│11│gemini
Afundo a cabeça na pia debaixo da torneira por exatos vinte segundos antes de tirar mais uma vez.
Minha franja longa goteja em frente ao meu rosto e eu encaro meu reflexo sem entender como meus olhos acabaram tão vermelhos.
— Wow, bom dia pra você também! — Mike entra no banheiro com os olhos arregalados equilibrando duas canecas personalizadas de alguma de suas séries idiotas que ele vinha me viciando nos últimos dias em que fui seu hóspede.
— E aí. — Gemo repousando a testa no granito sentindo como se uma marreta batesse de segundo em segundo no meu crânio.
— Sabe, se você continuar nessa posição eu vou esquecer que você é casado. — Comenta as minhas costas e é quando dou por conta que a minha posição é no mínimo comprometedora ao estar inclinado no balcão da pia do banheiro e com uma única peça de roupa. Mas francamente não estou nem aí — Cuequinha vermelha, meu deus, Louis Tomlinson, você é indecente! — Conclui com um assobio.
— Você não tem ninguém mais pra amolar, não?
— Até tinha, mas a Vee começou a mostrar os dentes, mais um minuto encima dela e eu ganho uma mordida.
— Se você continuar me enchendo eu vou acabar te mordendo. — Encontro forças para levantar a cabeça mais uma vez, tudo parece girar — Liam não deveria dar uma festa com tanto álcool. Foi muita irresponsabilidade da parte dele.
— Com certeza, a culpa foi toda dele por você encher a cara. Meu deus, Louis, você parecia um alcoólatra.
— Tem razão, a culpa não era do Liam e sim do Harry, eu ainda não acredito que ele apareceu lá e com aquele puto do Aaron. Eu só queria poder atirar nele. — Esbravejo irritado, batendo no potinho de escovas e recolhendo tudo em seguida quando o mesmo rola pelo chão — Quer dizer, você viu como a calça do Harry era apertada? Ele queria chamar a minha atenção.
Mike faz uma careta coçando a barriga forrada pela camisa velha do Seinfeld.
— Ele não parecia dar a mínima pra você.
Pulo do chão, pegando a outra caneca de sua mão.
— Credo, Mike! Você quer mesmo arruinar o meu casamento? — Indago marchando para fora do banheiro bebendo meu café. Só então percebo que não escolhi bem as palavras, Michael é a pessoa mais desencanada que eu conheço.
— Sempre. — Responde do outro cômodo imitando o tom de um vilão.
Ele tem sido ótimo me deixando ficar aqui mesmo depois de conseguir um outro apartamento, na verdade sua companhia sempre me fez muito bem. Nos conhecíamos há anos e eu sabia que Michael era alguém em quem eu podia confiar, embora uma parte de mim se receace com a possibilidade de Harry descobrir que eu estava aqui. Ele não vinha sendo muito condescendente comigo, muito pelo contrário, havia cortado toda e qualquer tipo de ligação. Ignorava minhas mensagens e fez questão de sair no dia em que fui em casa buscar algumas coisas.
Quando contei pra Liam na festa ele disse que não seria nada demais, já Mitch garantiu que o próximo passo era o divórcio. Eu fiquei em pânico e quando meu marido chegou na festa de aniversário de Payne com o Sr. Bonitão Johnson não deu em outra, eu bebi como se não houvesse amanhã.
Tudo ficou confuso e desesperador.
Me lembro vagamente de ter encontrado com ele no corredor, da luz ser quase nula e do glitter dourado abaixo de seus olhos. Ele estava tão bonito e de repente não me ignorou, me prensou contra a parede e enfiou a mão na minha calça me masturbando rápido e firme até que eu viesse em seus dedos.
Harry não me beijou ou disse qualquer coisa, apenas esfregou a mão na minha camisa e se foi. Quando reaprendi a mover meus pés e ir atrás dele já era tarde demais, Harry já tinha ido... Com Aaron.
No meio da madrugada enviei uma mensagem agradecendo a punheta, ele respondeu dizendo que eu era um pervertido nojento que deveria parar de falar dos meus sonhos imundos com ele e que era pra buscar o saco de pulgas do Sonny que não parava de choramingar por mim. Fiquei de levá-lo para um passeio, mas pela minha ressaca o melhor seria cancelar.
Tomei um banho frio, refiz meus curativos e me vesti a caráter para o meu retorno. Ou seja, o bom e velho social com a jaqueta e óculos escuros.
Michael ficou sem entender quando me viu na porta rodando a chave no dedo.
Ele era o meu oposto, tênis, moletom e uma toca para conter os fios oxigenados que ele não tinha interesse em lidar. Mike parecia meu filho punk adolescente.
— Pra onde você vai?
— De volta ao trabalho.
Solta um tom de reprovação.
— Você está de férias, deveria descansar.
— Eu já descansei. Agora vamos prender bandidos. — Anuncio animado e ele se força a sorrir pequeno.
— Posso ver a cueca vermelha de novo? — Pergunta no corredor.
— Morre, Clifford!
— Só se for de amores por você. — Devolve.
Não faço questão de segurar o elevador pra ele que quase morre ao enfrentar as escadas.
Xx
Eu não deveria me animar sobre como sou recebido no escritório naquela manhã, eu só fiz o meu trabalho e não o exerci da melhor maneira, ainda por cima. Mas mesmo assim todos estão de pé batendo palmas me ovacionando e é como nos velhos tempos em que eu pegava todos os homicidas que surgiam pra mim. Desde Andrômeda os dias de glória haviam passado, mas hoje ele ressurge com força total.
Ajo humildemente, dispensando todo o ato com um gesto de mão e caminhando calmamente com minha bengala, consequência de um ferimento de guerra era o que se comentava pelo lugar.
Há algumas policiais jogando confete em mim quando passo por suas mesas, Liam está gritando algo como "o melhor", Sarah tem uma corneta e Luke mostra o dedo do meio. Invejoso.
— Como eles sabiam que eu viria hoje? — Me pergunto.
— Eu fiz algumas ligações. — Mike cochicha indo em direção a sua mesa.
Sorrio para ele chegando até meus amigos.
— Veja só o super-homem. — Mitch grita me empurrando um copo de milkshake.
Sugo o canudinho antes de responder.
— Não sei porque tudo isso, eu nem peguei o cara.
— Não, você fez muito mais que isso. Salvou duas garotas e nos levou até o esconderijo dele, o lugar está infestado de digitais, vamos encontrá-lo assim. — Estrala os dedos em frente ao meu rosto — Você é o cara Tommo.
Dou uma risadinha fraca ao redor do canudo me sentindo incomodado com o fato daquele maldito rato de esgoto ser identificado. Não quero fotos ou informações dele por aí, o quero no esquecimento, ele não existe mais...
— Tem certeza? — A voz surge de algum canto sombrio da minha mente.
— É bom tê-lo de volta. — Coloco um sorriso falso no rosto para encarar Nicholas que aparece de supetão em sua porta.
— É ótimo estar de volta.
— Que bom! Podemos dar uma palavrinha? — Ele torna a entrar na sala, deixo minha bebida, tal como a minha paciência do lado de fora e o sigo. A porta bate as minhas costas e me acomodo diante de sua mesa.
— Então...? — Cruzo as pernas apertando os descansos de braço da cadeira.
Nick se senta com toda a sua postura arrogante de "chefe".
— Primeiramente devo lhe felicitar pelo excelente trabalho, os diretores pediram que eu expressasse nossa imensa alegria em ter um profissional como você é...
Não consigo segurar a gargalhada.
— Tem câmeras aqui, né? — Estico o pescoço, examinando os cantos da sala — Você não me chamou pra tecer elogios a minha pessoa.
— Do que você–
— Eu leio bem os meus inimigos.
— Não somos inimigos, Louis.
— Bom, amigo de estuprador eu não sou. — Ele automaticamente fecha a cara, o punho se aperta sobre a mesa tentando me intimidar. Acho que a essa altura nem o próprio Satã com seis chifres e um rabo pontudo causariam algo além de tédio em mim.
— Esse mal entendido foi resolvido há muito tempo. — Responde evasivo.
— Com certeza, ficou bem claro que estava tudo bem quando ela se matou. — Reviro os olhos batucando os dedos na madeira.
Grimshaw suspira alto, irritado com o assunto.
— Pelo amor de Deus, Louis! Aquela garota não passava de uma drogada, ela alucinava praticamente o tempo todo.
— Eu acredito na Kacey.
— Sim, porque você não passa de um viciado assim como ela era. Oh, o que foi? Pensou que eu não soubesse?
— Eu estou limpo há muito tempo.
Ele sorri se inclinando sobre a mesa.
— O agente que esteve com você no hospital falou sobre algumas conversas suas sozinho, ou por acaso tinha alguém aí na sua cabeça? Se eu bem me lembro você via muita gente depois de uma ou duas carreiras, não foi você mesmo que jurava ter falado com Abraham Lincoln? Você na narcóticos era como colocar o rato atrás do queijo, não é mesmo?
Me remexo desconfortável na cadeira.
— Por que não deixamos o passado no passado?
— Concordo plenamente e apesar de você ser um ser humano deveras desagradável eu estive conversando com nossos diretores sobre adiarem o fechamento do caso da Evangeline.
— Você o quê?
— É, eu precisei bajular muito os velhotes, mas consegui um adiamento até o final do ano. Payne e Rowland cuidarão pessoalmente das investigações.
— Isso...isso é ótimo! Mesmo, é incrível! Eles são mil vezes melhor do que o inútil do Hemmings. — Minha cabeça é tomada por uma onda de alívio e felicidade, quando de repente associo uma coisa a outra — Mas o Liam é meu parceiro, ele é um dos cabeças pra toda a investigação de Andrômeda.
— Sobre isso. — Nick coça o queixo — O acordo foi fechado com o Horan e ele fez uma exigência especial.
— Que tipo de exigência?
— Ele tem um sobrinho recém saído da academia e é um grande fã seu.
Eu quero morrer.
— Vai me dar um tiete como novo parceiro?
— Infelizmente é esse o trato, ou você aceita Niall Horan como seu pupilo e parceiro ou não teremos um responsável pelo que houve com a sua filha.
Era óbvio que eu não tinha escolha e era óbvio que eu ia aceitar, assim como era óbvio que eu sairia daquela sala puto da vida em direção a minha sala e querendo matar a porra loira mexendo na minha estante.
— Que merda é você? — Rosno da porta me sentindo um velho de duzentos anos com a bengala e a cara enfezada. Foda-se. Eu quero empurrar Niall daquela janela e pegar Liam de volta.
Ele deve ter algum problema porque toda a minha raiva e desgosto não parecem atingi-lo, pelo contrário, ele vem sorridente em minha direção, todo uniformizado feito um babaca com sua arminha recém comprada e uma estrelinha de bom menino no peito.
Otário. Eu te odeio. Some. Morre. Sai já daqui.
Há uma possibilidade de que eu esteja projetando no garoto toda a minha ira e frustração e não me importo nem um pouco com tal injustiça. Estagiários servem pra isso mesmo.
— Eu sou Niall Horan, detetive Tomlinson, e preciso dizer que é uma honra estar trabalhando com o senhor. — O menino espevitado para saltitante na minha frente — E-Eu posso apertar sua mão?
— Não, você não pode tocar em mim, assim como não pode falar comigo, mas essa regra você já quebrou, então vamos esclarecer algumas coisas, Niall. Você não é um detetive, nem ao menos um recruta, só está aqui porque você tem dinheiro e pode passar por cima de gente bem melhor que você. Não espere que eu sirva de mentor, eu tenho um caso sério pra resolver, se quiser aprender volte pra academia. Não encha meu saco, não faça perguntas, melhor, não fale! Eu quero que você seja como uma sombra silenciosa por esse escritório, entendeu?
Ele tem os olhos azuis arregalados.
— Sim, eu acho que sim.
— Perfeito!
Meu celular apita com uma nova mensagem de Harry, espero que seja algo mais romântico do que:
Venha buscar o saco de pulgas senão vou ligar pra carrocinha!
— Horan, tenho uma missão pra você. — Digo animado como se fosse algo de verdade.
— Sim, senhor. — Niall bate continência.
Qual é o problema dele?
— Você vai até a minha casa e vai pegar o meu cachorro, leve ele no parque e deixo-o se divertir ao máximo. Faça ele feliz! Aqui. — Coloco alguns dólares em sua mão — Pode levá-lo até em clube de stripper se ele quiser. Depois disso leve ele de volta e se o meu marido reclamar ignore, ele é surtado mesmo. Pegue o endereço com a Sarah.
Niall permanece parado por mais tempo que o necessário o que acaba me tirando do sério.
— Agora, Niall. — Grito e ele pula para fora pedindo várias desculpas.
Me jogo na minha cadeira desacreditado que colocaram um idiota desses pra trabalhar comigo. Andrômeda deve estar rindo da minha cara.
Xx
Na hora do almoço escapo para o bar do outro lado da rua. Foda-se que é meio-dia, eu preciso de uma bebida.
Acabo de receber o meu scoth quando Luke puxa uma cadeira do meu lado, não trocamos nenhuma palavra. Bebemos em silêncio, ele resolve terminar sua vodca enquanto joga sinuca com uns motoqueiros mal encarados e eu tento entender qual é o problema de Harry. O sino da porta soa quando alguém novo passa por ela, cambaleante, com seus cabelos armados e roupas em tons de terra: Aaron.
Percebo que Hemmings está olhando pra ele, assim como eu, ele cai em uma mesa na parede ao fundo. Desnorteado e passando a mão pelo rosto e cabelo sem parar, a recordação do que ele me disse em nosso último encontro vem como um soco na cara.
"Essa morte não tem um propósito pra ela."
Foi o que ele disse na ocasião. Pode ser loucura escutar alguém como Johnson, mas já é alguma coisa. Ele pode ser a conexão com Andrômeda.
Saio do balcão e vou até Luke. Após encaçapar mais uma bola ele dá um longo gole em sua bebida.
— Ei, Luke, como eu estou?
— Estagnado no mesmo caso há anos, manco e sem um dedo. — Responde amável como sempre.
— Engraçado! Hilário! Vou me lembrar de rir mais tarde, o Aaron está bem ali. Você acha que eu estou atraente o suficiente?
Junta as sobrancelhas loiras em confusão.
— O que v– Oh, meu deus! Puta merda, Tomlinson! — Ele ri alto e escandaloso chamando muita atenção indesejada — Você vai mesmo foder o amante do seu marido? Isso é contra as regras, cretino. Eu respeito isso. Vai lá, precisa de alguma coisa? Quer que eu vá comprar lubrificante ou te ensine algumas cantadas? Se bem que aquele ali fica de quatro por você rapidinho.
— Eu não tenho interesse nele de quatro, mas eu quero que ele fale. Você lembra do dia em que o interrogamos?
— Claro. — O outro adota uma postura mais séria — Ele falou como se tomasse o chá das cinco com Andrômeda. Sabe que nada do que ele disser pode ser relevante por ele ser usuário e é claro, pela forma pouco ortodoxa que você espera tirar informações dele.
Balanço a cabeça em concordância, puxo meu maço de cigarros do bolso, acendo um e dou o trago. A nicotina não vai me amansar agora.
— Não preciso de nada oficial. Uma pista é uma pista de qualquer forma. — Me afasto de Luke para ir em direção a Aaron que ainda não pediu nada e provavelmente se esqueceu onde está. Chapado é apelido pro seu estado. Sento na cadeira ao seu lado e ele se sobressalta — Oh, desculpe, posso sentar aqui?
— S-sim, claro. — Responde confuso, voltando a me olhar exatamente um minuto depois — Você é o detetive. Louis, o marido do Harry.
— Touché. — Sorrio soltando a fumaça devagar.
Seus olhos seguem cada movimento meu. Excelente.
— Eu queria me desculpar por aquele dia, durante o interrogatório eu fui um completo idiota. Por que não tomamos alguma coisa? — Sinalizo para o garçom que prontamente atende, peço uma rodada de tequila.
— Acho que já estou bêbado o bastante. — Ele diz embolado.
— Oh, não, é só meio-dia.
— Eu meio que não dormi desde ontem, então...
O olho atravessado, pensando comigo mesmo: por que não, seu monte de bosta, é por que você estava fodendo meu marido? E por um momento estive bem consciente da arma no quadril.
Baixa a bola, Tomlinson.
O garçom logo trouxe a bebida, Aaron estava meio relutante em aceitar. Eu precisava que esse cara soltasse língua de uma vez, Luke sibilou um "vadia" quando me viu desfazendo os primeiros botões da camisa. Meus métodos não tinham nada de ortodoxos.
— Vamos só uma, eu insisto. — Falo sorrindo e lhe dando uma piscadela ao virar a pequena dose de uma vez garganta abaixo. Essa merda tá forte! Não transpareço nada ao correr os dedos pelos cabelos, uma mecha longa cai pela minha testa e o idiota cai na minha.
— É só um pouco de tequila, acho que tudo bem. — Ele pega o copo e o esvazia facilmente, logo passamos para as outras doses.
— E como vai o trabalho? — Começo com uma conversa furada.
— Fraco, a exposição, ou melhor dizendo fiasco, de Harry foi o último grande evento na galeria.
— Foi uma pena o que aconteceu. Todos estávamos fora de controle, agindo fora do normal, o jeito que eu te tratei no interrogatório. — Tento parecer o mais culpado possível, não é fácil, mas serve perfeitamente para um bêbado.
— Pensar que eu fiz aquilo foi absurdo. — Aaron ri, desfazendo alguns cachos com os dedos.
— Sim, totalmente, e você não estava lá muito bem, falando sobre Andrômeda como se o conhecesse. — Arrisco para ver sua reação, o homem encara o vazio por um bom tempo até estalar a língua no céu da boca e me olhar de canto.
— Andrômeda é uma garota e ela fica muito aborrecida quando se referem a ela no masculino. — Fala como se estivesse compartilhando um segredo.
Eu posso acreditar nesse cara?
— Andrômeda é uma garota?
— Uma garota muita má. — Sorri, batendo o ombro no meu.
Uma garota muito má? Eu nem percebi.
— E muito forte também.
Um vinco surge entre suas sobrancelhas.
— Por que forte?
— An, você já viu o que ela faz? Como suspende homens corpulentos no teto como se não fossem nada. Ou ela é muito forte ou tem...
— Amigos. — Aaron arrota pedindo ao garçom a garrafa mais cara da casa.
Passo o braço sobre o estofado atrás dele e o cretino se vê no direito de apoiar sua cabeça nele, piscando sonolento em minha direção.
— Você é um desses amigos?
— Eu não me meto nos assuntos dela.
— Por que não é mau o suficiente?
— Ela não é má, as pessoas só não compreendem, o que ela faz é proteger eles, os mantém unidos. Na verdade é muito lindo, detetive.
— Como matar gente inocente pode ser lindo, Sr. Johnson? — Meu tom endurece. Porra.
— Eu acho melhor eu ir... — Diz, tentando se levantar.
Me apresso em segurar sua mão.
— Olha, Aaron, me desculpe, talvez eu ainda não a compreenda.
Ele se empertiga assim que o solto.
— Você irá, quando for a sua vez. — Disse antes de me dar as costas e partir.
Luke se aproximou da minha mesa, girando o giz na ponta do taco.
— Conseguiu arrancar alguma coisa dele?
— Bom, ele garantiu que Andrômeda é uma garota e que não está sozinha, além disso ela não é uma vilã, mas sim uma salvadora que está protegendo suas vítimas.
— Isso não faz sentido, é a erva falando.
— Pode ser, mas também temos isso. — Entrego o celular de Aaron em suas mãos.
— V-você roubou o celular dele? Tomlinson, esse cara pode ferrar com você.
— É por isso que você é quem vai cuidar disso, um processo não é nada pra quem já tem quatorze, não é mesmo? — Lhe dou uma piscadela e ele acaba por concordar.
Estamos indo a algum lugar.
Pegaremos essa garota pelas pontas soltas que ela for deixando.
Xx
Depois da conversa com Aaron eu resolvo dar uma volta pelo quarteirão, deixar que minha cabeça absorva as novas informações e pense além. Eu estou vivo e de volta, a minha sobrevivência só pode se dever a um propósito maior, o propósito de pegar Andrômeda e salvar o máximo de vidas possíveis, em muito tempo começo a ter alguma direção para qual seguir. Ela se acha esperta, mas eu sou mais, tenho que ser.
E parece até engraçado como o meu pessoal e profissional andam atrelados, eu reflito sobre um caso enquanto avisto uma pessoinha em frente a uma banca de sorvetes com um grupo de meninas, todas usando o mesmo uniforme padronizado em vermelho e azul. Ela parece brilhar sob o sol do início de tarde, rindo absurdamente alto com os olhos apertados, na maioria das vezes em que eu a vi ela só expressava pontos característicos ao Zayn, mas talvez ela tivesse um pouco de mim.
Suspeito que ela tenha puxado o meu sexto sentido para quando estou sendo observado porque no exato momento em que meus olhos estão fixos nela, Mia se vira e pode ser impressão, mas seu sorriso se amplia ao correr em minha direção.
— Louis! Olá, ouvi dizer que o senhor estava no hospital, está melhor?
Mia tem seus grandes olhos azuis fixos em mim.
— Sim, sim, estou melhor. — Pigarreio, vendo um carro preto dobrar a esquina. A menina está alheia a chegada iminente de seu pai, assim como ao sorvete de chocolate derretendo e gotejando em sua mão — E você como está?
— Eu estou bem! Essa semana tivemos uma feira das profissões, os pais foram até a escola falar sobre os seus empregos. O Zayn não pode ir, mas o diretor disse que tudo bem por causa das grandes contribuições para a instituição, eu não entendi muito bem. Também haviam muitos testes de aptidões e adivinha o que deu no meu?!
Nesse mesmo momento o vidro fumê do banco traseiro do carro abaixou, Zayn nos olhou sobre o óculos escuro e não tardou em sair do veículo, batendo a porta com força. Ele vai achar que eu vim atrás dela. Tudo o que eu não precisava era de mais uma briga. Merda!
Tento me atentar a Mia que continua sorrindo.
— Hum, deixe-me ver, deu que você vai ser uma veterinária? Bailarina? — Ela balança a cabeça negando — Não sei, o que poderia ser?
— Uma super detetive! — Grita dando alguns pulinhos.
— Menos, Miranda. — Zayn diz brando as suas costas, ela se vira para ele e corre para abraça-lo pela cintura.
— Papai, não acredito que veio me buscar.
Malik baixa os olhos pra ela e toca sua franja antes de afasta-la com um olhar reprovador.
Haviam muitos pontos a serem levados em consideração nessa história antes de concluir que Zayn era algum monstro sem coração ou amor pela única filha.
Nós dois crescemos juntos no Brooklyn, meus pais viviam um casamento infernal e eu me refugiava na casa de Zayn. Éramos inseparáveis e foi lado a lado que lidamos com nossas primeiras descobertas, ele definitivamente foi o meu primeiro amor, junto com a justiça, mas eu não era o amor dele. Talvez não o suficiente. Ele sempre foi ambicioso, por isso começou a andar com quem eu não aprovava e fazer coisas que só foram nos afastando.
Eu nunca disse a ele, mas todas as vezes em que ele me rejeitava por ser um "careta" eu chorava trancado no quarto a noite inteira.
Foi só quando a mãe dele morreu em um acidente de carro que ele me deu uma brecha pra voltar a me aproximar, na época eu estava na academia de polícia e Zayn me desprezava por isso. Mesmo assim nós estávamos juntos quando ele engravidou e é claro que ele não gostou disso.
Estava construindo um nome de peso no mundo do tráfico e um bebê seria um puta empecilho, ao mesmo tempo que seria sua única família. Indo contra todas as expectativas Malik quis a criança, porém impôs a condição de que eu não me meteria em seus assuntos, em outras palavras me mandou cair fora.
Nunca fez parte dos seus planos ter um marido, um bebê e uma casa com cerca branca. Ele queria a ostentação, luxo e extravagância e um policial a tira colo como pai da sua filha não lhe era vantajoso.
Foi assim que eu tive de seguir outro rumo e no meio do caminho encontrei alguém que quis comigo tudo aquilo que Zayn rejeitou.
Por outro lado Zayn não era um pai ruim, nunca foi, ele protegia Mia com tudo o que tinha e ela deveria ter a melhor educação de toda a América. Nos primeiros anos ele foi bem amável e carinhoso, era inevitável, mas um chefe de uma gangue rival queria acabar com ele, então mandou um assassino até sua casa, o homem entrou, só que Zayn estava fora do país.
Mas Mia estava, em companhia dos funcionários e a babá.
Ele a levou.
A menina tinha cerca de quatro anos e não havia sinal de onde ela poderia estar.
Aquela deve ter sido a minha primeira e mais arriscada ação ilegal. Mobilizei uma equipe de peso para localizá-la, nós a encontramos do outro lado do país e quando foi devolvida em segurança, Zayn não quis tomá-la nos braços e enchê-la de amor. Deixou tudo o que envolvesse a criança na responsabilidade das babás e foi atrás da tal gangue, no outro dia só se falava sobre o massacre no Queens.
Ele nunca mais foi o mesmo.
A rigidez, frieza e sobriedade o dominara.
— Por que não estava dentro do colégio?
— Eu vim comprar sorvete com as m–
— Bom saber! Você está de castigo. Entre já no carro.
— Mas.... — Começou não sendo capaz de concluir pela expressão do pai que não dava espaço para discordância — Sim, senhor. — Se deu por vencida caminhando até o carro.
— Fico feliz que não tenha morrido ainda, mas eu não quero saber de você vindo atrás dela. — Ele fala arrogante com as mãos dentro dos bolsos do terno Armani. Debaixo do sol com os cabelos negros novamente e toda a sua pose de grande chefe ele parece o próprio Hades saído do submundo.
— Nos encontramos por acaso.
— Claro. — Franze os lábios girando nos calcanhares e se pondo a caminhar.
— Ela está linda. — Digo de repente.
— Eu sei. — Zayn olha por cima do ombro com um pequeno sorriso e esse deve ser o máximo que já partilhamos de um momento paternal em relação a Mia.
Um pouco antes do carro andar ela surge na janela e lança um beijinho. Faço o mesmo e ela ri.
— Uma super agente? — Pondero sozinho — Nem por cima do meu cadáver.
Estou em caminho de acender um novo cigarro quando meu celular começa a vibrar no bolso, interrompo com má vontade minha ação para poder atender.
— Alô?
— Boa tarde, é o senhor Louis Tomlinson, correto? — Resmungo sim, sem reconhecer a voz da mulher, só pode ser alguém querendo me vender algo, estou prestes a desligar e tocar com o meu dia quando ela continua: — Eu sou Margareth Downson, diretora da escolinha dos gêmeos.
Isso definitivamente me faz mudar de ideia quanto a desligar.
— Boa tarde, Sra. Downson, algum problema com os garotos?
— Não exatamente, mas acho que precisamos falar com urgência sobre o Spencer.
Em questão de minutos retorno até o FBI onde deixo avisado que não retornarei mais hoje e vou direto pra creche. É no mínimo estranho estar do lado de dentro do lugar, me lembro vagamente de ter vindo a uma peça deles no outono passado, mas logo recebi um chamado e deixei tudo por conta de Harry. Mesmo assim tento soar o mais relaxado possível quando a Sra. Downson retorna com duas xícaras de café, ela entrega uma pra mim que a recebo bastante grato, depois de beber no bar eu havia ingerido muita água para driblar o álcool, mas nunca se sabe e se tratando do meu filho devo estar o mais sóbrio possível.
— Eu sinto muito pela ligação no meio do dia, devo tê-lo atrapalhado. — Ela diz solene se acomodando em sua cadeira giratória.
— Não, está tudo bem, eu só estranhei um pouco que tenha entrado em contato comigo. — Disse coçando a nuca e dando um gole em meu café. A mulher franze o cenho.
— Como assim?
Dou de ombros.
— Normalmente é o meu marido, Harry, quem lida com esses assuntos.
— Esses assuntos?
— É, assuntos das crianças. O meu emprego me mantém ocupado a maior parte do tempo, então eu não participo muito da vida académica deles.
— Sim, compreendo, eu normalmente buscaria entrar em contato com o seu marido, porém, acredito que você seja o melhor para termos essa reunião.
Termino minha bebida e deixo a xícara vazia sobre sua mesa, me ajeito na cadeira ainda sem entender o que isso significa.
— A senhora falou sobre o Spencer? Por acaso ele bateu em algum coleguinha? Talvez por eu ser um policial a senhora pense que eu incito nele algum tipo de violência, mas...
Ao que ela se apressa em dizer:
— De forma alguma, o Spencer é a criança mais doce da turma dele e não tenho dúvidas de que é um excelente pai. A questão é que já faz alguns dias que ele vem demonstrando um comportamento preocupante. — Arqueio as sobrancelhas, esperando que ela se explique melhor — Ele sempre foi mais tímido e sentimental, sabe que ele é muito sensível?
Concordo plenamente.
Na verdade eu não fazia a menor ideia que ele fosse sensível, na minha cabeça Spencer sempre me pareceu mimado, manhoso e insuportável.
— Além de empático e observador, ele nota absolutamente tudo ao seu redor, é impressionante, cada mudança de comportamento dos coleguinhas ou dos professores, acredita que foi por meio dele que descobrimos que uma estagiária havia sido vítima de violência sexual?
— Meu deus! Eu nem imagino como isso foi possível. — Comento embasbacado.
— Ele apenas notou as mudanças e se fixou com firmeza a elas, segundo o que a mesma nos contou, seu filho disse que ela "deveria contar os probleminhas pra alguém grande que saberia como ajudar, que ela não podia deixar o coração tristinho" foi por isso que ela se abriu conosco e pudemos ajudá-la. Spencer é um ótimo garoto.
Balanço a cabeça ainda consternado com tudo o que ouvi. Ao que parece meu filho de dois anos é muito mais esperto e maduro do que eu.
Um sorriso orgulhoso cresce em meu rosto.
— Acho que com isso ele acaba de conseguir uma passagem vip pra Disney. — Margareth sorri, porém algo parece incomodá-la — Não foi por isso que me chamou até aqui, não é mesmo?
— Como eu mencionei, o comportamento dele tem sido preocupante, repentinamente Spencer está afastado e meio assustado com tudo. Ele não fala e evita contato visual, normalmente quando isso acontecia eram devido ao seu acesso de saudades pelo seu marido, então bastava dar alguma coisa dele ou mostrar uma foto, em casos mais extremos recorríamos a um Facetime e dez minutos de conversa com Harry eram o bastante para colocá-lo nos eixos. No entanto, todos esses recursos tem sido brutalmente recusados por ele, semana passada ele jogou na caixa de areia a bandana do pai que costumava ficar na escola e que ele tratava como um amuleto da sorte, nós tentamos conversar a respeito, descobrir o que houve entre ele e o papa Hairy que ele tanto ama, mas ele só diz que o papai sumiu. Conversamos algumas vezes com o seu marido e foi no mesmo período em que o senhor esteve desaparecido, associamos essa atitude do Spencer ao seu sumiço, mas mesmo após o seu retorno ele continuou estranho e recentemente começou a desenhar, sem parar.
— E o que ele tem desenhado?
No lugar de palavras ela me dá provas visuais, dispondo sobre a mesa dúzias de rabiscos em sulfite, todos brilham em vermelho com palitinhos caídos sobre. Leva um curto tempo até que eu associe o vermelho com sangue, os bonequinhos estão sangrando no chão até a morte.
Que porra é essa?
Vou passando as folhas e todas mostram a mesma coisa. Algumas mostram o que parece ser uma senhorinha sentada em uma poltrona enquanto... Isso é um capacete de cabeça pra baixo? Mas tem patas. Uma tartaruga? Um cágado! Isso, um cágado sangra no chão.
— Todos estamos preocupados com esses desenhos, não sabemos o que significa, talvez ele tenha visto um filme de horror ou... — Fixo os olhos em uma especial, a única na qual o bonequinho usa uma roupa, está sendo cor de rosa e com um tutu.
— Uma foto. — Concluo, imaginando da onde viria a origem de seus desenhos. A mulher me encara confusa.
— Ele foi encaminhado para a psicóloga, os dois têm conversado bastante e ele expressou seu desejo de ficar com você. Pelo que soubemos não está vivendo com seu marido no momento.
— Nós tivemos um breve desentendimento, mas já está tudo em ordem.
— Que bom ouvir isso, espero que possamos trabalhar juntos para que Spencer volte a ser o garotinho fenomenal de sempre.
— Com toda a certeza, e o Blake, como está?
— Ele é ótimo, só vive correndo atrás da bola e tentando escapulir pra quadra. — A diretora conta aos risos e se levanta para me guiar até a porta, deixando que eu mantenha os desenhos comigo, antes que eu saia ela julga necessário pedir: — Talvez seja uma boa ideia manter o Spencer afastado do Harry, enquanto não identificamos o problema entre eles.
Meio incerto acabo concordando ao mesmo tempo que a professora surge no corredor correndo atrás de um anãozinho com a fantasia do homem aranha que não tarda em escalar minhas pernas.
Algo no banco de trás me faz dirigir bem mais atento e nervoso que o normal. Olho de um em um minuto o retrovisor para checar se está tudo bem com meu filho preso na cadeirinha no banco de trás, ele sequer percebe toda a atenção, ocupado em assistir ao desenho animado pela televisão acoplada ao banco do passageiro.
Paro a espera do sinal liberar e um carro também para ao meu lado, assim como surge outro na minha frente. Um suor frio brota no meu pescoço ensopando minhas costas, desde Eve eu não consigo relaxar quando tenho um dos meninos no carro sozinho, os meus dedos abandonam a marcha pra envolver o cabo da arma. Apenas a espreita e então o meu coração para quando o som de tiros enche o carro.
Foi um milagre eu não ter sacado a arma e atirado no carro ao lado.
Não se tratava de um ataque. Os outros dois veículos seguiram viagem tranquilamente, o carro do outro lado era de Cheryl e ela sorriu e acenou, Bear também.
E os disparos vieram do maldito desenho de Spencer.
Dobro o pescoço para encontrá-lo gargalhando com toda a inocência do mundo. Nossos olhos se encontram e ele sorri, uma covinha brotando em sua bochecha.
— Eu te amo, carinha.
— Também amo você, carinha. — Devolve só então voltando para os seus desenhos.
Quando passo na minha casa, afim de pegar algumas coisas de Spencer, primeiro preciso lidar com seu ataque quando ele pensa que vai ter que ficar lá; Segundo, encontro Niall flertando com Cams do outro lado da calçada, pelo menos ele está com Sonny, tanto Shae quanto Mona se enrolam nas minhas pernas e eu luto contra a vontade de levar todas comigo. Não há sinal de Harry e eu não procuro por ele.
Com as malas feitas retornamos ao apartamento de Michael, onde almoçamos, tomamos banho e assistimos Discovery Kids até eu sentir vontade de dar um tiro na cabeça, mas é meio que terapêutico ficar jogado no sofá envolto em almofadas e cobertores, bebendo iogurte natural tendo como único preocupação não deixar o pesinho no meu estômago cair no chão.
Assistimos em silêncio, começando a pegar no sono quando Mike chega pra dar fim a ordem. Fazem literalmente anos desde a última vez que ele viu Spencer e quando o encontra na sua sala de estar sua reação não podia ser mais desesperada. Eu chego a me assustar com a forma que ele pula do meu lado, pegando Spencer e falando sem parar, meu filho se anima porque Mike tem um cabelo legal e ele se encanta.
— A última vez que eu te vi você era desse tamanho. — Mostra o dedo indicador pouco afastado do polegar. Spencer acredita — Você sabia que eu sou seu padrinho?
Os dois não se desgrudam mais e a última coisa que associo é a televisão ligada com o Just dance de alguma música da Kesha passando e os dois pulando no centro da sala. Eu rio do quão limitado os movimentos do meu filho são por conta de suas pernas curtas, porém, sou interrompido pelo toque da campainha.
Ando descalço pelo corredor e olho pelo olho mágico antes de abrir a porta para o meu excelentíssimo marido que está no clima pra uma boa briga.
— Cadê o Spencer? — Ruge olhando por cima do meu ombro.
Ele está fenomenal com um sobretudo listrado, cachecol, botas e todo aquele cabelo bonito jogado.
— Ele está bem e vai ficar alguns dias comigo. Eu te deixei um recado.
— Não importa, me dá o meu filho. — Avança para dentro do apartamento e coloco uma mão em seu peito.
— Nosso filho. Como eu disse, o Spencer vai passar alguns dias comigo. — Digo calmo e devagar para que ele entenda — Agora vai pra casa, está tarde e é perigoso ficar por aí.
Harry resmunga, batendo em minha mão.
— Não finja que se importa. — Cruza os braços rente ao peito, repuxando os lábios em um biquinho irritado. Temperamental.
— Eu não preciso fingir nada. — Coloco as mãos nos bolsos para conter o desejo de puxa-lo pela cintura — Eu te amo.
Harry me olha desconfiado, então estica a mão, tocando minhas ataduras. Por um momento eu até acredito que estamos chegando a algum lugar quando Mike e Spencer começam a cantar, reconhecendo a voz, meu marido avança repentinamente com tudo, me empurrando o bastante para correr o corredor e encontra-los na sala.
— Harry. — Escuto Clifford murmurando, desconcertado, Spencer está em seu colo.
Eu temo que ele irá separar a pele dos ossos de Michael, contudo ele o ignora e apenas dá mais alguns passos adiante, estendendo os braços e chamando por Spencer que tem uma expressão estranha, antes de começar a chorar.
— Não, não, não! Papa mau! — Berra como eu nunca ouvi antes, Harry também não parece entender a reação dele.
— Spen, meu amor, sou eu, o papa Hairy, eu não sou mau. — Diz o cacheado com a voz vacilante. O bebê olha atento, como se reconhecesse seu pai, mas ainda reluta em ir com ele.
— Quero fica aqui.
— Você tem que ficar comigo, querido. — Harry dá mais um passo, mas eu o seguro pelo braço, não deixando que ele chegue mais perto ao que Spencer vai ficando mais nervoso.
— Vem, Haz, eu te levo pra casa.
Ele me olha com horror, se desvencilhando e encarando nós três como se presenciasse uma traição, o que de certa forma ele concluiria, mantendo-se calado atravessou a porta, eu fui atrás dele, esperando não encontrar rastro algum seu, mas ele ainda estava ali. Andando de um lado para o outro no corredor.
Fui até ele e quando estava próximo o bastante agarrei sua cintura e deixei que ele me abraçasse apertado, chorando no meu ombro. Seus braços envolveram meus ombros e eu o apertei com mais afinco.
— Por que ele me rejeita? O que eu fiz de errado? — Soluçou entre o pranto incessante.
Massageio suas costas, apenas sentindo o peso da sua dor sobre mim.
— Eu não sei, gatinho, mas logo vai passar. Ele te ama.
— P-Primeiro você, agora ele, eu não posso perde-lo também.
— Você não me perdeu, nós só estamos dando um tempo, foi você quem quis assim.
— Eu quis? Eu não entendo, eu não entendo o que está acontecendo. — O desespero escorre por entre suas palavras, o afasto o suficiente para contemplar seu rosto choroso, seco suas lágrimas e Harry vai se aninhando as minhas mãos.
— Você precisa descansar, me deixe te levar pra casa.
Ele assente.
O caminho até nossa casa é silencioso, a noite é fria e nublada e eu deveria ter calçado meus sapatos. Adentro nosso bairro parando em frente a grande casa antiga, uma luz do segundo andar está ligada.
— Sua mãe ficou com o Blake? — Harry balança a cabeça, também concordo, batucando os dedos no volante.
— Assim que o Spencer quiser eu o trago, na mesma hora. — Digo, mas ele continua cabisbaixo e perdido em si mesmo — E sobre o Mike ele...ele só está sendo um bom amigo, não existe mais nada entre nós. Você sabe que eu me arrependo do que fiz e...
Subitamente o sinto tocar minha mão e sem explicações a coloca por debaixo do suéter que está vestindo. Depois do que parecem anos, estou, enfim, tocando nosso bebê.
Harry está beirando os três meses ainda, sendo recente demais para que eu possa sentir qualquer movimento do feto, mas isso, esse pequeno gesto significa tanto. Aos poucos ambos vamos relaxando e ele permite que eu desenhe espirais ao redor do seu umbigo, admirando cada pequena reação sua.
— Eu preciso entrar. — Diz quase meia hora mais tarde, me inclino sobre ele para abrir a porta recebendo sua respiração ofegante em meu pescoço. Caso eu quisesse poderia travar essa porta, mandá-lo para o banco de trás e fode-lo como eu quiser, mas é estranho concluir que eu só o quero na cama, dormindo profundamente.
Volto para o meu lugar, ignorando sua expressão perdida.
— Boa noite, Lou.
— Boa noite, Haz. — A porta bate e de canto de olho o assisto entrar em casa.
Quando chego no apartamento de Clifford, tanto ele quanto Spencer estão dormindo no sofá, ambos roncando feito tratores. Levo meu filho até o meu quarto onde o seu cercadinho está montado e repleto de seus travesseiros, bichinhos e cobertas, trazê-lo foi um truque de mestre. Ele espera até que eu esteja saindo do quarto pra pedir a mamadeira e lá vou eu, só depois de alimentar a minha cria, volto para sala onde tomo Mike nos braços até o seu quarto, ele continua tão organizado e meticuloso como sempre foi, assim que seu corpo toca o colchão ele começa a se remexer, esse cara se mexia mais do que um peixe fora d'água durante o sono.
Num desses movimentos sua camisa acabou por se embolar alguns centímetros acima do estômago e esse mínimo de pele foi estranho de se ver, por vezes eu acabo esquecendo o que aconteceu e que sim, eu já vi muito mais do que isso, que nós de fato fizemos coisas que um homem casado não deveria fazer, principalmente com o melhor amigo do seu marido.
Como eu não quero me perder em pensamentos que não valem o meu tempo rumo para o meu quarto onde depois de uma hora inteira olhando para o teto eu consegui adormecer bem lentamente.
Perdido no reino dos sonhos uma sensação deliciosa me envolve quando sinto um peso sobre mim. Quente e macio deslizando sobre o meu peito para sugar um beijo molhado no meu pescoço, minhas mãos deixam de ser imóveis ao lado do meu corpo para ir até debaixo dos cobertores envelopar o par de pernas firmes ao meu redor. Ele está completamente nu.
Sua boca toca o centro da minha garganta e o cabelo faz cócegas no meu nariz. Abro os olhos a tempo de captar o loiro.
— Eu sabia que você ainda me queria. — Mike solta antes de atacar meus lábios em um beijo intenso, exatamente como no passado. Não, eu não posso. Ele se afasta minimamente tocando a minha franja, sob a luz do luar ele soa angelical e tentador — Eu sou o seu melhor erro.
As palavras formigam na minha garganta, incapazes de encontrar libertação.
Tomo um fôlego profundo e então a meu pescoço é rudemente agarrado, o atrito dos metais gelados causam arrepios em cada uma das minhas vértebras.
Ele é alto, esguio e tem cabelos longos que caem por seus ombros nus. Minhas unhas se apertam em suas coxas.
— Mas eu sou tudo o que você quer, tudo o que você ama, tudo o que você é. — Harry sussurra, apertando com mais força, ao mesmo tempo que arqueia os quadris e senta perfeitamente no meu pau. Oh sim. Cavo as unhas até agarrar sua bunda.
O cacheado morde os lábios recheados satisfeito e se move, quicando no meu colo.
Vou me deixando levar pelo calor sufocante ao redor do meu pescoço e pela sensação de sua pele se apertando entre meus dedos, até que a pressão em meu pescoço aumenta em 50% e é frio como gelo, levo as mãos até ele sentindo o metal trançado.
Correntes.
Ele me puxa e eu dou de cara com Aaron que agarra meus cabelos ofegando próximo ao meu ouvido:
— Você é tão sexy, senhor policial.
O agarro pelo cintura e inverto as posições, o deixando contra a cama, mas aconteceu de novo. A mudança.
Zayn tem aquele olhar presunçoso de sempre, como se fosse o rei do maldito mundo e bom demais pra mim. Diferente dos outros ele está vestido, exatamente como hoje, mas com a diferença de que ele está na minha cama, seus braços estão abertos e idêntifico de relance um brilho prateado em seus pulsos. Algemas.
— Por que as algemas?
Ele ri como se eu tivesse contado alguma piada.
— Esse é o único jeito de me ter. — Responde puxando as mãos, provando que não existe escapatória — Você me pegou.
— Eu não...
Deus, ele é tão bonito!
Me curvo para beija-lo, os lábios macios, quentes e entregues.
Tem algo de errado, o Zayn de agora não seria quente nem se o lançassem em uma fogueira.
Sinto uma presença pairando atrás de mim. Beijos delicados vão tomando cada centímetro das minhas costas e então está me empurrando na cama, por algum milagre Malik está livre e eu tomei o seu lugar, com as algemas me aprisionando. Harry senta no meu peito e esconde o rosto no meu pescoço.
Então ele morde.
Não uma mordidinha leve e sensual, mas sim uma mordida de verdade que me causa uma dor horrível. Tento me libertar sem sucesso. Mike surge as costas do meu marido, me levando para dentro dele, e a morbidez só aumenta com seus sorriso satisfeito com dentes e unhas afiadas como ele não costuma ter normalmente.
Suas unhas que agora formam garras correm pelas coxas de Harry, criando filetes de sangue que escorrem por sua derme, mas ele não parece se incomodar e me morde mais vezes.
Sinto algo tocando minha ferida na perna e mergulhando o dedo dentro. O grito que dou é bloqueado pelo beijo que Harry me dá, a sua boca está úmida e com um gosto diferente, só quando ele se afasta vejo o sangue colorindo sua boca e o queixo.
Fecho os olhos, sentindo dentes, unhas e rosnados por toda a parte enquanto a dor só vai aumentando, aumentando, aumentando... Até que eu desperto, ofegante e suado, com o coração em disparada.
Afasto alguns fios úmidos dos olhos e tento acalmar minha respiração.
Spencer está dormindo calmamente em seu berço improvisado, as janelas e portas estão fechadas, sem sinal de Michael, Harry, Aaron ou Zayn. Não há ninguém aqui.
Bem, é o que eu penso.
Olho pro chão, diante da janela onde a luz da lua entra em abundância pelo quarto, uma silhueta enorme só cresce. Vou subindo os olhos, é escuro, alto e com cabelos longos.
Ele dá um passo a frente.
Vejo seu rosto.
— É bom te ver de novo, Louis. — Lucian diz se aproximando mais e mais — Gostou do sonho que te dei? Foi feito com muito carinho.
Embora o cabelo esteja diferente, ele permanece igual, com a mesma expressão congelada de olhos vazios e sorriso amedrontador.
— Isso não é verdade. Você não está aqui. — Digo ansioso, esfregando os olhos na esperança de que ele desapareça, vou me forçando a acordar, a despertar daquele transe.
Não é real.
Não é real.
Não é real.
Sinto o ar quente tocando minha têmpora.
Despedaçado o encaro, sem entender porque ele não vai embora.
Seu rosto se parte em um sorriso demoníaco.
— Quando eu acabar você vai implorar.
— Pelo que? — Soluço.
Lucian toca meu peito, me deitando.
— Pela dor, Louis, você vai ficar viciado nela.
Fecho os olhos e sendo verdade ou não, eu sinto tudo.
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