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│26│sagitta


Se dependesse de mim, eu não estaria aqui.

Julgamentos são sempre enfadonhos e repetitivos, um falava uma coisa e o outro dispara um: Protesto e era obrigado a reformular toda a frase. Estávamos na metade da segunda semana e nada apontava para uma absolvição, não quando a promotoria trazia duas vezes mais testemunhas de acusação.

Em algum ponto foi exigido avaliações psiquiátricas de nós dois. Gemma tinha problemas com raiva e autocontrole, isso era sabido por todos, agora eu, seria uma caixinha de surpresas. A hipótese de um desequilíbrio mental surgiu com o depoimento do nosso psicólogo, Dr. Pendergast, claro que ele viria animadamente fincar os últimos pregos no meu caixão.

De seu assento elevado, ao lado do juiz, ele parecia muito profissional em sua roupa social e óculos de grau. Um homem respeitável.

— Louis sempre teve grandes oscilações de humor e comportamentos impulsivos e sem sentido. Sem falar de sua grande resistência em buscar tratamentos adequados ou de fato, se abrir. Basicamente ele ia até mim para assegurar que estava bem.

— Ele procurou o senhor voluntariamente? — O promotor indaga eloquentemente, se aproximando de Adam.

— Não, não, foi uma exigência do FBI após o atentado que sofreu, eles temiam algum estresse pós-traumático.

— E ele realmente sofre de um?

— Sim, mas também apresentava resistência em se medicar. Nos últimos meses ele havia demonstrado uma súbita mudança de comportamento, porém, também começou a insistir que seu marido, Harry, sofria de um transtorno raro.

— O suposto Transtorno dissociativo de identidade?

— Exatamente, o que é ilógico, em anos atendendo-o nunca demonstrou indício algum de ter dois ou mais alters. Ele é literalmente uma das pessoas mais doces e expressivas que eu já conheci, na verdade, senhores, se me permitirem, gostaria de sugerir que fossem realizadas avaliações psiquiátricas com os réus, em especial o senhor Tomlinson.

E foi assim que tive toda a minha vida, passado e presente revirados. Um grupo de psiquiatras e neurologistas me monopolizaram de todas as formas possíveis, só era liberado nos momentos das audiências.

Minha cabeça ainda doía quando entrei na corte naquela manhã. Me instalei em meu assento e ali permaneci cabisbaixo, até sentir um toque em meu ombro, virei o pescoço e dei de cara com dois pares de olhos azuis.

— Spen! Blay! — Exclamei, descrente que depois de tanto tempo os tinha tão perto.

Para melhor representar a linda família feliz e unida, "Harry" os trazia diariamente, talvez fosse realmente para passar a imagem de família inofensiva ou para me lembrar que os tinha com ele e poderia facilmente feri-los se eu não colaborasse.

— Papai! — Os dois disseram, se empurrando para conseguirem se enrolar no meu pescoço. Minha mãe sorriu, os segurando.

— Oi, como estão? Eu senti tanta falta. — Beijo cada um, notando como parecem crescidos e fisicamente bem.

— Bem. — Spencer respondeu puxando minha gravata — Que é isso?

— Isso é uma gravata. Eu preciso usar aqui.

— Onde é aqui? — Blake resmungou, coçando os olhos.

— Aqui é... É um lugar que o papai precisa estar por enquanto, mas já vai se resolver.

— E a gente vai pra Disney?

Aproximo o rosto do rostinho minúsculo de Spencer.

— Sim, nós vamos pra Disney.

— Papai! Papai! — Blake se agita, de repente, me puxando pra ele — O bebê não é mais bebezinho.

— É, é, papai, é desse tamanhão. — Spencer exibe a mãozinha, acreditando estar representando o tamanho real do bebê — Eu ser irmão mais velho.

Sorrio, sentindo aquela estranha amargura.

— Você é. Vocês dois são.

— Louis. — Minha mãe indica onde Anne nos encara com as sobrancelhas franzidas — Eu preciso levá-los.

— Certo. — Concordo, relutantemente me despedindo deles. Anne se acomoda com eles e logo, Harry está se sentando ao seu lado, sem nunca olhar na minha direção. Assim é melhor.

Ao longo destas duas semanas de inquisição, muitos rostos conhecidos e desconhecidos subiram ao banco de testemunhas para depor contra nós. Desde o garçom do restaurante, os guardas que me deteram naquela vez em que perdi o controle com Harry na obstetrícia, até Bebe que fala sobre ter visto Harry caído na entrada de casa e eu, aparentemente, o ameaçando, Liam e Luke também não prestam testemunhos nada favoráveis. Eu não sabia que tinha tantos momentos nebulosos até ouvir da boca de terceiros. Já estava calejado com os ataques entoados por vozes calmas, o promotor por mais de uma vez fez insinuações sobre o meu caráter perverso e psicótico, enquanto era bem mais direto quanto a Gemma ser uma vadia louca e invejosa, ele literalmente disse vadia e ninguém o contestou.

Fatores como idade, deficiência, depressão, infertilidade, entre outros foram fortes armas contra ela. Uma mulher é bem mais fácil e aceitável de ser crucificada, ninguém via problema na dureza com que ela era tratada, mesmo sem ter sido condenada, homens e mulheres a descreviam como a pior criatura da face da terra e Harry era a presa ingênua e ameaçada dentro da teia de Gemma.

Ah, se eles soubessem.

Na entrada do tribunal, grandes grupos de populares se aglomeravam, repórteres querendo entrevistas, qualquer exclusiva, a família clamava por justiça, outros exigiam a pena de morte e carregavam cartazes com um linguajar baixo e imagens nos demonizando o máximo possível. Uma das "artes" a mim dirigidas, me fizeram passar noites em claro, profundamente perturbado. O que mais doía era saber que meus filhos estavam vendo aquilo.

Eles tinham visto e vivido coisas que pessoa alguma deveria experienciar, seria um milagre se tudo isso não deixasse traumas irreversíveis neles.

A porta lateral torna a abrir e desta vez, Gemma surge, acompanhada da advogada, suas algemas são retiradas, o cabelo escuro caindo sobre seu rosto pálido quando ela caminha até a mesa e toma seu lugar – porém, não é o habitual – , tento não parecer tão surpreso quando ela se senta ao meu lado.

O nosso contato vinha sendo mínimo uma vez que estávamos acusados de sermos amantes tão terríveis quanto Paul Bernardo e Karla Homolka.

— Tudo bem? — Indago em baixo tom quando ela mantém o rosto voltado para frente.

— Minha mãe vai testemunhar, quer dizer, ela vai mentir. — Responde, sem emoção.

Então é hoje?

Minutos depois, a corte está em sessão.

Após duas fraquíssimas testemunhas de defesa, a promotoria chama Anne. Noto o estremecer em sua mão sobre a Bíblia ao fazer o juramento.

O promotor começa a interrogá-la.

— Pode dizer a corte o seu nome?

— Anne Styles.

— Qual a sua profissão senhora Styles?

— Eu sou proprietária de um restaurante no centro da cidade. — Ela diz.

O júri parece achar isso adorável. Ela é como a vovó amável que cozinha biscoito para os netos, tricota casacos e acoberta os homicídios do filho. Adorável.

— Sabemos que não é fácil para a senhora ter de testemunhar contra a própria filha, mas precisamos que não hesite. — O homem alto fala, gesticulando demais. Eu não gosto dele e nem é pelo fato de estar tentando me conseguir uma pena de morte. Anne assente — Como era o comportamento da ré durante a infância?

Ao meu lado, Gemma contraiu a mandíbula, as unhas batendo devagar contra a mesa de ébano.

— Era... Difícil. Ela sempre foi geniosa e tinha a tendência de perder o controle quando as coisas não iam como ela queria. Em certas ocasiões ela se tornava agressiva. Quebrava coisas, rasgava fotos...

A antiga fotografia dela com Harry, foi ela quem a rasgou.

— Os médicos prescreviam calmantes e isso funcionou na infância.

— Em algum momento a senhora detectou indícios de perversidade? Digo, algo que a levasse a crer que...

— Que ela fosse capaz de matar? Bem, eu sempre percebi que ela era bastante fria e indiferente. Ela nunca pareceu realmente feliz com nada, eu acreditava que se tornar tia a faria mais carinhosa e próxima de nós, mas era o contrário, ela se encheu de inveja e remorso por ver o irmão construindo uma família.

Olhei para ela de relance e percebi que suas unhas atingiam a madeira com mais força, provocando arranhões sobre a superfície.

— Toda mulher quer casar e ter filhos, mas Gemma tinha muita dificuldade para manter relacionamentos e bebia e usava muitos remédios o tempo todo, foi por isso que ela sofreu o acidente. Ela raramente estava sóbria.

— E como descreveria o relacionamento dos seus filhos?

Anne desvia o olhar e Harry a encara de volta, uma ameaça velada.

— Harry sempre fez o que pode para que tivessem uma convivência harmoniosa, o que se provou infrutífero, uma vez que ela nunca esteve disposta a tentar. Então, ela entrou para o ramo das artes, ela me disse que queria superá-lo em alguma coisa. Até aquele momento achava que era pura competitividade de irmãos, mas quando minha neta, sobrinha dela, Evangeline morreu e Gemma não demonstrou um pingo de emoção, comecei a me preocupar. — Ela engole em seco, usando o lenço para secar os olhos e os dedos de Gemma se recolheram em punho — Depois disso mais desconfianças foram surgindo, ela aprendeu a atirar e estava mais calada que o normal, distante. Antes dos homicídios começarem, ela se mudou para Chicago, porém, pouco tempo depois soube que ela tinha sido demitida e estava morando no Brooklyn. Eu guardei essa informação porque ela me pediu, mas não entendia o motivo de não querer que soubessem que ela estava na cidade.

Franzo as sobrancelhas. Ela estava na cidade esse tempo todo? Por que ela nunca disse a ninguém?

— Assim, ela frequentava minha casa, ela tinha chave e livre acesso, eu ouvia alguns ruídos no galpão, mas nunca dei atenção. Eram as coisas dela, provavelmente.

— Nunca pensou que sua filha poderia ser Andrômeda?

— Jamais! Isso parece tão fora da nossa realidade, ela era uma boa menina, até que...

— Até quê? — O promotor força, embora isso já tenha sido ensaiado.

— Descobri que ela tinha um caso com o Louis. Eu encontrei as mensagens e tudo mais... Foi um choque. Eles não podiam estar fazendo aquilo, uma traição dessas com o Harry, justamente agora e depois de tudo. Eu tive de confrontá-la e quando o fiz, ela me mostrou uma faceta que eu ainda não conhecia. Ela riu e confirmou minhas suspeitas, estava orgulhosa por "ter roubado o homem do irmão dela", ela se vangloriou e não satisfeita, quis me mostrar o que mais tinha feito, foi quando descobri o que se escondia no galpão, o que a fazia quando saía tarde da noite. Eu só... Tinha que fazer algo, então, fiz a denúncia. Ela é minha filha e eu a amo, mas não poderia acobertar uma assassina. — Ao terminar, Anne está com lágrimas nos olhos, o juiz lhe oferece um novo lenço, compadecido por seu sofrimento. Ela tem o júri na palma da mão.

A advogada de Gemma terá um trabalho árduo-

Há um barulho alto que ecoa por toda a corte quando a cadeira de Gemma atinge o chão quando ela se levanta e soca a mesa com ambos os punhos, levantando o dedo em direção a mãe.

— Sua maldita mentirosa! Como você tem coragem de vir até aqui e falar esse monte de merda? De olhar na minha cara e chorar. Você é louca!

— Ordem! — O juiz exige. Os guardas se aproximam e a advogada tenta refreá-la.

— Foda-se você e esse circo! — Ela cospe para o juiz — Sabe, Anne, você é só uma marionete, o ventríloquo está bem ali. — Gemma se vira, indicando Harry que muda rapidamente a expressão, provavelmente outra personalidade veio à tona. É Allicent.

— Sugiro que controle sua cliente. — O juiz diz a advogada, mas é em vão.

— E Andrômeda também, ele é o culpado, o filho da puta que armou tudo isso. — Ela se aproxima da divisória de madeira polida que reparte a corte e é claro que esse momento lhe parece propício, Harry faz questão de se levantar, com Blake no colo. Aquela expressão fingida é proposital, para deixar Gemma mais possessão e dá certo — Você é quem devia estar aqui, você é a porra do assassino. Eu sei que você matou o papai.

— Gem, me ferir não vai te ajudar. — Ele diz com a voz embargada. Como se sofresse com toda a situação.

— Tão cínico, você só pode ter um problema, isso não é normal, seu doente. — Ela balança a cabeça, sendo contida pelos guardas que tentam fazê-la retornar ao seu lugar, porém seus olhos sombrios permanecem nele — Eu não sou uma assassina, sabe que não, mas não me importaria em me tornar uma se fosse pra acabar com você. Eu te odeio tanto!

Ele escuta e abaixa a cabeça, capto seu sorriso mínimo que some antes que ele torne a encará-la, agora trazendo lágrimas aos olhos. É tudo pelo drama. O julgamento está sendo televisionado, são momentos como esse que o deixam no topo dos holofotes.

— Mesmo assim... — Respira fundo — eu te perdôo.

Porra.

Até eu tenho um sobressalto quando Gemma engole em seco e cospe na sua cara.

Parece racional com a euforia raivosa queimando em suas veias, mas isso foi uma armadilha bem elaborada que ela caiu, não, não, ela se afundou nela. Ela cuspiu em um santo pai de família inocente e devoto, grávido, segurando o filho nos braços, desolado com a traição do marido e da irmã e que mesmo assim foi benevolente o bastante para perdoá-la. E ela cospe na cara dele.

Gemma garantiu uma pena de morte.

Todos sabem disso.

Ela avança violentamente em sua direção e os guardas precisam ser mais incisivos em dominá-la. O juiz bate o martelo ferozmente, decretando que a corte está em recesso e mandando tirar Gemma do tribunal.

A corte alvoroçada o rodeia, agora é a vez dele ser o alvo da pena de todos. Consigo ver seu sorriso vitorioso para mim quando sou conduzido para fora da bagunça.

O lado de fora está mil vezes pior. É difícil cavar o caminho para o carro com a enxurrada de jornalistas em cima de mim, os policiais tentam afastá-los, mantenho a cabeça baixa, sentindo o sol queimando minha testa e estou fritando debaixo daquele terno quando algo se choca contra mim e aperta minha cintura, pisco tentando discernir do que se trata. É uma criança? Que criança... O cabelo preto brilhoso cobre seu rosto, o afasto com dificuldade pelas algemas e Mia me encara.

— Papai. — Ela murmura antes de ser rapidamente afastada.

Dobro o pescoço, tentando ver o que aconteceu, escuto um: Senhorita Malik , em meio a confusão. Um homem mal encarado e um policial discutem e ela está no meio disso, tentando se desvencilhar do homem.

Então, sou empurrado para dentro do carro.

Ah, Mia.

Encosto a testa no vidro quando o carro é posto em movimento. Observo a cidade correndo através da janela, sem emoção. O prédio alto onde costumava ser a galeria de Aaron está no caminho, parece envelhecido e abandonado, as janelas rachadas, a entrada elegante pichada. Faz parte de uma realidade que não existe mais.

Porém uma história bem vivida, uma vez que Aaron também foi apontado como um dos apoiadores de Andrômeda, além de um possível amante – era o que indicavam os inúmeros retratos meus que ele mantinha ainda daquela exibição em sua galeria – e que justificava ter me feito seu herdeiro. De modo simplificado, nós o usamos e o descartamos, ficando apenas com seu dinheiro.

Aproveitando que o julgamento fora interrompido pelo restante do dia, meu advogado viu como uma oportunidade para discutirmos minha situação no caso.

— Então, você me garante que nunca houve nada? Nenhum beijinho ou uma mão boba?

Reviro os olhos, caminhando pela sala minúscula de visitas do presídio.

— Não, eu sou definitivamente gay.

— Bom, bom... — Ele assente, não muito convencido, abrindo outra pasta — tem alguma forma de provar isso?

Me viro exaurido.

— Não sei, ser casado com outro homem não é convincente o bastante?

Ele arqueia uma sobrancelha, os lábios se torcendo de uma maneira que já aprendi a decifrar. Entendi.

— Eu sou muito temperamental quando questionado. — Digo o óbvio.

— Sim e é por isso que te colocar para depor está fora de questão.

— As provas não são contestáveis?

— Infelizmente não. Você sabe, quando existem armas, digitais e demais fluidos corporais, a justiça não quer saber, eles só agem determinados a punir, sem direito a conversa. Além do mais, as tais conversas entre você e a Srta. Styles foram aceitas e são suficientemente consistentes com a história do caso. E não é exatamente criminoso se envolver com a sua cunhada, mas agir em conjunto para realizarem homicídios é...

— Eu sei, eu sei. — Suspiro, coçando a nuca — As coisas não vão nada bem para ela.

— Você está sendo gentil, ela cavou a própria cova e entrou nela. Analisando tudo, só existe uma forma de você amenizar a sua situação.

— Não!

— Louis, sejamos razoáveis. Você está prestes a ser condenado por uma série de barbaridades, o país te odeia. E ter o seu marido grávido e traído todo o santo dia naquele tribunal só está te queimando cada vez mais, eu sei que vocês estão brigados-

— Brigados? — Grito indignado — Ele armou toda essa merda pra mim. Ele é Andrômeda. Não ele exatamente.

— Sim, sei das personalidades que você acredita que ele tenha.

— Eu não acredito. — Retruco, usando de seu tom de voz irônico — É verdade. Saberiam se o juiz exigisse um diagnóstico.

— O juiz não vai exigir nada do Harry. Ele é a vítima aqui.

Abro a boca para contestar esse absurdo, mas diante das circunstâncias parece inútil continuar batendo na mesma tecla.

— E quanto a guarda das crianças?

Dr. Reynalds não esconde mais uma vez sua frustração.

— Ela segue pertencendo ao seu marido e agora sua mãe não tem a menor chance.

— C-Como assim? — Me exalto, temendo que eles tenham feito algo com a minha mãe.

— Ela tem um ordem de restrição.

— O quê?

— Hamm me ligou agora pouco, sua mãe deu um soco e fez ameaças graves a Sra. Anne Styles.

Caio na cadeira.

— Minha mãe bateu na Anne?

— Sim. A ordem de restrição diz que ela não pode chegar a menos de 300 metros de Anne, Harry, Blake e Spencer por representar um risco à segurança das respectivas partes.

— Isso significa que meus filhos estão completamente nas mãos daqueles dois malucos? — Berro socando a mesa. O guarda no canto me olha duramente, a mão no coldre. Ele não seria intimidante nem se fosse a porra do demônio — Isso é perfeito, é excelente! Eu não vou ter mais acesso nenhum a eles. É isso, ele vai matar eles, meus filhos vão morrer. Que ótima notícia!

— Louis, pelo amor...

— Pelo amor? Pelo amor digo eu, como... — Engasgo, incapaz de completar uma mísera frase — Como eu pude deixar isso acontecer? — Enterro o rosto entre as mãos, desolado.

— Se você se mostrar arrependido e afável, vocês estão juntos há mais de uma década, é claro que se amam.

Solto uma risada seca.

— Você pode persuadir o seu marido a voltar atrás, faça as pazes com ele. Ter o apoio dele seria muito vantajoso.

— Qual parte do ele armou tudo isso você ainda não entendeu?

— Eu sou seu advogado, não precisa omitir nada.

Afasto as mãos, mirando o homem à minha frente. Ele não consegue disfarçar o desconforto ao se ver como alvo do meu olhar raivoso. Ele é como os outros presos, crentes de que o rasgarei de fora a fora na primeira oportunidade.

— Se não acredita em mim, o que ainda está fazendo aqui?

Reynalds pigarreia.

— Claro que acredito, mas amanhã Harry irá depor e ele vai testemunhar contra você.

— Naturalmente. — Relaxo na cadeira.

— Eu tenho uma cópia do depoimento colhido pelo FBI. Ele diz que você o estuprou.

— É mentira. — Digo sem pestanejar.

— Se lembra do ocorrido?

— Não.

— Por que não estava sóbrio?

Aperto os lábios, desviando o olhar.

— Sim.

— Então, talvez seja verdade.

— Eu garanto que é mentira.

— Sim, porque você afirma que é "uma das muitas mentiras daquela boneca vadia demoníaca da Allicent", correto?

— Correto.

— Você também não o socou no rosto durante a gestação atual e o ameaçou?

— Isso é verdade. — Admito vergonhosamente.

— Você também demonstrou um comportamento agressivo em certa ocasião no hospital no início desta gravidez?

— Sim.

— Ao que parece você não é exatamente carinhoso com o seu marido. — Ele comenta — Você o esfaqueou? E incendiou o túmulo da sua filha?

— Sim. Mas- — O último é injustificável, de qualquer forma.

— E o estuprou e agrediu nas últimas horas antes de ser capturado?

— Não, isso é mentira. Ela... Ele se feriu diante dos meus olhos.

— Haviam vestígios de pele debaixo das unhas dele e batem com o seu DNA. Por que ele te arranhou?

— Para dar veracidade a mentira dele.

— Ele disse que fez isso lutando contra o abuso.

— É mentira.

— Céus, Louis, ele é um ótimo mentiroso, então. Como você encontrou alguém assim?

Dou de ombros.

— Não sei, mas ele com certeza faz parte de alguma maldição ou coisa assim. É só ruim demais para ser verdade.

Xx

— Todos de pé! — O guarda ordena com a voz firme.

O juiz entra e nos libera para que tomemos nossos assentos novamente. Hoje, Gemma está distante e absolutamente muda, com o rosto voltado para baixo.

— A corte está em sessão. — Dito isso, o promotor é o primeiro a se levantar.

— Meritíssimo, a promotoria chama como testemunha de acusação o Sr. Harry Edward Tomlinson.

Algo que sempre fora característico de Harry, independentemente de suas demais identidades, ele jamais estaria menos arrumado do que o esperado. Poderia ser uma simples ida ao mercado ou o almoço de domingo, não importa, Harry sempre seria elegante e com um ar de altivez. Blazer, sobretudo, scarfs, mocassins, boinas, chapéus, óculos ou bolsas, o que fosse, seria da marca mais cara possível e nunca, em hipótese alguma, seria simples. Mas hoje, logo hoje, houve uma exceção à regra.

Em questão de vestuário, ele está irreconhecível.

Ao longo da noite, tentando refúgio das perturbações da minha cabeça, comecei a pensar no que ele vestiria. Haviam tantas hipóteses bem mais prováveis do que a que se apresentava diante de mim.

Simplesmente porque era inconcebível que ele usasse jeans, jeans surrados, um tanto largo e com a barra por fazer cobrindo quase que completamente seu vans – Vans? Onde estão as botas? – , a camiseta desbotada também era novidade. Eu não lembro de tê-la visto alguma vez na vida, ele fez questão de comprar uma camisa velha? Por cima, vestia um grande e volumoso casaco de tricô multicolorido, os anéis sumiram de seus dedos, apenas a aliança, os cabelos bagunçados e os olhos fundos e inchados, o rosto pálido. Tudo milimetricamente organizado para a simulação de coitadinho.

Ele não dorme, ele não come, ele não tem paz, apenas chora e clama aos céus por um instante de paz. Eu mereço! Se para mim soa caricato e previsível demais, para os outros é a imagem da perfeita vítima, as feições se contorcem em pena ao vê-lo caminhando devagar, como se não tivesse forças para manter o passo firme. No momento de subir ao banco das testemunhas, precisou ser ajudado pelo guarda.

Estranho, duvido que tenha precisado de ajuda quando matava todas aquelas famílias diariamente.

O vi engolir em seco e se acuar ao olhar para frente e encontrar as dezenas de olhos voltados para ele. Cody. Seu lábio estremeceu, a timidez e insegurança dominando seu rosto.

— Não tenha medo, Harry, ele não pode te machucar. — O promotor disse, olhando para mim.

Oh, ele está com medo de mim? Claro.

Harry assentiu e olhou para baixo e depois para o juiz.

— Eu gostaria de me culpar, meritíssimo, queria ter me vestido de maneira mais apropriada, mas no momento isso é tudo o que cabe em mim.

O maldito júri se confundiu em um misto de risadinhas e olhares ternos. Em algum momento um deles levantaria e ninaria Harry em seus próprios braços.

Ele era a coisa mais fofa e inocente daquele lugar imundo aos olhos dos imbecis.

— Não se preocupe, querido. — O juiz tranquilizou.

Querido?

A partir daí, ele repetiu toda a confissão enganosa que me contou anteriormente. Articulando ao máximo, sempre se colocando como uma pobre vítima, Gemma como o gênio do mal e eu como seu cão carniceiro. Ele tornou a detalhar a sua invenção do estupro e sobre como eu matei Ashton e o torturei por horas a fio, também fazendo questão de chegar a soluçar ao contar como eu admiti ter matado Michael. Praticamente podia sentir o ódio de Luke fervilhando em minha direção.

Harry se interrompia por vezes, chorava, soluçava e dizia que não podia continuar. Depois se recompunha e murmurava fracamente mais atrocidades que vivenciou ao meu lado.

— Eu perdi as contas de quantas vezes ele apontou a arma para mim e me convenceu de que iria atirar, em uma destas vezes, eu sofri o inicio de um aborto espontaneo e ele não moveu um dedo para me ajudar. — Soluça, passando a mão pelo rosto avermelhado — E depois que ele fez aquela monstruosidade com o túmulo da nossa filha... Ele não só me atacou covardemente, como disse que odiava a todos nós, odiava a nossa família e disse que esperava que eu tivesse uma morte dolorosa muito em breve, então, não tenho dúvidas de que se o FBI não tivesse chegado a tempo eu teria tido essa morte que ele prometeu. Não sei o que aconteceu, mas esse não é o homem com quem eu me casei.

E ele volta a chorar, o júri inteiro está utilizando lenços para secar as lágrimas, uma jurada está literalmente em pranto e até o juiz parece abalado.

— Eu só quero que a justiça seja feita e eles paguem por todo mau que causaram. — É a sua última declaração.

E assim como Gemma, só me resta aceitar em silêncio.

Retornamos à penitenciária, mas ao invés da minha cela, me levam até a sala de visitas onde costumava ter meus encontros com meu advogado, no entanto, ele tinha seguido na direção contrária, então o que seria... Estranho quando encontro Niall na porta, indicando que eu entre.

— O quê?

Ele suspira quando eu entro.

— Você tem visita. — E se afasta para que Harry entre em meu campo de visão.

Ele não aparenta o abalo de antes, pelo contrário, está ótimo. Caminhando até a cadeira e se sentando. Eu automaticamente recuo, tentando sair, mas o policial as minhas costas me segura com firmeza e me puxa até o assento diante dele.

— Não, eu não quero falar com você. Eu não quero ouvir nenhuma das suas merdas! Tira ele daqui. — Exijo a Horan, que hesita — Niall, você não pode me obrigar a falar com ele.

Vendo meu nervosismo, ele chega a uma conclusão.

— Harry, não acho que seja um bom momento. — Se aproxima, tocando o ombro de Harry que deixa as orbes esverdeadas caírem sobre a mão de Niall.

— Eu acho que é o momento ideal, agora se afaste de mim. — Retruca com a voz cortante. Os olhos do garoto cresceram de tamanho, ele não estava interessado em bancar o inocente para Niall.

Sabendo que seria um caso perdido, me dei por vencido.

— Tudo bem, Irlanda.

— Certo, chefe. — Parecia um tanto estúpido que ele continuasse a se referir daquela forma, dada a minha atual posição, mas sorri mesmo assim.

Quando ele saiu, Harry bocejou, entediado.

— Esse lugar é melhor do que eu esperava. Estou meio decepcionado.

— Você já deveria ter me imaginado em Alcatraz, no mínimo.

— É, por aí, mas sei que não vai continuar aqui depois da sentença, então, como tem sido? — Soa repentinamente interessado, a voz sussurrada — Já derrubou o sabonete na hora do banho? Entrou para alguma gangue? É a putinha de algum neonazista?

— Não para todas as suas perguntas. Na verdade todos me evitam aqui, eles tem medo de mim.

Suas sobrancelhas arquearam.

— É mesmo? Andrômeda impõe tanto respeito assim? Que divertido. — Sorri satisfeito, ele estende a mão, ajeitando meu colarinho. Enrijeço, e é quando sinto algo raspando nas pontas dos dedos, tem alguma coisa na cadeira. Dedilho novamente, é um brinco. Alguém deve ter deixado cair sem perceber — Não vou poder ficar muito tempo, tenho uma entrevista com a Oprah e tem uns dez jornais querendo falar comigo, a fama não é tão legal quanto eu imaginava. Só perguntam de você o tempo todo.

— Foi você quem escolheu me passar essas honrarias. — Digo com desprezo, conseguindo pegar disfarçadamente o brinco sem que o guarda do outro lado do vidro pareça notar.

— Você tem razão. Oh, isso me lembra. — Pega a sua bolsa de mão, revirando até encontrar o que deseja e a empurra sobre a mesa. Uma fotografia de um ultrassom — A nossa bebê, ela está enorme. Já estamos no sétimo mês. — Acaricia a barriga.

— Nossa? — Repito, olhando brevemente — Pensei que fosse do Aaron. Ou do zelador, padeiro, mecânico, quem sabe do juiz...

Sua expressão se fecha em algo bem mais carrancudo.

— Não faça piadas, ela é nossa, minha e sua.

— Quando você diz "minha" a qual das almas endiabradas você se refere, porque eu tenho certeza que não é o Harry.

Aquele semblante neutro e contido responde ao meu questionamento.

— Então, esse é o fruto do nosso amor, Allicent Rose? — Não escondo a ironia.

— Exatamente. — Murmura séria.

— Isso é estranho, porque eu não te amo. Na verdade eu tenho horror só de pensar como você é de verdade, meu advogado leu os livros do Desmond e segundo ele, você é um coisinha nojenta e feiosa. Claro que deve se achar muito digna usando o corpo do Harry como fachada, mas na realidade, sabemos que você é só um monte de lixo feito de plástico, como alguém como eu poderia amar alguém como você?

Ela pisca devagar, a respiração engatando.

— Você adora falar sobre o "Harry", mas não existe Harry nenhum. Esse corpo é meu, essa vida é minha, tudo o que você acha que conhece ou sabe sobre esse tal Harry não passa de invenção, porque ele não existe. Eu posso ter sido uma boneca há muito tempo atrás, mas hoje em dia estou muito longe disso e você, querendo ou não, já esteve comigo muitas e muitas vezes. O que te aborrece é saber que está aqui. — Ela exibe a mão — Na palma da minha mão. O seu complexo de superioridade não te permite tolerar o fato de que você foi vencido. E enquanto você apodrece aqui, eu vou ter a nossa filhinha, o meu bebê que será só meu pela primeira vez, e você nunca vai ver ou tocar nela, assim como você nunca mais vai ver o Spencer e o Blake. Eles vão esquecer que você existe.

Allicent sorri, o olhar frio e avaliador.

— Se você me odeia tanto, por que fez questão de ter uma filha comigo?

Uma sombra começa a se formar no canto da sala, se movendo vagamente atrás dele, os cachos dourados tocando o pescoço de meu marido quando a sombra se curva sobre ele.

Que audácia vir até aqui. — Diz indignado.

— Como por quê? Você me deve isso! Depois de ter causado a morte da Eve e me condenar aqueles dois... Aqueles dois garotos, eu merecia ter uma só minha. Era o mínimo. E se isso significa que eu te amo ou quero ter um pedaço seu na minha vida? Não. Se você me odeia, eu o odeio dez mil vezes mais, o meu ódio por você é tão devastador e violento que nada do que eu te causar nesta vida será o bastante, nem mesmo que eu pudesse viver outras vidas mais dedicadas unicamente em te torturar bastaria, mas farei a minha parte, eu vou ensinar essa criança a te odiar, a ter mágoa e raiva no coração e seja como for, algo vindo de nós dois jamais poderia ser bom. Nós dois somos podres, imundos e mesmo sendo só um bebê, a Leslie já é o mal encarnado, consumida pelo nosso ódio. Porque é isso que ela é, o fruto do nosso ódio, por isso ela é tão mais valiosa do que os outros. Antes mesmo de nascer, ela tem me ajudado a te manter aqui e em poucos dias sairá o veredito e você vai ser condenado, claro que vai e nós estaremos assistindo na primeira fila.

Meu peito esmaga com suas palavras. Eu não sei o que pensar, eu não... É um pesadelo, só pode ser a porra de um pesadelo.

— Se veio aqui para me dizer isso, pode ir embora. — Sussurro, girando o brinco entre os dedos, até que a ponta metálica roça na fechadura das algemas.

Ela sorri para mim, triunfante em ver meu abalo.

— Isso te deixou tristinho? Que pena, mas era exatamente essa a minha intenção. Pelo que dizem a sua condenação é certa e suas histórias absurdas sobre um tal de TDI tem virado piada mundo afora.

— Você sumiu com a minha pesquisa e do Ashton.

— Eu jamais faria isso.

— Então um dos seus capachos fez.

— Ah, Louis, você deveria me agradecer por estar aqui, apesar de todo o mal que me causou.

Te agradecer por vir me perturbar ainda mais?

— Deveria ter me deixado pegá-lo quando tive a chance. — A voz de Lucian ecoa somente aos meus ouvidos, quando ele caminha pela sala, um olhar de repúdio sobre Harry — Essa cobra armou para nós e ainda tem a coragem de continuar provocando. O que ela acha que nós somos?

Decidido a não lhe dar ouvidos permaneço calado.

Ouço uma série de soluços e sei que a atuação retornou.

— Eu sempre te amei, sempre fui devoto a você e foi assim que me retribuiu, caçando aquelas pobres pessoas como animais na calada da noite.

Eu não fiz isso.

— Estripando crianças inocentes.

Para com isso.

— Não era à toa que nossos filhos tinham tanto medo de você.

Chega de mentir.

— Todo esse tempo, você era Andrômeda, você estava matando, você era...

Não diga isso.

Não diga.

Não.

— Você era um assassino!

Ergo os olhos, sentindo meus dedos que se moviam sozinhos dando a última volta na fechadura. Enxergo um montante de sombras retorcidas as costas de Harry, mas é a minha quem fala, direto em meu ouvido o timbre rouco de Lucian rosna:

Ele nos chamou de assassinos?

— Sim. — O cacheado parece confuso ao me ver falando sozinho.

Se somos assassinos, o que assassinos fazem, Louis?

— Matam.

Em um instante, as algemas se soltam dos meus pulsos. Com um impulso firme, viro a mesa, tirando-a do meu caminho e não importa quantas personalidades loucas ele tenha, a minha única é mais mortal que todas elas e voo sobre eles, caindo em cima de Harry, ele rola para fora da cadeira, mas o pego no caminho, forçando meu peso sobre ele e firmando as mãos ao redor de seu pescoço. Sem vacilar ou hesitar, só apertando o mais forte que posso, assistindo de perto ele lutando para me afastar, seu rosto muda de cor e o ruído alto do ar lhe faltando.

Algo me diz que não consegue mudar agora.

Essa é a hora de acabar com isso.

A porta é rapidamente arrebentada e vejo corpos vindo sobre mim, tentando me puxar, com um único braço consigo golpear cada um deles e continuar meu serviço. E é quando percebo meu joelho esmagando sua barriga e mesmo sem fôlego ele consegue gritar. Um grito estridente e dolorido que nem mesmo Allicent poderia forjar.

Leslie.

Na mesma hora paro. Eu não consigo ir adiante e apesar das minhas mãos longe, ele continua a gritar, gemer e se contorcer sem fôlego, a mão caindo sobre a barriga como se indicasse a sua fonte de dor. Os policiais estão me segurando e me mantendo imóvel quando Niall, completamente horrorizado entra e embora empalidecido, pega Harry no colo e o leva para fora da sala. Da porta aberta escuto seus gritos pelo corredor.

Maldição.

O que eu fiz?

Xx

Na solitária, só me resta falar com as paredes, indo de uma extremidade a outra, arrancando os cabelos e me martirizando. Eu o odeio, mas ao mesmo tempo não o odeio. Por que essa maldita tinha que ter o rosto dele, a voz dele, ser ele? Por que eu tenho que viver nesse inferno? Por que eu simplesmente não morro e me livro de tudo isso? Eu não aguento mais. Eu não aguento.

De repente, a porta é aberta e alguém adentra a minha escuridão. A luz rarefeita de sempre, ilumina a expressão velada de Niall Horan, ele está diferente, não parece o garoto de antes, risonho e ingênuo. Ele parece mais endurecido e até ferido.

— Niall, o que aconteceu? Eles estão bem?

Niall olha ao redor, procurando no ar as palavras que precisa dizer.

Eu posso ler nas entrelinhas.

— Não estão?

— O Harry está internado, mas ele vai se recuperar em algumas semanas.

— Que bom. — Aperto os olhos, suspirando aliviado.

— Mas a Leslie, ela... — Ele engasga antes de dizer: — Ela nasceu morta.

— M-Morta? Fui eu? Naquela hora eu... Eu? — Choramingo estremecendo.

Niall inspira profundamente, o rosto já banhado por lágrimas e assente.

Eu deslizo pela parede até o chão. E assim como ele, me rendo ao mais completo descontrole, chorando abertamente.

— Ela tinha razão, eu sou um monstro, eu fiz tudo o que ela disse. — Minha voz embargada e soluçada ecoa morbidamente pelo espaço.

Eu só quero gritar.

Eu quero morrer.

Mas morrer é bom demais, eu preciso queimar em agonia para toda a eternidade e nunca será o bastante.

— Eu sinto muito. — Niall ajoelha perto de mim e me abraça. Abalado como estou, mal lhe dou ouvidos, apenas deixo minha testa tombar em seu ombro e o abraço de volta, me afogando em lágrimas e desespero — A culpa é minha, eu não devia ter deixado ele entrar, eu não devia... Me perdoa, por favor, me perdoa. Você é meu melhor amigo e eu te trai.

A culpa não é sua, Irlanda. Não é.

Porém, eu não consigo dizer.

Xx

O país inteiro só fala de uma coisa. Sobre como eu matei a minha família.

Há manifestantes nas portas do presídio, no tribunal, na nossa casa e até na casa da minha mãe. Todos exigem que eu receba pena de morte quando o júri se reúne para deliberar a sentença.

Parece que é um fato. Minha mãe não pode se aproximar e somente através de Niall sei um pouco sobre o que acontece com as crianças e Harry, segundo ele, os meninos estão bem e Harry continua internado. Por isso, ele não está presente quando o júri chega a uma conclusão sobre Gemma, por conta da grande revolta contra a mim, a advogada insistiu para que nossas sentenças fossem lidas separadamente.

Pela manhã era a dela.

E a minha viria ao entardecer.

Assistimos pela televisão a decisão do júri chegando às mãos do juiz Roffman. Gemma estava em pé, usando um terninho preto e os cabelos jogados sobre o ombro direito e ela não parecia nada calma.

— Antes de ouvir a sentença, tem algo que gostaria de dizer à corte, Srta. Styles?

Ela olha para a advogada e respira fundo.

— Eu sei que vocês não acreditam, mas eu sou inocente. — Diz com a voz baixa e afetada — Posso ter um gênio péssimo, mas sempre tentei melhorar e infelizmente nada disso tem importância porque sei que vocês decidiram a pior das alternativas para mim e está tudo bem, eu não odeio os senhores. — Olha para os jurados e dobra o pescoço, para encontrar a mãe — Mas você sim. Obrigada, meritíssimo.

— Certo. — Ele ajeita os óculos e começa a ler: — A senhorita Gemma Anne Styles foi declarada culpada de todas as acusações e sentenciada à morte por injeção letal.

Se escuta o ligeiro grito de horror de Anne na platéia e mesmo sem qualquer estrutura, Gemma permanece de pé, ouvindo o restante de sua condenação.

— A senhorita receberá uma injeção intravenosa de uma quantidade letal de um barbiturato em combinação com um agente paralisador, até morrer.

Ela solenemente aceitou a decisão, mesmo que não tivesse culpa alguma. Provavelmente a advogada iria recorrer, mas havia poucas chances da pena ser revogada.

Uma já foi.

Era a minha vez.

Horas mais tarde, eu ocupava exatamente o mesmo lugar que Gemma esteve. Observando o juiz receber a decisão. Gostaria que ao menos minha mãe pudesse estar aqui, mas com Anne no recinto não era possível. Niall, pelo menos, estava às minhas costas.

— Antes de ouvir a sentença, tem algo que gostaria de dizer à corte, Sr. Tomlinson?

Penso no discurso que passei e repassei com meu advogado. Lembro linha por linha, no entanto, só existe uma coisa que desejo dizer diante destas pessoas. E ao meu ver, é a única verdade.

— Eu sou o culpado.

Um burburinho se espalha rapidamente, até que as vozes se elevam.

— Louis?! — Dr. Reynalds me puxa.

— Ordem! — Juiz Roffman bate o martelo — O que quer dizer, Sr. Tomlinson?

— A culpa é minha, eu posso não ter matado diretamente essas pessoas, mas fui eu quem desencadeou isso. Eu causei tudo isso. A culpa é minha. — Digo num só fôlego, secando os olhos.

O juiz contraiu a mandíbula e como de costume, ajeitou os óculos antes de baixar os olhos para o documento.

— O FBI terá de prestar contas quanto a isso. — Alguns se entreolham, permaneço imóvel com as mãos unidas diante do corpo — Como solicitado, tenho aqui os resultados da avaliação psiquiátrica ao qual o senhor foi submetido e segundo ele, é reconhecido que em natureza dos distúrbios mentais diagnosticados e em sua total incapacidade de resistir aos impulsos violentos, é aceita a alegação de insanidade mental, sendo assim, está sentenciado a cumprir prisão perpétua no Sanatório W. Lincoln, no Estado da Geórgia.

Ele bate o martelo. Está feito.

Não expresso emoção. Um hospício? Quem poderia imaginar.

Finalmente estarei em um lugar propício ao que eu sou.

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