⁷|Isso não é uma regra, é um fato
Eu nunca tive um namorado na adolescência. Estudei em um colégio só para garotas, então as únicas chances de poder ficar com um garoto, era nas festas que mamãe dava ou as outras que éramos obrigados a comparecer. Eu tive meu primeiro beijo em uma delas. Não foi ruim, mas facilmente esquecível se não tivesse sido o meu primeiro.
Quando fui para a faculdade, porém, eu me libertei. Fiz amigos, ia a festas e uma vez fiquei com três garotos numa só noite. Foi o meu maior recorde e eu estava feliz com essa vida de baladeira, até que eu o conheci. Foi em um barzinho, eu já estava pra lá de bêbada e um homem estava dando em cima de mim, minhas palavras saiam emboladas e eu estava tentando afastá-lo, quando ele surgiu.
— A moça disse não — foram suas palavras ao empurrar o homem bêbado para longe.
Quando olhou para mim, eu não lembrava mais de como fazer minhas pernas funcionarem ou explicar a palpitação em meu coração. Ele parecia um anjo: cabelos loiros e os olhos azuis. Não ficaria surpresa se surgisse uma auréola sobre sua cabeça e asas em suas costas.
Pois é, eu estava bêbada assim.
Eu não recebi nenhum aviso que, ao aceitar sua carona e lhe dar meu telefone, eu estaria cometendo o maior erro da minha vida ou que aquilo fosse resultar em algo tão lindo.
Agora, eu encaro aquele mesmo homem que me deu o que eu mais amo na vida, mas que deixou meu coração em pedaços no processo.
— Bom ver você, Tobias. — Estou ciente de Eros ao meu lado, seu braço mais uma vez em minha cintura. Eu nem lembro de tê-lo visto se mover.
Não, minha concentração está em não desmaiar agora mesmo.
— Então continuamos fingindo que não odiamos um ao outro? — Deus, até sua voz ainda é igual… Não que eu esperasse que seis anos fosse mudar algo nele, mas é como olhar para o meu passado e encontrá-lo perfeitamente como me deixou.
— Você só sabe fingir, então não se incomode em mudar por minha causa — responde Eros, o tom afiado.
Tobias ri, o som me causando um arrepio desagradável.
— Genevieve? — Não é Eros quem diz meu nome porque meu nome em sua voz não faz com que uma sensação oleosa se espalhe pela minha pele. — Não vai cumprimentar um velho amigo?
Controle-se. Controle-se. Controle-se.
— Tobias, quanto tempo. — Forço um sorriso, sentindo um desconforto em meu estômago. Pelo seu sorriso de cobra, ele sabe o que está fazendo comigo.
— Vocês se conhecem? — Eros pergunta, surpreso.
Digo antes que Tobias possa:
— Estudei em Oxford também, lembra? Tobias e eu nos esbarramos uma e outra vez. — Dou de ombros, a mentira pesando em meus ombros e deixando um gosto ruim na minha boca.
Os olhos de Tobias brilham com malícia perversa quando ele ouve a mentira. E agora eu dei a ele algo para usar contra mim se quiser, pois nós dois sabemos que não nos esbarramos nem uma, nem duas vezes.
— Então, estão noivos — diz, sua atenção indo para minha mão que segura a taça, vendo o anel e depois para a mão de Eros em minha cintura.
— Isso aqui é uma festa de noivado, o que você acha? — É claro que é Eros quem diz isso.
— Sabe, primo, esqueci o quanto você é agradável.
— Fico sempre feliz em lembrar.
Um silêncio desagradável rodeia nosso pequeno grupo e eu me pergunto se podem ouvir as batidas aceleradas do meu coração, se Eros consegue sentir cada batida ecoando por meu corpo enquanto eu aguardo o próximo passo de Tobias. Ele irá contar a verdade?
Essa pergunta deve estar brilhando em meus olhos, pois o sorriso de Tobias fica ainda mais maligno.
Mas ele apenas diz para mim:
— É sempre um prazer vê-la. — E nos dá as costas.
— Idiota — Eros murmura.
Dou-me três segundos para fechar os olhos e respirar. Não havia percebido que minha outra mão estava sobre meu estômago.
— Você está bem? — Eros pergunta ao meu lado quando abro os olhos.
— Sim, por quê? — Franzo as sobrancelhas, fingindo não entender sua preocupação. — Acho que eu subestimei minha habilidade de socializar pois essas pessoas estão sugando toda a minha energia.
Eros ainda está me olhando desconfiado quando Anthony, que estava calado até agora, interrompe.
— Eu realmente odeio ser o portador de notícias ruins, mas vocês têm mais convidados desagradáveis.
Eros e eu seguimos o seu olhar. America e Noah estão caminhando em nossa direção, tendo acabado de chegar.
— Quem foi que abriu as portas do inferno? — Eros diz entredentes.
— Você é o diabo, deveria saber — murmuro, ganhando um aperto. Ele parece ter ficado muito confortável em me segurar. — Qual o plano? Ser agradáveis ou perversos?
— O último, é claro.
Lanço a ele um sorriso que promete caos, por um momento me permitindo esquecer o problema chamado Tobias.
— Genevieve, Eros, é um prazer vê-los juntos outra vez. — A voz de America é doce, mas não me deixo enganar.
Sorrio de volta para ela.
— Que bom que vieram. Mal tivemos tempo de conversar da última vez — digo, fingindo não notar o olhar de Noah em meu corpo. Eros, porém, fica tenso ao meu lado.
— Sim. Sentimos que não fomos muito agradáveis com você no último encontro. Queríamos pedir desculpas e desejar parabéns — America continua, desviando rapidamente sua atenção para o homem ao meu lado.
— Não se preocupe com isso, querida. Agradável é um termo raramente usado no nosso meio social mesmo. — Dou de ombros, rindo um pouco. O insulto, claro, não passa despercebido.
— "Nosso"? — Noah arqueia a sobrancelha. — Pelo que sabemos, você foi praticamente excluída do nosso meio social pelo seu pai.
Uma pergunta e uma alfinetada.
— Pelo visto passou seu tempo pesquisando sobre a minha noiva, Noah — Eros finalmente diz alguma coisa. — De volta aos velhos hábitos?
A risada de Noah é desagradável, assim como seu sorriso.
— Apenas ficando por dentro de tudo.
— Oh, com certeza você ficou por dentro de alguma coisa — murmuro propositalmente, e é claro que todos ouvem. O sorriso falso de America vacila.
— De fato, ser agradável não é algo que todos conseguem. — O sorriso de Noah é mais apertado, mas ele não deixa a máscara cair.
— Você deve estar por dentro disso também, eu imagino — devolvo.
Mais uma vez, aquela risada nada calorosa.
— Você é uma coisinha interessante. — Quase vomito com o interesse descarado em seu olhar, como se sua noiva não estivesse bem ao seu lado. America, por sua vez, parece gostar tanto do comentário quanto eu, franzindo as sobrancelhas.
— Foi assim que ele a conquistou? — Arqueio uma sobrancelha para ela. — Achei meio decadente.
— Se eu tivesse tentando conquistá-la, garota, você certamente estaria ciente — a resposta cortante de Noah me diz muito sobre o seu ego ferido.
Acho que Eros está há um passo de voar no pescoço do ex-melhor amigo, mas eu o abraço, fingido afeto quando na verdade estou tentando contê-lo.
— Dispenso a proposta. Por que eu iria querer o bronze se eu tenho o ouro?
Como se eles não fossem nada, viro-me para Eros, que está me encarando. Seu rosto não revela nada, mas vejo um brilho diferente em seus olhos.
— É a nossa música! Vamos dançar, por favor?! — pergunto quando No One Can Fix Me começa a tocar.
Antes que ele tenha a chance de revirar os olhos e recusar, puxo sua mão na direção da pista de dança improvisada. Seus olhos são desafiadores, mas eu sorrio o mais docemente que posso. De fato, ele revira os olhos, mas vem comigo.
Quando chegamos a pista de dança e nos posicionamos para começar a dançar, é que percebo todos nos olhando.
— Urgh, talvez isso não tenha sido uma boa ideia — murmuro.
— Eu deveria estar surpreso por você mais uma vez tomar uma decisão impulsiva? — Sinto suas mãos em minha lombar, segurando-me. Quase não há espaço algum entre nós quando passo os braços por seu pescoço.
— Eu estava improvisando — resmungo, mas começo a me mover com Eros. Eu nem sequer sabia que ele dançava. Outro golpe de sorte.
— Pare de olhar para eles. — Ele me aperta, enfatizando o comando e eu volto meus olhos para ele, fuzilando-o antes de forçar um sorriso, lembrando-me que estamos sendo observados.
— Pare de mandar em mim! — digo entredentes.
— Ah, mas você gosta tanto — ronrona, enviando malditos arrepios por minha pele.
— Suas suposições em relação a mim são mesmo preocupantes — tento manter um tom desinteressado, mas seus olhos observam meus brancos, os pelos arrepiados.
— Está com frio? — murmura. Abro a boca para dizer que definitivamente sim, quando ele pega minha mão e sem aviso prévio, gira meu corpo.
Ainda estou atordoada quando Eros me puxa de volta, mas minhas costas acabam coladas em seu peito.
— Talvez eu devesse aquecê-la, o que acha? — murmura em meu ouvido enquanto continuamos dançando assim. — Conheço uma ótima maneira de produzir calor corporal.
Minhas bochechas devem estar atingindo um forte tom de rosa, mesmo que eu me recuse a reconhecer o frio em minha barriga.
Eros dá a volta por mim, ficando em minha frente outra vez e conduzindo nós dois tranquilamente, apesar dos seus olhos brilharem.
Ponho a mão em seu peito, buscando manter alguma distância enquanto ordeno ao meu coração que pare de bater tão rápido. Como se fosse fácil assim.
— Acho que devíamos estabelecer algumas regras — consigo dizer finalmente.
— Ah? Sou todos ouvidos, amor. Nada de algemas? Eu também não gosto, na verdade, irritam minha pele. Mordaças? Chicotes?
Aperto seu ombro com a outra mão e ele sorri, me provocando.
— Isso — faço um discreto sinal entre nós — não é real.
Eros estala a língua.
— Isso não é uma regra, é um fato.
— Ótimo. Espero que se lembre disso depois.
Sem aviso, eu cubro sua boca com a minha.
É um beijo tímido no início, faz tempo que eu não beijo alguém, mas Eros, maldito seja, não perde um segundo ao me segurar firmemente contra si e me beijar de volta. Como tudo com ele é uma exigência e uma ordem, sua língua exige que eu o deixe aprofundar o beijo e maldita seja eu, mas lhe dou essa abertura, suspirando quando nossas línguas se enroscam uma na outra.
Eu mal percebo que paramos de nos mover quando sua mão segura minha nuca, mantendo-me colada a ele, a outra mão um aperto sólido em minha cintura. As minhas estão em seu peito e seguro seu blazer, querendo puxá-lo mais para perto...
Não, não, não. Você o beijou apenas para tirar aquele sorriso arrogante de seu rosto, você não pode estar gostando disso. Não pode!!!!!
Mas eu quase me desfaço em seus braços quando Eros segura meu lábio entre seus dentes, antes de deixar beijinhos em minha boca.
Porra, o homem sabe beijar.
Tento, sem sucesso, não me mostrar abalada quando nos afastamos. Eu ignoro completamente as pessoas aplaudindo como se tivéssemos dado algum show. Eu imagino que sim, a música parou há muito tempo e tem apenas nós dois na pista de dança.
Minhas bochechas ficam rosa.
— Deveríamos sair daqui — murmuro, afastando-me completamente dele, esperando que ninguém tenha notado o gesto abrupto.
Eros não diz nada, mas segura minha mão quando deixamos a pista de dança.
— Eu… — gaguejo. — Eu vou ao banheiro. — Então tento não parecer uma fugitiva ao me afastar dele outra vez.
❦︎
Estou ignorando Eros há um hora, apesar de constantemente sentir seus olhos em mim. Não devolvi nenhum olhar, fingindo estar muito entretida em alguma conversa.
Então continuei aceitando o champanhe e dando sorrisos, assim como falsas histórias sobre a minha história de amor com o homem que agora eu ignoro.
O que aconteceu naquela pista de dança foi o famoso "o feitiço vira contra o feiticeiro". Eu queria abalar Eros, mas sou eu que ainda sinto seus lábios contra os meus e de como foi ter seu corpo musculoso e forte contra o meu, segurando-me como se eu fosse sua. Eu deveria tê-lo tocado, sentindo a sensação dos seus cabelos e ouvir o som que ele faria quando eu os puxasse…
Não. Você nem deveria estar pensando nisso, Genevieve!
Claro, claro. É o champanhe, não estou acostumada a beber tanto.
Vou ao banheiro outra vez, precisando dar algumas batidinhas com a água em meu rosto.
Estou fechando a porta quando ela é empurrada contra mim e eu cambaleio, deixando assim o espaço livre para o invasor entrar.
Uma parte idiota minha espera que fosse Eros, querendo repetir aquele beijo, me jogar contra a parede e tudo, mas seus cabelos não são loiros e nem seus olhos, azuis.
Tobias sorri como um lobo ao fechar a porta e se encostar na mesma, bloqueando qualquer chance que eu tinha de sair.
— "Nos esbarramos uma e outra vez"? — Pergunta, fingindo estar ofendido. — É assim que você chama os quatro meses que ficamos juntos?
Fecho minhas mãos em punho ao lado do meu corpo, mas minha voz é firme quando digo:
— Saia. Agora.
Tobias ignora meu pedido, cruzando os braços sobre o peito. Ele não é tão alto, nem tem tantos músculos quanto Eros, mas isso não diminui a sua beleza. Não, ele é tão bonito quanto Noah, mas sua beleza é mais inocente, feita para enganar o lobo por baixo da pele de cordeiro.
— Como ela está? — Tobias pergunta, olhando para minha mão sobre minha barriga, como se lembrasse daquele dia que contei a ele. Estávamos exatamente assim e ele me mandou embora depois de me humilhar.
— Não é da sua conta.
— Confesso que eu fui um pouco… relutante em aceitar, mas agora estou pronto para recuperar o que é meu.
— O que é seu? Ela não é nada sua! — praticamente grito, avançando um passo em sua direção, mas só.
— Não foi o que você alegou há seis anos quando disse que estava grávida de um filho meu. — Tobias arqueia a sobrancelha, me desafiando a contradizê-lo. — Fiz algumas pesquisas e descobri… Freya, não é? Seu nome.
Preciso me segurar no mármore da pia para não cair. Não há como ele saber o nome dela. Nem mesmo sei se meu pai se lembra do nome da neta. Eu não tenho redes sociais, não participo de eventos públicos, então não estou na mídia. Mesmo esse noivado falso com Eros não revela nada sobre Freya. Para ele saber…
— Você tem… tem me espionado? Me seguido? — Olho para ele com os olhos arregalados.
— Não seja tão dramática. Você só não é tão discreta quanto acha. — Dá de ombros. Deus, acho que vou vomitar.
— Fique longe de mim, fique longe da minha filha! — Se eu tivesse uma faca comigo, certamente o ameaçaria com ela, mas como não tenho, minhas palavras terão que bastar. — Ou eu juro que…
— O quê? Seu noivo não poderá fazer nada já que ele não sabe, não é? — Uma risada sombria. — Eu já posso imaginar a reação dele… Eros tem uma obsessão doentia por lealdade e confiança, e quando ele souber que a noiva escondeu dele que o primo que ele detesta é pai da filha dela…
— Cale a boca! — Atiro um porta-sabonete nele, que se parte em pedacinhos ao seu lado na porta. Ele nem pisca.
— Espero que ela não tenha herdado esse seu temperamento horrível. — Tobias faz uma careta. — Enfim, eu queria apenas avisá-la: eu vou lutar pelo que é meu.
— Se você ousar tentar tirá-la de mim, eu mato você — assim que as palavras deixam meus lábios, eu percebo a verdade que elas carregam. Ninguém ficará entre minha filha e eu, e se o preço disso for cometer assassinato, farei com prazer, principalmente se for Tobias quem eu irei matar.
O homem em questão apenas sopra um beijo para mim.
— Darei notícias em breve. — Ele vai embora depois disso.
❦︎
Volto para a festa, minhas bochechas doendo com o esforço de manter o sorriso no rosto ou prestar atenção em uma conversa. Antes eu não estava alegre ao fazer isso, mas estava achando divertido pelo menos, agora… Eu não posso culpar Eros por odiar.
Falando nele, sinto sua mão em minhas costas antes de seu rosto surgir em meu campo de visão.
— Fugindo de mim, amor? — pergunta, mas seu sorriso se desmancha quando estuda meu rosto. — O que houve?
Pergunto-me se meus olhos estão vermelhos dos minutos que chorei no banheiro, mesmo que eu tenha retocado a maquiagem e treinado uma expressão suave no espelho. Eu sei que não há vestígios de vômito também pois cheguei a privada a tempo e lavei bem a boca depois.
E não há como ele saber de nada disso, então digo:
— Nada. Só estou cansada e acho que bebi demais. — Não é mentira. De fato, minha visão está começando a ficar turva e eu mal consigo me manter em meus saltos.
— Por que não disse antes? — Ele segura minha mão, franzindo as sobrancelhas. — Você está gelada.
— Eu não queria estragar a festa. — Encolho os ombros, puxando minha mão de volta.
Observo sua mandíbula tensionar, mas ele anue.
— Vou avisar aos meus pais que estamos indo.
Queria ser altruísta o suficiente para dizer a ele que posso aguentar mais alguns minutos, mas não sou, então anuo também.
Vou com ele, pelo menos, não querendo ser rude com seus pais ao sair sem me despedir. Apesar de nem Eros nem eu estivéssemos esperando por uma festa, foi gentil da parte deles. Na verdade, Kate estava certa, eles são realmente adoráveis e não houve um segundo que duvidei do amor deles, pois Enrico sorri para tudo que a esposa diz, como um completo apaixonado, tratando-a como a rainha que ela merece ser tratada, pois em pouco tempo em sua presença, também percebi como ela é incrível.
Depois que nos despedimos deles — eu me desculpando por um mal estar — Eros nos conduz para a saída, até o carro.
Antes de chegarmos ao veículo, porém, sinto algo em meus ombros. Olho para cima, para ver Eros colocando seu blazer em meus ombros.
Penso em dizer que não precisa, mas desisto.
— Obrigada — digo ao invés da recusa.
Harold, que saiu do carro ao nos avistar, abre a porta do veículo para nós. Entro, indo para o canto. Quando Eros se acomoda, o assento do meio paira entre nós.
Eu apenas fecho os olhos ao encostar com a cabeça na janela, ciente de Eros dizendo a Harold para irmos para o meu apartamento.
O caminho até lá é silencioso.
❦︎
Uma mão gelada em minha bochecha me faz abrir os olhos. Encaro a luz amarela do poste do outro lado da rua. Ele nem sempre funciona e até fico surpresa por estar aceso hoje. Deve ser um bom sinal. De quê, eu não sei.
Viro o rosto, encontrando olhos escuros encarando-me de volta. Meus olhos fazem um curto trajeto até sua boca, seus lábios nem muito finos, nem muito cheios. Perfeitos.
Sei que disse a última palavra em voz alta quando eles se curvam em um sorriso que beijei mais cedo.
— Vamos lá, ratinha, a não ser que queira dormir aqui, é melhor sair — Eros diz, ignorando o que eu disse antes, apesar do seu sorriso permanecer.
— Tão encantador — resmungo quando ele já está saindo.
Eros me ajuda a sair do carro, provando pela primeira vez que sabe ser cavalheiro.
— Jesus, quanto champanhe você bebeu? — pergunta quando eu oscilo e ele precisa me segurar.
— Pouquinho. — Mostro a ele meu polegar e meu indicador próximos um do outro com um pequeno espaço entre eles.
— Imagine se tivesse sido muito. — Eu o ouço murmurar.
Resmungo alguma coisa para ele e seguro seu braço ao me inclinar para tirar meus saltos. Suspiro de alívio ao sentir o chão gelado e sujo, estranhamente melhor do que os saltos que estavam machucando meus pés.
Começo a andar depois disso, empurrando o portão inútil do meu prédio e subindo os degraus, usando a parede como apoio. Bocejo, cogitando a ideia de dormir nos degraus.
— Não acho que seja uma boa ideia — Eros diz atrás de mim quando eu mais uma vez deixo escapar meus pensamentos. — Você iria acordar sem nenhum pertence no corpo.
Dou risada, porque é verdade. Não que haja muito para roubar além desse anel deslumbrante em meu dedo.
No segundo andar, faço uma pausa. Sinto que estou esquecendo alguma coisa…
Bato na minha própria testa, virando-me para Eros.
— Precisamos pegar a Freya — não sei porque digo isso no plural ou porque Eros continua me seguindo.
— Por isso eu não tenho filhos — ele resmunga. — Fique aqui.
Pela primeira vez, eu o obedeço sem pestanejar e observo os músculos das suas costas se contrairem sob o terno.
Eros bate na porta do apartamento de Kevin e nós esperamos meu amigo abrir. Eu não sei que horas são, mas espero não ser tarde. Kevin trabalha cedo amanhã e é por isso que não pode ficar com Freya pelo resto da noite.
Meu amigo abre a porta, olhando uma vez para Eros e depois para mim, encostada na parede com meus saltos e minha bolsa em mãos.
— A noite foi boa, suponho…? — Kevin pergunta com um sorrisinho.
— Fiquei bêbada pela primeira vez em anos… Não vejo isso como algo bom — digo a ele, que ri.
— Ela está no sofá, dormindo.
Oh, Freya. Suspiro, afastando-me da parede para ir pegá-la, mas Eros entra no apartamento antes que eu possa.
Kevin ergue as sobrancelhas para mim e eu desabo contra a parede outra vez. Eu ouvi e vi Eros interagindo com Freya ontem e hoje, ele foi legal, gentil até e porque sei disso, além de conhecê-lo há anos, deixo que ele pegue minha filha.
Os dois surgem um minuto depois, uma Freya adormecida nos braços grandes demais de Eros. Ela parece tão pequena e frágil. Ele a segura com cuidado e uma parte… uma parte minha que não sei identificar, acha a cena fofa o suficiente para fazer meu coração doer.
Kevin entrega a Eros a mochila de Freya e se despede de nós. Eu agradeço ao meu amigo pela segunda vez, que me dispensa.
Eu subo na frente, a mão de Eros agora em minhas costas para me equilibrar quando eu quase tropeço.
Chegamos ao meu andar sem acidentes e eu demoro algumas tentativas antes de conseguir abrir a porta do apartamento. Dou um passo para trás, deixando Eros entrar e depois jogo meus saltos e minha bolsa no chão, fechando a porta em seguida.
É engraçado como fizemos tudo isso como se já tivéssemos repetido essa cena mil vezes antes. Chega a ser… aconchegante.
Eu nunca mais vou beber champanhe.
Vou até o quarto de Freya, acendendo a luz e Eros entra atrás de mim. Tiro os brinquedos dela da cama e puxo os cobertores.
Com um cuidado que definitivamente faz meu coração chorar um pouco, Eros põe Freya na cama. Ela se mexe um pouco, mas felizmente não acorda. Eu lhe cubro com sua coberta do Homem-Aranha, dando um beijo em seus cabelos em seguida.
Eros e eu saímos do quarto depois que apago a luz, fechando a porta atrás de mim.
— Obrigada — digo baixinho, mordendo o lábio enquanto uso a porta atrás de mim como apoio.
— Ao seu serviço, amor — Eros diz baixinho, seus olhos em minha boca.
"Amor". Ele sempre usou esse apelido, desde o primeiro dia na empresa. Eu nunca perguntei o porquê e não vou começar agora, mas… mas mexe comigo. Um pouco. Com certeza é apenas uma palavra para ele, assim como o beijo deve ter sido só um beijo. Não que não tenha sido só um beijo…
— Você deveria ir embora agora — digo de repente.
— Não mereço nem um convite para dormir aqui? — Eros finge uma cara triste.
— Não.
— Ai. — Leva a mão ao coração. — Estou profundamente magoado. — Não digo nada. — Nem um beijo de boa noite?
— Parece que você está um pouco desesperado para quem alegou que nunca desceria ao meu nível — apesar das palavras, meu coração acelera as batidas diante de sua proposta.
— Caridade, amor. Isso se chama caridade
— Continue dizendo isso a si mesmo quando sonhar comigo essa noite — sussurro, passando por ele para abrir a porta.
Não dou nem dois passos antes que Eros me detenha, segurando meu braço.
Eu paro, sentindo quando ele se coloca atrás de mim, como na hora da dança.
— Eu vou sonhar, sim — ele sussurra, seus lábios roçando meu ouvido. — E depois, amor, você irá realizar cada sonho meu.
Eros mordisca minha orelha, o ato terminando antes mesmo de começar quando ele se afasta, indo até a porta, abrindo e indo embora, sem nem mesmo me dar um último olhar.
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Então, esse capítulo confirmou suas suspeitas?👀
Gostaram desse primeiro beijo? Confesso que fiquei meio hesitante em colocá-lo nesse capítulo — estar indo rápido demais e tal — mas espero que tenham gostado!
E o que foi essa cena do Eros pegando a Freya no colo? Foi tão-----😍✨♥😭🤧🌹
Enfim, até terça-feira ♥
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2bjs, môres♥
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