, os estilhaços perfuraram suas costas fazendo o sangue escorrer enquanto Emilly enrolava a gravata no seu pescoço cortando a sua voz e a sufocando com a gravata enquanto a mulher se debatia desesperadamente tentando se desvencilhar de Emilly a qualquer custo, mas não tinha forças, com o seu pulmão queimando por dentro a procurar de ar, seus pés balançava no ar freneticamente tentando acertar Emilly até começarem a ficar lentos e moles. Fabiana estava perdendo as forças, perdendo a vida.

Emilly só a soltou quando sentiu seu corpo ficar pesado, as mãos de Fabiana soltaram os pulsos de Emilly e penderam caindo ao lado do corpo.
Quando Fabiana caiu no chão morta a seus pés, ainda com os olhos vermelhos Emilly puxou um dos cacos das costas da mulher e desenhou o símbolo no espelho do banheiro com o dedo usando o sangue de Fabiana como tinta.

O espelho começou a tremer emitindo um brilho que acabou ofuscando a sua visão até se apagar segundos depois.

Emilly de repente sentiu-se sufocada e começou a tossir iinterruptamente  até expulsar uma fumaça negra através da sua boca.

A fumaça negra começou a ganhar forma, surgindo em frente a Emilly.
A entidade estava se tornando uma silhueta feminina, ficando parecida com Emilly, porém ainda não tinha rosto.

Emilly ficou a observando ofegante, claramente perdida. Olhou para suas mãos sujas de sangue e um dos espelhos do banheiro em estilhaços formando um rastro de sangue até o chão até uma Fabiana morta.

— Bom trabalho, Emy. — disse a entidade com um sorriso maligno.

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